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16 de Junho de 2024

Pagamento indevido da taxa de corretagem e o prazo prescricional para a repetição do indébito

Nota.

Publicado por Adroaldo • Jaon
há 10 anos

Versando-se de aquisição de imóvel em construção diretamente da construtora, é abusiva a cláusula que transfere ao adquirente o ônus do pagamento de comissão de corretagem.

A jurisprudência dominante[1], consubstanciada nos princípios da boa-fé objetiva contratual e, sobretudo, equidade, é assente no entendimento de que cláusula atinente à cobrança da taxa de corretagem constante em contrato standard de compra e venda de imóvel é, per si, leonina, colimando que não há a aquiescência do adquirente do bem (objeto mediato do contrato) em pagar referida taxa (objeto imediato estranho ao contrato), motivo pelo qual devem ser restituídos os valores pagos indevidamente, com seus acréscimos legais.

Some-se a isso que entendimento contrário faleceria de fundamentação, é dizer teratológico, eis que, em casos tais, inexiste um contrato de corretagem (Código Civil, art. 722 a 729) apartado do contrato principal, mas sim a inserção indevida daquele contrato numa cláusula do principal, ou até mesmo a cobrança sob a nomenclatura “sinal”, evidenciando tamanha má-fé do agenciador à vista de não haver ab initio, como cediço, liberdade contratual em contratos standard, tão somente, in casu, vício do consentimento.

Há nessa relação jurídica – nada serena – três sujeitos de direitos e deveres, quais sejam: o agenciador (construtora do imóvel; solvens da taxa), corretor (accipiens da taxa) e o adquirente do imóvel (consumidor, destinatário final do bem); incumbe ao primeiro sujeito, e não ao terceiro, o pagamento da taxa ao segundo, pois os serviços do corretor são única e exclusivamente prestados à construtora, já que preexiste uma relação jurídica entre eles, relação essa espargida pelo consumidor quando, e. G., este se dirige ao estande de vendas da construtora e lá se faz presente o corretor, o qual se utiliza de mecanismos (e. G. uso de vestuário ou crachá do agenciador) que fazem deduzir ser ele funcionário da construtora, seu preposto.

O consumidor não aufere qualquer proveito com a suposta intermediação empreendida pelo corretor, pois a aquisição é avençada diretamente com a construtora. O corretor não age, nesta hipótese, como intermediário ou prestador autônomo de serviço, mas como verdadeiro preposto da construtora, de modo a facilitar a atividade empresarial desta.

Nesse viés lógico, questiona-se: qual o prazo prescricional para o consumidor reaver os valores pagos indevidamente sobre a comissão em voga? Para responder a essa indagação, faz-se necessário saber a derivação jurídica do ato/cobrança, e se há previsão legal de prazo prescricional desse efeito.

Parte da jurisprudência[2], que venturosamente se intensifica, da qual me filio, entende ser o instituto civil do pagamento indevido (CC, art. 876 a 883) a derivação jurídica do ato, sendo, com isso, de dez anos o prazo prescricional em discussão, por força do art205555 doCCC (prazo ordinário); noutra linha, há julgados[3] que entendam seja o instituto do enriquecimento sem causa (CC, art. 884 a 886) a conseqüência jurídica do ato, sendo, com isso, de três anos o prazo prescricional, por força do art206666, §§§ 3ºº, inc. IV, doCCC; no mais, há quem compreenda seja enriquecimento sem causa o gênero do qual o pagamento indevido é espécie[4].

Sem embargo, D. M. V., deve prevalecer o primeiro posicionamento, já que os institutos não se confundem, tampouco seja um a espécie e o outro gênero ante o legislador tratá-los como institutos autônomos. Elucide-se, assim, que no pagamento indevido há de se falar das figuras do accipiens e solvens, ocorrendo, no entanto, erro em quem cumpre a obrigação (ou como cumpre) e/ou em quem se beneficia (e. G. a cobrança de comissão de corretagem pela construtora ao consumidor, sendo que quem contratara o corretor fora unicamente a construtora); já no enriquecimento sem causa inexistem essas figuras, ocorrendo, no entanto, um não benemérito (e. G. a invasão de um imóvel com finalidade de adquirir a sua propriedade[5]).

À vista disso, conclui-se, sinteticamente, que a derivação jurídica do ato da construtora, quando insere a discutida cláusula abusiva no contrato standard – nula de pleno direito (Código de Defesa do Consumidor, art. 51, inc. IV) –, é o pagamento indevido da taxa de corretagem realizado pelo consumidor, sendo decenal o prazo prescricional para reaver os valores pecuniários cobrados indevidamente (CC, art. 205), contado a partir do efetivo pagamento (CC, art. 189).

REFERÊNCIAS

[1] (TJ-PR - RI: 002535916201381601820 PR 0025359-16.2013.8.16.0182/0 (Acórdão), Relator: Gustavo T. De Almeida, Data de Julgamento: 16/10/2014, 1ª Turma Recursal, Data de Publicação: 23/10/2014); (TJ-DF - APC: 20130111268648 DF 0032803-13.2013.8.07.0001, Relator: JOSÉ GUILHERME; Data de Julgamento: 01/10/2014, 3ª Turma Cível, Data de Publicação: Publicado no DJE: 13/10/2014. Pág.: 179).

[2] (...) COMISSÃO DE CORRETAGEM. PAGAMENTO INDEVIDO. PRAZO PRESCRICIONAL. DEZ ANOS (...) (TJ-DF - ACJ: 20140110007892 DF 0000789-39.2014.8.07.0001, Relator: FLÁVIO AUGUSTO MARTINS LEITE, Data de Julgamento: 10/06/2014, 2ª Turma Recursal dos Juizados Especiais Cíveis e Criminais do DF, Data de Publicação: Publicado no DJE: 11/06/2014. Pág.: 228).

[3] (...) considerando que a redução do patrimônio dos Requerentes implicou no enriquecimento patrimonial da Construtora às suas custas, aplica-se o prazo prescricional trienal do artigo 206, § 3º, inciso IV, do Código Civil (...) (Apelação Nº 201400714131, 1ª CÂMARA CÍVEL, Tribunal de Justiça do Estado de Sergipe, OSÓRIO DE ARAÚJO RAMOS FILHO, RELATOR, Julgado em 21/10/2014).

[4] RODRIGUES, Silvio; Direito Civil, v. 3, p. 421, ed. São Paulo: Saraiva, 2003.

[5] TARTUCE, Flávio; Direito Civil, v. 4, p. 57, ed. Método, 2009.

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2 Comentários

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Luana Alves
9 anos atrás

Oi Dr. Adroaldo, muito boa sua explicação. Estou com 2 casos envolvendo exatamente essa questão, gostaria de saber se você possui algum modelo de inicial que possa me ajudar já que estou começando e trabalho sozinha. Obrigada! continuar lendo

Adroaldo • Jaon
9 anos atrás

Agradecido pelo encômio, Bela. Luana! Contate-me (e-adroaldo@hotmail.com), para alcançarmos o arrazoado colimado. continuar lendo