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1 de Maio de 2024
  • 2º Grau
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Detalhes

Processo

Órgão Julgador

Primeira Câmara Criminal

Publicação

Julgamento

Relator

Jayme Weingartner Neto

Documentos anexos

Inteiro TeorTJ-RS_ACR_70070987029_230eb.doc
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Inteiro Teor


JWN

Nº 70070987029 (Nº CNJ: XXXXX-90.2016.8.21.7000)

2016/Crime


APELAÇÃO CRIMINAL. EMBRIAGUEZ AO VOLANTE. ALEGAÇÃO DE VERIFICAÇÃO PERIÓDICA ANUAL VENCIDA. NÃO COMPROVAÇÃO. VALIDADE DO ETILÔMETRO COMO COMPROVANTE DA CONCENTRAÇÃO DE ÁLCOOL NO SANGUE.
Tem-se que calibração e verificação são conceitos distintos e que o objetivo principal da verificação é a manutenção da confiança no resultado da calibração, até que nova calibração seja efetuada. A presunção de legalidade dos atos administrativos abarca o manejo de perícia a que serão submetidos os administrados. Se irregular, deve a defesa, concretamente, apontar tal circunstância, com a respectiva comprovação. Nesta linha, a prova de que o equipamento não estava de acordo com a resolução do CONTRAN é matéria a ser demonstrada pela defesa. Precedente do STF, a sedimentar a necessidade de prova pela defesa da alegação de irregularidade do aparelho do etilômetro. A prova carreada aos autos é suficiente para embasar o juízo de condenação, pois o apelante foi submetido a teste do bafômetro, o qual atestou que o condutor encontrava-se embriagado. Não há, portanto, mácula na materialidade delitiva.
consentimento do réu. DESNECESSIDADE da presença de advogado e de advertência de que é facultativo.
No caso dos autos, o teste do bafômetro foi realizado com o consentimento do réu. Não há indícios de que o acusado tenha sido coagido para realizá-lo ou de outros vícios da vontade, o que afasta violação ao princípio de que ninguém é obrigado a produzir prova contra si. Descabido o argumento de constrangimento ilegal. Consideração à vontade do réu, faceta da autodeterminação pessoal, que substancia dimensão positiva da dignidade da pessoa humana. Consentimento desinformado que não se presume.
PENA ACESSÓRIA REDIMENSIONADA.

No tocante ao quantum, em respeito ao princípio da proporcionalidade, a pena de suspensão/proibição de se obter a permissão ou habilitação para dirigir veículo automotor deve guardar certa simetria com a pena privativa de liberdade, bem como com a gravidade do injusto.
RECURSO PARCIALMENTE PROVIDO.
Apelação Crime


Primeira Câmara Criminal

Nº 70070987029 (Nº CNJ: XXXXX-90.2016.8.21.7000)


Comarca de Caxias do Sul

MICHEL DOUGLAS DA ROSA COSTA


APELANTE

MINISTÉRIO PÚBLICO


APELADO


ACÓRDÃO

Vistos, relatados e discutidos os autos.

Acordam os Desembargadores integrantes da Primeira Câmara Criminal do Tribunal de Justiça do Estado, à unanimidade, prover parcialmente o recurso.
Custas na forma da lei.

Participaram do julgamento, além do signatário, os eminentes Senhores Des. Sylvio Baptista Neto (Presidente) e Des. Honório Gonçalves da Silva Neto.

Porto Alegre, 26 de outubro de 2016.

DES. JAYME WEINGARTNER NETO,

Relator.

RELATÓRIO

Des. Jayme Weingartner Neto (RELATOR)

O MINISTÉRIO PÚBLICO ofereceu denúncia contra MICHEL DOUGLAS DA ROSA COSTA, dando-o como incurso nas sanções do artigo 306 da Lei 9503/97, pela prática do seguinte fato delituoso:

No dia 18 de novembro de 2012, por volta das 20h35min, na rua Alfredo Chaves, n.º 1.333, em via pública, bairro Exposição, na cidade de Caxias do Sul/RS, o denunciado MICHEL DOUGLAS DA ROSA COSTA conduzia veículo automotor, na via pública, sob a influência de álcool, estando com concentração de álcool por litro de sangue superior a 6 (seis) decigramas, expondo a dano potencial a incolumidade de outrem.
Naquela ocasião, o denunciado conduzia o automóvel GM/Kadett, de cor azul, placas ICU-7644 (veículo não apreendido), pela citada via, quando foi abordado por fiscais municipais de trânsito, em patrulhamento de rotina, tendo sido encaminhado para realização de teste de alcoolemia, restando o exame concluído pela existência de 0,64mg/l de álcool por litro de sangue (equivalente a 12,8dg/l), assim, constatando-se a influência de álcool (auto de arrecadação da fl. 09 e teste de bafômetro da fl. 10 do IP). Ainda nesta oportunidade, foi constatado que o acusado não possuía Carteira Nacional de Habilitação.

A denúncia foi recebida em 27 de agosto de 2013 (fl. 79 e verso).

Após regular instrução, sobreveio sentença de procedência da ação penal para condenar o réu como incurso no artigo 306 da Lei 9.503/97, à pena privativa de liberdade fixada em 06 (seis) meses de detenção, a ser cumprida em regime aberto, à pena de multa fixada em 10 (dez) dias multa à razão mínima legal, bem como à suspensão da habilitação para conduzir veículo automotor por 03 (três) meses. A pena privativa de liberdade foi substituída por uma restritiva de direitos (fls. 109/114).

Irresignada, a defesa busca a reforma da decisão. Em razões, aduz ausência de prova da materialidade, pois o etilômetro encontrava-se fora dos padrões exigidos pela Portaria 06/2002. Alega que o réu não foi informado do direito de não produzir prova contra si, bem como da necessidade de advogado para a realização do exame. No mérito, sustenta a retroatividade da lei mais benéfica. Alega, ainda, insuficiência probatória e requer a redução do quantum da pena acessória (fls. 121/133).

Foram apresentadas contrarrazões recursais (fls. 134/139).

Nesta instância, o Dr. Procurador de Justiça manifestou-se pelo desprovimento do recurso interposto (fls. 151/157).

Registra-se que esta Câmara adotou o procedimento informatizado, tendo sido atendido o disposto no artigo 613, inciso I, do Código de Processo Penal.

É o relatório.

VOTOS

Des. Jayme Weingartner Neto (RELATOR)

Imprestabilidade do aparelho de etilômetro

A calibração é considerada pelo Inmetro
como o ?conjunto de operações que estabelece, em condições específicas, a correspondência entre o estímulo e a resposta de um instrumento de medir, sistema de medição ou transdutor de medição?.
Já a verificação é tida como o ?conjunto de operações, compreendendo o exame, a marcação ou selagem e (ou) a emissão de um certificado e que constate que o instrumento de medir ou medida materializada satisfaz às exigências regulamentares?. Na prática, ainda segundo informações obtidas no site do Instituto Nacional de Metrologia, Qualidade e Tecnologia, o objetivo principal da verificação é a manutenção da confiança no resultado da calibração, até que nova calibração seja efetuada.

Esta verificação, nos termos da Resolução do CONTRAN, deve ser realizada pelo INMETRO ou pelo RBMLQ, justamente para aferir a necessidade de nova calibração no instrumento. Nos termos da referida resolução, o medidor deve observar quatro requisitos: a) aprovação do modelo pelo INMETRO; b) aprovação na verificação periódica inicial realizada pelo INEMTRO ou RBMLQ (a já referida calibração inicial); c) ser aprovado na verificação periódica anual realizada pelo INMETRO OU RBMLQ e d) ser aprovado em inspeção em serviço ou eventual, conforme determina a legislação metrológica vigente.
Os feitos levados a julgamento por este Tribunal têm demonstrado que vários são os modelos de etilômetros utilizados pela Brigada Militar, os quais passam, necessariamente pela aprovação do INMETRO e pela verificação periódica inicial/calibração (circunstância visível em alguns modelos, v.g. Dräger, que traz no espelho do teste o número da Portaria do INMETRO e do DENTRAN). A verificação anual vem estampada nos extratos de alguns etilômetros. Entretanto, a data lançada obedece a lógica da validade da verificação efetuada anteriormente, ou seja, realizada a verificação no aparelho, o espelho do exame reflete a data limite de validade da verificação, que obedece ao interregno de um ano.

Cabe destacar que a Resolução não disciplina nem uniformiza os modelos e/ou extratos dos etilômetros, tanto que as informações apresentadas são diferentes de acordo com o modelo utilizado.

Nessa senda, cabe destacar que o etilômetro da marca Dräger que, salvo anotações acerca da aprovação do modelo e da calibração, não consta o momento da realização da verificação anual (nem data pretérita e nem futura). Na linha de que a ausência de data inicial de verificação no extrato do etilômetro acarreta a falta de prova de materialidade para o delito de embriaguez, tal fato determinaria a absolvição do réu. A presunção, nestes casos, deve ser em prol da boa-fé da autoridade administrativa que, a priori, mormente em tema de intenso debate na esfera pública, deve ter tomado as cautelas necessárias no manejo de perícia a que serão submetidos os administrados. E se não o fez, deve a defesa, concretamente, apontar tal circunstância, com a respectiva comprovação.

Nesta linha, a prova de que o equipamento não estava de acordo com a resolução do CONTRAN é matéria a ser demonstrada pela defesa. Nesse sentido, recente decisão do Supremo Tribunal Federal, a sedimentar a necessidade de prova pela defesa da alegação de irregularidade do aparelho do etilômetro.

Vale a transcrição da decisão:

EMENTA: HABEAS CORPUS. PACIENTE DENUNCIADO PELO CRIME PREVISTO NO ART. 306 DA LEI 9.503/2007. EMBRIAGUEZ

COMPROVADA POR MEIO DE TESTE DE ETILÔMETRO. SUSPENSÃO CONDICIONAL DO PROCESSO. POSTERIOR PEDIDO DE

TRANCAMENTO DA PERSECUÇÃO CRIMINAL. SUPOSTA UTILIZAÇÃO DE EQUIPAMENTO EM DESCONFORMIDADE COM OS REQUISITOS REGULAMENTARES. NÃO COMPROVAÇÃO. MEDIDA EXCEPCIONAL CUJA PERTINÊNCIA NÃO RESTOU DEMONSTRADA. IMPOSSIBILIDADE DE SUBSTITUIÇÃO DO PROCESSO DE CONHECIMENTO PELA VIA ESTREITA DO HABEAS CORPUS. ORDEM DENEGADA.

I ? A denúncia descreve conduta que, em tese, configura o tipo então previsto no art. 306 da Lei 9.503/1997, uma vez comprovada a embriaguez do paciente por meio de teste de etilômetro. II ? Embora a impetrante tenha questionado a validade do teste de alcoolemia efetuado no paciente, aduzindo que o equipamento encontrava-se com a sua verificação periódica anual vencida, não trouxe nenhuma prova nesse sentido, nem mesmo algum documento que comprovasse tal irregularidade. III ? O trancamento da ação penal, em habeas corpus, constitui medida excepcional que só deve ser aplicada nos casos de manifesta atipicidade da conduta, de presença de causa de extinção da punibilidade do paciente ou de ausência de indícios mínimos de autoria e materialidade delitivas, o que não ocorre na situação sob exame. IV ? A jurisprudência desta Corte, de resto, em diversas oportunidades, assentou o entendimento de que não se pode substituir o processo de conhecimento pela via excepcional do habeas corpus, o qual se presta, precipuamente, para afastar a manifesta violência ou coação ilegal ao direito de locomoção. V ? O paciente aceitou as condições da suspensão condicional do processo sem nenhuma oposição ou questionamento quanto ao que tinha sido assentado no auto infracional ou na denúncia e, atualmente, vem cumprindo devidamente as condições elencadas no acordo entabulado.

VI ? Habeas corpus denegado. (SEGUNDA TURMA HABEAS CORPUS 114.597 MINAS GERAIS 02/04/2013) RELATOR: MIN. RICARDO LEWANDOWSKI )

Extrai-se do voto do nobre Relator ponderação cristalina: ?Pois bem. Embora a impetrante tenha questionado a validade do teste de alcoolemia efetuado no paciente, aduzindo que o etilômetro encontrava-se com a sua verificação periódica anual vencida, não trouxe nenhuma prova nesse sentido, nem mesmo algum documento que comprovasse tal irregularidade. Assim, não há como acolher a tese defensiva, já que presunção de veracidade do teste efetuado milita em favor do pode público, não bastando a mera alegação em contrário.? (p. 09 do acórdão citado, grifou-se).

Penso, com a máxima vênia e o maior respeito aos entendimentos diversos, que se podem revelar mais adequados ao longo do debate jurisdicional que ora se trava, que absolver, em casos como o dos autos, em face de uma alegada desconformidade formal (que sequer se comprova empiricamente) com um espelho idealizado que, ainda que talvez fosse mais completo e elucidativo, não consta de nenhuma exigência normativa, representa uma formalização abstrata do processo, a ignorar por completo as exigências de ?verdade substancial? (um dos vetores do art. 566 do CPP, entre parênteses todas as dificuldade epistemológicas do conceito), delibando, até, a violação do dever de proteção que o Estado tem em relação aos direitos fundamentais, assente sua dimensão objetiva e a proporcionalidade também como vedação de proteção insuficiente.

Tenho dito que o Estado-juiz, no processo criminal do Estado democrático de direito (aliás numa definição que se aproxima do garantismo de Ferrajoli), deve verificar empiricamente (evidente que de acordo com as regras do jogo, a maioria delas de dignidade constitucional) uma hipótese acusatória formulada pelo Estado-acusação (no mais das vezes), num modo-de-ser marcado pelo contraditório e pela ampla defesa. Portanto, não deve, o Estado Constitucional, demitir-se do dever de verificação empírica da hipótese acusatória, salvo na incidência de regras cominatórias específicas.

No presente feito, a alegação da defesa de que o aparelho utilizado estava em desconformidade com a legislação veio ao autosapenas em sede de memoriais, e desacompanhada de qualquer substrato probatório.

Entendo, portanto, válida a prova da materialidade. Afasto, assim, a preliminar suscitada.

No tocante à indispensabilidade da presença de um advogado para a realização do teste do etilômetro, tenho que o artigo do Código de Processo Penal dispõe que a autoridade policial, ao tomar conhecimento da prática de infração penal, deverá determinar a produção de prova pericial. Referido preceito não contempla a necessidade de advogado no momento da realização da perícia.

Ademais, a voluntariedade da realização do exame do bafômetro contempla a garantia constitucional de que ninguém será obrigado a produzir prova contra si. Não há falar que a assunção ao teste pode ser considerada verdadeira confissão e é realizada sem a presença de advogado. Na esteira desse entendimento, Damásio de Jesus
:

Nosso Direito Constitucional consagra o princípio segundo o qual ninguém é obrigado a produzir prova contra si mesmo, seguindo a Convenção Americana de Direitos (1969), o Pacto de São José da Costa Rica e Convenção Americana dos Direitos e Deveres do Homem (1948). Em face disso, não pode lei infraconstitucional impor a obrigação da sujeição do motorista suspeito ao exame de bafômetro (etilômetro), sob pena de configurar-se presunção contra ele. (...) Do ponto de vista penal, de considerar intransponível, no atual estágio de desenvolvimento das garantias constitucionais, a superação do direito ao silêncio, reconhecido no art. , LXIII, da CF, com o intuito de obrigar o condutor a colaborar na produção da prova contra si.
Assim, tratando-se de teste que só pode ser realizado com a concordância do examinado e não havendo qualquer prova nos autos de que houve coação por parte dos policiais, entendo que válida a prova da materialidade delitiva. Tal entendimento, ademais, prestigia a autodeterminação pessoal, bem de ver dimensão positiva da dignidade da pessoa humana, pedra basilar do Estado Democrático de Direito (artigo , III, CF).

Neste sentido, precedente desta Câmara Criminal:

APELAÇÃO CRIMINAL. EMBRIAGUEZ AO VOLANTE. ART. 306 DO CTB. NULIDADE DO EXAME DE ETILÔMETRO AFASTADA. PROVAS DA AUTORIA E DA MATERIALIDADE. CONDENAÇÃO MANTIDA. PRECEDENTES. ATENUANTE DE CONFISSÃO ESPONTÂNEA AFASTADA. PENA FIXADA NO MÍNIMO LEGAL. PENA DE PRESTAÇÃO DE SERVIÇOS À COMUNIDADE AFASTADA. 1. É desnecessária a presença de advogado no momento em que o réu sopra o etilômetro, sobretudo por estar ele abarcado pelo nemo tenetur se detegere, podendo se negar a fazê-lo. Réu que prestou o teste voluntariamente. A calibração do etilômetro não se confunde com a verificação, que deve ser feita anualmente, nos termos da Resolução 206/2006 do CONTRAN. No caso, havendo indicação da próxima certificação em menos de um ano antes dos fatos, presume-se a regularidade do teste. 2. Incide no tipo previsto no art. 306 do CTB o réu que conduz veículo automotor com concentração de álcool por litro de sangue superior a 6 decigramas ou igual ou superior a 0,3 miligrama de álcool por litro de ar alveolar, como no caso. Condenação mantida. 3. Na esteira do entendimento do STJ, a exemplo da Súmula 231, a pena provisória não pode ficar aquém do mínimo legal. Precedentes. 4. Tendo a pena sido fixada em 6 meses, segundo teor do art. 44, § 2º, do CP, basta a aplicação de uma pena restritiva de direitos. No presente, diante do pedido formulado pela defesa e da proporcionalidade em relação ao fato, mostra-se adequado o afastamento da pena de prestação de serviços à comunidade, mantendo-se apenas a pena pecuniária fixada. APELAÇAO PARCIALMENTE PROVIDA. (Apelação Crime Nº 70065141491, Primeira Câmara Criminal, Tribunal de Justiça do RS, Relator: Julio Cesar Finger, Julgado em 14/10/2015)

Vai, dessa forma, afastada a alegação.

Não reconheço, ainda, a abolitio criminis em relação a fatos denunciados antes da última alteração legal, e nem mesmo ?novatio legis in mellius?. Primeiro, do princípio da legalidade não se retira que toda interpretação tenha que ser estrita, ainda que de norma penal incriminadora. Segundo, a conduta praticada pelo réu, e pela qual foi denunciado, continua taxativamente proibida e não é, por expressa disposição legal, ?completamente diferente? daquela enunciada pelo caput do art. 306, em sua novel versão. Terceiro, eventual tarifação de prova, cujos contornos de aplicação são discutíveis, é matéria de processo penal, que sequer estaria sujeita ao princípio da irretroatividade. Quarto, em vez de presumir arbitrariedade no critério legal inserido (desde a Lei nº 11.705/2008)? 6 decigramas de álcool por litro de sangue ?, cujo ônus demonstrativo seria de quem se insurge, em face da presunção de legitimidade dos atos legislativos, parece-me mais promissor admitir prova em contrário como tese defensiva ou eventual dúvida insuperável em situações fáticas peculiares.

Observo, ainda, que eventual atecnia do legislador (seja heterotopia, hibridismo penal-processual ou indevida sinonímia entre os verbos constatar e presumir), no diapasão de um garantismo ideal, não chega a afastar a solução proposta do marco de regulação legal, que não opera diante de um vazio normativo, mas escolhe uma possibilidade interpretativa de um elemento típico existente (capacidade psicomotora alterada, caput do art. 306), utilizando logicamente outro que também existe (concentração igual ou superior a 6 decigramas de álcool por litro de sangue, inciso I), mormente em face do conector das condutas expresso no § 1º da atual redação do dispositivo em comento, que vai lido literalmente na sua totalidade. Neste linde hermenêutico, tenho como concluir que, à vista do legislado (princípio da legalidade), conduzir veículo automotor com a concentração de álcool indicada configura alteração da capacidade psicomotora.

No tocante ao mérito, não merece guarida a tese defensiva. A materialidade restou demonstrada pelo teste de etilômetro (fl. 31), bem como pelo registro de ocorrência (fl. 08) e pelo auto de prisão em flagrante.

Da mesma forma, incontroversa a autoria. Por oportuno, colaciono trecho da decisão em que transcrita a prova oral:

O fiscal de trânsito ADÃO GILSON CORDEIRO não recordou do fato, tendo, apenas, reconhecido a assinatura lançada no inquérito policial (mídia ? fl. 99).
O colega JOÃO DANIEL KUSE não se lembrou dos detalhes da prisão. Contudo, reconheceu a assinatura lançada no feito, confirmando, inclusive, que firmou o teste de bafômetro (mídia ? fl. 99).
Por fim, VANDERLEI MÁRIO BENINI apenas confirmou o depoimento prestado na fase pré-processual (mídia ? fl. 99).
A versão do acusado sobre os fatos é desconhecida, porquanto preferiu o silêncio na fase inquisitorial (fl. 23) e, em juízo, reconhecido revel (fl. 92).
Ainda que as testemunhas tenham apresentado relato conciso, há prova suficiente para a condenação. Os depoimentos prestados em sede policial alinham-se à descrição apresentada em juízo. Comprovadas, portanto, autoria e materialidade deve ser mantida a condenação do apelante. Mais que evidente a alteração do estado psicomotor, como exige a atual redação do artigo 306 do Código de Trânsito Brasileiro.

Ao cabo, em relação à redução da pena acessória de suspensão da habilitação para conduzir veículo automotor, assiste razão à defesa. Efetivamente, a elevação acima do mínimo mostra-se desproporcional, pelo que vai fixada em 02 (dois) meses.

Voto, pois, pelo parcial provimento do recurso interposto para redimensionar a pena acessória de suspensão da habilitação para conduzir veículo automotor para 02 (dois) meses.

Des. Honório Gonçalves da Silva Neto (REVISOR) - De acordo com o (a) Relator (a).
Des. Sylvio Baptista Neto (PRESIDENTE) - De acordo com o (a) Relator (a).
DES. SYLVIO BAPTISTA NETO - Presidente - Apelação Crime nº 70070987029, Comarca de Caxias do Sul: \À UNANIMIDADE, PROVERAM PARCIALMENTE O RECURSO.\
Julgador (a) de 1º Grau: REBECCA ROQUETTI FERNANDES




? Disponível em: www.inmetro.gov.br/infotec/publicacoes/.../met_legal.htm

? JESUS, Damásio. Crimes de Trânsito. Anotações à parte criminal do Código de Trânsito. 8. ed. São Paulo: Saraiva, 2010, pp. 171/172.



12
Disponível em: https://www.jusbrasil.com.br/jurisprudencia/tj-rs/928591155/inteiro-teor-928591158