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30 de Maio de 2024

Realização de obras em condomínio

Diferença entre os artigos 1.341 e 1.342 do código civil

Publicado por PINHEIRO ADVOGADOS
há 6 anos

PARECER JURÍDICO

EMENTA: CONDOMÍNIO VILA DOS LAGOS - CONSULTA DO SÍNDICO – REALIZAÇÃO DE OBRAS NA PORTARIA DO CONDOMÍNIO – TIPO DE OBRA – DELIBERAÇÃO E VOTAÇÃO EM ASSEMBLEIA – DIVERGÊNCIA ACERCA DO “QUÓRUM DE VOTAÇÃO”. APROVAÇÃO DA OBRA POR MAIORIA DOS CONDÔMINOS.

RELATÓRIO

Trata-se o expediente de uma consulta instada pelo síndico do Condomínio Vila dos Lagos para que sejam dirimidas eventuais dúvidas acerca do tipo de obra e o quórum de aprovação para realização da reforma na portaria, a luz do código civil e da convenção.

Estudada a matéria e analisando a estrutura legal para aprovação da obra na portaria do condomínio Vila dos Lagos, no escopo de aplicar a correta interpretação das normas que regem o assunto, está assessoria jurídica passa a opinar da seguinte forma:

FUNDAMENTAÇÃO

Como é sabido por todos, o Rio Grande do Norte passa por um intenso estado de emergência e calamidade no âmbito da segurança pública. Infelizmente é uma realidade nacional.

De tal modo, a procura por moradia em condomínios edilícios é a solução mais procurada por aqueles que querem tranquilidade e paz. Todavia, mesmo diante dos diversos mecanismos de segurança aplicados para inibir a ação de criminosos, os condomínios nunca deixaram de ser alvo das investidas da criminalidade, seja roubo, sequestro relâmpago, invasão de domicílio, arrombamentos, assalto a mão armada, “arrastões”.

Desta feita, no afã de proteger o interesse da coletividade, a atual gestão do condomínio Vila dos Lagos, sob responsabilidade do síndico Jaime Azevedo, se viu na obrigação de realizar uma reforma na portaria, para suprir as necessidades vitais dos condôminos, dentre eles: conforto, comodidade, tecnologia, mas principalmente, proteção a integridade patrimonial e física dos moradores.

Salientamos, que a tarefa de conservação, zelo e guarda das partes comuns é de total responsabilidade do síndico, e, em caso de omissão por parte do mesmo ou em não cumprimento adequado na prestação do serviço, que venha causar prejuízos aos condôminos ou a terceiros, poderá motivar sua responsabilidade civil, segundo a prescrito da legislação brasileira.

Art. 1.348. Compete ao síndico:

(...)

V - diligenciar a conservação e a guarda das partes comuns e zelar pela prestação dos serviços que interessem aos possuidores;

Assim sendo, mesmo diante da indispensável realização da obra, o síndico não pode de forma alguma tomar tal decisão em caráter unipessoal, já que é indispensável a aprovação em assembleia previamente convocada, segundo o artigo 8º da convenção do condomínio. Senão vejamos.

Artigo 8º da Convenção – As áreas e coisas de uso comum não poderão ser alteradas, supridas, removidas ou substituídas sem aprovação previa da Assembleia Geral.

Por conseguinte, o síndico também pode ser responsabilizado civilmente por obras realizadas sem a devida deliberação e votação dos condôminos, bem como sofrer o risco de algum morador discordar dela e entrar com pedido de embargo.

Superada a matéria sobre o imperativo de ser realizada a obra e da obrigatoriedade de aprovação em assembleia geral, passemos a analisar outro aspecto importante e que gera bastante dúvida no momento de aprovar uma obra num condomínio, qual seja: qual o tipo de obra e seu quórum de aprovação.

O primeiro passo é identificar o tipo de obra a ser realizada, que, segundo o código civil, pode ser caracterizada como NECESSÁRIA, ÚTIL OU VOLUPTUÁRIA.

Apesar de não ser fácil, em uma leitura inicial da legislação civilista, é com a identificação do tipo de obra que a lei determina o quórum necessário para a aprovação em assembleia.

Então, segundo a lei civil, obras necessárias são as que têm por fim conservar o bem ou evitar que se deteriore. Já as obras úteis são as que aumentam ou facilitam o uso do bem. E por fim, obras voluptuárias são aquelas de mero deleite ou recreio, que não aumentam o uso habitual do bem, ainda que o tornem mais agradável.

Pois bem, A OBRA DA PORTARIA DO CONDOMÍNIO VILA DOS LAGOS, SE ENQUADRA COMO SENDO A DO TIPO ÚTIL, OU SEJA, AQUELA QUE AUMENTA OU FACILITA O USO DO BEM, segundo inteligência do artigo 96 § 2º do Código Civil. Vejamos.

Art. 96 – As benfeitorias podem ser voluptuárias, úteis ou necessárias.

(...)

§ 2º - São úteis as que aumentam ou facilitam o uso do bem.

Para esse tipo de obra, código civil, em seu artigo 1.341, II, exige quórum de aprovação em assembleia da maioria dos condôminos.

Art. 1.341. A realização de obras no condomínio depende:

(...)

II - Se úteis, de voto da maioria dos condôminos.

Entretanto, ao nos depararmos com o disposto no artigo 1342, percebemos que uma obra na parte comum, que venha acrescentar às já existentes, para também facilitar ou aumentar a sua utilização, depende do quórum de 2/3 (dois terços) de todos os condôminos para aprovação em assembleia. Vejamos:

Art. 1.342. A realização de obras, em partes comuns, em acréscimo às já existentes, a fim de lhes facilitar ou aumentar a utilização, depende da aprovação de dois terços dos votos dos condôminos, não sendo permitidas construções, nas partes comuns, suscetíveis de prejudicar a utilização, por qualquer dos condôminos, das partes próprias, ou comuns.

Posta assim a questão, esta obra dependeria da aprovação da maioria dos condôminos, estipulada pelo artigo 1.341, II, ou do quórum qualificado de dois terços exigido pelo artigo 1.342, ambos do Código Civil?

Diante de uma leitura minuciosa e um estudo aprofundado na jurisprudência em vigor, este jurídico opina pelo a seguinte:

As obras em condomínios que tragam novos equipamentos ou um novo espaço não existente no plano inicial e no memorial de incorporação, tratar-se-á do um acréscimo na área comum do condomínio, logo, dependerá do quórum qualificado de 2/3 (dois terços) para a aprovação, segundo artigo 1.342 do código civil. O que não se enquadra na situação do condomínio Vila dos Lagos.

Já as obras em condomínios, além da aquisição de pertenças, mas em partes já existentes, sem implicar em acréscimo, na área comum do condomínio, dependerá do voto da maioria dos condôminos quando se tratar de obra útil, segundo artigo 1.341, II do código civil. O que se enquadra perfeitamente na situação do condomínio Vila dos Lagos.

Podemos perceber que tais artigos demonstram que, embora tenham as benfeitorias a mesma natureza, qual seja: UTILIDADE, seu quórum de aprovação depende de sua existência ou não nas dependências do condomínio.

Exemplificando, caso não exista em um determinado condomínio já constituído e entregue, uma piscina, mas com o passar do tempo, os condôminos se interessem em construir uma, estar-se-á diante de acréscimos às obras de uma área comum de condomínio já existente, e, consequentemente, seu quórum de aprovação será o de 2/3 (dois terços dos condôminos), independente se a obra seja útil ou voluptuária.

Por outro lado, se o caso for, por exemplo, de ampliação da academia de ginástica já existente no condomínio ou reforma de uma portaria que já opera desde a instituição, para aumentar ou facilitar o uso (obra útil), o quórum de aprovação será de maioria dos condôminos.

Portanto, ao nos debruçarmos sobre a situação do Vila dos Lagos, opinamos pelo quórum de aprovação da obra pela maioria dos condôminos, pois, não há que se falar em acréscimo de outra portaria, mas tão somente em aumentar e facilitar a utilização de uma portaria já existente no condomínio.

Diante disso, trago alguns julgados:

AGRAVO DE INSTRUMENTO. CONDOMÍNIO EDILÍCIO. AÇÃO DECLARATÓRIA. NULIDADE DE ASSEMBLÉIA. APROVAÇÃO DE OBRA EM ÁREA COMUM DO CONDOMÍNIO. QUORUM NECESSÁRIO. SUSPENSÃO DA OBRA. TUTELA ANTECIPADA. A prova inequívoca do alegado e a verossimilhança da alegação associadas a uma das hipóteses previstas nos incisos I e II do art. 273 do CPC são requisitos que devem ser preenchidos para o deferimento da referida medida. Ausentes estes requisitos, resulta inviável o deferimento da antecipação de tutela pleiteada. No caso concreto, em sede de cognição sumária, pode-se afirmar que a reforma do salão de festas envolve obra útil, a qual é passível de aprovação pelo voto da maioria dos condôminos (art. 1.341, II do CCB). AGRAVO DE INSTRUMENTO DESPROVIDO. (Agravo de Instrumento Nº 70056780232, Décima Nona Câmara Cível, Tribunal de Justiça do RS, Relator: Marco Antonio Angelo, Julgado em 22/05/2014).

AÇÃO DECLARATÓRIA DE NULIDADE DE DECISÃO ASSEMBLEAR E ABSTENÇÃO DE ATOS DO SÍNDICO CUMULADA COM DEPÓSITO. COLOCAÇÃO DE CENTRAL TELEFÔNICA VISANDO À MAIOR SEGURANÇA DA COLETIVIDADE. OBRA ÚTIL E NECESSÁRIA. ART. 1341, II, DO CÓDIGO CIVIL/2002. O Código Civil de 2002 prevê, no art. 1341, II, que a realização de obras úteis no condomínio depende do voto da maioria dos condôminos, sendo que, em segunda convocação poderá deliberar por maioria dos votos presentes, ausente previsão, até porque inexistente convenção no caso, da exigência de quórum especial. A característica da obra, colocação de uma central telefônica, evidencia-se útil e necessária, e não voluptuária. Além disso, a realidade da vida condominial impõe, sempre que se mostrar possível, se delibere acerca dos pontos levados à discussão na assembleia e dê a eles o devido encaminhamento.

Por fim, para aprovação da obra da portaria do condomínio Vila dos Lagos, se faz imperioso a votação no sentido favorável a reforma, da maioria (50% + 1) de todos os condôminos, por se tratar de quórum especificamente trazido pelo artigo 1.341, II do código civil.

Nesta medida o seguinte julgado: Tribunal de Justiça de São Paulo - APELAÇÃO N. 0146185-03.2006.8.26.0000 - CÍVEL/ANULAÇÃO DE ASSEMBLEIA EM CONDOMÍNIO. RELATOR: DES. FRANCISCO LOUREIRO. COMARCA: SÃO PAULO. ÓRGÃO JULGADOR: 4ª CÂMARA DE DIREITO PRIVADO. DATA DO JULGAMENTO: 05/03/2009. DATA DE REGISTRO: 24/03/2009. OUTROS NÚMEROS: 4863044800, 994.06.146185-0. Ação declaratória de nulidade - Condomínio - Assembleia de condôminos em que foi aprovada a realização de obras voluptuárias em área comum - Compra e instalação de parque infantil - Artigo 1.342 do Código Civil - Realização de obras em áreas comuns carecem da aprovação por 2/3 dos condôminos aptos a votar - No caso concreto apenas 213 dos condôminos estiveram presentes e ao menos o autor não anuiu com a realização de tais obras de forma que não observado o preceito legal - Nulidade em assembleia não pode ser convalidada por abaixo-assinado - Reunião dos condôminos é o momento adequado para a exposição dos motivos da dissidência e discussão das questões de maior relevo - Sentença improcedente - Recurso provido.

CONCLUSÃO

Pelo exposto, respondendo ao questionamento formulado na consulta da senhor síndico, opina esta assessoria jurídica no sentido de que seja realizado uma assembleia devidamente constituída para aprovação da obra da portaria do condomínio Vila dos Lagos.

E mais, por ser classificada como uma obra útil, porquanto aumentará e facilitará o uso de uma portaria já existente desde a constituição e instituição do condomínio, este jurídico opina pela aprovação em assembleia por um quórum de maioria dos condôminos (50%+1).

DESTARTE, AS DECISÕES EM ASSEMBLEIA SÃO SOBERANAS, NÃO SE DISCUTE SE CUMPRE!

É o parecer!

Natal, 12 de setembro de 2018.

FRANCISCO SÉRGIO BEZERRA PINHEIRO FILHO

OAB/RN - 8123

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1 Comentário

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Prezado Dr Francisco Sérgio Bezerra Pinheiro Filho gostaria de perguntar neste mesmo sentido, quando um síndico, fazendo uso de suas prerrogativas, utiliza do Fundo de Reserva sem autorização prévia em AGE (tanto para discutir, nem após realizar a obra para comunicar aos condôminos) e a obra já está concluída (51mil reais), que preceitos legais podem ser tomados? Pois se tratou de uma obra de reparação e melhoria da piscina que teve uma de suas paredes demolida pela obra de impermeabilização do térreo. Caso possa dirimir essa minha dúvida fico inteiramente grato. Atenciosamente. Ryedell Sousa continuar lendo