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17 de Junho de 2024
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    Superior Tribunal de Justiça STJ - RECURSO ESPECIAL: REsp XXXXX PR XXXX/XXXXX-7 - Rel. e Voto

    Superior Tribunal de Justiça
    há 11 anos

    Precedente Obrigatório • Tese Jurídica

    Tema 586

    Discute-se a possibilidade de rescisão de acórdão proferido em ação de restituição de parcelas pagas por consorciados desistentes, com base em documento novo e erro de fato.

    Tese

    "Em sede de ação rescisória, microfilmes de cheques nominais emitidos por empresa de consórcio configuram documentos novos, nos termos do art. 485, VII, do CPC, aptos a respaldar o pedido rescisório por comprovarem que a restituição das parcelas pagas pelo consorciado desistente já havia ocorrido antes do julgamento do processo originário".

    Detalhes

    Processo

    Órgão Julgador

    S2 - SEGUNDA SEÇÃO

    Publicação

    Julgamento

    Relator

    Ministro PAULO DE TARSO SANSEVERINO
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    Relatório e Voto

    RELATOR : MINISTRO PAULO DE TARSO SANSEVERINO
    RECORRENTE : VALTER LUIZ CURTULO E OUTROS
    ADVOGADO : LUIZ GUSTAVO FRAGOSO DA SILVA E OUTRO (S)
    RECORRIDO : CNF CONSÓRCIO NACIONAL LTDA
    ADVOGADO : VANESSA CRISTINA CRUZ SCHEREMETA E OUTRO (S)
    RELATÓRIO
    O EXMO. SR. MINISTRO PAULO DE TARSO SANSEVERINO (Relator):
    Trata-se de recurso especial interposto por VALTER LUIZ CURTULO E OUTROS, com fundamento na alínea a do inciso III do art. 105 da Constituição Federal, contra acórdão proferido pelo Tribunal de Justiça do Estado do Paraná, que julgou procedentes os pedidos veiculados na ação rescisória proposta por CNF CONSÓRCIO NACIONAL LTDA, em acórdão assim ementado:
    CONSÓRCIO. DUPLO FUNDAMENTO: DOCUMENTO NOVO E ERRO DE FATO (INCISOS VII E IX, DO ART. 485, DO CPC). PROCEDÊNCIA SÓ DO PRIMEIRO. DECLARATÓRIA/CONDENATÓRIA PARCIALMENTE RESCINDIDA. ABATIMENTO DO VALOR JÁ RESTITUÍDO. LITIGÂNCIA DE MÁ-FÉ CONFIGURADA (ART. 17, II, DO CPC). DEVOLUÇAO EM DOBRO (ART. 1531, DO CCB/16, ATUAL 940).
    Os recorrentes sustentaram que o acórdão recorrido negou vigência aos: (a) art. 4855, VII, doCPCC, alegando que não configura documento novo apto a respaldar ação rescisória o cheque emitido pelo próprio autor e por ele contabilizado, considerando que sua utilização no momento oportuno sempre esteve ao seu alcance; (b) art. 4855, IX, doCPCC, afirmando a impossibilidade de se propor ação rescisória com fundamento em erro de fato relativo a fato novo não alegado no processo de conhecimento; (c) art. 1.5311 doCC/166 e arts. 177, I, II e III, e188 doCPCC, defendendo não estar provado o dolo necessário à aplicação das penalidades de restituição em dobro e daquelas oriundas de litigância de má-fé; (d) Lei5.4333/68 e seu regulamento, o Decreto1.7999/96, asseverando ter o pedido rescisório sido fundamentado e deferido com base em documento que desatende as exigências legais (fls. 1.000-1.010 e-STJ).
    Foram apresentadas contrarrazões ao recurso especial (fls. 1.016-1.028 e-STJ).
    O presente recurso e o REsp n.º 1.135.563/PR foram admitidos pela 1ª Vice-Presidência do Tribunal de Justiça do Estado do Paraná como representativos de controvérsia multitudinária (fls. 1.032 e-STJ).
    Diante da multiplicidade de recursos versando acerca da mesma controvérsia no Tribunal de Justiça do Estado do Paraná, o julgamento dos recursos foi afetado à Segunda Seção deste Superior Tribunal, nos termos do que dispõem o art. 543-C do CPC e a Resolução 08/2008 deste Superior Tribunal (fls. 1.039-1.040 e-STJ).
    O Ministério Público Federal manifestou-se pelo conhecimento parcial e pelo desprovimento do recurso especial (fls. 1.045-1.047 e-STJ).
    É o relatório.
    VOTO
    O EXMO. SR. MINISTRO PAULO DE TARSO SANSEVERINO (Relator):
    Eminentes Colegas, a presente controvérsia devolvida ao conhecimento deste Superior Tribunal de Justiça envolve inegável multiplicidade de recursos em tramitação no Poder Judiciário do Estado do Paraná, ainda que não diga respeito a matéria nacionalmente abrangente.
    Conforme consignado pelo Tribunal de origem, foram propostas, na Comarca de Paranavaí, mais de duas mil ações idênticas, todas patrocinadas pelos advogados dos recorrentes, por meio das quais se buscava a restituição das parcelas pagas por consorciados desistentes do Consórcio Nacional Ford LTDA.
    Posteriormente ao julgamento de procedência das respectivas ações, o Consórcio Nacional Ford LTDA ajuizou ação rescisória dos respectivos julgados, fundando-se em documentos que, embora localizados tardiamente, comprovam que a restituição das cotas já havia ocorrido.
    Portanto, a controvérsia apresenta caráter multitudinário, a despeito de sua abrangência regional, considerando que há, nos termos do que prevê o art. 543-C do Código de Processo Civil, uma multiplicidade de recursos com fundamento em idêntica questão de direito.
    A controvérsia limita-se às seguintes questões:
    a) existência de documento novo, para fins do art. 485, VII, do CPC;
    b) ocorrência de erro de fato, nos termos do art. 485, IX, do CPC;
    c) regularidade dos microfilmes apresentados frente às determinações da Lei n. Lei 5.433/68 e de seu regulamento, o Decreto n. 1.799/96;
    d) caracterização da litigância de má-fé por parte dos réus, com a aplicação das penalidades dela decorrentes.
    Passo ao exame de cada uma dessas questões.
    a) Existência de documento novo
    Um dos fundamentos da ação rescisória é a existência de documento novo, consubstanciado em microfilmes de cheques nominais que comprovam a restituição das parcelas pagas pelos consorciados desistentes.
    O autor sustenta que não pôde obter em tempo hábil os referidos documentos, considerando a situação peculiar que se instaurou na Comarca de Paranavaí, em que foram ajuizadas milhares de ações por consorciados domiciliados em todo o território nacional.
    Os recorrentes, por sua vez, defendem que os microfilmes não podem ser considerados documentos novos para fins de incidência da norma prevista no art. 485, VII, do Código de Processo Civil, uma vez que eles sempre estiveram ao alcance do recorrido, que poderia tê-los apresentado já no curso da ação originária.
    Segundo abalizada doutrina acerca do tema (MOREIRA, José Carlos Barbosa. Comentários ao Código de Processo Civil, Lei nº 5.869, de 11 de janeiro de 1973 . Vol. V. Rio de Janeiro: Editora Forense, 2009, p. 137-139), entende-se por documento novo:
    (...) não se deve entender aqui o constituído posteriormente.O adjetivo "novo" expressa o fato de só agora ser ele utilizado, não a ocasião em que veio a formar-se. Ao contrário: em princípio, para admitir-se a rescisória, é preciso que o documento já existisse ao tempo do processo em que se proferiu a sentença. Documento "cuja existência" a parte ignorava é, obviamente, documento que existia; documento de que ela "não pôde fazer uso" é, também, documento que, noutras circunstâncias, poderia ter sido utilizado, e portanto existia.
    Fosse qual fosse o motivo da impossibilidade de utilização, é necessário que haja sido estranho à vontade da parte. Esta deve ter-se visto impossibilitada, sem culpa sua, de usar o documento, v.g., porque lhe fora furtado, ou porque estava em lugar inacessível, ou porque não se pôde encontrar o terceiro que o guardava, e assim por diante. Não se exige, porém, que a impossibilidade se haja devido a ato do adversário - caso em que se poderá configurar o fundamento contemplado no inciso III (dolo da parte vencedora). É concebível que a responsabilidade caiba até a litisconsorte, cujo interesse talvez não coincidisse com o daquele a quem aproveitaria a produção do documento, ou a assistente, conluiado ou não com o litigante adverso. São hipóteses, todas essas, que de maneira alguma excluem a viabilidade da rescisória, mas tampouco precisam ocorrer para ensejá-la. (Grifou-se)
    Na espécie, os microfilmes de cheques nominais efetivamente existiam à época da prolação do julgado rescindendo, porém ao Consórcio Nacional Ford LTDA não foi possível sua utilização em tempo hábil na ação originária.
    Conforme já afirmado, foram propostas na Comarca de Paranavaí mais de duas mil ações contra a empresa autora, em que se buscava a restituição de parcelas pagas por consorciados desistentes cujo contrato, na grande maioria dos casos, não guardava qualquer relação com aquele juízo.
    Com efeito, além de poucos serem os autores residentes naquela comarca, a grande maioria dos contratos foram firmados em outras unidades da Federação, sendo perfeitamente razoável concluir que a concentração de demandas naquele juízo do interior do Paraná tinha o único intuito de dificultar a defesa do réu.
    Assim, se, em uma situação ordinária, seria razoável pressupor a possibilidade de juntada de documentos que estavam em poder do réu, no caso em tela, havendo situação excepcional criada justamente com o intuito de lhe dificultar a defesa, deve-se reconhecer que ao Consórcio Nacional Ford LTDA não foi possível a utilização dos microfilmes no curso do processo originário.
    Verifica-se, portanto, a existência de documento novo apto a servir de fundamento para a ação rescisória em questão.
    b) Ocorrência de erro de fato
    O segundo fundamento para a propositura da ação rescisória é a configuração de erro de fato no julgado rescindendo, que teria deixado de considerar que a restituição das parcelas pagas já havia sido realizada voluntariamente após a extinção da relação contratual.
    Os recorrentes defendem o descabimento da ação rescisória quanto ao ponto, ressaltando que, para fins do art. 485, IX, do CPC, era imprescindível que a questão relativa à restituição tivesse sido considerada no julgamento da ação originária, o que não ocorreu.
    A doutrina tradicional acerca do tema tem estabelecido um rol de requisitos para a configuração do erro de fato, nos termos do disposto no art. 485, IX, do CPC (ALVIM, Arruda; ASSIS, Araken de; ALVIM, Eduardo Arruda. Comentários ao Código de Processo Civil . 1. ed. Rio de Janeiro: GZ Ed., 2012, p. 486):
    Conforme se extrai do 1º do art. 485, há erro quando a decisão for fundada na admissão de um fato inexistente, ou quando considerar inexistente um fato efetivamente ocorrido. É imprescindível, quer em uma, quer em outra hipótese, que não tenha havido controvérsia, nem pronunciamento judicial sobre o fato (2º). Cumpre-nos observar que a doutrina reconhece a existência de seis requisitos para a caracterização do erro de fato, quais sejam: (a) deve dizer respeito a fato; (b) deve constar nos autos onde foi proferida a decisão rescindenda, não se admitindo produção de prova para demonstrá-lo ; (c) deve ser causa determinante da decisão; (d) a decisão deve ter suposto um fato que inexista ou supor existente um fato que não ocorreu; (e) sobre esse fato não pode ter havido controvérsia; (f) sobre esse fato não pode ter havido pronunciamento judicial. (Grifou-se)
    No caso em comento, não se configura a hipótese prevista no referido dispositivo legal, considerando que, nos autos da ação originária, não havia prova do fato considerado erroneamente inexistente no acórdão rescindendo.
    Com efeito, a restituição das parcelas pagas apenas se tornou de conhecimento do recorrido após o julgamento da ação originária, com a obtenção dos microfilmes de cheques nominais ora apresentados como documentos novos.
    Há evidente incompatibilidade na alegação de erro de fato cuja prova está consubstanciada em documento novo apresentado apenas na ação rescisória, considerando que, para que esteja configurada a hipótese do art. 485, IX, do CPC, é imprescindível que a prova esteja nos autos do processo originário.
    Relembre-se doutrina específica acerca do tema (SOUZA, Bernardo Pimentel. Introdução aos Recursos Cíveis e à Ação Rescisória . 7. ed. São Paulo: Editora Saraiva, 2010, p. 838-839):
    Com efeito, além das limitações gerais insertas no caput do artigo 485, o inciso IX indica que só o erro de fato perceptível à luz dos autos do processo anterior pode ser sanado em ação rescisória. Daí a conclusão: é inadmissível ação rescisória por erro de fato, cuja constatação depende da produção de provas que não figuram nos próprios autos do processo primitivo.
    Na espécie, a prova da restituição das parcelas não constou dos autos da ação originária, de tal modo que não se mostra possível o reconhecimento da ocorrência de erro de fato.
    c) Atendimento às determinações da Lei n. 5.433/68 e do Decreto n. 1.799/96
    Os recorrentes sustentaram que os microfilmes apresentados não atendem às determinações previstas na legislação pátria acerca da microfilmagem.
    A irresignação, porém, esbarra no óbice previsto na Súmula 7 deste Superior Tribunal.
    Com efeito, o Tribunal de Justiça do Estado do Paraná tem entendido que os microfilmes de cheques nominais apresentados pelo Consórcio Nacional Ford LTDA preenchem todos os requisitos legalmente previstos, constituindo-se documentos hábeis a comprovar a restituição já realizada aos consorciados desistentes.
    A alteração dessa conclusão exigiria necessariamente a incursão nos elementos fático-probatórios dos autos, o que não se mostra possível nesta instância especial.
    d) Configuração da litigância de má-fé
    O Tribunal de Justiça do Estado do Paraná, com base nos autos do processo originário, concluiu que, tendo os recorrentes pleiteado o reembolso de cotas já restituídas, agiram com evidente má-fé, nos termos do art. 17, II, do CPC, condenando-os ao pagamento de multa de 1% sobre o valor dado à causa, bem como ao pagamento em dobro do valor que reclamaram indevidamente.
    Os recorrentes alegam, em síntese, que pela petição inicial da ação originária infere-se que não foi requerida a restituição das cotas, mas, sim, a devolução dos valores devidos, após a exibição de documentos atestando sua real posição financeira frente ao consórcio.
    Defendem, assim, não ter havido qualquer alteração na verdade dos fatos, devendo ser reconhecida a ausência de má-fé em sua conduta.
    Contudo, o recurso especial, quanto ao ponto, igualmente encontra óbice na Súmula 7/STJ.
    Com efeito, para se afastar o reconhecimento da litigância de má-fé, seria imprescindível o revolvimento dos fatos ocorridos na ação originária, providência vedada nesta instância especial.
    Conclusão
    Em síntese, pode-se concluir que, nas ações rescisórias propostas pelo Consórcio Nacional Ford LTDA, com o objetivo de rescindir julgado que o condenou à restituição das cotas de consorciados desistentes:
    a) os microfilmes de cheques nominais emitidos pelo Consórcio Nacional Ford LTDA aos consorciados desistentes configuram documento novo apto a autorizar a procedência da ação rescisória com fundamento no art. 485, VII, do CPC;
    b) não está configurado o erro de fato apto a fundar o pedido rescisório, não havendo incidência do art. 485, IX, do CPC;
    c) a verificação da regularidade dos microfilmes apresentados frente à Lei n. 5.433/68 e ao Decreto n. 1.799/96 e a análise da configuração da litigância de má-fé dos réus constituem matérias que não podem ser analisadas em recurso especial, por exigirem o reexame de matéria fático-probatória, vedado pelo óbice previsto na Súmula 7/STJ.
    Tese
    Para fins do art. 543-C do Código de Processo Civil, a tese a ser firmada é a seguinte:
    Em sede de ação rescisória, microfilmes de cheques nominais emitidos por empresa de consórcio configuram documentos novos, nos termos do art. 485, VII, do CPC, aptos a respaldar o pedido rescisório por comprovarem que a restituição das parcelas pagas pelo consorciado desistente já havia ocorrido antes do julgamento do processo originário.
    Julgamento do caso concreto
    No caso em exame, o acórdão recorrido julgou procedentes os pedidos veiculados na ação rescisória, mas apenas com fundamento nos documentos novos, pois concluiu que não ter havido erro de fato no julgado rescindendo.
    Sendo assim, o recurso especial não pode ser conhecido quanto à apontada violação do art. 485, IX, do CPC, por ausência de interesse recursal.
    No mais, deve ser negado provimento ao recurso especial, pela ausência de violação do art. 485, VII, do CPC e pela aplicação da Súmula 7/STJ, nos termos da fundamentação supra.
    Ante o exposto, conheço em parte do recurso especial e a ele nego provimento.
    É o voto.

    Documento: XXXXX RELATÓRIO E VOTO
    Disponível em: https://www.jusbrasil.com.br/jurisprudencia/stj/23368453/relatorio-e-voto-23368455

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