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6 de Maio de 2024
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    TRE indefere, em decisão unânime, registro de candidato por afinidade com filha do governador. (Voto do relator)

    AUTOS DE PROCESSO: Nº 949

    RELATOR : Des. ROOSEVELT QUEIROZ COSTA

    REQUERENTE: COLIGAÇÃO PPS-PFL

    ASSUNTO: REGISTRO DE CANDIDATURA AO CARGO DE DEPUTADO ESTADUAL

    RELATÓRIO

    Trata-se de pedido de registro da candidatura de GUILHERME ERSE MOREIRA MENDES ao cargo de Deputado Estadual formulado pela Coligação PPS-PFL.

    A Secretaria Judiciária deste Tribunal procedeu à conferência da documentação e análise das exigências insertas nos arts. 25 e 26 da Resolução nº 22.156 /06-TSE, tendo certificado à fl. 15 a regularidade do presente pedido.

    Registre-se, inicialmente, que houve impugnação das candidaturas lançadas pela Coligação PPS-PFL (autos de processo nº 914 e autos nº 933 , fls. 33/34), já julgada nesta Corte.

    O Ministério Público Eleitoral impugnou o pedido de registro da candidatura alegando, em suma, a ligação entre a família do atual Governador do Estado, Ivo Cassol e a família Moreira Mendes, principalmente depois do nascimento de Enzo Guilherme Cassol Erse, filho do interessado com Juliana Mezzomo Cassol, filha do Governador, caracterizando, dessarte, o parentesco por afinidade, o que implica em inelegibilidade, nos termos do artigo 14 , § 7º , da Constituição Federal e artigo , § 3º , da Lei Complementar nº 64 /90. Juntou os documentos de fls. 22 a 62.

    Sobreveio a contestação (fls. 66/85), com documentos (fls.86/94).

    Aduz o impugnado, preliminarmente, a inépcia da petição inicial em razão da intempestividade no ajuizamento da impugnação ao registro, caracterizando, assim, a decadência.

    Alega, também, que não há suporte probatório mínimo apto a deflagar a ação de impugnação do registro o que enseja a extinção do processo..

    No mérito, o impugnado assevera que nunca conviveu de forma duradoura, pública e contínua com a filha do Governador Ivo Cassol de modo a caracterizar uma união estável, mas somente manteve uma relação de namoro com a mesma. Juntou documentos às fls. 86/93.

    Foram ouvidas as testemunhas Manoel Flávio Médici Jurado (fl. 132), Emerson Gutemberg da Silva (fl. 133), Ivanildo Vitorino da Silva (fl. 134), Francinildo Carneiro do Nascimento (fl. 135), Luis Carlos Cordeiro de Souza (fl. 136) e Gerson Martins Maia (fl. 137).

    Em alegações finais, o impugnado reitera seja acolhida a preliminar de inépcia e, no mérito, julgado improcedente o pedido de Impugnação de Registro de Candidatura. Por fim, requereu o deferimento do registro da candidatura.

    O MPE, por sua vez, ratifica a inicial, aduzindo a improcedência das preliminares, bem como reafirma a existência da união estável entre o interessado e a filha do atual Governador do Estado.

    Por derradeiro, o Ministério Público alega que existe uma evidente aproximação política entre o Governador Ivo Cassol e a família Moreira Mendes, máxime quando foram nomeados para cargos em comissão no Governo tanto o impugnado Guilherme Erse Moreira Mendes como seu irmão Ricardo Erse Moreira Mendes e até o próprio Rubens Moreira Mendes Filho, conforme dão conta as portarias de nomeação juntadas às fls. 55 /61.

    É o relatório.

    VOTO

    Friso inicialmente, relembrando à Corte que a impugnação apresentada pela Coligação Rondônia no Coração, nos autos nº 914 , foi julgada improcedente. De conseqüência, neste particular não há óbice para o exame do presente feito.

    I - Preliminar de inépcia da inicial de impugnação

    1. O impugnado sustenta a inépcia ao argumento de que impugnação ao pedido de registro de candidatura além de ser intempestiva não veio carreada com as provas do alegado.

    Insta registrar que a alegada inelegibilidade está inserida no § 7º do art. 14 da Constituição Federal . Verbis: § 7º. São inelegíveis, no território de jurisdição do titular, o cônjuge e os parentes consangüíneos ou afins, até o segundo grau ou por adoção, do Presidente da República, de Governador de Estado ou Território, do Distrito Federal, de Prefeito ou de quem os haja substituído dentro dos seis meses anteriores ao pleito, salvo se já titular de mandato eletivo e candidato à reeleição.

    E em se tratando de matéria constitucional, conforme dispositivo acima transcrito, a inelegibilidade de candidato não sofre os efeitos da preclusão, porquanto é mat éria de ordem pública,implicando dizer que pode ser conhecida até de ofício pelo julgador.

    Ademais, o legislador conferiu à Justiça Eleitoral a atribuição de julgar de acordo com a livre apreciação dos fatos públicos e notórios, dos indícios e presunções e prova produzida, atentando para circunstâncias ou fatos, ainda que não indicados ou alegados pelas partes, desde que preserve o interesse público de lisura eleitoral (art. 23 do Código Eleitoral). Verbis:

    Art. 23. O Tribunal formará sua convicção pela livre apreciação dos fatos públicos e notórios, dos indícios e presunções e prova produzida, atentando para circunstâncias ou fatos, ainda que não indicados ou alegados pelas partes, mas que preservem o interesse público de lisura eleitoral.

    Não bastasse isso, o art. 40 da Resolução TSE nº 22.156 /2006, dispõe que o registro de candidato inelegível será indeferido, mesmo que não tenha sofrido ação de impugnação. Verbis:

    Art. 40. O registro de candidato inelegível ou que não atenda ás condições de elegibilidade será indeferido, ainda que não tenha havido impugnação.

    Dessa forma, mesmo reconhecendo que a ação de impugnação de registro da candidatura pelo Ministério Público tenha sido ajuizada após o prazo de cinco dias, o julgador deve conhecer de ofício da inelegibilidade.

    Aliás, é nessa linha que o Tribunal Superior Eleitoral tem decidido, conforme ementa abaixo:

    Inelegibilidade - Preclusão - Matéria Constitucional. 1. Registro de Candidato. 2. Inelegibilidade prevista no artigo , I , g , da LC 64 /90. 3. Impugnação do Ministério Público apresentada intempestivamente à vista do artigo , da LC 64 /90. 4. Inelegibilidade prevista na Constituição e inelegibilidade prevista em lei complementar. Quanto às últimas, invocável se faz a preclusão. 5. Recurso desprovido. (Acórdão nº 113, no Recurso Ordinário nº 113 - PE, publicado em sessão em 1º.9.1998, Relator Ministro Néri da Silveira).

    Ainda sobre a matéria, há o Acórdão nº 10.829, de 10.8.89, rel. Min. Miguel Jerônymo Ferrante, in Revista JTSE, vol. 10, nº 1, pág. 190, cuja ementa se encontra escrita nos seguintes termos:

    Inelegibilidade. Parentesco. Norma Constitucional. A inelegibilidade de ordem constitucional pode ser argüida a qualquer tempo, até mesmo na diplomação, sem ofensa a qualquer direito adquirido, de cujo conceito estão excluídos os direitos relativos ao interesse público. Mantém-se a decisão regional que cassou o diploma, não sendo aplicável à espécie o art. 219 do CE. Agravo de instrumento improvido.

    Assim ponderado, não procede a preliminar de intempestividade, no contexto de inépcia da inicial, anotando, por oportuno, que o fundamento em tela não evidencia as hipóteses de inaptidão da exordial.

    Portanto, repilo a preliminar de intempestividade, submetendo-a aos partes.

    2. Quanto à argüição de falta de prova da inelegibilidade do interessado, é matéria atinente ao mérito e como tal será apreciada, pois relacionada à existência do parentesco por afinidade.

    II – In mérito

    Quanto ao mérito há que se perquirir, inicialmente, se estão presentes os pressupostos fáticos e juridicos caracterizadores da união estável entre Guilherme Erse e Juliana Cassol.

    O Código Civil define a união estável nos seguintes termos:

    Art. 1.723. É reconhecida como entidade familiar a união estável entre o homem e a mulher, configurada na convivência pública, continua e duradoura e estabelecida com o objetivo de constituição de família.

    Vê-se, portanto, que para configurar a união estável é necessário que o relacionamento seja público, contínuo, duradouro e com a intenção de constituir família . Vejamos cada um dos requisitos:

    1 – REQUISITOS DA UNIÃO ESTÁVEL

    1.1 – RELACIONAMENTO PÚBLICO

    A notoriedade é o primeiro requisito da união estável. Significa dizer que relações clandestinas, às escondidas e com o objetivo apenas de relacionamento sexual não podem configurá-la.

    No caso dos autos, verifica-se que Juliane Cassol e Guilherme Erse aparecem em público como um casal.

    Com efeito, consta no documento de fl. 37 a seguinte notícia:

    SOCIAL

    Juliane Cassol e Guilherme Erse – casal sempre presente nos mais importantes acontecimentos filantrópicos da capaital e Candeias do Jamari.

    Em notícia veiculada no documento de fl. 45 consta:

    (...) Também marcaram presença (...) Guilherme Erse e sua noiva, Juliana Cassol (...)

    Na matéria jornalística de fl. 48 dos autos, está assim consignado:

    (...) Aliás, pode-se juntar nesse contexto a possibilidade de Moreira e Cassol se tornarem da "mesma família". É que o ex-vereador Guilherme Erse (filho de MM) e a senhorita JULIANE (filha de Cassol) estão de namoro firme, inclusive, já esperam um filhinho para breve. Portanto, Cassol e Moreira Mendes serão vovôs brevemente. Isso, certamente, possibilitará uma "afinação política" ainda maior entre ambos. Comenta-se ainda, que MM deverá candidatar-se à Câmara dos Deputados em 2.006.

    Em declarações prestadas por testemunhas perante a Procuradoria Regional Eleitoral e confirmadas em Juízo, ficou assentado o seguinte:

    (...) QUE desde quando voltou a trabalhar no condomínio ouviu a notícia de que Guilherme Erse e a filha do Governador estão juntos, isto é mantém um relacionamento amoroso; QUE este fato perdura até os dias de hoje; QUE é comum o Sr. Guilherme Erse e a filha do Governador saírem de carro juntos, sendo que se recorda que a última vez que isso aconteceu foi a mais ou menos um mês; QUE sabe que Guilherme Erse e a filha do Governador tiveram um filho; QUE o relacionamento afetivo prosseguiu normalmente mesmo depois do nascimento do filho do casal. (Termo de declarações de Emerson Gutemberg da Silva, fls. 108/109, ratificado em juízo à fl. 133).

    (...) QUE ficou sabendo que existe um relacionamento afetivo entre o Sr. Guilherme Erse e a filha do Governador e que ambos tiveram um filho; QUE não entendia porque o Sr. Guilherme Erse entrava e saia com tanta freqüência durante a noite, chagando o declarante a acreditar que o Sr. Guilherme Erse era um fiscal dos seguranças que prestam serviço ao Governador e seus familiares. (Termo de declarações de Ivanildo Vitorino da Silva – fls. 110/111, ratificado em juízo à fl. 134).

    (...) QUE ficou sabendo que este último fato passou a acontecer em razão de o Sr. Guilherme Erse haver iniciado um relacionamento afetivo com a filha do Governador, de nome Juliana; QUE somente a partir do início do namoro com Juliana foi que o Sr. Guilherme Erse passou a freqüentar a casa do Governador; QUE desde então é comum o Sr. Guilherme Erse ir no condomínio, pelo menos durante o plantão do declarante para buscar Juliana para saírem juntos; QUE quando saem juntos, Guilherme Erse e Juliana costumam voltar de madrugada, sendo que algumas vezes o declarante largou o plantão noturno sem que tivessem voltado; QUE se recorda o declarante que a última vez que isso aconteceu foi, mais ou menos, no final da semana passada; QUE é comentário geral no condomínio que Guilherme Erse e Juliana tem relacionamento afetivo; QUE soube que Guilherme Erse e Juliana tiveram um filho. (Termo de declarações de Francinildo Carneiro do Nascimento – fls. 112/113, ratificado em juízo à fl. 135)

    (...) QUE é muito comum o Sr. Guilherme Erse ir, durante a noite, na casa do Governador; QUE tais visitas acontecem sempre que o Governador e sua filha estão no condomínio; QUE soube que o Sr. Guilherme Erse mantém relacionamento amoroso com a filha do Governador; QUE não sabe dizer quando o Sr. Guilherme Erse iniciou o relacionamento íntimo com a filha do Governador; QUE também ouviu comentário que ambos tiveram um filho. (Termo de declarações de Luiz Carlos Cordeiro de Souza – fls. 116/117, ratificado em juízo à fl.136).

    Em vista desses depoimentos, inegável se mostra o relacionamento existente entre o casal, a configurar a união estável.

    1.2 – CONTÍNUO

    O segundo requisito da união estável é a CONTINUIDADE. Tal requisito ficará caracterizado quando não ocorrem separações freqüentes.

    Voltando aos autos, vemos que as provas trazidas estão a indicar que o requisito da continuidade está caracterizado. Na realidade, de acordo com o que foi coletado, observa-se que o relacionamento entre Guilherme Erse e Juliana Cassol nunca teve um termo final. Senão vejamos:

    O documento de fl .37 diz que "Guilherme Erse e Juliane Cassol fazendo filantropia em Porto Velho e Candeias". Tal documento é datado do dia 16.05.2006, ou seja, é bastante recente.

    Poder-se-ia dizer que, por se tratar de matéria jornalística, não serviria como prova. Com efeito, a matéria, por si só, não pode ser vista como verdade absoluta. Todavia, há outros elementos probatórios que confirmam a continuidade do relacionamento entre ambos.

    Emerson Gutemberg da Silva em depoimento prestado na Procuradoria da República no dia 07/08/2006 (fls. 96/97) e confirmado em juízo (fl. 121), disse o seguinte:

    (...) QUE desde quando voltou a trabalhar no condomínio ouviu a notícia de que Guilherme Erse e a filha do Governador estão juntos, isto é mantém um relacionamento amoroso; QUE este fato perdura até os dias de hoje; QUE é comum o Sr. Guilherme Erse e a filha do Governador saírem de carro juntos, sendo que se recorda que a última vez que isso aconteceu foi a mais ou menos um mês; QUE sabe que Guilherme Erse e a filha do Governador tiveram um filho; QUE o relacionamento afetivo prosseguiu normalmente mesmo depois do nascimento do filho do casal.

    Do Termo de Declarações de Ivanaldo Vitorino da Silva (fls. 98/99), também firmado em Juízo, extrai-se:

    (...) ficou sabendo que existe um relacionamento afetivo entre o Sr. Guilherme Erse e a filha do Governador e que ambos tiveram um filho; QUE não entendia porque o Sr. Guilherme Erse entrava e saia com tanta freqüência durante a note, chagando o declarante a acreditar que o Sr. Guilherme Erse era um fiscal dos seguranças que prestam serviço ao Governador e seus familiares.

    Francinildo Carneiro do Nascimento (fls. 100/101) confirma o relacionamento quando diz:

    (...) QUE ficou sabendo que este último fato passou a acontecer em razão de o Sr. Guilherme Erse haver iniciado um relacionamento afetivo com a filha do Governador, de nome Juliana; QUE somente a partir do início do namoro com Juliana foi que o Sr. Guilherme Erse passou a freqüentar a casa do Governador; QUE desde então é comum o Sr. Guilherme Erse ir no condomínio, pelo menos durante o plantão do declarante para buscar Juliana para saírem juntos; QUE quando saem juntos, Guilherme Erse e Juliana costumam voltar de madrugada, sendo que algumas vezes o declarante largou o plantão noturno sem que tivessem voltado; QUE se recorda o declarante que a última vez que isso aconteceu foi, mais ou menos, no final da semana passada; QUE é comentário geral no condomínio que Guilherme Erse e Juliana tem relacionamento afetivo; QUE soube que Guilherme Erse e Juliana tiveram um filho.

    Do Termo de Declaração de Luiz Carlos Cordeiro de Souza (fls. 104), igualmente firmado em Juízo, pinça-se:

    (...) é muito comum o Sr. Guilherme Erse ir, durante a noite, na casa do Governador; QUE tais visitas acontecem sempre que o Governador e sua filha estão no condomínio; QUE soube que o Sr. Guilherme Erse mantém relacionamento amoroso com a filha do Governador; QUE não sabe dizer quando o Sr. Guilherme Erse iniciou o relacionamento íntimo com a filha do Governador; QUE também ouviu comentário que ambos tiveram um filho.

    Consta ainda que Guilherme Erse freqüentava a casa de Cássio Dantas Fon, morador do condomínio Jardim das Palmeiras, indicando uma amizade entre ambos. (Depoimento de Emerson Gutemberg da Silva – fl. 133). Referido morador - amigo de Guilherme consoante alegações finais - comentou que este mantinha um relacionamento com a filha do Governador. Veja-se:

    (...) Cássio Dantas Fon comentou na portaria sobre o relacionamento do impugnado Guilherme e a filha do Governador quando ele foi buscar correspondência e quando estava comentando sobre a fixação de placa. (Termo de depoimento de Ivanildo Vitorino da Silva – fl. 134)

    Ressalte-se que esse comentário ocorreu recentemente, por ocasião do episódio da afixação da placa de propaganda política no Condomínio Jardim das Palmeiras.

    Diante dessas declarações precisas e seguras, forçoso concluir que não houve ruptura entre o impugnado e a filha do Governador do Estado

    O impugnado tenta provar a ruptura no relacionamento por meio de documentos de fls. 86/92. Entretanto, o acordo em ação de alimentos entre Guilherme Erse e Juliana Cassol perante a Segunda Vara Cível de Rolim de Moura não é suficiente para descaracterizar a união entre ambos.

    É que a homologação ocorreu na data de 27 de junho de 2.006 , poucos dias antes do requerimento de registro da candidatura do interessado. Tal fato pode ser interpretado como tentativa de burlar a legislação eleitoral no sentido de afastar a inelegibilidade prevista no § 7º do art. 14 da Constituição Federal e na Lei Complementar nº 64 /90.

    Assim entendo porque referido documento não harmoniza com os demais elementos probatórios constantes dos autos, especialmente os depoimentos das testemunhas.

    Resta, portanto, configurada a continuidade do relacionamento entre Guilherme Erse e Juliana Cassol.

    1.3– CONVIVÊNCIA DURADOURA

    Pois bem. Somente será possível determinar se a união foi duradoura ou não no momento que a relação acabar, uma vez que será nesse momento em que se ficará sabendo quanto tempo durou.

    Como se sabe, a nossa legislação não fixou prazo mínimo para configurar a união estável ficando a análise para cada caso concreto.

    Aqui, como em linhas volvidas, o relacionamento ainda perdura, não podendo se falar em ruptura. O que se extrai dos autos é que a união vem se estendendo por tempo razoável, máxime com o nascimento do filho do casal em 03 de março de 2.006. Além disso, o porteiro do condomínio Jardim das Palmeiras deixou consignado em seu depoimento de fls.... que o relacionamento dura há bastante tempo:

    QUE trabalhou no condomínio Jardins das Palmeiras durante uns três anos, ficando uns oito meses afastado e retornando a pouco mais de um ano, desde julho de 2.005; (...) QUE desde quando voltou a trabalhar no condomínio ouviu a notícia de que Guilherme Erse e a filha do Governador estão juntos, isto é, mantém um relacionamento amoroso; QUE este fato perdura até os dias de hoje; (...) (Termo de declarações de Emerson Gutemberg da Silva - fl. 108)

    Sendo assim, o fator tempo para a constatação da união estável também está caracterizado, ainda mais com o nascimento do filho do casal.

    1.4 – COM OBJETIVO DE CONSTITUIR FAMÍLIA

    O objetivo de constituir família, último requisito legal para caracterizar a união estável, ficou caracterizado consoante se afere dos documentos de folhas 37 e 45, visto que o casal era visto pela sociedade em reuniões e inclusive, fazia trabalhos filantrópicos em conjunto, demonstrando de forma inequívoca o elemento anímico da união estável.

    Além disso, a intenção de constituir um núcleo familiar comprova-se, no caso, pelo nascimento do filho ENZO GUILHERME CASSOL ERSE MENDES. Embora este não seja um fator impositivo da permanência em convívio, ocorrendo o nascimento de prole, a intenção de constituir uma família reveste-se de forte presunção.

    Dessa feita, tenho que a intenção de constituir um núcleo familiar restou configurada.

    2 – DA CONVIVÊNCIA SOB O MESMO TETO

    Alega o impugnado que, na união estável, há a convivência do homem e da mulher sob o mesmo teto, o que não é o caso, uma vez que Juliana Cassol reside em Rolim de Moura e Guilherme Erse na capital.

    Ab initio, constata-se que a lei que regula o direito dos companheiros Lei nº 9278 /96 bem como o Código Civil não exigem à caracterização da união estável o requisito de coabitação, ou seja o convívio sob o mesmo teto.

    No caso em análise, observamos que realmente o impugnado residia em Porto Velho e a filha do Governador na cidade de Rolim de Moura. Mas isso não é motivo para afastar a existência da união estável, pois não podemos olvidar que é possível que companheiros residam em locais diversos.

    Com efeito, no caso incide o que dispõe a Sumula 382 do STF:

    Súmula STF nº 382 . A vida em comum sob o mesmo teto, more uxorio , não é indispensável à caracterização do concubinato.

    O STJ, ao analisar o Recurso Especial nº 474962/2002-SP, cujo relator foi o Ministro SÁVIO DE FIGUEIRODO TEIXEIRA, deixou assentado o seguinte:

    DIREITOS PROCESSUAL CIVIL E CIVIL. UNIÃO ESTÁVEL. REQUISITOS. CONVIVÊNCIA SOB O MESMO TETO. DISPENSA. CASO CONCRETO. LEI N. 9.728 /96. ENUNCIADO N. 382 DA SÚMULA/STF. ACERVO

    FÁTICO-PROBATÓRIO.REEXAME. IMPOSSIBILIDADE. ENUNCIADO N. 7 DA SÚMULA/STJ. DOUTRINA.PRECEDENTES. RECONVENÇÃO. CAPÍTULO DA SENTENÇA. TANTUM DEVOLUTUM QUANTUM APELLATUM. HONORÁRIOS. INCIDÊNCIA SOBRE A CONDENAÇÃO. ART. 20 , § 3º , CPC . RECURSO PROVIDO PARCIALMENTE. I - Não exige a lei específica (Lei n. 9.728 /96) a coabitação como requisito essencial para caracterizar a união estável. Na realidade, a convivência sob o mesmo teto pode ser um dos fundamentos a demonstrar a relação comum, mas a sua ausência não afasta, de imediato, a existência da união estável

    .

    II - Diante da alteração dos costumes, além das profundas mudanças pelas quais tem passado a sociedade, não é raro encontrar cônjuges ou companheiros residindo em locais diferentes.

    III - O que se mostra indispensável é que a união se revista de estabilidade, ou seja, que haja aparência de casamento, como no caso entendeu o acórdão impugnado.

    IV - Seria indispensável nova análise do acervo fático-probatório para concluir que o envolvimento entre os interessados se tratava de mero passatempo, ou namoro, não havendo a intenção de constituir família.

    Não se pode ignorar que no caso em exame, a convivência more uxório tornaria Guilherme Erse claramente inelegível. Daí a possível justificativa para o casal ter residências distintas.

    Desse modo, considerando que o relacionamento é público, contínuo, duradouro e ainda com a intenção da constituir família, afigura-se desnecessária a convivência sob o mesmo teto entre o casal.

    3 – DA INTERDEPENDÊNCIA FINANCEIRA

    O impugnado afirma que não há nem nunca houve interdependência financeira entre o casal e que tal fato elide a união estável.

    É que a exemplo da coabitação, a interdependência financeira entre os conviventes não é requisito essencial, fato que em nenhum momento a lei assim o previu, de modo que configurada a convivência pública, contínua, duradoura e com o objetivo de constituir família, desnecessário é a prova da dependência econômica, máxime em se tratando da filha do Governador do Estado.

    4 – DO VÍNCULO ENTRE AS FAMÍLIAS CASSOL E MOREIRA MENDES

    Além da configuração da convivência pública, contínua, duradoura e com o objetivo de constituir família, exsurge dos autos um envolvimento familiar e social entre a família do impugnado e a família Cassol, consoante constata a documentação de fls. 55/61, concernente a funções de confiança à família Moreira Mendes no governo atual.

    Em suma, confirma-se a ligação entre o Senhor Governador Ivo Cassol com a família do impugnado: pelas nomeações a cargos de confiança no Executivo Estadual como pelo nascimento de Enzo Guilherme Cassol Erse Mendes.

    Como se sabe, a regra da inelegibilidade em razão do parentesco busca evitar o uso da máquina administrativa para favorecer os parentes, consangüíneos ou afins, candidatos a cargo eletivo na circunscrição do titular, além, é claro, de evitar a perpetuação de um mesmo agrupamento familiar na chefia do poder executivo.

    Configurada a união estável entre o impugnado e a Sra. Juliana Cassol, resta, dessarte, caracterizado o parentesco por afinidade em primeiro grau do pretenso candidato com o atual Governador do Estado, Senhor Ivo Narciso Cassol. Portanto a inelegibilidade do requerente se impõe, mercê do disposto no artigo , § 3º da Lei Complementar nº 64 /90.

    Em face do exposto, julgo procedente o pedido de Impugnação do Registro de Candidatura de GUILHERME ERSE MOREIRA MENDES, via de conseqüência INDEFIRO seu pedido de registro ao cargo de Deputado Estadual pela Coligação PPS-PFL.

    É como voto.

    EMENTA – Registro de candidatura. Inelegibilidade. Preclusão. Matéria constitucional. Impugnação pelo Ministério Público. Intempestividade. Rejeição. União estável. Caracterização. Parentesco por afinidade em primeiro grau. Governador do Estado. Indeferimento.

    A inelegibilidade fundada em matéria constitucional não sofre os efeitos da preclusão, podendo o juiz conhecer da matéria inclusive de ofício para preservar o interesse público de lisura eleitoral.

    Configurada a união estável entre o impugnado, pretenso candidato a deputado estadual, e a filha do Governador do Estado, resta evidenciado o parentesco por afinidade em primeiro grau entre o Chefe do Executivo Estadual e aquele, caracterizando, destarte, hipótese de inelegibilidade, que impede o deferimento do registro da candidatura.

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