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23 de Maio de 2024
  • 2º Grau
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Supremo Tribunal Federal STF - RECURSO EXTRAORDINÁRIO COM AGRAVO: ARE XXXXX BA XXXXX-61.2002.4.01.3301

Supremo Tribunal Federal
há 2 anos

Detalhes

Processo

Partes

Publicação

Julgamento

Relator

ROBERTO BARROSO

Documentos anexos

Inteiro TeorSTF_ARE_1364721_2be17.pdf
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Ementa

Decisão

DECISÃO: Ementa: Direito constitucional e administrativo. Recurso extraordinário com agravo. Nulidade dos títulos de propriedade de imóveis localizados na área da Reserva Indígena Caramuru-Paraguaçu. 1. Recurso extraordinário com agravo contra acórdão que manteve a sentença de procedência de interdito proibitório ajuizado contra a Comunidade Indígena Pataxó, a Fundação Nacional do Índio (Funai) e a União, para proteção da posse de imóvel rural situado no Município de Itaju do Colônia/BA. 2. Na ACO 312, esta Corte reconheceu expressamente a natureza meramente declaratória do procedimento demarcatório e julgou parcialmente procedente o pedido para declarar a nulidade dos títulos de propriedade de imóveis localizados na área da Reserva Indígena Caramuru-Paraguaçu, ainda que não finalizado o procedimento de demarcação administrativa da terra indígena. 3. O art. 231 da CF reconhece aos índios direitos originários sobre as terras que tradicionalmente ocupam. As terras indígenas “são inalienáveis e indisponíveis, e os direitos sobre elas, imprescritíveis” (art. 231, § 4º, CF), bem como “são nulos e extintos, não produzindo efeitos jurídicos, os atos que tenham por objeto a ocupação, o domínio e a posse das terras” indígenas (art. 231, § 6º, CF). 4. Caracterizado o imóvel objeto da lide como terra indígena, não há como ser objeto de ação possessória ajuizada com amparo na legislação civil que disciplina os institutos da posse e propriedade, sob pena de afronta ao art. 231 da Constituição. 5. Agravo conhecido e recurso extraordinário provido. 1. Trata-se de agravo interposto pela Fundação Nacional do Índio - Funai, com pedido de efeito suspensivo, cujo objeto é decisão que negou seguimento a recurso extraordinário contra acórdão do Tribunal Regional Federal da 1ª Região, assim ementado: CIVIL E PROCESSUAL CIVIL. INTERDITO PROIBITÓRIO. IMÓVEL RURAL. POSSE E EXPLORAÇÃO DE ATIVIDADE AGROPECUÁRIA PELO APELADO HÁ PELO MENOS TRINTA ANOS. INVASÃO POR ÍNDIOS DA COMUNIDADE PATAXÓ. 1. É cabível a proteção possessória pleiteada pelo autor, ante a comprovação, nos autos, de que ele exerce pacificamente a posse do imóvel rural há mais de 30 anos, localizado no Município de Itajú do Colônia/BA, e da utilização sócio-econômica desse imóvel, onde são executadas atividades de criação de gado, dando-se cumprimento à função social da propriedade rural, em atendimento ao que preceitua o artigo 186 da Carta Magna. 2. No âmbito de ação possessória não deve o órgão judiciário, a pretexto de tutelar pretensos direitos indígenas, reconhecer como legitima a invasão de terra por indígenas, que viola o direito de posse de imóveis rurais exercido por largo e continuado lapso de tempo. 3. “Caso em que o amparo pelo Poder Judiciário de conduta invasora de silvícolas em fazendas onde se exercem atividades sócio-econômicas, de forma continuada, por décadas, pacificamente, significaria inversão da ordem jurídica, dos princípios que presidem a segurança pública, no que concerne à organização da vida social, com evidente quebra da ordem pública interna, à qual devem se submeter todos os cidadãos do país, sob pena, inclusive, de se admitir a ocorrência de graves conflitos, com sério risco à vida para os segmentos populacionais envolvidos.” (AC XXXXX-1/BA, Rel. Desembargador Federal Fagundes de Deus, Quinta Turma, e-DJF1 p.212 de 21/10/2011). 4. Nega-se provimento aos recursos de apelação. 2. A parte agravante sustenta que o acórdão recorrido violou o art. 231, caput e §§ 1º, , e , da Constituição Federal, pois é incontroverso que o título de propriedade foi constituído sobre terra indígena. 3. A Procuradoria-Geral da República manifestou-se pelo provimento do agravo, em parecer ementado nos seguintes termos: AGRAVOS EM RECURSOS EXTRAORDINÁRIOS. AÇÃO POSSESSÓRIA. IMÓVEL RURAL SITUADO EM PERÍMETRO DE RESERVA INDÍGENA. INTERDITO PROIBITÓRIO AJUIZADO POR PARTICULAR EM FACE DA COMUNIDADE INDÍGENA PATAXÓ. ALEGAÇÃO DE AMEAÇA IMINENTE DE ESBULHO OU TURBAÇÃO DA POSSE OSTENTADA PELO AUTOR. PEDIDO JULGADO PROCEDENTE EM PRIMEIRO GRAU. EXPEDIÇÃO DE MANDADO PROIBITÓRIO. DECISÃO MANTIDA PELO TRF/1ª REGIÃO. RECURSOS EXTRAORDINÁRIOS DA UNIÃO E DA FUNAI ALEGANDO VIOLAÇÃO AO ART. 231, CAPUT E §§ 1º, , E , DA CF, E CONTRARIEDADE À DECISÃO TOMADA PELO PLENÁRIO DO STF NO JULGAMENTO DA ACO 312/BA. APELOS INDEVIDAMENTE OBSTADOS NA ORIGEM. PRESSUPOSTOS RECURSAIS ATENDIDOS. INSUBSISTÊNCIA DOS FUNDAMENTOS DA DECISÃO AGRAVADA. MÉRITO. ALEGAÇÕES PROCEDENTES. PARECER PELO PROVIMENTO DOS AGRAVOS PARA QUE SEJAM CONHECIDOS E PROVIDOS OS RECURSOS EXTRAORDINÁRIOS. 4. É o relatório. Decido. 5. O recurso merece ser provido. 6. Na origem, João Avilete Sobral ajuizou interdito proibitório em face da União e da Comunidade Indígena Pataxó, representada pela Fundação Nacional do Índio – FUNAI, com o objetivo de defender a posse que exerce na propriedade rural denominada Fazenda Alegrete, situada no Município de Itaju do Colônia/BA, a qual, segundo alega, está sob a iminente ameaça de esbulho pela comunidade requerida. 7. Em contestação, a União e a Funai afirmaram que o imóvel em questão se encontra localizado em território da Reserva Indígena Caramuru-Paraguassu e, por esse motivo, não pode ser objeto de proteção possessória em favor de particulares, diante do direito assegurado no art. 231 da Constituição Federal. 8. A sentença de procedência foi mantida pela Quarta Turma do TRF da 1ª Região. O acórdão recorrido considerou que: (i) os documentos juntados aos autos comprovam a posse anterior do requerente, assim como a utilização socioeconômica do imóvel, onde executa atividade ligada à pecuária; (ii) não cabe ao Poder Judiciário reconhecer a prevalência dos interesses indígenas sobre situação pacífica e consolidada no tempo. Quanto à localização do imóvel na Reserva Indígena Caramuru-Paraguassu, o Tribunal de origem afirmou que “o reconhecimento da existência de reserva indígena é questão que deve ser decidida pelo Supremo Tribunal Federal nos autos da ação cível originária n. 312/BA, na qual se pretende a anulação de registros de títulos dominiais no Estado da Bahia”. 9. A ACO 312 foi ajuizada pela Fundação Nacional do Índio (Funai), em 1º.7.1982, visando à declaração de nulidade dos títulos de propriedade e registros imobiliários, ao argumento de que o Governo do Estado da Bahia concedeu tais títulos em área indígena que abrange parte do território de diversos municípios ao sul daquele Estado. Tais imóveis estariam localizados, segundo a autora, nos municípios baianos de Conquista, Itambé, Itapetinga, Canavieiras, Itabuna, Pau Brasil e Itaju do Colônia. 10. Nesse precedente, o STF reconheceu expressamente a natureza meramente declaratória do procedimento demarcatório e julgou parcialmente procedente o pedido para declarar a nulidade de todos os títulos de propriedade cujas respectivas glebas estejam localizadas dentro da área da Reserva Indígena Caramuru-Paraguaçu, ainda que não finalizado o procedimento de demarcação administrativa da terra indígena. O acórdão contou com a seguinte ementa: 1) AÇÃO CÍVEL ORIGINÁRIA. AÇÃO DE NULIDADE DE TÍTULOS DE PROPRIEDADE SOBRE IMÓVEIS RURAIS SITUADOS NO SUL DA BAHIA EM RESERVA INDÍGENA. 2) CONFLITO GRAVE ENVOLVENDO COMUNIDADES SITUADAS NA RESERVA INDÍGENA DENOMINADA CARAMARUMU-CATARINA-PARAGUAÇU. AÇÃO JUDICIAL DISTRIBUÍDA EM 1982 IMPONDO A OBSERVÂNCIA DO REGIME JURÍDICO CONSTITUCIONAL DA CARTA DE 1967 PARA DISCIPLINAR A RELAÇÃO MATERIAL SUB JUDICE. 3) PRELIMINAR DE IMPOSSIBILIDADE JURÍDICA DO PEDIDO EM RAZÃO DA INEXISTÊNCIA DE INDIVIDUALIZAÇÃO DA PROPRIEDADE REIVINDICADA. PRELIMINAR REJEITADA À LUZ DO PEDIDO DE RECONHECIMENTO DA NULIDADE DE TÍTULOS DE PROPRIEDADE EM ÁREA INDÍGENA MERCÊ DA EXISTÊNCIA DE FARTA DOCUMENTAÇÃO FORNECIDA PELA FUNAI QUE VIABILIZOU A REALIZAÇÃO DOS TRABALHOS PERICIAIS. 4) DEMARCAÇÃO DA ÁREA SUB JUDICE OCORRIDA EM 1938 DESACOMPANHADA DE HOMOLOGAÇÃO. INCERTEZA ORIUNDA DA AUSÊNCIA DE HOMOLOGAÇÃO DA DEMARCAÇÃO DE TERRAS INDÍGENAS RELEGANDO A COMUNIDADE A UMA SITUAÇÃO FRÁGIL E A UM AMBIENTE DE VIOLÊNCIA E MEDO NA REGIÃO. 5) A HOMOLOGAÇÃO AUSENTE, DA DEMARCAÇÃO ADMINISTRATIVA REALIZADA EM 1938, NÃO INIBE O RECONHECIMENTO DA EXISTÊNCIA DE RESERVA INDÍGENA NO LOCAL, ORIGINANDO A IMPOSSIBILIDADE DE SE TER POR VÁLIDOS ATOS JURÍDICOS FORMADOS POR PARTICULARES COM O ESTADO DA BAHIA. 6) AUSÊNCIA DE DÚVIDAS QUANTO À PRESENÇA DE ÍNDIOS NA ÁREA EM LITÍGIO DESDE O PERÍODO ANTERIOR AO ADVENTO DA CARTA DE 1967 EM FACE DOS REGISTROS HISTÓRICOS QUE REMONTAM A MEADOS DO SÉCULO XVII. 7) O RECONHECIMENTO DO DIREITO À POSSE PERMANENTE DOS SILVÍCOLAS INDEPENDE DA CONCLUSÃO DO PROCEDIMENTO ADMINISTRATIVO DE DEMARCAÇÃO NA MEDIDA EM QUE A TUTELA DOS ÍNDIOS DECORRE, DESDE SEMPRE, DIRETAMENTE DO TEXTO CONSTITUCIONAL. 8) A BAIXA DEMOGRAFIA INDÍGENA NA REGIÃO EM CONFLITO EM DETERMINADOS MOMENTOS HISTÓRICOS, PRINCIPALMENTE QUANDO DECORRENTE DE ESBULHOS PERPETRADOS POR FORASTEIROS, NÃO CONSUBSTANCIA ÓBICE AO RECONHECIMENTO DO CARÁTER PERMANENTE DA POSSE DOS SILVÍCOLAS. A REMOÇÃO DOS ÍNDIOS DE SUAS TERRAS POR ATOS DE VIOLÊNCIA NÃO TEM O CONDÃO DE AFASTAR-LHES O RECONHECIMENTO DA TRADICIONALIDADE DE SUA POSSE. IN CASU, VISLUMBRA-SE A PERSISTÊNCIA NECESSÁRIA DA COMUNIDADE INDÍGENA PARA CONFIGURAR A CONTINUIDADE SUFICIENTE DA POSSE TIDA POR ESBULHADA. A POSSE OBTIDA POR MEIO VIOLENTO OU CLANDESTINO NÃO PODE OPOR-SE À POSSE JUSTA E CONSTITUICONALMENTE CONSAGRADA. 9) NULIDADE DE TODOS OS TÍTULOS DE PROPRIEDADE CUJAS RESPECTIVAS GLEBAS ESTEJAM LOCALIZADAS DENTRO DA ÁREA DE RESERVA INDÍGENA DENOMINADA CARAMURU-CATARINA-PARAGUAÇU, CONFORME DEMARCAÇÃO DE 1938. AQUISIÇÃO A NON DOMINO QUE ACARRETA A NULIDADE DOS TÍTULOS DE PROPRIEDADE NA REFERIDA ÁREA INDÍGENA, PORQUANTO OS BENS TRANSFERIDOS SÃO DE PROPRIEDADE DA UNIÃO (SÚMULA 480 DO STF: Pertencem ao domínio e administração da União, nos termos dos artigos 4, IV, e 186, da Constituição Federal de 1967, as terras ocupadas por silvícolas). 10) A IMPOSSIBILIDADE JURÍDICA DO PEDIDO ERIGIDA PELA CONSTITUIÇÃO FEDERAL IMPÕE QUE AS AÇÕES JUDICIAIS PENDENTES EM QUE SE DISCUTE O DOMÍNIO E/OU A POSSE DE IMÓVEIS SITUADOS NA ÁREA RECONHECIDA NESTE PROCESSO COMO RESERVA INDÍGENA SEJAM EXTINTAS SEM RESOLUÇÃO DO MÉRITO NOS TERMOS DO ART. 267, INCISO V, DO CÓDIGO DE PROCESSO CIVIL. 11) O RESPEITO ÀS COMUNIDADES ÍNDIGENAS E À SUA CULTURA IMPLICA RESTE PRESERVADA A POSSIBILIDADE DE SUPERVENIENTE INCLUSÃO, PELA UNIÃO, ATRAVÉS DE DEMARCAÇÃO ADMINISTRATIVA OU MESMO JUDICIAL, DE NOVAS ÁREAS NA RESERVA INDÍGENA CARAMURU-CATARINA-PARAGUAÇU ALÉM DA JÁ RECONHECIDA NESTES AUTOS. 12) DEVERAS, A EVENTUAL AMPLIAÇÃO DA ÁREA ANALISADA NESTES AUTOS EM RAZÃO DE DEMARCAÇÃO SUPERVENIENTE A ESTE JULGAMENTO DEMANDARÁ COMPROVAÇÃO DE QUE O ESPAÇO GEOGRÁFICO OBJETO DE EVENTUAL AMPLIAÇÃO CONSTITUÍA TERRA TRADICIONALMENTE OCUPADA PELOS ÍNDIOS QUANDO DA PROMULGAÇÃO DA CONSTITUIÇÃO DE 1988. 13) AÇÃO JULGADA PARCIALMENTE PROCEDENTE APENAS QUANTO AOS TÍTULOS DE PROPRIEDADE E REGISTROS IMOBILIÁRIOS REFERENTES AOS IMÓVEIS ABRANGIDOS PELO ESPAÇO GEOGRÁFICO DEMARCADO EM 1938 E COMPROVADO NESTES AUTOS, TOTALIZANDO APROXIMADAMENTE 54 MIL HECTARES. SOB ESSE ÂNGULO, A AÇÃO FOI JULGADA PROCEDENTE PARA RECONHECER A CONDIÇÃO JURÍDICO-CONSTITUCIONAL DE TERRA INDÍGENA SOBRE A TOTALIDADE DA ÁREA DEMARCADA EM 1938 E TOTALIZANDO CERCA DE 54 MIL HECTARES CORRESPONDENTES À RESERVA CARAMARU-CATARINA-PARAGUAÇU, E DECLARAR A NULIDADE DE TODOS OS TÍTULOS DE PROPRIEDADE CUJAS RESPECTIVAS GLEBAS ESTEJAM LOCALIZADAS NA ÁREA DA RESERVA. 14) AS RECONVENÇÕES RELATIVAS ÀS TERRAS SITUADAS NO INTERIOR DA ÁREA DEMARCADA EM 1938 IMPROCEDEM. CONDENAÇÃO DESSES RÉUS RECONVINTES, CUJOS TÍTULOS FORAM ANULADOS, A PAGAREM 10% (DEZ POR CENTO) SOBRE O VALOR ATUALIZADO DA CAUSA E COMPENSADOS OS HONORÁRIOS DOS OUTROS RECONVINTES QUE DECAÍRAM DA RECONVENÇÃO. ( ACO 312, Red. p/ acórdão o Min. Luiz Fux, Tribunal Pleno) 11. O recorrido, João Avillete Sobral, figurou como réu na ação originária, tendo apresentado contestação e reconvenção, que foi julgada improcedente consoante a ementa acima transcrita. Ademais, anoto que o voto do relator, Min. Eros Grau, faz expressa referência ao título de propriedade outorgado pelo Governo do Estado da Bahia ao recorrido, consoante se verifica do seguinte trecho: “Os documentos relativos aos imóveis dos réus foram juntados aos autos em 2002 [fl. 5.572 - vol. XVII], por determinação do Ministro NELSON JOBIM. Títulos de propriedade outorgados pelo Governo do Estado da Bahia entre os anos de 1978 a 1984, nos Municípios de Itajú do Colônia, Pau Brasil e Camacan, as seguintes pessoas físicas [Vol. XVII]: 1 - Agnaldo Lima da Silva, em 14.03,83, fl. 5593; 2 - Álvaro Luiz de Carvalho, em 2.2.82, fl. 5.599; 3 - Alide Maria da Silva, em 14.3.83, fl. 5.605; 4 - Antonio Rodrigues Ferreira, em 30.8.83, fl. 5.615; 5 - Benjamim Tito da Luz, em 3.2.83, fl. 5.620; 6 - Domingos Carvalho de Gois, em 24.3.81 e 14.3.83, fls. 5.625 e 5.631; 7 - Eloy Gomes dos Santos, em 22.6.78, fl. 5.636; 8 - Filomeno José dos Santos, em 14.3.83, fl. 5.642; 9 - Francisco Lins Cardoso, em 5.9.84, fl. 5.646; 10 - Gildemberg Siqueira Viana, em 30.1.81, fl. 5.652; 11 - João Avílete Sobral, em 14.3.83, f 1.5.656; 12 - João Pedro dos Santos, em 29.6.81, fl. 5.664; 13 - José Bispo do Nascimento, em 30.10.78, fl. 5-668; 14 - Luiz Profeta dos Santos, em 14.3.83, fl. 5.674.” 12. Portanto, o imóvel rural alvo do litígio possessório está inserido no perímetro da reserva indígena Caramuru-Paraguassu, consoante decido por esta Corte na ACO 312. 13. O art. 231 da Constituição Federal assegura aos índios direitos originários sobre as terras que tradicionalmente ocupam e é claro em afirmar que as terras “são inalienáveis e indisponíveis, e os direitos sobre elas, imprescritíveis” (art. 231, § 4º). Trata-se de reconhecer a precedência jurídica do direito dos povos originários do território brasileiro, que tem por consequência a nulidade dos títulos de domínio sobre as terras indígenas (art. 231, § 6º, CF). A corroborar essa interpretação, veja-se que o texto constitucional utilizou o verbo reconhecer, que pressupõe a existência de uma relação anterior à promulgação da Carta e o seu caráter declaratório. Não se trata de conferir novos direitos. Por esse motivo, a demarcação da terra indígena possui caráter declaratório e não constitutivo do direito. 14. A proteção dos direitos territoriais indígenas constitui direito fundamental ligado ao mínimo existencial de populações vulneráveis. 15. Em primeiro lugar, a relação dos povos indígenas com a terra possui dimensão existencial que transcende a concepção civilista da posse. O laço do índio com a terra define a sua própria existência, desde as atividades produtivas até a dimensão espiritual e religiosa. Diferentemente da noção possessória, que está ligada a ‘ter’, a posse tradicional indígena está ligada ao ‘ser’. Sob a perspectiva indígena, o índio não possui a terra no sentido de exercer domínio sobre ela, ele é parte integrante da natureza. 16. Em segundo lugar, a posse tradicional possui natureza coletiva, sendo reconhecida à Comunidade Indígena como um todo e não se confundindo com a ideia de condomínio. A terra é o que possibilita o modo de viver de um povo. Ela se assimila à ideia de habitat . 17. Em terceiro lugar, a posse tradicional sobre as terras que ocupam não se confunde com a posse sobre o local físico da aldeia, a base da comunidade. A posse contempla “as utilizadas para suas atividades produtivas, as imprescindíveis à preservação dos recursos ambientais necessários a seu bem-estar e as necessárias a sua reprodução física e cultural, segundo seus usos, costumes e tradições” (art. 231, § 1º, CF/1988). Ela compreende todo o espaço necessário ao desenvolvimento de atividades como a agricultura, a caça e a pesca, por exemplo. O conceito é abrangente e deve compreender a dinâmica de uma cultura. 18. A interpretação constitucional – e de todo o ordenamento jurídico – deve ser realizada de modo a promover o acesso das comunidades indígenas à terra, e não restringi-lo. Nesse contexto, uma vez caracterizado como terra indígena o imóvel objeto da demanda, não há como ser objeto de ação possessória ajuizada por particular com amparo na legislação civil que disciplina os institutos da posse e propriedade, sob pena de afronta ao art. 231 da Constituição. A apresentação de certidão do Registro Geral de Imóveis ou de documentos que supostamente comprovam a posse do recorrido, bem como considerações sobre a alegada utilização socioeconômica do imóvel, não são aptas a afastar a posse imemorial indígena. 18. Diante do exposto, com base no art. 932, V, c/c o art. 1.042, § 5º, do CPC/201 e no art. 21, § 2º, do RI/STF, conheço do agravo da Fundação Nacional do Índio – Funai e dou provimento ao recurso extraordinário, para julgar improcedente o pedido formulado na inicial. Invertidos os ônus de sucumbência. Publique-se. Brasília, 18 de agosto de 2022. Ministro LUÍS ROBERTO BARROSO Relator
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