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28 de Maio de 2024
  • 2º Grau
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Tribunal de Justiça de Minas Gerais
há 10 meses

Detalhes

Processo

Órgão Julgador

4ª Câmara Cível Especializada

Publicação

Julgamento

Relator

Des.(a) Alice Birchal

Documentos anexos

Inteiro TeorTJ-MG_AI_23001560920218130000_89b87.pdf
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Inteiro Teor

Número do XXXXX-9/001 Númeração XXXXX-

Relator: Des.(a) Alice Birchal

Relator do Acordão: Des.(a) Alice Birchal

Data do Julgamento: 04/08/2023

Data da Publicação: 04/08/2023

EMENTA: AGRAVO DE INSTRUMENTO - AÇÃO ORDINÁRIA - LEGADO - REVOGAÇÃO - PRELIMINARES - INADMISSIBILIDADE - INOVAÇÃO RECURSAL - ILEGITIMIDADE ATIVA - AUSÊNCIA DE INTERESSE DE AGIR - PRESCRIÇÃO - DECADÊNCIA - INOCORRÊNCIA.

- Em observância à tese das taxatividade mitigada do art. 1.015 do CPC, a decisão saneadora que analisa questões de ordem pública é recorrível por meio de Agravo de Instrumento.

- Argumentos apresentados em sede de contestação e em fase recursal não caracterizam inovação recursal.

- É possível a cessão de direitos hereditários sobre bens do inventário, devendo se observar a forma prescrita da escritura pública.

- A contagem do prazo decadencial/prescricional aplicável a eventual pedido de revogação do legado inicia-se a partir do descumprimento das obrigações estabelecidas no testamento.

AGRAVO DE INSTRUMENTO-CV Nº 1.0000.21.230014-9/001 - COMARCA DE JUIZ DE FORA - AGRAVANTE (S): SANTA CASA DE MISERICÓRDIA DE JUIZ DE FORA - AGRAVADO (A)(S): ALENCAR AUGUSTO TRISTAO

ACÓRDÃO

Vistos etc., acorda, em Turma, a 4a Câmara Cível Especializada do Tribunal de Justiça do Estado de Minas Gerais, na conformidade da ata dos julgamentos, em REJEITAR AS PRELIMINARES SUSCITADAS PELA

PARTE AGRAVADA E PELO ÓRGÃO MINISTERIAL E, NO MÉRITO, NEGAR PROVIMENTO AO AGRAVO DE INSTRUMENTO.

DESA. ALICE BIRCHAL

RELATORA

DESA. ALICE BIRCHAL (RELATORA)

VOTO

Trata-se de Agravo de Instrumento interposto pela Santa Casa de Misericórdia de Juiz de Fora contra decisão proferida pelo Juízo da Vara de Sucessões, Empresarial e de Registros da Comarca Juiz de Fora que, nos autos da Ação Ordinária ajuizada por Alencar Augusto Tristão, rejeitou as preliminares de ilegitimidade ativa e falta de interesse de agir, afastou a prejudicial de mérito de prescrição e decadência e deferiu a produção de prova testemunhal e depoimento pessoal.

A Agravante sustenta que o Autor não possui legitimidade para propositura da ação de origem, que visa a revogação de legado instituído em seu favor, por ser parente colateral de 5º grau do Testador e não ser considerado herdeiro legítimo deste.

Alega que a Escritura Pública Declaratória de Cessão de Direitos hereditários feita por Custódio Silveira Tristão em favor do Autor não atende a nenhum dos requisitos de validade do negócio jurídico, é nula e não pode sustentar a decisão agravada, em razão do Cedente não ser titular de direitos hereditários do Testador, tampouco legatário do testamento de Cícero Tristão.

Aduz a ausência do interesse de agir do Autor e argumenta que o Agravado jamais poderia ser herdeiro do Testador, seja pela absoluta impossibilidade legal perante ordem de vocação para sua sucessão válida, seja em decorrência da cessão de direitos hereditários, via escritura pública respectiva que não abriga objeto possível e, ainda, por não ser possível transmitir a condição de herdeiro.

Aponta que decorreu o prazo prescricional para o exercício do suposto direito do Agravado e que desde a data do Registro Cartorário do Legado, efetuado em 28/08/1969, lhe foi assegurada a chancela legal da publicidade e da consolidação real da propriedade do imóvel legado, bem como garantia da inquebrantável segurança jurídica em seu favor e da propriedade, devendo a referida data ser considerada como marco inicial para a contagem da prescrição vintenária, protetiva dos atos jurídicos realizados e que incide in casu.

Afirma que decaiu o direito material do Agravante e argumenta que, desde a data da adjudicação dos legados apostos no testamento, iniciou-se o prazo decadencial para que os legitimados, como Legatários e o Testamenteiro pudessem, se fosse o caso, exercer pretensos direitos relativos ao legado que lhe foi deixado.

Ao final, pugna pela atribuição de efeito suspensivo ao recurso e, no mérito, pelo seu provimento para acolher as suas razões recursais e extinguir o feito.

Distribuído o feito ao ilustre Des. Adriano Mesquita Carneiro, nos termos do art. 79, § 5º do TJMG, foi indeferido o feito suspensivo pretendido (doc. 158).

Contraminuta apresentada tempestivamente, oportunidade em que o Agravado suscitou preliminar de inadmissibilidade do recurso e inovação recursal (doc. 162).

Determinação de redistribuição do feito às Câmaras Cíveis de Direito Público deste Tribunal de Justiça (doc. 163).

Intimada a se manifestar sobre as preliminares suscitadas em Contraminuta (doc. 164), a Agravante apresentou petição em atendimento ao comando judicial proferido (doc. 165).

Determinação de redistribuição do feito nos termos da Resolução nº 977/2021/TJMG (doc. 166).

Petição intermediária e memoriais protocolados pela Agravante (doc. 168/169).

Petição intermediária protocolada pela parte Agravada (doc. 171).

Parecer da douta Procuradoria-Geral de Justiça opinando pelo parcial conhecimento do recurso e pelo desprovimento do recurso na parte conhecida (doc. 172).

Petições intermediárias protocoladas por ambas as partes (doc. 174/177).

É o relatório.

PRELIMINARES - INADMISSIBILIDADE DO RECURSO E INOVAÇÃO RECURSAL

Verifico, inicialmente, que o Agravado, ao apresentar resposta ao recurso, aduz preliminarmente a inadmissibilidade do recurso e argumenta que a matéria versada na decisão recorrida não se encontra no rol do art. 1.015 do CPC.

Registro, por oportuno, que o Parquet, ao apresentar Parecer no feito, apontou que o recurso não deveria ser conhecido quanto à alegada ilegitimidade ativa e falta de interesse de agir.

Pois bem.

Em análise da admissibilidade do presente recurso, que perfilhava-me ao entendimento de que o rol do Agravo de Instrumento teria natureza taxativa, não comportando "elastecimentos interpretativos".

Entretanto, importa sublinhar que o STJ firmou entendimento no recurso repetitivo - REsp 1.696.396 (Tema nº 988) -, fixando a tese quanto à possibilidade de mitigação da taxatividade do rol de decisões recorríveis por via do Agravo de Instrumento:

RECURSO ESPECIAL REPRESENTATIVO DE CONTROVÉRSIA. DIREITO PROCESSUAL CIVIL. NATUREZA JURÍDICA DO ROL DO ART. 1.015 DO CPC/2015. IMPUGNAÇÃO IMEDIATA DE DECISÕES INTERLOCUTÓRIAS NÃO PREVISTAS NOS INCISOS DO REFERIDO DISPOSITIVO LEGAL. POSSIBILIDADE. TAXATIVIDADE MITIGADA. EXCEPCIONALIDADE DA IMPUGNAÇÃO FORA DAS HIPÓTESES PREVISTAS EM LEI. REQUISITOS. (...) 6- Assim, nos termos do art. 1.036 e seguintes do CPC/2015, fixa-se a seguinte tese jurídica: O rol do art. 1.015 do CPC é de taxatividade mitigada, por isso admite a interposição de agravo de instrumento quando verificada a urgência decorrente da inutilidade do julgamento da questão no recurso de apelação.7- Embora não haja risco de as partes que confiaram na absoluta taxatividade com interpretação restritiva serem surpreendidas pela tese jurídica firmada neste recurso especial repetitivo, eis que somente se cogitará de preclusão nas hipóteses em que o recurso eventualmente interposto pela parte tenha sido admitido pelo Tribunal, estabelece-se neste ato um regime de transição que modula os efeitos da presente decisão, a fim de que a tese jurídica somente seja aplicável às decisões interlocutórias proferidas após a publicação do presente acórdão. (...) ( REsp XXXXX/MT, Rel. Ministra NANCY ANDRIGHI, CORTE ESPECIAL, julgado em 05/12/2018, DJe 19/12/2018).

O voto condutor, de lavra da Min. Relatora, Nancy Andrigui, pondera que "o rol do art. 1.015 do CPC, como aprovado e em vigor, é insuficiente, pois deixa de abarcar uma série de questões urgentes e que demandariam reexame imediato pelo Tribunal".

Cumpre-me apontar que a legitimidade ativa e o interesse de agir objeto do presente recurso foram objeto de análise pelo Juízo de origem em decisão saneadora e, considerando que esta se trata de matéria de ordem pública e que o feito já foi sentenciado de forma favorável à ora Recorrente, julgo que o presente recurso deve ser conhecido na sua totalidade.

Sob esse prisma, rejeito a preliminar suscitada tanto pela parte Agravada, como pela Procuradoria-Geral de Justiça.

Ultrapassada a referida preliminar, passo à análise da preliminar de inovação recursal suscitada pelo ora Agravado relativas às alegações apresentadas quanto à ausência de ilegitimidade do cedente dos direitos sucessórios do Testador para empreender e transmitir os direitos hereditários que possuía em seu favor.

Pois bem.

Da leitura da Contestação apresentada pela parte ora Agravante, verifico que esta aduz a ineficácia da cessão de direitos hereditários promovida em favor do Autor quando argumentou a ausência de legitimidade para propositura da ação e a ausência de interesse processual, afirmando, na oportunidade, que o cedente não detinha qualquer título do alegado direito hereditário relativo ao Testador.

Diante disso, julgo que não houve a alegada inovação recursal e, por consequência, REJEITO A PRELIMINAR SUSCITADA PELA PARTE AGRAVADA.

Diante disso, CONHEÇO DO RECURSO NA SUA INTEGRALIDADE, haja vista a presença de seus pressupostos de admissibilidade.

MÉRITO

Cinge-se a controvérsia quanto à ilegitimidade da parte Autora para propositura da ação e a (in) validade da cessão de direitos hereditários promovida em favor do Autor, bem como a ausência de interesse de agir desta e, ainda, a ocorrência de prescrição e decadência.

No que se refere à (i) legitimidade do Autor e da (in) validade da cessão de direitos hereditários promovida em favor do Autor, julgo que estas devem ser analisadas conjuntamente, uma vez que a segunda poderá ensejar em eventual reconhecimento da alegada ilegitimidade.

Diante disso, passo à análise da (in) validade do cessão de direitos hereditários em favor do Autor.

Conforme se infere da Escritura Pública Declaratória de Cessão de Direitos Hereditários acostada aos autos, verifico que Custódio Silveira Tristão, alegando ser legítimo herdeiro de Cícero Tristão, testador do legado deixado em favor da Requerida, ora Agravada, cedeu em favor do Autor, cedeu/transferiu quaisquer e todos os direitos hereditários sobre o legado dos bens de Cícero Tristão (doc. 13).

A Agravante, por sua vez, alega que a referida cessão de direitos não atende a nenhum dos requisitos de validade do negócio jurídico e que o cedente não detém a titulação de herdeiro, tampouco de legatário do testador, e que o cessionário/autor, ora Agravante, não poderia obter, legalmente, os direitos hereditários para habilitá-lo para ter legitimidade ativa para o ajuizamento da ação.

No que se refere à legitimidade para revogação de legado deixado em testamento, registro que o Código Civil estabelece que aplica-se ao legatário o disposto no mesmo diploma quanto às doações de igual natureza (art. 1.938) e, que eventual descumprimento da condição imposta quanto ao legado deixado acrescerá o quinhão dos herdeiros na proporção de seus quinhões, se o legado deduziu a herança, como no caso em comento (art. 1.943 e art. 1.944, parágrafo único).

Dessa forma, o descumprimento de eventual condição imposta para o exercício do direito ao legado do falecido que, no caso dos autos foi fixado de forma que a legatária, ora Agravante, teria o dever de "manter e conservar, sem modificar ou transformar", o bem imóvel deixado em testamento em favor da legatária e "manter um serviço de assistência às crianças desamparadas e aos velhos doentes", legitimaria os sucessores do testador em revogar o legado em razão de eventual inexecução dos encargos impostos para o exercício do legado, de modo a acrescer a herança deixada para partilha entre os herdeiros do testador.

Pois bem.

No caso dos autos, a cessão de direitos hereditários que ora se impugna foi firmada por Custódio Silveira Tristão, filho de Antônio da Silveira Tristão que é irmão do testador. Assim, considerando que o cedente é parente de terceiro grau do testador, este teria legitimidade, como descendente do falecido, para pleitear a revogação do legado deixado pelo e acrescer o quinhão dos herdeiros do testador, observado o disposto no art. 1.938 do CC, em razão do falecimento do seu genitor, irmão deste e, por conseguinte, promover eventual cessão de direitos hereditários que possui (doc. 111/116).

Nesse contexto, julgo que negócio jurídico que cedeu os direitos hereditários em favor do Autor, ora Agravado, atende aos requisitos legais de validade estabelecidos no art. 104 do CC.

Por conseguinte, reconheço a legitimidade do Autor para o ajuizamento da ação que originou o presente recurso.

No que se refere à ausência de interesse de agir, consigno que, como condição da ação, o interesse processual, também chamado "interesse de agir" é caracterizado pela necessidade e utilidade do provimento jurisdicional.

Sobre o tema, merece transcrição lição da saudosa processualista Ada Pellegrini Grinover:

"Repousa a necessidade da tutela jurisdicional na impossibilidade de obter a satisfação do alegado direito sem a intercessão do Estado - ou porque a parte contrária se nega a satisfazê-lo, sendo vedado ao autor o uso da autotutela, ou porque a própria lei exige que determinados direitos só possam ser exercidos mediante prévia declaração judicial [...]" (CINTRA, Antônio Carlos de Araújo; GRINOVER, Ada Pellegrini; DINAMARCO, Cândido R. Teoria Geral do Processo, 1997, p.260).

Assim, não sendo factível que a parte obtivesse o provimento jurisdicional pretendido por outra via, senão a jurisdicional, mostra-se evidente a presença do interesse hábil a justificar o ajuizamento da ação que originou o presente recurso.

No que se refere à decadência e prescrição, cumpre-me apontar, a princípio, verifico que a legislação civil admite a revogação da doação em duas hipóteses: a) por inexecução do encargo, na doação modal e b) por ingratidão do donatário e, ainda, que nos legados com encargo aplica-se ao legatário o disposto no Código Civil quanto a doações de igual natureza.

Por oportuno, destaco que o Código Civil estabelece que a doação pode ser revogada por ingratidão do donatário, ou por inexecução do encargo (art. 555).

Ressalto, por oportuno, e, consonância com o Parecer emitido pelo Órgão Ministerial, que o prazo prescricional é vintenário ou decenal, conforme regra de direito intertemporal no Código Civil (art. 2.028) do CC.

É importante esclarecer, em se tratando de inexecução de encargo, que o prazo prescricional é de vinte ou dez anos, conforme regra de direito intertemporal prevista no art. 2.028 do CC/2002 (art. 177 CC/1916 e art. 205 CC/2002).

O prazo prescricional/decadencial para revogação do legado deixado pelo falecido iniciar-se-ia, igualmente, a partir da data em que ficou caracterizada a violação dos direitos dos herdeiros, conforme pontuado no Parecer emitido pelo Parquet.

Porém, no caso dos autos, não foi fixado prazo no testamento para execução dos encargos impostos à legatária.

Dessa forma, considerando que a obrigação imposta no testamento se protrai no tempo, indefinidamente, não houve a prescrição ou decadência alegada, pois o descumprimento noticiado nos autos data de setembro de 2011, não havendo prova da inexecução do encargo em momento anterior, tampouco de sua eventual ciência pela parte interessada.

Com tais considerações, REJEITO AS PRELIMINARES SUSCITADAS PELA PARTE AGRAVADA E PELO ÓRGÃO MINISTERIAL E, NO MÉRITO, NEGO PROVIMENTO AO AGRAVO DE INSTRUMENTO.

Custas recursais pela parte Agravante, suspensa a sua exigibilidade nos termos do art. 98, § 3º do CPC.

DES. KILDARE CARVALHO - De acordo com o (a) Relator (a).

DES. MOREIRA DINIZ - De acordo com o (a) Relator (a).

SÚMULA: "REJEITARAM AS PRELIMINARES SUSCITADAS PELA PARTE AGRAVADA E PELO ÓRGÃO MINISTERIAL E, NO MÉRITO, NEGARAM PROVIMENTO AO AGRAVO DE INSTRUMENTO"

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