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Ação Rescisória e Querela Nullitatis - Ed. 2022

Ação Rescisória e Querela Nullitatis - Ed. 2022

2. Capítulo 2

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Sumário:

2.1.A ação rescisória como ação de impugnação autônoma

A ação rescisória é uma ação autônoma de impugnação que visa, como regra, à desconstituição da coisa julgada que, com o trânsito em julgado, terá passado a revestir a decisão de mérito e que pode levar, em alguns casos, ao rejulgamento da causa originária.

O sistema processual de 2015, contudo, prevê duas hipóteses em que há rescindibilidade sem julgamento de mérito. Trata-se do cabimento da ação rescisória contra decisões que, embora de natureza processual, impedem a nova propositura da mesma demanda e as decisões que obstam admissibilidade de recurso (art. 966, § 2º). 1

A ação rescisória não consiste, pois, em um recurso, que é o meio de impugnação das decisões na própria relação jurídica processual em que são proferidas. É ação porque dá origem a uma nova relação processual, voltada à desconstituição do pronunciamento judicial, normalmente de mérito, proferido em outro processo e do qual não caiba mais recurso. 2 -3

3 O seu objeto é um determinado ato judicial: via de regra, o pronunciamento de mérito transitado em julgado, ou seja, cujo teor tornou-se imutável e indiscutível, em virtude do trânsito em julgado. Precisamente por essa razão – a imutabilidade ou marcante estabilidade – é que, para que se possa voltar a haver debate sobre o objeto do processo, é necessário, antes, proceder à desconstituição da coisa julgada, para romper a barreira da imutabilidade.

A ação rescisória é o meio próprio para tanto, cabível nas hipóteses previstas em lei, que se referem a situações em que as decisões padeçam, elas próprias, de vícios reputados graves, ou que decorram de processos em que tais vícios estejam presentes. Por isso, são rescindíveis decisões inquinadas de (i) nulidades absolutas, a respeito das quais há previsão expressa como, por exemplo: decisões proferidas mediante fraude do juiz; por juiz impedido; por juízo absolutamente incompetente; que violem a coisa julgada; (ii) que resultem de dolo ou coação da parte vencedora em detrimento da parte vencida ou, ainda, de simulação ou colusão entre as partes; (iii) que violem manifestamente norma jurídica, seja de índole material ou processual (e aqui se encartam os demais casos em que decisões de mérito são proferidas apesar da falta de pressupostos processuais e condições da ação, 4 sobre os quais o art. 966 não dispõe expressamente); (iv) contenham erro de fato ou fundadas em prova cuja falsidade tenha sido apurada em processo criminal ou venha a ser demonstrada na própria ação rescisória. A única hipótese prevista em lei em que o pronunciamento de mérito, que se pretende desconstituir, não contém vício algum, é a de obtenção, em certas condições, de prova nova.

2.2.Natureza jurídica da ação rescisória

Como se verá com mais vagar nos itens seguintes, o julgamento da ação rescisória se realiza (ou pode vir a se realizar) em três etapas: o juízo de admissibilidade da ação, com a verificação da presença dos ‘pressupostos de admissibilidade do julgamento de mérito’; o juízo rescindente (iudicium rescindens), em que o tribunal decide se o pedido de desconstituição da coisa julgada procede. Se o tribunal concluir pela procedência do juízo rescindente, verificará se a situação posta em juízo impõe o rejulgamento, ou não. Se houver necessidade de rejulgamento, parte-se, então, para o juízo rescisório (iudicium rescissorium). 5

A natureza jurídica da ação rescisória, no que diz respeito ao juízo rescindens , é constitutiva negativa. 6 Ela desconstitui a situação jurídica de imutabilidade, desconstitui a própria coisa julgada.

Quando se diz que a ação rescisória tem natureza desconstitutiva, 7 está-se referindo ao juízo rescindente, não ao de rejulgamento, que pode ter diversas naturezas. 8

Desconstitui-se a coisa julgada, para se atingir, mediata e indiretamente, a nulidade da decisão rescindenda. Em princípio, são rescindíveis sentenças nulas que, apesar de o serem, transitam em julgado. E aí se percebe uma diferença fundamental entre o sistema das nulidades no direito civil – em que nulidades são declaradas enquanto tais – e o sistema de nulidades no processo. Afinal, sentenças nulas são rescindíveis (= desconstitutíveis). 9

Pensamos que, quando desconstituída está a coisa julgada, a carga declaratória do pronunciamento rescisório se volta contra a nulidade da sentença. Esta, sim, é declarada. Daí os efeitos ex tunc, como regra, do juízo de anulação. 10 - 11

A coisa julgada pode ser vista como uma espécie de proteção que se forma em torno da decisão de mérito, conferindo a ela uma estabilidade mais visível. Trata-se, em nosso entender, de fenômeno típico de direito público, semelhante à presunção de legitimidade que se forma em torno do ato de agente público.

Exemplo de sentença nula-rescindível é a sentença de mérito proferida por juízo incompetente (ausente pressuposto processual de validade – juízo competente); está-se diante de nulidade (art. 966, II do CPC/15).

Referir-se à rescindibilidade da sentença significa dizer-se que o modo de se a impugnar é a ação rescisória . Quando se diz que a sentença é nula , está-se referindo ao vício de que padece. Portanto, pode-se dizer que sentenças nulas são rescindíveis , sem incorrer em nenhum tipo de imprecisão.

Todas as sentenças nulas são rescindíveis, embora nem todas as sentenças rescindíveis sejam nulas (que é o que acontece na hipótese de ação rescisória proposta com base em prova nova, art. 966, VII, CPC/15).

Vale ressaltar que sentenças nulas são aquelas a que faltam os pressupostos de validade do processo. 12 A ação rescisória diz respeito, portanto, à invalidade: desconstitui-se a coisa julgada, para declarar a nulidade do ato, reconhecer a sua invalidade e, se for o caso, realizar novo julgamento da ação que deu origem à decisão rescindenda, em regra, dentro dos limites da pretensão então deduzida.

Já se mencionou, contudo, que, em algumas situações, configura-se, no processo, o vício da inexistência. 13

Uma das categorias jurídicas em que se configura o vício da inexistência (como veremos no Capítulo 5) é a da ausência dos pressupostos de existência do processo. Sentença de mérito proferida em processo a que faltem os pressupostos de existência é sentença inexistente e, porque juridicamente inexiste, não transita em julgado. A inexistência, também, pode ser intrínseca à sentença. Assim, mesmo que presentes os pressupostos processuais, será inexistente , por exemplo, a sentença desprovida de dispositivo.

Os pressupostos de existência do processo são aqueles relacionados à jurisdição, ao pedido e à citação. Entendemos, tal como nos referimos no capítulo anterior, que também a “legitimidade” postulatória é pressuposto de existência. As condições da ação são, por sua vez, o interesse de agir e a legitimidade para a causa.

Os requisitos para que se considere um processo como sendo juridicamente existente são correlatos à definição clássica de processo, que praticamente o identifica com a relação jurídica que se estabelece entre autor, juiz e réu. Portanto, sem que haja um pedido, formulado diante de um juiz, em face de um réu (potencialmente presente, ou seja, citado) não há, sob o ângulo jurídico, propriamente, um processo.

Se o réu não foi citado e, em razão disso, acabou sendo revel, a sentença de mérito, que venha a ser proferida nesse processo, será juridicamente inexistente.

Se o autor formulou os pedidos x1 e x2 e o juiz, na sentença, julga os pedidos x1, x2 e x3, no que se refere a x3 será a sentença reputada juridicamente inexistente porque inexiste tal pedido.

A formulação de pedido é mola propulsora para a formação da relação jurídica processual. É formulado perante o juiz, contra (ou em face) do réu. Sem pedido, não há, juridicamente, processo: ou seja, o que ocorre não pode ser juridicamente qualificado como processo.

A sentença de mérito proferida apesar da falta de uma das condições da ação, também, é inexistente juridicamente .

Quando se trata de impugnar sentença juridicamente inexistente, a parte interessada deve, sem necessidade de se submeter ao prazo do art. 975 do CPC, intentar ação de natureza declaratória, com o único objetivo de gerar maior grau de segurança jurídica à sua situação. O interesse de agir, em casos como esse, nasce não da necessidade, mas da utilidade da obtenção de uma decisão nesse sentido, que tornaria indiscutível o assunto, sobre o qual passaria a pesar autoridade de coisa julgada.

A ação rescisória é, portanto, por excelência, meio de desconstituição da coisa julgada, 14 instituto esse que, como visto, compõe o rol das garantias fundamentais estabelecidas no art. 5º, XXXVI 15 , da Constituição Federal. Interessante é destacar que a própria Constituição Federal estabelece a possibilidade de se lançar mão dessa ação de impugnação autônoma, que se volta contra a coisa julgada. É a Constituição Federal, ainda, que estabelece a competência originária dos tribunais para julgar a ação rescisória. Ve-se isso, por exemplo, na regra do art. 102, I, j , da CF, em que se prevê que compete originariamente ao STF processar e julgar a ação rescisória de seus julgados. Portanto, o constituinte brasileiro fez a opção política pela coisa julgada, mas ele mesmo ressaltou que não se trata de uma garantia absoluta.

Hoje se pode asseverar que, de fato, o meio adequado e eficaz para se impugnarem decisões judiciais sobre as quais pesa autoridade de coisa julgada (bem como aquelas a que se refere o art. 966, § 2º, I e II) é a ação rescisória.

Trata-se de um meio típico de impugnação do pronunciamento de mérito transitado em julgado (e, nos termos do atual CPC, não só dele, mas também das decisões indicadas no art. 966, § 2º, I e II). Diz-se que é típico porque é um “modelo” particular e restrito de ação, predisposto à obtenção de um determinado resultado – a quebra da coisa julgada. 16 De fato, este é o perfil clássico da ação rescisória.

2.3.Título executivo judicial inexigível e a coisa julgada (os arts. 525, §§ 12, 13, 14 e 15 e 535, §§ 5º, 6º, 7º e 8º CPC/15)

Nos termos dos arts. 475-L e 741, parágrafo único, do CPC/73, considerava-se:

[...] inexigível o título judicial fundado em lei ou ato normativo declarados inconstitucionais pelo Supremo Tribunal Federal, ou fundado em aplicação ou interpretação da lei ou ato normativo tidas pelo Supremo Tribunal Federal como incompatíveis com a Constituição Federal l.

Dizia-se tratar-se de mecanismo com eficácia rescisória das sentenças inconstitucionais, pois buscava solucionar o específico conflito entre os princípios da coisa julgada e da supremacia da Constituição.

À luz da supremacia da Constituição Federal, e da premissa de que é nocivo ao sistema manterem-se interpretações descoincidentes ou diferentes, da mesma norma, e tendo em vista, ainda, o que já vinha decidindo o STJ, bem como sustentava parte da doutrina, 17 entendíamos ser possível afirmar que os mencionados dispositivos estabeleciam mecanismo rescisório diverso da ação rescisória, que incidiriam sob as seguintes condições:

a) – apenas nos casos em que os títulos …

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24 de Maio de 2024
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