"Devo não nego, pago quando puder” Emenda Constitucional nº 113 - correção e juros de mora contra Fazenda Pública*
“
A expressão popular descreve a situação financeira de muitos consumidores brasileiros diante dos bancos, financeiras, prestadoras de serviço e comércio em geral vivenciam quando estão inadimplentes. Mas, agora a questão ficou mais preocupante, pois, é o Estado que está usando desse adágio popular para se defender de seus débitos e, postergar o máximo possível; gerando verdadeira injustiça. A Emenda Constitucional "do calote" está ativa e operante.
Este sintético artigo tem, por objetivo, dialogar a respeito da alteração do sistema que cuida dos pagamentos das condenações que possui por devedora a Fazenda Pública . Assim, apesar do pouquíssimo tempo de publicada, a EC/113 de 9/12/2021, já está ficando conhecida como “a nova emenda do calote”.
O objetivo da presente análise não é dissecar a Emenda Constitucional de n.º 113, mas, ressaltar de forma objetiva o que esta emenda acarretará de mudanças, na prática, para os credores da Fazenda Pública.
A EC/113 trata, especialmente, acerca da atualização monetária e juros de mora aplicáveis à Fazenda Pública. Não será dissecado o tema, por completo, mas apenas será analisado os dispositivos dessa Emenda que tratam sobre as atualizações e correções e as regras que envolvem os precatórios já expedidos.
Emenda Constitucional nº 113, de 8 de dezembro de 2021 (publicada em 9/12/2021), Art. 3.º:
Art. 3º Nas discussões e nas condenações que envolvam a Fazenda Pública, independentemente de sua natureza e para fins de atualização monetária, de remuneração do capital e de compensação da mora, inclusive do precatório, haverá a incidência, uma única vez, até o efetivo pagamento, do índice da taxa referencial do Sistema Especial de Liquidação e de Custódia (Selic), acumulado mensalmente. (Sem grifos ou destaques no original).
O dispositivo trata “das discussões” (leia-se: nos processos em curso), “nas condenações” – decisões judiciais – transitadas em julgado – que envolvem a Fazenda Pública independente da sua natureza. Processos em curso, decisões condenações (transitadas em julgado) em tudo haverá a incidência da SELIC acumulado mensalmente. Este é o novo capítulo da “novela”. A EC 113/2021 – “apaga” tudo e passa a aplicar a SELIC para todas as hipóteses em que a Fazenda Pública for devedora?
Independentemente da sua natureza: previdenciárias, tributárias, cíveis. Sim, com base na nova emenda constitucional n.º 113/2021 todas as dívidas terão por correção e atualização a SELIC.
A EC 113/2021 se aplica a partir da data da publicação em 9/12/2021. Em data para trás, aplicaremos os índices que já existiam, leia-se o art. 5.º da aludida Emenda:.
Art. 5º As alterações relativas ao regime de pagamento dos precatórios aplicam-se a todos os requisitórios já expedidos, inclusive no orçamento fiscal e da seguridade social do exercício de 2022. (Sem grifos ou destaques no original).
Importante entender como funcionava antes:
Dívidas Previdenciárias: Temas 810/STF e 905/STJ
- Até março de 2006: IGP-DI
- De abril de 2006 até junho de 2009: INPC
- A partir de julho de 2009: IPCA-E para BCP e LOAS; INPC para os demais benefícios previdenciários.
Dívidas Tributárias
- Selic
Cíveis
- IPCA-E para correção e TR para os juros
A partir de 9/12/2021 é SELIC para tudo. Se era para simplificar o problema dos indexadores utilizados para fins de correção e atualização de dívidas a serem pagas pela Fazenda, tal fato não se discute; afinal se tomou um único indexador para todas as hipóteses de débito da Fazenda.
Mas, é preciso entender que; trocar todas as outros índices têm-se como resultado que os credores receberão menos a título de juros e correção monetária. Utilizar a SELIC importa em diminuição de valores para os credores. Significa dizer que teremos um novo capítulo no que diz respeito aos juros de mora e correção.
Este fato já desencadeou uma nova discussão: a ação direta de inconstitucionalidade proposta pelo PDT (Partido Democrático Trabalhista) ajuizou a ADI 7047 com pedido liminar com fins de que EC 113/2021 que alterou os índices de pagamento dos precatórios seja, integralmente, invalidada pelo STF. O partido argumenta que propostas de alterações semelhantes no texto Constitucional já foram anteriormente rechaçadas pelo STF.
Na ADI 7047/2021 o PDT argumenta que a fixação da SELIC como índice de correção e remuneração dos precatórios viola o direito fundamental à propriedade. Segundo a tese hospedada na ação direta de inconstitucionalidade a taxa não é instrumento adequado para repor as perdas da inflação. Porque, é instrumento de política monetária de controlar a inflação e não de reparar perdas posteriores.
A agremiação partidária autora da ADI 7047/2021 sustenta a inconstitucionalidade formal e material da EC nº 113/2021 por violação do devido processo legislativo (CF, arts. 58, caput, 60, I e § 2º), do princípio da separação dos poderes (CF, art. 2º), da garantia da coisa julgada (CF, art. 5º, XXXVI), do direito à igualdade (CF, arts. 5º, caput), do princípio da impessoalidade (CF, art. 37, caput), do direito à propriedade (CF, art. 5º, XXII), do princípio republicano (CF, art. 1º, caput), do regime de pagamento de precatórios (CF, art. 100) e da vedação ao confisco (CF, art. 150, IV).
O PDT argumenta que o novo regime instituído pela EC nº 113/2021 traz grande prejuízo aos credores, pois “haverá um limite para o pagamento de precatórios com base no gasto de 2016 (ano de criação do teto de gastos) corrigido pela inflação, o que reduz o valor do próximo ano de R$ 89 bilhões para cerca de R$ 45 bilhões”.
Com isso, “as dívidas não pagas entram em uma fila, sem prazo para que o dinheiro seja recebido”. Em consequência, “quem quiser receber os valores no ano seguinte, precisa abrir mão de 40% (quarenta por cento) do valor, deságio abaixo do valor de mercado e criado de forma arbitrária”.
Mas não é só isso o PDT também defende o fato de que a taxa é fixada de forma discricionária pelo COPOM – Comitê de Política Monetária (conforme as preferencias circunstanciais da política econômica encampada por determinado governo).
Mais uma celeuma instalada.
É fato que o regime jurídico dos precatórios é tema bastante complexo e sinalizamos que esta análise não tem aptidão encerrar qualquer questionamento, ao contrário: apenas externou-se a dificuldade e a polêmica que envolve o tema; extrai-se desse episódio de mais uma “grande novela” que se inicia que existiu como de fato existe um imenso desrespeito ao jurisdicionado-credor; especialmente aos credores previdenciários.
*Suzana Barboza
Graduação em Direito pela Universidade do Estado da Bahia - UNEB. Graduação em Letras Espanhol Universidade Federal de Pernambuco - UFPE. Advogada militante, com experiência nas áreas de Direito Civil, com ênfase em Direito Real Imobiliário. Pós-graduada em Direito Civil e Processual Civil pela Escola Superior da Magistratura de Pernambuco - ESMAPE. Pós-graduada em Direito Processual Civil (Novo CPC - ESA - OAB/PE). Pós-Graduanda em Direito Notarial e Registral - Anhanguera Educacional (SP). Pós-Graduanda em Finanças, Investimentos e Banking, na PUC- RS. Atuei como professora em programa da UPE - Universidade de Pernambuco, da disciplina de Língua Espanhola.
0 Comentários
Faça um comentário construtivo para esse documento.