25 de Maio de 2024
- 1º Grau
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TRT17 • Homologação da Transação Extrajudicial • XXXXX-40.2020.5.17.0101 • Vara do Trabalho - Vara do Trabalho de Venda Nova do Imigrante do Tribunal Regional do Trabalho da 17ª Região - Inteiro Teor
Detalhes
Processo
Órgão Julgador
Assunto
Indenização por Tempo de Serviço 8824
Rescisão do Contrato de Trabalho 2620
Juiz
Partes
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PODER JUDICIÁRIO JUSTIÇA DO TRABALHO TRIBUNAL REGIONAL DO TRABALHO DA 17ª REGIÃO Vara do Trabalho de Venda Nova do Imigrante ENDEREÇO: AV ANGELO ALTOÉ, 886, ED. ESMIG - Segundo andar, SANTA CRUZ, VENDA N IMIGRANTE/ES - CEP: 29375-000 EMAIL: vnov01@trtes.jus.br HTE XXXXX-40.2020.5.17.0101 REQUERENTES: J. A. M. REQUERENTES: W. A. V. |
I – Relatório
J. A. M. e W. A. V., devidamente qualificados nos autos, postularam a homologação do acordo extrajudicial espelhado no ID. 57d6c98.
II – Conhecimento
Convém, de início, sem olvidar a vocação pragmática da atividade judicante, que não objetiva assentar doutrina, traçar o perfil do instituto, de recente positivação no âmbito da CLT, apenas o suficiente para o estabelecimento de critérios operacionais, no intuito de orientar tanto as partes quanto o próprio juízo no manejo do procedimento em questão.
O Processo do Trabalho, como é de geral conhecimento, priorizou desde a edição da CLT, há mais de setenta anos, pioneiramente entre nós, o mecanismo conciliatório enquanto metodologia apta à obtenção de soluções satisfatórias para os envolvidos em disputas em torno de interesses e de direitos.
À premissa, então em voga, de que justiça verdadeira só poderia ser alcançada única e exclusivamente por meios judicatórios, a abordagem conciliatória encampada pelo Processo do Trabalho foi alvo de contraposições e até de incompreensões.
A doutrina identifica institutos conciliatórios, entre nós, desde o Código Comercial de 1850, mas, bem o sabemos, eles não tiveram operacionalidade prática.
O processo judicial (tipicamente judicatório) foi então, até recentemente – a inflexão talvez deva ser localizada, em termos positivos, no CPC de 2015, que incentivou a adoção dos métodos autocompositivos, abrindo o próprio procedimento judicial à negociação das partes (art. 190, CPC 2015)–, ressalvada a experiência conciliatória desenvolvida pela Justiça do Trabalho, e as, mais recentemente, pelos Juizados Especiais, o estuário para onde todos os conflitos de interesse confluíam na busca de composição.
Com a evolução social e os novos enfoques trazidos pelas pesquisas, impulsionadas pelos déficts operacionais das instituições encarregadas de operar o mecanismo judicatório, passaram, então, a ser amplamente aceitos e valorizados métodos autocompositivos, consensuais, não judicatórios, públicos e privados.
Nessa senda, refletindo um movimento crescente de consensualização do Poder Judiciário, o Conselho Nacional de Justiça avaliza política (Política Pública de RAD) que visa implantar (por meio da qualificação técnica do corpo de operadores) uma cultura que tem na autocomposição a solução prioritária para os conflitos de interesse.
Do Manual de Mediação Judicial editado pelo CNJ, vale a pena transcrever o seguinte excerto:
... Como será examinado no capítulo seguinte, a Política Pública de Resolução Apropriada de Disputas conduzida preponderantemente pelo Conselho Nacional de Justiça tem refletido um movimento de consensualização do Poder Judiciário, uma vez que passa a estabelecer a autocomposição como solução prioritária para os conflitos de interesse. Isso significa que o legislador crê que a maior parte dos conflitos pode ser resolvida por meios consensuais. O Código de Processo Civil apresenta uma série de indicações nesse sentido como o conciliador e o mediador sendo auxiliares da justiça (art. 149) e a criação de centros judiciários de solução consensual de conflitos (art. 165). De fato, estas indicações refletem normas infralegais estabelecidas no CNJ, como a Recomendação 50/2014 e a Resolução 125/10, respectivamente... (p. 29, acesso em 10 jan, 2018)
A adoção do procedimento de homologação de acordos extrajudiciais (art. 855-B e segs. da CLT, redação atribuída pela Lei n. 13.467/2017), reflete, então, um movimento mais amplo, que procura valorizar a participação das partes na solução de seus conflitos, rompendo com a exclusividade do modelo heterocompositivo.
Reflete, bem é de se notar, a ideia do sistema multiportas (Multidoor Courthouse), concebido pelo Prof. Frank Sander, que projeta um judiciário operador de mecanismos diversificados, com vistas à harmonização social.
Vez mais, com as vênias das partes, merece, do Manual de Mediação Judicial (op. cit.) ser transcrito o seguinte excerto (p. 41):
... Nesse contexto de se estimular o uso de práticas cooperativas em processos de resolução de disputas, "o acesso à Justiça deve, sob o prisma da autocomposição, estimular, difundir e educar seu usuário a melhor resolver conflitos por meio de ações comunicativas. Passa-se a compreender o usuário do Poder Judiciário como não apenas aquele que, por um motivo ou outro, encontra-se em um dos polos de uma relação jurídica processual – o usuário do poder judiciário é também todo e qualquer ser humano que possa aprender a melhor resolver seus conflitos, por meio de comunicações eficientes – estimuladas por terceiros, como na mediação ou diretamente, como na negociação. O verdadeiro acesso à Justiça abrange não apenas a prevenção e reparação de direitos, mas a realização de soluções negociadas e o fomento da mobilização da sociedade para que possa participar ativamente dos procedimentos de resolução de disputas como de seus resultados". Naturalmente, se mostra possível realizar efetivamente esse novo acesso à justiça se os tribunais conseguirem redefinir o papel do poder judiciário na sociedade como menos judicatório e mais harmonizador. Busca-se assim estabelecer uma nova face ao judiciário: um local onde pessoas buscam e encontram suas soluções – um centro de harmonização social…
A concepção apegada ao processo judicatório verá no procedimento sob análise, pois que não exibe conflito entre as partes, ausência de interesse processual, e isso inviabilizaria a obtenção, pelas partes, do provimento homologatório perseguido.
Mais que isso, chegou-se a defender, em sede doutrinária, fosse atribuída aos Sindicatos a atividade homologatória aqui em questão.
Mas o Sindicato não é um terceiro neutro, a quem se pudesse atribuir a tarefa. O que ele faz na homologação do TRCT, quando finda o contrato de trabalho, é um exercício de fiscalização. Verifica se os direitos da parte a quem assiste foram atendidos a contendo, e, não o sendo, assinala a competente ressalva.
De se notar, a propósito, que o legislador dispensou a homologação dos TRCTs, mas sobrevivem múltiplas cláusulas coletivas que o exigem. Na verdade, elas se multiplicarão nas convenções coletivas futuras, dada a vocação natural dos Sindicatos para a defesa dos direitos dos seus representados.
Sob a ótica ampliada de que o Judiciário deve abraçar a posição de centro de harmonização social, fica evidente o interesse das partes em ver seladas suas posições jurídicas, compostas por meio do acordo apresentado na petição inicial.
A elas interessa a resolução, segundo o instrumento do acordo extrajudicial, definitiva das posições jurídicas ativas e passivas decorrentes da relação jurídica por elas travada. Ou seja, interessa-lhes a impressão do atributo da definitividade ao que for ajustado.
O interesse, então, no caso presente, repousa no direito de as partes acessarem a segurança jurídica que a homologação judicial (estando tudo em conformidade com o direito aplicável) atribuirá ao ajuste por elas apresentado.
Conhece-se, então, do procedimento em questão, dando-se por presentes os requisitos necessários à atuação da atividade jurisdicional.
A propósito, assinale-se, que a atividade de homologação aqui atribuída ao Juiz não é atípica, de vez que, no marco processual vigente, a atividade típica atribuída ao Juiz ultrapassa aquela consistente em julgar lides.
A respeito, assinala José Miguel Garcia Medina, nos seus comentários ao novo Código de Processo Civil, São Paulo, Ed. Revista dos Tribunais, 2015, p. 77:
... O CPC de 2015 incorporou a ideia de que o Poder Judiciário deve atuar também na promoção de solução consensual dos conflitos (assim, não se pode mais dizer, no contexto do CPC de 2015, que é típica apenas a atividade do magistrado consistente em"julgar"lides)…
O influxo dessa proposição, sustentada pelo direito positivo vigente (art. 3º do CPC), acerca das concepções do que vem a ser jurisdição contenciosa (em cuja resolução se tinha o exercício da atividade típica do Juiz – jurisdicional) e jurisdição voluntária (onde o Juiz atua exercendo atividade atípica, não jurisdicional) acabará por impor a ressignificação da atividade jurisdicional, pois a atividade típica do Juiz não mais se resume a compor heteronomamente (se substituindo às partes) os conflitos, tendo sido ampliada para abarcar atuação efetiva também nos mecanismos de solução consensual dos conflitos.
No caso em questão, cuida-se, portanto, de atividade tipicamente jurisdicional a ser desempenhada em procedimento não contencioso.
A contenciosidade, a adversarialidade, a existência de litígio entre as partes deixou de ser, com todo respeito às posições divergentes, no marco do CPC de 2015, o mote exclusivo deflagrador do exercício da atividade jurisdicional.
Entendendo pela aplicabilidade das disposições do processo comum (o CPC de 1973 também admitia a homologação de acordo extrajudicial, no art. 475-N, inciso V, redação dada pela Lei 11.232/2005), mesmo antes da promulgação da Lei n. 13.467/2017 este Juízo admitia o procedimento de homologação de acordo extrajudicial, entendendo preenchido o requisito consistente no interesse processual.
Procedimento / Efeitos projetados pelo acordo extrajudicial
É certo que o Juiz não pode modificar o acordado, atribuindo às partes obrigações e direitos diversos daqueles que elas expressamente assumiram, pois não se cuida de procedimento judicatório, aquele em que o Juiz se substitui às partes, promovendo uma solução heterônoma.
Não menos exato é que o Juiz não está obrigado a homologar o acordo entabulado pelas partes.
A alínea f do art. 652 da CLT, ao acrescer competência ao Juiz do Trabalho para atuar em casos como o presente, referiu: decidir quanto à homologação de acordo extrajudicial em matéria de competência da Justiça do Trabalho. (destacamos)
A fórmula legislativa atribuiu ao Juiz do Trabalho competência para decidir quanto à homologação, disso resultando pelo menos duas conclusões de suma importância: 1. Ambos os resultados são possíveis: homologar ou negar homologação; 2. As partes devem trazer a contextura fática, todos os dados necessários à convicção do magistrado, pois deles desmuniciado não haverá como formar a convicção e, de conseguinte, decidir, concluir pela homologação.
Há de igualmente pôr em relevo, a fim de bem demarcarmos os efeitos projetados pelos acordos extrajudiciais, a opção legislativa estampada no art. 855-E da CLT (redação dada pela multicitada Lei n. 13.467/2017): a petição, assinala o dispositivo legal, de homologação de acordo extrajudicial suspende o prazo prescricional da ação quanto aos direitos nela especificados. (destacamos).
Contrario sensu, não suspende a prescrição quanto a eventuais direitos que da referida petição não constam.
Em verdade, o dispositivo em tela é bem claro, só reconhecendo efeitos jurídicos relativamente a direitos expressamente referidos na petição do acordo extrajudicial.
Identificada a mens legis, que circunscreve os efeitos jurídicos aos direitos expressamente referidos no instrumento do acordo extrajudicial, é de se repelir a quitação em branco que, de resto, não deveria mesmo ser homologada pelo Judiciário.
A premissa básica da autocomposição, é importante ter em mente, é a mútua confiança, que não se logra à míngua da mais cristalina transparência quanto ao objeto da negociação.
Prevalece, então, a lógica do humano, do senso comum, de que não se logra quitação (efeito liberatório) relativamente àquilo que não foi objeto da composição entre as partes e que não tenha, expressamente, constado do acordo extrajudicial trazido à homologação.
III – Mérito
Presentes os requisitos do art. 855-B da CLT, e não se avistando, in casu, qualquer vício de vontade, homologa-se o acordo extrajudicial objeto deste feito.
IV – Dispositivo
Ante o exposto, decide-se, nos termos dos artigos 652, alínea f, e 855-B, da CLT, e do art. 487, inciso III, alínea b, do CPC, de aplicação subsidiária, HOMOLOGAR, para que surtam os efeitos legais, o ACORDO EXTRAJUDICIAL formulado entre J. A. M. e W. A. V.
Custas processuais, a serem rateadas pelas partes, no importe global de R$80,00, mensuradas sobre o montante do acordo, R$4.000,00, dispensadas do pagamento (sob invocação analógica do disposto no § 3º do art. 90 do CPC) a título de incentivo à composição autônoma dos conflitos.
Sem incidência de contribuição previdenciária.
VENDA N IMIGRANTE/ES, 22 de outubro de 2020.
PAULO EDUARDO POLITANO DE SANTANA
Juiz (íza) do Trabalho Titular