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17 de Maio de 2024
  • 2º Grau
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Supremo Tribunal Federal STF - RECLAMAÇÃO: Rcl 33137 SC - SANTA CATARINA

Supremo Tribunal Federal
há 5 anos

Detalhes

Processo

Publicação

Julgamento

Relator

Min. EDSON FACHIN
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Ementa

Decisão

Decisão: Trata-se de reclamação proposta pelo Ministério Público de Santa Catarina, com pedido liminar, em face de decisão monocrática de membro do Tribunal de Justiça de Santa Catarina, proferida nos autos do Agravo de Instrumento n. XXXXX-55.2018.8.24.0000 (correlato à Ação Civil Pública n. XXXXX-27.2018.8.24.0023), que teria violado o conteúdo da medida cautelar referendada pelo Pleno desta Corte, na Arguição de Descumprimento de Preceito Fundamental nº 548 (eDOC. 1). A decisão reclamada considerou, em juízo de cognição sumária, lícito o ato da parlamentar eleita de divulgar em sua rede social que seu gabinete serviria “como um canal de denúncias dos estudantes, garantido o anonimato acaso queiram, quanto a manifestações político-partidárias ou ideológicas que humilhem ou ofendam sua liberdade de crença e consciência.” O pedido liminar foi deferido considerando que a decisão paradigma proibiu que agentes públicos inibam ou controlem a manifestação livre de ideias e divulgação do pensamento nos ambientes acadêmicos. Foi interposto Agravo Regimental (eDOC 27) e apresentada a Contestação (eDOC 32), sustentando-se que a Reclamação não poderia ter sido utilizada como substitutiva de recurso e que a decisão na ADPF n. 538 não serve de parâmetro, porque esta teria aplicação no âmbito das Universidades, enquanto a decisão reclamada trataria do ensino fundamental. As questões fáticas, ademais, devem ser apreciadas pelas instâncias ordinárias. Assevera que, na sala de aula, deve prevalecer a publicidade ( CRFB, art. , XXXIII), garantindo-se, ainda, o direito de petição (art. 5º, XXXLIV) em caso de ilícitos ali praticados. Não seria pertinente equiparar esse direito ao poder de polícia, o que, ademais inviabilizaria outros mecanismos privados de fiscalização. Requerido juízo de retratação, este foi negado (eDOC 37), ocasião em que abri vista à Procuradoria-Geral da República, a qual se manifestou em parecer assim ementado: RECLAMAÇÃO. MEDIDA CAUTELAR DEFERIDA NA ADPF 548/DF PELA MINISTRA RELATORA E REFERENDADA PELO PLENÁRIO DESSE SUPREMO TRIBUNAL FEDERAL. LIMINAR DEFERIDA. AÇÃO CIVIL PÚBLICA. SUPOSTA DIVULGAÇÃO DE CONVOCAÇÃO EM REDE SOCIAL DE COMPUTADORES (FACEBOOK) COM CONOTAÇÃO QUE VIOLARIA PRECEITOS CONSTITUCIONAIS. LIMINAR PARCIALMENTE DEFERIDA PARA RETIRAR A PUBLICAÇÃO. AGRAVO DE INSTRUMENTO. EFEITO SUSPENSIVO CONCEDIDO PARA “RETORNAR A EXPRESSÃO OMITIDA NA PÁGINA DO FACEBOOK”. NECESSIDADE DE SE PRESERVAR O NÚCLEO CENTRAL E A PARTE DISPOSITIVA DAS DECISÕES DESSE SUPREMO TRIBUNAL FEDERAL PROFERIDAS EM SEDE DE CONTROLE CONCENTRADO DE CONSTITUCIONALIDADE. MANIFESTAÇÃO PELA PROCEDÊNCIA DA RECLAMAÇÃO, COM A CONFIRMAÇÃO, NO MÉRITO, DA LIMINAR INICIALMENTE DEFERIDA AB INITIO. A autoridade reclamada apresentou suas informações (eDOC 24). É o relatório. A fim de evitar tautologia, ratifico as razões expendidas quando do deferimento da medida liminar, para dizer que o cabimento da reclamação, instituto jurídico de natureza constitucional, deve ser aferido nos estritos limites das normas de regência, que somente a concebem para preservação da competência do Tribunal e para garantia da autoridade de suas decisões (art. 102, I, l , CF), bem como contra atos que contrariem ou indevidamente apliquem Súmula Vinculante (art. 103-A, § 3º, da CF). No caso concreto, a alegação é de afronta à decisão tomada por este Supremo Tribunal Federal, quando referendou medida cautelar concedida na ADPF nº 548, amoldando-se a ação, teoricamente, portanto, à hipótese para a qual foi concebida constitucionalmente. O parâmetro de controle invocado é a decisão tomada por unanimidade pelo Colegiado desta Casa, em sede de medida cautelar e que possui o seguinte teor: ‘O Tribunal, por unanimidade, reconheceu adequada a utilização da arguição de descumprimento de preceito fundamental, seja porque respeitado, no caso, o princípio da subsidiariedade, seja, ainda, porque processualmente viável a impugnação, por seu intermédio, de decisões judiciais ou de interpretações judiciais de textos normativos. Em seguida, o Tribunal, também por votação unânime, referendou, integralmente, a decisão proferida pela Relatora, Ministra Cármen Lúcia, decisão essa que se reveste de efeito vinculante e de eficácia contra todos (suspendendo-se os efeitos de atos judiciais ou administrativos, emanados de autoridade pública que possibilitem, determinem ou promovam o ingresso de agentes públicos em universidades públicas e privadas, o recolhimento de documentos, a interrupção de aulas, debates ou manifestações de docentes e discentes universitários, a atividade disciplinar docente e discente e a coleta irregular de depoimentos desses cidadãos pela prática de manifestação livre de ideias e divulgação do pensamento nos ambientes universitários ou em equipamentos sob a administração de universidades públicas e privadas e serventes a seus fins e desempenhos). (…)’ Plenário , 31.10.2018. Já a decisão ora reclamada adota a premissa de que a Deputada eleita teria se colocado “como um canal de denúncias dos estudantes, garantido o anonimato acaso queiram, quanto a manifestações político-partidárias ou ideológicas que humilhem ou ofendam sua liberdade de crença e consciência” (grifos acrescidos). No mesmo sentido, ainda, assevera que “se coloca a requerida como uma espécie de ouvidora social no combate a que se propõe a toda espécie de abuso ou excesso que se venha a praticar em sala de aula, a partir da transgressão pelo professor dos limites constitucionais que lhe são deferidos para o exercício de sua docência. [...] E conclui, quanto a tal atuação “(...) em linha de princípio, neste estágio inicial de juízo de delibação, não vislumbro nenhuma ilegalidade na iniciativa da agravante, Deputada estadual eleita, de colocar seu futuro gabinete como meio social condensador do direito que todo cidadão possui, estudantes inclusive, de peticionar a qualquer órgão público denunciando ato que entenda ilegal praticado por representante do Estado, sobretudo quando se tratar de ofensas e humilhações em proselitismo político-partidário travestido de conteúdo educacional ministrado em sala de aula.” Ou seja, a Deputada eleita não apenas “se coloca à disposição, nas redes sociais, para ouvir a população”, “como uma espécie de ouvidora social”, como propõe o silogismo da decisão reclamada. Transcrevo palavras literais: “.. . 29 de outubro, é o dia em que os professores doutrinadores estarão inconformados e revoltados. Muitas deles não conterão sua ira e farão da sala de aula um auditório cativo para suas queixas político-partidárias em virtude da vitória de Bolsonaro. Filme ou grave todas as manifestações político-partidárias ou ideológica.” Como se infere, incita-se, assim, a que os alunos se comportem como se agentes do Estado fossem, dando a entender que essa atuação é legítima, quando nem ao próprio Estado é conferido o poder de controlar tais manifestações (e esse é o núcleo da decisão da ADPF nº 548). Ao se apresentar e se identificar como Deputada eleita, há mensagem – e ressalto porque este ponto é relevantíssimo –, que, por ser agente político do Estado, estaria apta a “investir” os alunos de poderes tipicamente estatais: exercício de fiscalização – poder de polícia, portanto – em relação a ideias e ideologias contrárias às por si propugnadas. Ao conclamar os alunos a exercerem verdadeiro controle sobre manifestações de opinião de professores, a Deputada transmite a ideia de que isso é lícito. Estimula-os, em consequência, a se sentirem legitimados a controlarem e a denunciarem manifestações político-partidárias ou ideológicas contrárias às suas. “Confere-lhes”, por meio de sua própria “autoridade”, segundo se depreende, direito ou poder de exercerem juízo de valor em detrimento de liberdade de expressão e de pensamento alheio, o que, nem às autoridades públicas (em sentido lato) cabe, segundo a decisão proferida na ADPF nº 548. Nesse contexto, é plausível a tese de equívoco na subsunção do caso concreto, permitindo, assim, que de pronto (ou seja: da própria decisão reclamada, sem necessidade de revolvimento fático, como se alega) se verifique a plausibilidade da tese que aponta a alegada afronta à decisão vinculante desta Corte na ADPF nº 548. É que, escandindo o comando decisório, em seu núcleo, há evidente proibição de que (ainda que haja ordem de autoridade judicial ou administrativa), agentes públicos, por diversos meios e modos (ingresso no estabelecimento estudantil, recolhimento de documentos, interrupção de aulas, etc.) inibam ou controlem a manifestação livre de ideias e divulgação do pensamento nos ambientes acadêmicos. E foi exatamente isso, em seu núcleo, que a decisão reclamada autorizou, à revelia da decisão tomada na ADPF 548. Eis a aderência: a Deputada eleita, porquanto agente político estatal, assemelha-se (considerando o público a que direcionado: alunos em idade escolar) à autoridade pública (pois ela se dirige ao público, em sua página, nessa condição; encarnando, nessa qualidade e medida, parcela do Estado, presentando-o). E ainda que devessem ser de todos os cidadãos conhecidas as atribuições de cada Poder do Estado, e, por conseguinte, de cada membro seu, que os presentam, na realidade, uma Deputada eleita se confunde e se assemelha, para fins de subsunção ao caso, à autoridade pública de quem está emanando chamamento para a prática de ato (convocação a que todos os alunos sejam fiscais da manifestação de pensamento alheia e que denunciem as ideias e ideologias diversas das suas) que justamente iniba, fiscalize e controle a manifestação livre de ideias e divulgação do pensamento nos ambientes universitários (neste caso: escolares). Nessa ordem de ideias, a decisão hostilizada, ao fazer uma releitura do conteúdo da mensagem que a Deputada fez publicar em sua rede social, indiretamente afrontou o pronunciamento desta Corte na ADPF nº 548, em que se proibiu expressa e justamente que autoridades públicas estatais determinem, promovam ou permitam o controle e a fiscalização, por agentes estatais, da liberdade de expressão e de pensamento de professores, alunos e servidores dentro dos ambientes escolares. O caso apresenta estrita aderência ao conteúdo da decisão indicada como parâmetro de controle. Não se afronta conteúdo de decisão ou se nega vigência a regra legal apenas de modo expresso. Há outros meios de de deixar de aplicar um entendimento ou um dispositivo legal cogente. E um deles consiste em enfocar o caso concreto sob premissas que não atrairão conclusões inevitáveis, que esbarrão em súmulas vinculantes, em decisões proferidas em controle concentrado ou em teses de repercussão geral. É o que ocorria, para ilustrar com casos recentes, em ações cuja incidência de determinada regra era cogente e só poderia ser afastada mediante declaração de inconstitucionalidade por órgão colegiado. Para tangenciar essa declaração (que exige reserva de plenário conforme art. 97 da CF e SV 10, STF), alguns pronunciamentos judiciais sequer tratavam da referida norma, recorrendo a outras normas ou entendimentos sedimentados como fundamento de decidir. Embora na espécie se trate de pronunciamento vinculante em ADPF (e não de declaração de inconstitucionalidade), o raciocínio jurídico aplicável é idêntico. Na hipótese dos autos, no ato reclamado deu-se, à situação de fato, interpretação ou qualificação que a desviaria da inexorável conclusão da afronta à decisão desta Casa na ADPF nº 548. Alterando-se uma das premissas essenciais, altera-se a conclusão. Assim, confirmo a decisão liminar para assentar que a decisão reclamada afrontou o conteúdo da ADPF 548, ainda que por vias oblíquas ou indiretas: na escolha de significantes que levam a significados que permitem a fuga da subsunção do caso concreto à norma proibitiva decorrente de comando jurisprudencial da Suprema Corte. Em relação as alegações da reclamada, como anotado, o fato da decisão paradigma tratar de universidades não afasta a sua extensão a outros ambientes escolares, pois não há critério distintivo nos fundamentos da decisão. Como lá ressaltei, “nas universidades e nas instituições de ensino, mais do que em qualquer outro lugar, as ideias disputam o coração das pessoas. Elas devem, portanto, livremente circular, para que a melhor possa prevalecer.” Tampouco se deve exigir o prévio esgotamento das instâncias ordinárias, pois não se aplica, aqui, o art. 988, § 5º, II, do CPC, mas o art. 988, II e III. Por fim, este Tribunal vem reiterado que a liberdade de expressão é o pilar da democracia, seja na ADPF paradigma, seja: quando do julgamento da ADI 4.451, Rel. Ministro Ayres Britto, DJe 24.08.2012, em que assentou que não cabe ao Estado, por qualquer dos seus órgãos, definir previamente o que pode ou o que não pode ser dito por indivíduos e jornalistas; na ADPF 130, também de relatoria do e. Ministro Ayres Britto, o Tribunal fez observar que o pensamento crítico é parte integrante da informação plena e fidedigna; na ADI 2.404, de relatoria do e. Ministro Dias Toffoli, a Corte, ao reconhecer a inconstitucionalidade da previsão legal de sanções para o descumprimento das regras de classificação indicativa, definiu que o exercício da liberdade de programação pelas emissoras impede que a exibição de determinado espetáculo dependa de ação estatal prévia; na ADI 2566, em que restei relator, j. 16.05.2018, a Corte entendeu inconstitucional a proibição de discurso proselitista em serviço de radiodifusão comunitária. Essa liberdade é também inerente ao ambiente acadêmico, microcosmo democrático e plural. O poder de polícia, ali, deve ser restrito, não amplo. Os dissensos devem ser debatidos, não tolhidos. Pressupõe-se, afinal, a capacidade de crítica que a multiplicidade de referências – da escola, da família, da comunidade, etc. - dos discentes permite. Eventuais ilícitos têm, no devido processo legal, seus meios para serem devidamente apurados, interna – no âmbito do poder disciplinar – ou externamente – no âmbito da responsabilidade civil ou penal. 3. Assim, confirmo a medida liminar anteriormente deferida e, nos termos do art. 21, § 1º, do RISTF, julgo procedente a Reclamação, para cassar a decisão proferida pelo Tribunal de Justiça de Santa Catarina nos autos do Agravo de Instrumento n. XXXXX-55.2018.8.24.0000 (correlato à Ação Civil Pública n. XXXXX-27.2018.8.24.0023). Prejudicado o agravo regimental (eDOC 27). Publique-se. Intime-se. Brasília, 10 de junho de 2019 Ministro Edson Fachin Relator Documento assinado digitalmente
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