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1 de Junho de 2024
  • 2º Grau
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Tribunal Regional Federal da 4ª Região TRF-4 - HABEAS CORPUS: HC XXXXX-50.2019.4.04.0000 XXXXX-50.2019.4.04.0000

Detalhes

Processo

Órgão Julgador

SÉTIMA TURMA

Julgamento

Relator

SALISE MONTEIRO SANCHOTENE
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Decisão

Trata-se de habeas corpus impetrado pela Defensoria Pública da União em favor de SAMUEL PHILIP - nigeriano, que ingressou em território nacional de forma clandestina, a bordo do navio MV ANNA M, de bandeira liberiana, em 24/06/2019 -, contra ato do Juízo Federal da 1ª Unidade de Apoio de Curitiba, que, nos autos do PEDIDO PRISÃO/LIBERDADE VIGIADA FINS DE EXPULSÃO nº XXXXX-31.2019.4.04.7000/PR, decretou a prisão cautelar do paciente, para fins de expulsão, com fulcro no art. 211 do Decreto nº 9.199 em 20 de novembro de 2017. Diz que o paciente foi apresentado pelo comandante da embarcação à Polícia Federal com atuação no Porto de Paranaguá/PR, em razão de seu embarque clandestino no Porto de Lagos, na Nigéria, sem submeter-se ao controle migratório de saída, ingressando de modo indevido no cargueiro e viajando por oito dias na parte traseira da embarcação, em local denominado "casa do leme"; que após o desembarque, em 24/06/2019, a Polícia Federal promoveu sua entrada condicional, nos termos dos arts. 41 da Lei nº 13.445/2017 e 172 do Decreto nº 9.199/2017, sendo suas despesas custeadas pelo agente transportador, substituído por empresa seguradora; e que, apesar de decorridos dois meses sem que fosse instaurado incidente de repatriação, por conta de "múltiplos incidentes ocorridos no hotel onde se encontrava custodiado, pela entrada condicional, que vão desde uma inusitada imputação de extorsão ate condutas como desacato e desobediência", teve decretada sua prisão cautelar, com base no 211 do Decreto nº 9.199/2017. Alega, em apertada síntese, que o caso é de entrada condicional, e não de admissão do imigrante em embarque clandestino, tanto que não há decisão judicial nesse sentido, e a única medida compulsória de saída aplicável ao caso seria a repatriação; que é manifesta a inconstitucionalidade e ilegalidade da prisão para fins de deportação ou expulsão após a vigência da Lei nº 13.445/2017; que a previsão de prisão pelo decreto regulamentador é incompatível com a Lei nº 13.445, que expressamente proíbe tais medidas; e que sendo inválido o Decreto nº 9199 no tocante à possibilidade de prião ou outras medidas cautelares no curso de processo de expulsão ou deportação, por extrapolar sua competência regulamentar, impõe-se a liberdade do requerente. Requer, inclusive por liminar, a revogação da prisão para fins de deportação, ou, subsidiariamente que a prisão seja convertida em liberdade vigiada, com comparecimento periódico em juízo, e, ao final, a concessão da ordem, além dos pedidos de intimação pessoal e prazo em dobro. É o sucinto relatório. Decido. Inicialmente, observo que tem direito a Defensoria Pública à intimação pessoal e ao prazo dobrado - pois assegurados por lei, que não distingue a modalidade de ação em que o órgão atue. Defiro, pois, os pleitos da impetrante. Anote a Secretaria. A decisão impugnada foi proferida nos seguintes termos (ev. 31 do PEDIDO PRISÃO/LIBERDADE VIGIADA FINS DE EXPULSÃO Nº XXXXX-31.2019.4.04.7000/PR): 1. Trata-se de representação da autoridade policial, inicialmente, pela prisão, para fins de deportação, de SAMUEL PHILIP, nigeriano, que ingressou em território nacional de forma clandestina, a bordo do navio MV ANNA M, de bandeira liberiana, em 24/06/2019. Após manifestação do Ministério Público Federal (evento 10), foi indeferida a representação diante da ausência de instauração de procedimento administrativo de deportação (evento 12). Em nova manifestação (evento 22), fundamenta o Ministério Público Federal a necessidade de decretação da prisão de SAMUEL PHILIP , alicerçado no disposto no art. 211, do Decreto n. 9.199/2017 c/c art. 312 do Código de Processo Penal. A autoridade policial, por sua vez, em nova representação (evento 25), requer a prisão do estrangeiro BENARD AMADI EVANS, também nigeriano, que ingressou no país da mesma forma que SAMUEL PHILIP. Na data de hoje foi comunicada a prisão em flagrante de SAMUEL PHILIP, pelas práticas dos crimes previstos nos seguintes dispositivos legais: art. 158, § 1º, do CP (extorsão), art. 330 do CP (desobediência), art. 329 do CP (resistência), art. 140, § 2º do CP (injúria qualificada por vias de fato) e art. 331 do CP (desacato), conforme informações advindas dos autos n. XXXXX-89.2019.4.04.7000. É o breve relatório. Decido. 2. Quanto à representação da autoridade policial para a prisão do estrangeiro BENARD AMADI EVANS, intime-se, com urgência, o Ministério Público Federal. Prazo: 1 (um) dia. 3. Em relação ao estrangeiro SAMUEL PHILIP, diante dos novos fatos trazidos nos autos de nº XXXXX-89.2019.4.04.7000, tenho que assiste razão ao Ministério Público Federal. Consta do auto de prisão em flagrante lavrado na data de hoje que: Conforme se extrai do auto de prisão em flagrante, SAMUEL PHILIP, nigeriano, ingressou em território nacional de forma clandestina, a bordo do navio MV ANNA M, de bandeira liberiana, em 24/06/2019. Segundo declarado pelo delegado de Polícia Federal que deu voz de prisão ao flagrado, aquela autoridade está conduzindo o processo de deportação de SAMUEL PHILIP e BERNARD AMADI EVANS. Ambos estão hospedados em hotel em Paranaguá, às expensas do armador do navio. Ambos teriam concordado em retornar a seu país, tendo ficado marcado o retorno de PHILIP para a data de 10/09/2019 e de BERNARD para 13/09/2019. Na manhã do dia 10/09/2019, todavia, SAMUEL PHILIP, quando ia ser escoltado para o aeroporto Afonso Pena, trancou-se no quarto em que estava hospedado e se recusou a acompanhar os policiais federais. Desde esse dia, SAMUEL exige U$S 3.000,00 para deixar o quarto e retornar a seu país. Em razão disso foi representada à autoridade judiciária a prisão administrativa de SAMUEL PHILIP para fins de sua deportação (autos XXXXX20194047000, também distribuídos a este juízo). Na manhã do dia de hoje, os policiais federais se deslocaram ao mesmo hotel para buscar BERNARD AMADI EVANS para repatriá-lo. Todavia, ao chegarem no hotel, este teria se trancado no mesmo quarto que SAMUEL e também estaria a exigir dinheiro. Os estrangeiros estariam fazendo algazarra no quarto, causando transtorno aos demais hóspedes, impedindo que o quarto fosse limpo, ofendendo os policiais e pedindo dinheiro. Arrombada a porta do quarto do hotel, com autorização de seu proprietário, a autoridade policial constatou que ali estava somente SAMUEL. Este estaria muito nervoso e, além de exigir dinheiro, proferia palavras de baixo calão ("go fuck you", "go to hell", "I want my money", "you stole my money", "I will kill you") e chegou a agredir um agente de Polícia Federal com um tapa no rosto. Recusou-se a fazer exame de corpo de delito. No que se refere à possibilidade de prisão para fins de deportação, a Lei nº 13.445/2017 revogou integralmente a Lei nº 6.815/80, que previa a prisão administrativa indistinta para efetivação da deportação. A lei atual dispõe sobre a questão da seguinte maneira: Art. 50. A deportação é medida decorrente de procedimento administrativo que consiste na retirada compulsória de pessoa que se encontre em situação migratória irregular em território nacional. § 1º A deportação será precedida de notificação pessoal ao deportando, da qual constem, expressamente, as irregularidades verificadas e prazo para a regularização não inferior a 60 (sessenta) dias, podendo ser prorrogado, por igual período, por despacho fundamentado e mediante compromisso de a pessoa manter atualizadas suas informações domiciliares. § 2º A notificação prevista no § 1º não impede a livre circulação em território nacional, devendo o deportando informar seu domicílio e suas atividades. § 3º Vencido o prazo do § 1º sem que se regularize a situação migratória, a deportação poderá ser executada. De forma a regulamentar a Lei de Migração foi publicado o Decreto nº 9.199 em 20 de novembro de 2017. Referido ato normativo dispõe acerca da possibilidade de prisão do estrangeiro nos seguintes termos: Art. 211. O delegado da Polícia Federal poderá representar perante o juízo federal pela prisão ou por outra medida cautelar, observado o disposto no Título IX do Decreto-Lei nº 3.689, de 3 de outubro de 1941 - Código de Processo Penal. § 1º A medida cautelar aplicada vinculada à mobilidade do imigrante ou do visitante deverá ser comunicada ao juízo federal e à repartição consular do país de nacionalidade do preso e registrada em sistema próprio da Polícia Federal. § 2º Na hipótese de o imigrante sobre quem recai a medida estar preso por outro motivo, o fato deverá ser comunicado ao juízo de execuções penais competente, para determinar a apresentação do deportando ou do expulsando à Polícia Federal. § 3º O deportando ou o expulsando preso será informado de seus direitos, observado o disposto no inciso LXIII do caput do art. da Constituição e, caso ele não informe o nome de seu defensor, a Defensoria Pública da União será notificada. Conforme bem asseverado pelo órgão ministerial, atualmente, para a decretação de prisão do deportando, há de restar configurada excepcional motivação para a medida cautelar, ao contrário da legislação anterior, que previa a possibilidade de prisão no decorrer de procedimento de deportação, independentemente de motivação excepcional. Feitas tais considerações, entendo que no caso vertente se está diante da excepcionalidade prevista pela legislação, apta a justificar o encarceramento do estrangeiro. Com efeito, consta dos autos que SAMUEL PHILIP se encontra em situação irregular no Brasil desde 24/06/2019. Após os trâmites administrativos cabíveis à espécie, seu retorno ao país de origem foi agendado para a data de 10/09/2019, com o que assentiu o estrangeiro. Entretanto, no dia 10/09/2019, quando ia ser escoltado para o aeroporto Afonso Pena, 10/09/2019, todavia, SAMUEL PHILIP trancou-se no quarto do hotel em que estava hospedado - custeado pelo armador do navio - e se recusou a acompanhar os policiais federais. Desde esse dia, SAMUEL exige U$S 3.000,00 para deixar o quarto e retornar a seu país. Além disso, na manhã do dia de hoje, quando os policiais federais se deslocaram ao mesmo hotel para buscar BERNARD AMADI EVANS, SAMUEL PHILIP teria dado abrigo a BERNARD em seu quarto, fazendo uma espécie de "barricada" no quarto do hotel. Na sequência, arrombada a porta do quarto do hotel, SAMUEL, além de exigir dinheiro, proferia palavras de baixo calão ("go fuck you", "go to hell", "I want my money", "you stole my money", "I will kill you") e chegou a agredir um agente de Polícia Federal com um tapa no rosto. Assim, em virtude da postura do estrangeiro em obstar, por diversas formas, a ação dos agentes federais na efetivação de sua deportação, inclusive mediante violência, agressões verbais e dano ao patrimônio de terceiros, tenho que o encarceramento se justifica para a finalidade de efetivação da sua deportação, porque presente o requisito da garantia da ordem pública. Trata-se, ao fim e ao cabo, de estrangeiro completamente irregular em solo nacional que, instado por autoridade policial com atribuição legal, a deixar o país, mediante procedimento administrativo regular, se nega peremptoriamente a fazê-lo, agredindo terceiros e exigindo, pra isso, vantagem econômica indevida. O desrespeito às instituições é evidente e o risco concretamente verificado à integridade de terceiros e ao exercício de um dos direitos decorrentes do plexo que compõe a soberania nacional exige a privação de sua liberdade para a efetivação da medida de retirada compulsória do território brasileiro. 4. Nesses termos, decreto a prisão cautelar do estrangeiro SAMUEL PHILIP, com fulcro no art. 211 do Decreto nº 9.199 em 20 de novembro de 2017. 4.1 Expeça-se mandado de prisão. 4.2 Fixo o prazo de 30 (trinta) dias para que ultimados os procedimentos para deportação/repatriação. 4.3 Deverá a autoridade policial, concomitantemente à execução da segregação administrativa da liberdade identificar-se como tal e informar as razões dela ao representado, mediante intérprete versado em seu idioma; franquear-lhe a comunicação com sua família ou pessoa por ele indicado; proporcionar-lhe a assistência de advogado; e ouvi-lo tomando suas declarações por termo, o qual, junto com outros documentos lavrados no ato, deverá ser submetido imediatamente à apreciação do Juízo e do Ministério Público, para deliberar sobre a manutenção da presente prisão administrativa, sob pena de revogação da medida. 4.4 Deverá a autoridade policial observar que o preso não poderá ser confinado junto com presos provisórios ou condenados na mesma cela, visto o que dispõe o art. 201 da Lei 7.210/84 ( Lei de Execução Penal), salvo impossibilidade de fazê-lo, devendo, neste caso, a Autoridade Policial Federal responsável por sua custódia justificar nos autos imediatamente esta circunstância para viabilizar a análise do Poder Judiciário à luz da situação concreta. 4.5 Deverá a autoridade policial, ainda, comunicar a prisão à repartição consular do país de nacionalidade do preso. 5. Intime-se o Ministério Público Federal e a Defensoria Pública da União. Embora ponderáveis as alegações da impetrante, tenho que, por ora, estão presentes os requisitos a justificar a manutenção da custódia cautelar nos termos em que decretada. De início reitero, como já consignado na decisão impugnada, que o Decreto nº 9.199/17, ao regulamentar a Lei nº 13.445/2017, expressamente prevê a possibilidade de prisão cautelar do estrangeiro, nos termos do art. 211 já mencionado. O paciente ingressou de forma clandestina na embarcação de origem, se encontra em território nacional de forma absolutamente irregular, e afirmou não ter interesse em permanecer no Brasil, concordando com a repatriação, sem qualquer manifestação em contrário, inclusive eventual pedido de refúgio, tendo suas despesas custeadas pelo agente embarcador até a efetiva saída do país, mas ao ser instado a efetivamente deixar o país passou a exigir altas quantias em dinheiro para cumprir o processo administrativo, demonstrando, ademais, comportamento extremamente agressivo contra a autoridade policial, agredindo fisicamente um policial federal, mas também contra terceiros, além de causar danos materiais, o que, em juízo preliminar, autoriza a manutenção da segregação com base no art. 211 do Decreto nº 9199/2017, sendo, ainda, incabível o pleito subsidiário de liberdade vigiada seja por se tratar de estrangeiro em situação absolutamente irregular no país, sem residência ou emprego no Brasil, e sem condições de retorno ao hotel onde se encontrava, pelo tumulto gerado e pelos danos causados a terceiros. Além disso, consoante manifestação Ministerial no feito de origem, há indícios de que o paciente seja "um clandestino profissional, que veio para o Brasil justamente para extorquir companhias marítimas, pedindo dinheiro para retornar ao seu país de origem", o que, do mesmo modo, autoriza a manutenção da custódia cautelar, para garantia da ordem pública e assegurar o cumprimento da medida de retirada compulsória do território nacional. Deste modo, ao menos em juízo preliminar, não vejo como acolher o pedido liminar, sendo mais aconselhável aguardar as informações da autoridade impetrada e a manifestação Ministerial, para o pronto julgamento de mérito pelo Colegiado. Nestes termos, indefiro a liminar. Embora se trate de processo eletrônico, onde todos os documentos já se encontram disponibilizados nesta Corte, pela peculiaridade do caso, solicite-se informações à autoridade impetrada e ao Delegado da Polícia Federal que conduz o Inquérito de origem (nº XXXXX-89.2019.4.04.7000), para que prestem esclarecimentos adicionais que possam ser relevantes para o julgamento do presente writ. Vindas essas ou não, ao final do prazo, dê-se vista ao Ministério Público Federal. Intimem-se.
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