Empresa é condenada a diminuir carga horária e garantir remuneração integral de trabalhadora com filho com transtorno do espectro autista
Decisão da 19ª Vara do Trabalho de Belo Horizonte transitada em julgado determina que empresa pública reduza jornada e mantenha salário de empregada com filho autista
A Justiça do Trabalho determinou que uma empresa pública reduza a carga horária de trabalho de uma funcionária sem reduzir seu salário, permitindo que ela possa acompanhar as atividades médicas e terapêuticas de seu filho autista. O juiz responsável pelo caso, Augusto Pessoa de Mendonça e Alvarenga, atuou na 19ª Vara do Trabalho de Belo Horizonte. A trabalhadora relatou que ocupa o cargo de “auxiliar de apoio ao educando” e trabalha oito horas por dia, de segunda a sexta-feira.
Ela demonstrou durante o processo que seu filho foi diagnosticado com Transtorno do Espectro Autista (TEA) e que precisa de acompanhamento multidisciplinar. Na decisão, o juiz permitiu que sua carga horária de trabalho seja reduzida para seis horas por dia e 30 horas por semana, das 7h às 13h15min, já considerando o intervalo intrajornada de 15 minutos. O juiz reconheceu que a presença da mãe é fundamental para o acompanhamento da criança. Ao fundamentar sua decisão, o juiz citou o artigo 226 da Constituição, que estabelece a proteção especial do Estado à família, que é a base da sociedade. Ele também mencionou o artigo 227 da Constituição, que estabelece o dever da família, da sociedade e do Estado de garantir à criança, ao adolescente e ao jovem o direito à vida, à saúde, à alimentação, à educação, ao lazer, à profissionalização, à cultura, à dignidade, ao respeito, à liberdade e à convivência familiar e comunitária.
Além disso, o juiz citou o artigo 1º da Lei 12.764/2012, que reconhece o autismo como deficiência. O fato de a Consolidação das Leis do Trabalho ( CLT) não estabelecer regras específicas para essa questão não impediu a atuação jurisdicional, conforme o artigo 5º, inciso XXXV, da Constituição, e o artigo 8º da CLT. O juiz observou que a reclamada é uma empresa pública que fornece mão de obra para a administração direta e aplicou ao caso, por analogia, a Lei 8.112/1990, que estabelece o regime jurídico dos servidores públicos. Os parágrafos 2º e 3º do artigo 98 da lei permitem a concessão de horário especial ao servidor que tenha cônjuge, filho ou dependente com deficiência.
O juiz destacou que a relevância do tema é tamanha que a lei específica assegura vários direitos à pessoa com transtorno do espectro autista, como vida digna, integridade física e moral, livre desenvolvimento da personalidade, segurança, lazer, proteção contra qualquer forma de abuso e exploração, saúde, educação, moradia, trabalho e previdência social, entre outros (artigo 3º da Lei 12.764/2012).
Segundo a decisão proferida, a aplicação do artigo 98, parágrafo 3º, da Lei 8.112/1990 aos empregados celetistas ocorre mediante a integração das normas em razão da lacuna legal e da equidade, sob pena de violação ao princípio da não discriminação previsto no ordenamento jurídico. O magistrado ressaltou sua obrigação de promover a adequada integração normativa, mediante análise ponderada, para garantir os direitos do filho menor da autora. Para fundamentar sua decisão, o juiz invocou a jurisprudência do TRT de Minas e do TST.
Ao avaliar o caso, o juiz concluiu que a jornada de trabalho de 44 horas semanais dificulta significativamente o acompanhamento do filho da autora e que o salário deve ser preservado, tendo em vista a necessidade de manutenção da renda da família para arcar com os custos dos tratamentos do menor. O magistrado considerou que a decisão assegura o direito da trabalhadora sem causar grandes prejuízos à empregadora. O Tribunal Regional do Trabalho da 3ª Região confirmou a decisão de primeira instância e o processo foi arquivado após o trânsito em julgado.
Processo n: 0010678-42.2022.5.03.0019
Consulte a íntegra: https://pje-consulta.trt3.jus.br/consultaprocessual/detalhe-processo/ 0010678-42.2022.5.03.0019
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