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30 de Maio de 2024
  • 2º Grau
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Detalhes

Processo

Órgão Julgador

4ª TURMA CÍVEL

Publicação

Julgamento

Relator

JAMES EDUARDO OLIVEIRA

Documentos anexos

Inteiro TeorTJ-DF__20140110716298_21f31.pdf
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Inteiro Teor

Poder Judiciário da União Fls. _____

TRIBUNAL DE JUSTIÇA DO DISTRITO FEDERAL E TERRITÓRIOS




Órgão

:

4ª TURMA CÍVEL

Classe

:

APELAÇÃO CÍVEL

N. Processo

:

20140110716298APC
(XXXXX-30.2014.8.07.0018)

Apelante(s)

:

DISTRITO FEDERAL

Apelado(s)

:

IVANILSO QUEIROZ SANTOS

Relator

:

Desembargador JAMES EDUARDO OLIVEIRA

Acórdão N.

:

1059572

E M E N T A

DIREITO ADMINISTRATIVO E PROCESSUAL CIVIL. AGRAVO RETIDO. CERCEAMENTO DE DEFESA. NÃO CONFIGURAÇÃO. AMPARO ASSISTENCIAL. PESSOA EM SITUAÇÃO DE VULNERABILIDADE SOCIAL. OMISSÃO DO DISTRITO FEDERAL NÃO VERIFICADA. DEVER DE INDENIZAR NÃO RECONHECIDO.

I. Não traduz cerceamento de defesa o indeferimento de prova testemunhal na hipótese em que a prova documental se revela suficiente para a elucidação dos fatos controversos e relevantes da causa.

II. Demonstrada a inexistência de omissão do Distrito Federal quanto ao amparo assistencial à pessoa em situação de vulnerabilidade social, não pode persistir a sua condenação a pagamento de indenização por dano moral.

III. Recurso provido.

Fls. _____

Apelação Cível XXXXXAPC

A C Ó R D Ã O

Acordam os Senhores Desembargadores da 4ª TURMA CÍVEL do Tribunal de Justiça do Distrito Federal e Territórios, JAMES EDUARDO OLIVEIRA - Relator, LUÍS GUSTAVO B. DE OLIVEIRA - 1º Vogal, FERNANDO HABIBE - 2º Vogal, sob a presidência do Senhor Desembargador FERNANDO HABIBE, em proferir a seguinte decisão: DAR PROVIMENTO AO RECURSO . UNÂNIME. , de acordo com a ata do julgamento e notas taquigráficas.

Brasilia (DF), 8 de Novembro de 2017.

Documento Assinado Eletronicamente

JAMES EDUARDO OLIVEIRA

Relator

Fls. _____

Apelação Cível XXXXXAPC

R E L A T Ó R I O

Trata-se de APELAÇÃO interposta pelo DISTRITO FEDERAL contra a r. sentença proferida pelo Juízo da 7ª Vara de Fazenda Pública do Distrito Federal que, na AÇÃO DE CONHECIMENTO ajuizada por IVANILSO QUEIROZ SANTOS, confirmou a tutela antecipada para que o Réu providencie abrigo ao Autor e julgou procedente o pedido de indenização por dano moral.

O Apelante sustenta (i) que não houve ato omissivo de sua parte, porquanto disponibilizou desde o início vaga para o Apelado em Unidade de Acolhimento; (ii) que, tendo o Apelado manifestado interesse em retornar à sua cidade de origem, também lhe foi disponibilizada passagem que acabou não utilizada; (iii) que o Apelado oscila quanto ao interesse em ser abrigado, retornar à cidade de origem e permanecer na rua, demonstrando instabilidade compatível com o transtorno mental que o acomete; (iv) que, após o acolhimento na Unidade de Acolhimento para Adultos e Famílias – UNAF Areal, o Apelado evadiu-se antes mesmo da elaboração do Plano Individual de Atendimento; (v) que, recusados os atendimentos pelo Apelado, não restou configurada a sua responsabilidade civil; e (vi) que, mantida a procedência dos pedidos, o valor dos danos morais deve ser reduzido.

Requer o provimento do recurso para que os pedidos iniciais sejam julgados improcedentes. Subsidiariamente, pugna pela redução do valor arbitrado a título de dano moral.

Ausente o preparo em face da isenção legal.

Recurso recebido no efeito meramente devolutivo (fl. 114).

Em contrarrazões, o Apelado requer, preliminarmente, o conhecimento e provimento do Agravo Retido para que seja produzida a prova testemunhal requerida para comprovar a negativa de atendimento pelo Apelante. No mérito, argumenta (i) que, ante a recusa de acolhimento, dormiu na rua por alguns dias e assim teve afetados direitos da sua personalidade; (ii) que a omissão do Apelante deve ser analisada sob a ótica da responsabilidade objetiva; e (iii) que o valor da condenação atende aos princípios da razoabilidade e proporcionalidade.

Pugna pelo desprovimento do recurso.

Parecer do Ministério Público pelo desprovimento do Agravo Retido e parcial da Apelação para excluir a condenação por danos morais (120/131).

É o relatório.

Fls. _____

Apelação Cível XXXXXAPC

V O T O S

O Senhor Desembargador JAMES EDUARDO OLIVEIRA - Relator

Presentes os pressupostos objetivos e subjetivos de admissibilidade, conheço do recurso de Apelação.

I. Agravo Retido

O Agravo Retido de fls. 70/72 tem como fundamento a existência de cerceamento de defesa.

A dilação probatória torna-se dispensável quando os documentos dos autos revelam-se suficientes para o deslinde da controvérsia, a teor do que dispõem os artigos 130 e 400, inciso I, do Código de Processo Civil de 1973. Consoante decidiu este Tribunal de Justiça:

CIVIL E PROCESSUAL CIVIL. IMPUGNAÇÃO À GRATUIDADE DE JUSTIÇA. PRELIMINAR DE

CERCEAMENTO DE DEFESA. INOCORRÊNCIA. JULGAMENTO ANTECIPADO DA LIDE. ALEGAÇÃO DE BENEFICIÁRIO COM CONDIÇÕES DE ARCAR COM AS DESPESAS PROCESSUAIS. AUSÊNCIA DE

COMPROVAÇÃO. DECISÃO MANTIDA. 1. Em se tratando de julgamento antecipado da lide, na qual se cuida de matéria unicamente de direito ou porque os autos já se encontram instruídos de forma satisfatória, aptos a convencer o julgador, certo é que se torna dispensável a produção de prova ante a proeminência de que os documentos constantes dos autos são suficientes para o deslinde da controvérsia. 2. O ônus de provar a inexistência dos requisitos autorizadores da gratuidade de justiça incumbe àquele que a fizer, não bastando para tanto meras alegações sem respaldo. (APC XXXXX, 5ª T., rel. Des. João Egmont, DJe 08/04/2011).

Fls. _____

Apelação Cível XXXXXAPC

A preponderância da matéria de direito e a suficiente elucidação da matéria fática por meio da prova documental emprestam legitimidade à resolução antecipada do mérito da demanda, valendo anotar que, à luz do princípio do livre convencimento motivado insculpido nos artigos 130, 131, 330 e 331, § 2º, do Código de Processo Civil de 1973, cabe ao juiz definir a atividade probatória de acordo com o que entende necessário à formação do seu convencimento. Nesse sentido é expressiva a jurisprudência do Supremo Tribunal Federal, consoante ilustram os seguintes julgados:

PROCESSUAL CIVIL. DILIGÊNCIA PROBATÓRIA DESNECESSÁRIA. ANÁLISE E VALORAÇÃO DA PROVA PELO ÓRGÃO JULGADOR. CERCEAMENTO DE DEFESA NÃO CONFIGURADO. O Supremo Tribunal tem decidido no sentido de que o indeferimento de diligência probatória, tida por desnecessária pelo juízo a quo, não viola os princípios do contraditório e da ampla defesa. Precedentes.(AGRG no AI XXXXX/RJ, 1ª T., rel. Min. Ricardo Lewandowski, DJe 82/2011, p. 04.05.2011).

DIREITO TRIBUTÁRIO. ISS. IMUNIDADE. DISTRIBUIÇÃO DE LIVROS, JORNAIS E PERIÓDICOS. INDEFERIMENTO DE PROVA. CERCEAMENTO DE DEFESA

INOCORRENTE.Inocorrência de cerceamento de defesa, por indeferimento de diligência probatória, quando consignada, pelo julgador, a presença de elementos suficientes à formação de seu convencimento.(AGRG no AI XXXXX/GO, rela. Mina. Rosa Weber, DJe 05.06.2012).

Fls. _____

Apelação Cível XXXXXAPC

Ausente, assim, o cerceamento de defesa que poderia conspurcar a validade da sentença.

II. Responsabilidade civil não caracterizada

De acordo com a inteligência do artigo 37, § 6º, da Constituição Federal, os entes estatais respondem objetivamente pelos danos provindos de ações e omissões dos seus agentes. Conforme vem decidindo reiteradamente o Supremo Tribunal Federal:

A jurisprudência da Corte firmou-se no sentido de que as pessoas jurídicas de direito público respondem objetivamente pelos danos que causarem a terceiros, com fundamento no art. 37, § 6º, da Constituição Federal, tanto por atos comissivos quanto por omissivos, desde que demonstrado o nexo causal entre o dano e a omissão do Poder Público. (AGRG no RE com AG XXXXX/RS, 1ª T., rel. Min. Dias Toffoli, DJe 25.04.2013).

Trata-se, é preciso ressalvar, de responsabilidade fundada no risco administrativo e não no risco integral, de molde a dispensar a existência de culpa, porém mantendo íntegros todos os outros pressupostos do dever de indenização: ação ou omissão, dano e relação de causalidade. Nesse sentido, deliberou o Supremo Tribunal Federal:

CONSTITUCIONAL. RESPONSABILIDADE DO ESTADO. ART. 37, § 6º, DA CONSTITUIÇÃO. PESSOAS JURÍDICAS DE DIREITO PRIVADO PRESTADORAS DE SERVIÇO PÚBLICO. CONCESSIONÁRIO OU PERMISSIONÁRIO DO SERVIÇO DE

Fls. _____

Apelação Cível XXXXXAPC

TRANSPORTE COLETIVO. RESPONSABILIDADE OBJETIVA EM RELAÇÃO A TERCEIROS NÃO-USUÁRIOS DO SERVIÇO. I - A responsabilidade civil das pessoas jurídicas de direito privado prestadoras de serviço público é objetiva relativamente a terceiros usuários e não-usuários do serviço, segundo decorre do art. 37, § 6º, da Constituição Federal. II - A inequívoca presença do nexo de causalidade entre o ato administrativo e o dano causado ao terceiro não-usuário do serviço público, é condição suficiente para estabelecer a responsabilidade objetiva da pessoa jurídica de direito privado. ( RE XXXXX/MS, Pleno, rel. Min. Ricardo Lewandowski, DJe 237/2009, p. 77).

Cumpre também não perder de vista que a omissão cuja ocorrência deflagra a responsabilidade objetiva do ente estatal é aquela que a doutrina denomina de omissão específica ou omissão concreta, isto é, caracterizada pelo descumprimento de um dever previamente definido, na medida em que a omissão genérica traz embutido em si mesma o vazio obrigacional. Como bem sintetizam Cristiano Chaves de Farias e Nelson Rosenvald:

Em reforço, vale sublinhar que a solução que melhor reverencia o Texto Constitucional é no sentido de reconhecer a responsabilidade objetiva do Estado para as condutas comissivas e também para as condutas omissivas. Não para qualquer tipo de omissão, mas, tão só, para as omissões específicas, quando houver "falta ou imperfeição no dever de agir imposto pela lei ou pelas circunstâncias do caso concreto, não havendo que se falar em responsabilidade civil nos casos de omissão genérica, em que inexiste individualizado dever de agir da Administração, igualmente apurável levando-se em consideração os ditames legais ou as circunstâncias do evento danoso", como explica LUIZ PAULO VIEIRA DE CARVALHO.

Fls. _____

Apelação Cível XXXXXAPC

(Curso de Direito Civil, Vol. 1, 10ª ed., JusPodivm, p. 434).

Pois bem, partindo dessa premissa interpretativa, é preciso verificar se o Apelante deixou de disponibilizar ao Apelado a medida assistencial de abrigo e por conta dessa omissão deve responder pelo dano moral reconhecido na r. sentença.

A assistência social é contemplada no artigo 203 da Constituição Federal nos seguintes termos:

Art. 203. A assistência social será prestada a quem dela necessitar, independentemente de contribuição à seguridade social, e tem por objetivos:

I - a proteção à família, à maternidade, à infância, à adolescência e à velhice;

II - o amparo às crianças e adolescentes carentes;

III - a promoção da integração ao mercado de trabalho;

IV - a habilitação e reabilitação das pessoas portadoras de deficiência e a promoção de sua integração à vida comunitária; V - a garantia de um salário mínimo de benefício mensal à pessoa portadora de deficiência e ao idoso que comprovem não possuir meios de prover à própria manutenção ou de tê-la provida por sua família, conforme dispuser a lei.

Seguindo esse vetor constitucional, prescrevem os artigos 14, incisos IV e V, e 23, § 2º, inciso II, da Lei 8.742/1993, que dispõe sobre a "organização da Assistência Social":

Fls. _____

Apelação Cível XXXXXAPC

Art. 14. Compete ao Distrito Federal:

(...)

IV - atender às ações assistenciais de caráter de emergência.

V. prestar os serviços assistenciais de que trata o art. 23 desta lei.

(...)

Art. 23. Entendem-se por serviços socioassistenciais as atividades continuadas que visem à melhoria de vida da população e cujas ações, voltadas para as necessidades básicas, observem os objetivos, princípios e diretrizes estabelecidos nesta Lei.

(...)

§ 2º Na organização dos serviços da assistência social serão criados programas de amparo, entre outros:

(...)

II - às pessoas que vivem em situação de rua.

Dessa síntese normativa depreende-se que é dever do Estado prestar serviço assistencial às pessoas que se encontrem em situação de risco e vulnerabilidade dentro das suas realidades orçamentárias.

O Apelado não tem lar definido e é portador de transtorno psiquiátrico grave (fls. 14 e 19), de maneira que a princípio faz jus ao apoio assistencial que incumbe ao Apelante. No entanto, as provas dos autos demonstram que não houve o desamparo narrado na petição inicial e que embasou a sentença condenatória.

No dia 08/05/2014 o Apelado, vindo da Bahia, procurou o Centro de Atenção Psicossocial (CAPS) e foi encaminhado para atendimento médico (fl. 17).

Especificamente quanto ao acolhimento em abrigo, o documento de fl. 13 revela que o Apelado declarou formalmente que não desejava "ser acolhido na rede socioassistencial do Distrito Federal e Entorno".

Contraditoriamente, no dia seguinte o Apelado procurou a Ouvidoria do MPDFT afirmando que não conseguiu ajuda dos diversos órgãos aos quais teria

Fls. _____

Apelação Cível XXXXXAPC

solicitado apoio (fl. 12).

Não houve, portanto, omissão do Apelante quanto ao amparo assistencial que lhe poderia ter sido exigido, valendo anotar que o documento oficial de fls. 57/59 corrobora o atendimento inicial do Apelante e a sua opção de não utilizar os abrigos disponíveis, talvez devido ao distúrbio mental de que é portador.

O Apelado chegou a ser acolhido depois de encaminhado pela Defensoria Pública, providência de resto desnecessária conforme consta do documento de fls. 57/59, mas optou por se esquivar de toda e qualquer abordagem assistencial.

Não há, à vista dessa síntese fática, omissão estatal apta a respaldar a condenação do Apelante ao pagamento de indenização por dano moral. Conforme sublinhado com no parecer do Ministério Público de fls. 120/131:

Na hipótese, não há dúvida de que o recorrido faz jus ao abrigamento. No entanto, com as mais respeitosas vênias, duvidosa a alegação de que houve negativa de prestação do serviço pelo Distrito Federal, a proporcionar composição por dano moral.

(...)

De tudo isso, assoma dúvida quanto ao relatos feitos pelo recorrido à Defensoria Pública e ao Ministério Público, porquanto não se lhe pode emprestar virtudes de sinceridade e veridicidade ao que dissera, à justa do quadro psicótico paranóide, acompanhado de alucinações e delírios.

(...)

Verifica-se, portanto, que são frágeis as alegações do autor de que permanecera 5 (cinco) dias dormindo na rua por negativa do DF em fornecer-lhe abrigamento adequado, devendo emprestar ao Memorando da Coordenação de Proteção Social Especial maior valor de prova, até porque não fora impugnado pela Defesa.

Fls. _____

Apelação Cível XXXXXAPC

Não se divisa, assim, ação ou omissão contrária ao Direito apta a respaldar a condenação do Apelante, com renovadas venias.

Isto posto, conheço e dou provimento ao recurso para julgar improcedentes os pedidos iniciais.

Ante a sucumbência, arcará o Apelado com o pagamento das custas processuais e dos honorários advocatícios, que fixo em R$ 1.500,00, com a ressalva do artigo 12 da Lei 1.050/1950, dada a sua condição de beneficiário da justiça gratuita.

O Senhor Desembargador LUÍS GUSTAVO B. DE OLIVEIRA - Vogal

Com o relator

O Senhor Desembargador FERNANDO HABIBE - Vogal

Com o relator

D E C I S Ã O

DAR PROVIMENTO AO RECURSO . UNÂNIME.

Disponível em: https://www.jusbrasil.com.br/jurisprudencia/tj-df/520669718/inteiro-teor-520669748