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2 de Maio de 2024
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    A concessão do benefício social para deficientes - Maria Clara Assunção

    Publicado por OAB - Rio de Janeiro
    há 10 anos

    Objetivo: Relacionar a finalidade da curatela para o caso de indivíduos com deficiência intelectual que não têm capacidade laboral, nem independência para as atividades da vida diária e que se enquadram no perfil para o

    recebimento do benefício social da prestação continuada.

    1. A Interdição e a Deficiência

    A interdição remonta ao Direito Romano, tendo sido criada para o suprimento de incapacidades (anormalidades e prodigalidades, assim identificadas à época). Ao longo do tempo, o conceito acerca da matéria sofreu alterações de maneira que foi possível a sua adaptação à evolução natural do pensamento, reproduzido em sociedade, muito mais sensível à noção da diversidade humana.

    O deficiente auditivo, por exemplo, foi discriminado por um longo período da história, pois, em função da dificuldade em se expressar através da Língua convencional, sua incapacidade era presumida. Assim como, os

    indivíduos com transtorno mental eram, pejorativamente, identificados pelo Código Civil de 1916 como "loucos de todo gênero".

    A forma com que a legislação lidava com o tema sofreu um abrandamento, a partir do novo Código Civil, introduzido pela Lei n.º 10.406 de 10 de janeiro de 2002, quando a expressão foi substituída pela seguinte

    descrição: os que, por enfermidade ou deficiência mental, não tiverem o necessário discernimento para a prática desses atos. Sendo indispensável a existência de um porta voz para os interesses do indivíduo nesta condição, a lei instituiu a ação de interdição como o meio processual hábil para situações em que se busca, através do pronunciamento do Juiz, declarar a incapacidade civil de alguém. O direito de ação, assim, é

    exercido pela instauração de um processo de jurisdição voluntária, iniciado por quem tenha legitimidade legal para tanto, finalizado com a nomeação de um curador, conforme previsto no art. 1177 do Código de Processo Civil.

    De acordo com o Decreto nº 3.298/99, a deficiência intelectual se evidencia antes dos dezoito anos e quando o indivíduo possui limitações associadas a duas ou mais áreas de habilidade, como: comunicação; cuidado pessoal; habilidades pessoais; utilização dos recursos da comunidade; saúde e segurança; habilidades acadêmicas; lazer e trabalho. Apesar do déficit cognitivo e da capacidade inferior de abstração em

    relação aos demais, as pessoas com deficiência intelectual manifestam sua vontade, ainda que com menor poder de decisão e firmeza quanto as suas razões, mas através de pedidos, atitudes e gostos próprios, ressalvando-se casos severos, o que acrescenta a importância do acompanhamento feito por pessoa sensível a estes desejos.

    Portanto, a depender do grau de acometimento da incapacidade a presença do responsável (curador) que lhe represente quase sempre é relevante, pois na maioria das vezes, as pessoas com deficiência intelectual distinguem-se pelo grau de sua inocência. Sendo comum que diante das regras sociais posicionam-se com demasiada simplicidade o que lhes coloca em posição vulnerável.

    Desta maneira, o Código Civil separa a incapacidade absoluta da incapacidade relativa (art. e 4º, CC). E a Lei Processual dispõe que o Juiz, ao decretar a interdição, fixará os limites da curatela na Sentença.

    2. Limites e Assistência

    Em virtude da dificuldade de raciocínio, uso da linguagem e de autodeterminação na maior parte dos casos, a pessoa com deficiência intelectual é a que encontra maior barreira dentro do processo de empregabilidade e possui menor resistência contra os elementos de exclusão.

    O aprendizado segue um ritmo mais lento, por isso são raros os casos em que o indivíduo com déficit cognitivo conclui etapas acadêmicas, o que o torna menos competitivo. Sendo certo que o critério de contratação no mercado de trabalho, constantemente, baseia-se no nível de escolaridade. Além disso, o modo pelo qual se relaciona socialmente também lhe é bem peculiar, geralmente incompatível com a idade cronológica. Alguns se inserem dentro do contexto e visualizam a cadeia administrativa formada pelo vínculo profissional, respeitam regras de convivência e desempenham funções mais simples, outros sequer compreendem a ordem das relações de trabalho, sem falar no bloqueio para o desempenho constante de determinada tarefa.

    Neste sentido, sem perquirir o valor da atividade laboral para o ser humano, como exercício e aprimoramento de suas capacidades, às pessoas com deficiência intelectual é direcionado o Benefício de Prestação Continuada.

    Direito que lhes assiste, com origem na Constituição Federal e esteio no princípio da dignidade da pessoa humana, fundamento do Estado Democrático de Direito.

    O art. 203 da CRFB/88 disciplina que a assistência social será prestada a quem dela necessitar, independentemente da contribuição à seguridade social. Como um dos objetivos da Assistência Social está a garantia de um salário mínimo de benefício mensal à pessoa com deficiência que comprove não possuir

    meio de prover à própria manutenção ou de tê-la provida por sua família, conforme dispuser a Lei.

    O dispositivo é complementado pela Lei Orgânica da Assistência Social (LOAS nº 8.742, de 7 de dezembro de 1993) que o materializa em seus artigos 20 e 21. O critério objetivo para a concessão do benefício social é a

    demonstração de renda mensal per capita inferior a 1/4 (um quarto) do salário-mínimo, conforme art. 20, 3º da Lei. Na hipótese de a pessoa com deficiência não ser acolhida pela família, a condição de acolhimento em instituições de longa permanência não prejudica o seu direito ao benefício de prestação continuada (art. 20, 5º).

    Sobre este aspecto é possível argumentar positivamente, pois as pessoas institucionalizadas são exemplo de sujeitos carentes e, ainda que, possam contar com a estrutura básica a seu favor, pois na maior parte das vezes, não possuem amparo familiar, permanecendo longos anos inseridos em programas de moradia e por serem dependentes para as atividades de vida diária, necessitam de constante assistência de cuidadores.

    Portanto, são potenciais beneficiários do BPC, caso estejam enquadrados nos requisitos ensejadores da sua contemplação e, a administração, naturalmente, ficará a cargo de um responsável. Nestas ocasiões, o Ministério Público é legitimado para requerer a curatela na forma do (art. 1178, CPC) que prevê a possibilidade de atuação do MP nos casos de anomalia psíquica, quando nenhum familiar promover a ação, ou no caso de serem estes menores ou incapazes. Por outro lado a lei não autoriza o Dirigente da Instituição ou Abrigo a intentar a Ação de

    Interdição, pois o rol legislativo do art. 1777 é taxativo. Contudo, por analogia ao art. 33, e 92 do Estatuto da Criança e do Adolescente, o Dirigente poderá ser indicado para assumir o encargo da curatela destes moradores, sem embargo da nomeação de outro profissional envolvido no programa como curador judicial. Na verdade, a situação deverá atender ao melhor interesse do interditando.

    Salienta-se que, no âmbito do Estado do Rio de Janeiro, foi criado o cargo de Testamenteiro e Tutor Judicial ao qual incumbe também exercer as funções de curador do interdito, na falta de cônjuge, ascendente, escendente

    ou, a critério do Juiz, de parente próximo idôneo. (art. 76, CODJERJ). O Benefício de Prestação Continuada é regulamentado pelo Decreto nº 6.564, de 12 de setembro de 2008 e articulado por Estados e Municípios,

    através das Secretarias de Desenvolvimento Social e Escolas. Nos casos de necessária representação legal do requerente, para que este receba o benefício, é preciso formalizar a situação por meio de documentação hábil, em se tratando do deficiente intelectual maior de idade, o termo de curatela será uma das exigências.

    3. Conclusão

    Nesta ordem de razões, compreende-se que o instituto da curatela contribui, socialmente para a redução de desigualdades. Neste contexto, considerada a concessão do benefício à Pessoa com Deficiência Intelectual maior de idade, que, em regra, dependerá da atuação de um representante para a defesa deste direito e de outros interesses. Nota-se que o perfil socioeconômico do público, abrangido pela LOAS, tem predomínio no indivíduo carente, o que desperta a importância da figura do curador para a efetividade da tutela dos direitos das pessoas com deficiência. A função garantidora do curador poderá se alargar para todo e qualquer direito que se pretenda defender em nome do interdito, além do mais, no caso específico da contemplação no BPC vislumbra-se a dupla tarefa de proteção, pois, embora a questão financeira seja objeto de disputa, ainda mais relevante se faz o amparo físico e moral da pessoa.

    A curatela, sem embargo do seu aspecto patrimonial, transcende às raias da mera proteção dos bens do incapaz, pois em se tratando da pessoa com deficiência intelectual o apoio honesto de seu bem estar é iniciativa principal, haja vista a sua condição pessoal de vulnerabilidade.

    A rigor, o benefício assiste os necessitados, efetivando a proteção social na medida em que contribui para a redução dos índices de miserabilidade, inobstante os critérios objetivos adotados serem extremamente hesitantes, levando-se em conta a realidade brasileira e o alto custo de vida.

    Pelo exposto, a referência jurídica tem como enfoque a relação entre a ação de interdição e o advento de um benefício social cujo escopo é alcançar a convivência de todos em uma sociedade livre de desigualdades acentuadas, como preconiza o art. , III da Constituição da Republica Federativa do Brasil.

    *Advogada e membro da

    Comissão de Defesa dos Direitos da Pessoa com Deficiência

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