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1 de Junho de 2024
  • 2º Grau
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Tribunal de Justiça do Paraná
há 7 anos

Detalhes

Processo

Órgão Julgador

4ª Câmara Cível

Publicação

Julgamento

Relator

Maria Aparecida Blanco de Lima
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Inteiro Teor

Digitally signed by ASTRID MARANHAO DE Certificado digitalmente por: CARVALHO RUTHES:7621 Date: 2017.08.30 13:58:50 BRT Reason: Validade Legal MARIA APARECIDA BLANCO DE LIMA Location: Paraná - Brasil
AGRAVO INTERNO CÍVEL Nº 1.650.147-6/01, DO FORO REGIONAL DE FAZENDA RIO GRANDE DA COMARCA DA REGIÃO METROPOLITANA DE CURITIBA - VARA CÍVEL E DA FAZENDA PÚBLICA AGRAVANTE: SINDICATO DA INDÚSTRIA DA CONSTRUÇÃO CIVIL NO ESTADO DO PARANÁ AGRAVADO: MUNICÍPIO DE FAZENDA RIO GRANDE RELATORA: DESEMBARGADORA MARIA APARECIDA BLANCO DE LIMA AGRAVO INTERNO NO AGRAVO DE INSTRUMENTO. MANDADO DE SEGURANÇA. ALVARÁ DE CONCLUSÃO DE OBRA DE PARCELAMENTOS DE SOLO URBANO. EXIGÊNCIA DE DOAÇÃO FUNDADA NO ARTIGO 17-A DA LEI COMPLEMENTAR 08/2006 DO MUNICÍPIO DE FAZENDA RIO GRANDE. EXAÇÃO QUE NÃO TEM NATUREZA JURÍDICA DE TRIBUTO, O QUE JUSTIFICOU O DEFERIMENTO DA LIMINAR NO "MANDAMUS", MAS SIM DE OUTORGA ONEROSA DO DIREITO DE CONSTRUIR E DE ALTERAÇÃO DE USO, CONFORME PREVISÃO NO ARTIGO , V, N, DA LEI 10.257/2001 E NO PLANO DIRETOR MUNICIPAL. PROBABILIDADE DE SUCESSO DA PRETENSÃO DEDUZIDA NO AGRAVO DE INSTRUMENTO ALIADA AO RECEIO DE DANO IRREPARÁVEL OU DE DIFÍCIL REPARAÇÃO. CONCESSÃO DE TUTELA DE URGÊNCIA NO AGRAVO DE INSTRUMENTO. MANUTENÇÃO. AGRAVO INTERNO DESPROVIDO.
Vistos, relatados e discutidos estes autos de Agravo Interno Cível nº 1.650.147-6/01, do Foro Regional de Fazenda Rio Grande da Comarca da Região Metropolitana de Curitiba, Vara Cível e da Fazenda Pública,


em que é Agravante Sindicato da Indústria da Construção Civil no Estado do Paraná e Agravado Município de Fazenda Rio Grande.
Trata-se de Agravo Interno interposto pelo Sindicato da Indústria da Construção Civil no Estado do Paraná em face da decisão de fls.
577/588, que deferiu o pedido de tutela de urgência para suspender os efeitos da decisão objeto do agravo de instrumento interposto por Município de Fazenda Rio Grande, a qual havia determinado a suspensão da exigibilidade da doação fundada nos artigos 17 e 17-A da Lei Complementar Municipal 08/2006, alterada pela Lei Complementar 85/2013, como condição para a concessão de alvará de conclusão de obra de parcelamentos de solo urbano.
Em suas razões, alega o Agravante que entendeu-se que a exigência denominada como "doação" na lei municipal tratava-se de outorga onerosa, situação que, entretanto, esbarra em preceito basilar do Estatuto da Cidade, precisamente de que tais instrumentos sejam instituídos por Plano Diretor do Município, o que não ocorreu. Entende que o Plano Diretor não pode ser preterido por outra lei municipal, sob pena de violação ao princípio da reserva de plano.
Aduz que atribuir a natureza de outorga onerosa à exigência imposta pela Lei Complementar 08/2006 implicaria em aceitar violação ao Estatuto da Cidade. Enfatiza que a outorga onerosa não tem previsão no Plano Diretor do Município.
Menciona que a exigência de doação imposta pelo Agravado não tem relação com o coeficiente de aproveitamento do terreno, conforme deveria ocorrer.


Argumenta que a outorga onerosa somente é devida se o proprietário não se conformar em construir dentro do coeficiente básico, o que não ocorre no caso, em que não foi estabelecido esse coeficiente.
Refere que o Plano Diretor também não traz menção ao instrumento de outorga onerosa de alteração de uso do solo.
Tece considerações sobre a distinção entre condomínio e loteamento, enfatizando a ilegalidade da exação cobrada, a qual tem natureza de tributo.
Alega que a própria Lei Municipal 08/2006 disponibiliza mecanismos de contrapartida a serem exigidos do empreendedor, que denomina de "medidas mitigadoras".
Defende que a exigência de pagamento prévio para atos regulares da atividade empresarial ofende o artigo 170 da Constituição Federal.
Considera necessária a manutenção dos efeitos da liminar suspensa pela decisão agravada.
Por fim, pede o provimento do recurso, com a reforma da decisão recorrida.
Não foram apresentadas contrarrazões.
Com vista dos autos, a douta Procuradoria de Justiça manifestou-se no sentido do provimento do agravo de instrumento.


É o relatório.
Voto.
Ab initio, não há que se falar em irregularidade na atuação processual do Sindicato Agravante na impetração do Mandado de Segurança Coletivo Preventivo de origem, eis que, nos moldes da Súmula nº 629 do Supremo Tribunal Federal, é dispensado o recolhimento de autorização expressa dos membros sindicalizados nesta hipótese:

Súmula nº 629 do Supremo Tribunal Federal A impetração de mandado de segurança coletivo por entidade de classe em favor dos associados independe da autorização destes.
Assim, observados os pressupostos de admissibilidade, conheço do recurso.
Cuida-se de Agravo Interno interposto por Sindicato da Indústria da Construção Civil no Estado do Paraná em face da decisão de fls.
577/588, que deferiu o pedido de tutela de urgência para suspender os efeitos da decisão objeto do agravo de instrumento interposto por Município de Fazenda Rio Grande, revertendo assim a suspensão da exigibilidade da doação fundada nos artigos 17 e 17-A da Lei Complementar Municipal 08/2006, alterada pela Lei Complementar 85/2013, como condição para a concessão de alvará de conclusão de obra de parcelamentos de solo urbano.
Discute-se no Mandado de Segurança de origem a legalidade de exigência da doação prevista no artigo 17-A da Lei Complementar 08/2006, alterado pela Lei Municipal 85/2013, do Município de Fazenda Rio Grande:

"Art. 17-A - Deverá ser doada ao Município, além das demais exigências constantes nesta Lei Complementar, com destinação direta ao Fundo Municipal de Políticas Públicas, o percentual equivalente ao número de unidades habitacionais, inclusive de parcelamentos verticais, para cada uma das unidades do empreendimento criadas através do parcelamento em condomínio, na seguinte proporção:

(...)

§ 1º O percentual estabelecido no" caput "deste artigo incidirá sobre o valor de mercado de cada uma das unidades habitacionais, após a implantação de toda a infraestrutura do condomínio, com exceção da realização da edificação das unidades habitacionais nos casos dos condomínios horizontais, não excepcionadas as edificações dos condomínios verticais.

§ 2º Não será fornecido alvará de conclusão de obra enquanto não houver no processo administrativo comprovante de recolhimento dos valores ao Fundo Municipal de Políticas Públicas, devendo o empreendedor comunicar à Secretaria de Urbanismo para que realize a avaliação no momento da conclusão da obra de infraestrutura do parcelamento, sob pena de ser considerado o valor final do empreendimento."
O Juízo "a quo" concedeu a liminar pretendida pela ora Agravante, suspendendo a exigência da exação referida, sob o fundamento de que a "doação" seria espécie de tributo e que o Município de Fazenda Rio Grande não disporia de competência constitucional para instituí-lo, conforme precedentes do Órgão Especial desta Corte.
Contra essa decisao o Município de Fazenda Rio Grande interpôs Agravo de Instrumento, ao qual foi concedido efeito suspensivo pela decisão ora agravada, que considerou provável o provimento daquele recurso, além de iminente o receio de dano irreparável ou de difícil reparação.
A plausibilidade da pretensão deduzida no Agravo de


Instrumento se revela pela verificação da natureza jurídica da "doação" prevista na norma municipal em destaque.
Conforme se concluiu na decisão ora agravada, a doação não é um tributo, conforme considerado pelo Juízo "a quo". A exação teria natureza de outorga onerosa do direito de construir e de alteração de uso, conforme previsão no artigo , V, n, da Lei 10.257/2001:

"Art. 4o Para os fins desta Lei, serão utilizados, entre outros instrumentos: (...) V ­ institutos jurídicos e políticos: (...) n) outorga onerosa do direito de construir e de alteração de uso;"
Entende a Agravante que "na exigência imposta pelo Município de Fazenda Rio Grande, não há nada, em absoluto, que se relacione com o coeficiente de aproveitamento do terreno", o que desfiguraria a referida outorga onerosa.
Bem ao contrário, conforme mencionado na decisão ora agravada "A exigibilidade da doação em pecúnia ao Fundo Municipal tem relação direta tanto com a majoração do coeficiente de aproveitamento do solo quanto com a alteração do uso do solo, consoante bem exemplificado nas razões de recurso, tomando-se por base os pedidos de alvará indicados no `mandamus'."
Efetivamente, da exegese da Lei Complementar 08/2006, extrai-se que a doação questionada é devida em função da pretensão

de construção de condomínio residencial que resulte na elevação da taxa de ocupação, como é o caso. Consoante o seu art. 31, inclusive, os recursos do fundo são revertidos para o uso de serviços públicos e de infraestrutura, beneficiando diretamente os moradores do condomínio residencial estabelecido.
Impõe-se esclarecer, todavia, que não se pode confundir a exigibilidade da outorga onerosa com sua base de cálculo. O art. 17-A, questionado, estabelece tão somente esta última. A definição de quais são os coeficientes de aproveitamento em cada zona da cidade e em quais delas de fato se permite a construção acima de referido parâmetro, encontram-se em lei diversa, não mencionada pelo Agravante, qual seja a Lei Complementar Municipal nº 06/2006, que dispõe acerca do Zoneamento de Uso e Ocupação do Solo Urbano do Município de Fazenda Rio Grande.
Repita-se, assim, que a exigibilidade da doação em pecúnia ao Fundo Municipal tem relação direta tanto com a majoração do coeficiente de aproveitamento do solo quanto com a alteração do uso do solo, consoante bem exemplificado nas razões de recurso, tomando-se por base os pedidos de alvará indicados no "mandamus", e a partir de uma análise completa de toda a legislação incidente sobre a hipótese, não havendo que se falar em previsão genérica isolada da ferramenta no Plano Diretor municipal.
A doação atende, então, os critérios previstos nos artigos 28 ou 29 da Lei 10.257/2001:
Art. 28. O plano diretor poderá fixar áreas nas quais o direito de construir poderá ser exercido acima do coeficiente de aproveitamento básico adotado, mediante contrapartida a ser prestada pelo beneficiário.

§ 1o Para os efeitos desta Lei, coeficiente de aproveitamento é a relação entre a área edificável e a área do terreno.

§ 2o O plano diretor poderá fixar coeficiente de aproveitamento básico único para toda a zona urbana ou diferenciado para áreas específicas dentro da zona urbana.

§ 3o O plano diretor definirá os limites máximos a serem atingidos pelos coeficientes de aproveitamento, considerando a proporcionalidade entre a infra-estrutura existente e o aumento de densidade esperado em cada área.

Art. 29. O plano diretor poderá fixar áreas nas quais poderá ser permitida alteração de uso do solo, mediante contrapartida a ser prestada pelo beneficiário.
A decisão ora agravada não olvidou sobre a compatibilidade da referida outorga onerosa no Plano Diretor do Município, nos termos do artigo da Lei Complementar 4/2006:

"Art. 9º Para cumprir a sua função social, a propriedade deve atender, simultaneamente, no mínimo, às seguintes exigências: I - intensidade de uso adequada à disponibilidade da infra- estrutura, de equipamentos e de serviços; II - uso compatível com as condições de preservação da qualidade do meio ambiente, da paisagem e do patrimônio local; III - aproveitamento e utilização compatíveis com a segurança e saúde de seus usuários e da vizinhança; IV - utilização adequada do terreno, segundo os parâmetros mínimos definidos na lei de Zoneamento do Uso e Ocupação do Solo e legislações correlatas.
§ 1º - O direito de propriedade sobre o solo não acarreta, obrigatoriamente, o direito de construir, cujo exercício deverá ser autorizado pelo poder executivo, segundo os critérios estabelecidos nesta lei e na lei de Zoneamento de Uso e Ocupação do Solo.
§ 2º - Os direitos decorrentes da propriedade individual estarão subordinados aos interesses da coletividade.
§ 3º - O Município utilizará os instrumentos previstos nesta lei e demais legislações pertinentes para assegurar o cumprimento da função social da cidade e da propriedade."


Nos artigos 64 a 69, o Plano Diretor do Município prevê, expressamente a instituição da "outorga onerosa do direito de construir", sendo inadmissível a alegação de que existe violação ao chamado "princípio da reserva de plano".
De acordo com o artigo 65 do Plano Diretor: "O poder executivo municipal poderá exercer a faculdade de outorgar onerosamente o exercício do direito de construir, mediante contrapartida financeira a ser prestada pelo beneficiário, conforme disposições dos artigos 28, 29, 30 e 31 da lei federal nº 10.257/2001 - Estatuto da Cidade, e de acordo com os critérios e procedimentos definidos em legislação especifica."
Existe, ainda, previsão no artigo 67 no sentido de que "A lei municipal específica estabelecerá os imóveis que poderão receber e as condições a serem observadas para a outorga onerosa do direito de construir, determinando no mínimo: I - a fórmula de cálculo da cobrança; II - os casos passíveis de isenção do pagamento da outorga; III - a contrapartida do beneficiário; IV - os procedimentos administrativos necessários."
Referido instrumento foi consolidado pelo artigo 17-A da Lei Complementar 08/2006, alterado pela Lei Municipal 85/2013, do Município de Fazenda Rio Grande, como mencionado.
Válida é a menção a respeito do tema em debate da decisão proferida pelo Supremo Tribunal Federal no âmbito do RE nº 607.940, em sede de repercussão geral:

CONSTITUCIONAL. ORDEM URBANÍSTICA.
COMPETÊNCIAS LEGISLATIVAS. PODER NORMATIVO MUNICIPAL. ART. 30, VIII, E ART. 182, CAPUT, DA CONSTITUIÇÃO FEDERAL. PLANO DIRETOR.


DIRETRIZES BÁSICAS DE ORDENAMENTO TERRITORIAL. COMPREENSÃO. 1. A Constituição Federal atribuiu aos Municípios com mais de vinte mil habitantes a obrigação de aprovar Plano Diretor, como "instrumento básico da política de desenvolvimento e de expansão urbana" (art. 182, § 1º). Além disso, atribuiu a todos os Municípios competência para editar normas destinadas a "promover, no que couber, adequado ordenamento territorial, mediante planejamento e controle do uso do solo, do parcelamento e da ocupação do solo urbano" (art. 30, VIII) e a fixar diretrizes gerais com o objetivo de "ordenar o pleno desenvolvimento das funções sociais da cidade e garantir o bem-estar dos habitantes" (art. 182, caput).
Portanto, nem toda a competência normativa municipal (ou distrital) sobre ocupação dos espaços urbanos se esgota na aprovação de Plano Diretor. 2. É legítima, sob o aspecto formal e material, a Lei Complementar Distrital 710/2005, que dispôs sobre uma forma diferenciada de ocupação e parcelamento do solo urbano em loteamentos fechados, tratando da disciplina interna desses espaços e dos requisitos urbanísticos mínimos a serem neles observados. A edição de leis dessa espécie, que visa, entre outras finalidades, inibir a consolidação de situações irregulares de ocupação do solo, está inserida na competência normativa conferida pela Constituição Federal aos Municípios e ao Distrito Federal, e nada impede que a matéria seja disciplinada em ato normativo separado do que disciplina o Plano Diretor. 3.
Aprovada, por deliberação majoritária do Plenário, tese com repercussão geral no sentido de que "Os municípios com mais de vinte mil habitantes e o Distrito Federal podem legislar sobre programas e projetos específicos de ordenamento do espaço urbano por meio de leis que sejam compatíveis com as diretrizes fixadas no plano diretor". 4. Recurso extraordinário a que se nega provimento.
( RE XXXXX, Relator (a): Min. TEORI ZAVASCKI, Tribunal Pleno, julgado em 29/10/2015, ACÓRDÃO ELETRÔNICO REPERCUSSÃO GERAL - MÉRITO DJe-036 DIVULG 25- 02-2016 PUBLIC XXXXX-02-2016) (grifos nossos)
O Pretório Excelso, oportuno também acrescentar, em diversas ocasiões já se manifestou acerca da possibilidade cobrança por parte dos Municípios da outorga onerosa do direito de construir ou de alteração do solo, sendo este instrumento de política urbana, e que não se confunde com


tributo. Isto porque, em verdade, não possui a natureza de compulsoriedade que estes têm. São cobrados pela Municipalidade nas hipóteses em que o responsável pela construção opte por edificar além do que possibilita o coeficiente mínimo de aproveitamento da zona ­ respeitando-se sempre, porém, o máximo para a área ­ e em zonas em que tal medida se revela possível com base na legislação aplicável, hipótese em que exigirá o ente federativo a contrapartida pecuniária como forma de mitigar os impactos urbanísticos e sociais acarretados pela edificação nos parâmetros desejados pelo particular.
Nesse sentido, cito os seguintes precedentes:

RECURSO EXTRAORDINÁRIO. LEI N. 3.338/89 DO MUNICÍPIO DE FLORIANÓPOLIS/SC. SOLO CRIADO.
NÃO CONFIGURAÇÃO COMO TRIBUTO. OUTORGA ONEROSA DO DIREITO DE CRIAR SOLO. DISTINÇÃO ENTRE ÔNUS, DEVER E OBRIGAÇÃO. FUNÇÃO SOCIAL DA PROPRIEDADE. ARTIGOS 182 E 170, III DA CONSTITUIÇÃO DO BRASIL. 1. SOLO CRIADO Solo criado é o solo artificialmente criado pelo homem [sobre ou sob o solo natural], resultado da construção praticada em volume superior ao permitido nos limites de um coeficiente único de aproveitamento. 2.
OUTORGA ONEROSA DO DIREITO DE CRIAR SOLO.
PRESTAÇÃO DE DAR CUJA SATISFAÇÃO AFASTA OBSTÁCULO AO EXERCÍCIO, POR QUEM A PRESTA, DE DETERMINADA FACULDADE. ATO NECESSÁRIO. ÔNUS.
Não há, na hipótese, obrigação. Não se trata de tributo.
Não se trata de imposto. Faculdade atribuível ao proprietário de imóvel, mercê da qual se lhe permite o exercício do direito de construir acima do coeficiente único de aproveitamento adotado em determinada área, desde que satisfeita prestação de dar que consubstancia ônus. Onde não há obrigação não pode haver tributo. Distinção entre ônus, dever e obrigação e entre ato devido e ato necessário. 3. ÔNUS DO PROPRIETÁRIO DE IMÓVEL URBANO. Instrumento próprio à política de desenvolvimento urbano, cuja execução incumbe ao Poder Público municipal, nos termos do disposto no artigo 182 da Constituição do Brasil.
Instrumento voltado à correção de distorções que o


crescimento urbano desordenado acarreta, à promoção do pleno desenvolvimento das funções da cidade e a dar concreção ao princípio da função social da propriedade [art. 170, III da CB]. 4. Recurso extraordinário conhecido, mas não provido.
( RE XXXXX, Relator (a): Min. EROS GRAU, Tribunal Pleno, julgado em 06/03/2008, DJe-078 DIVULG XXXXX-04-2008 PUBLIC XXXXX-05-2008 EMENT VOL-02317-04 PP-00799 RTJ VOL-00204-03 PP-01314 LEXSTF v. 30, n. 355, 2008, p.
263-287) (grifos nossos)

Tributário. Parcela do solo criado: Lei municipal nº 3.338/89.
Natureza jurídica. 1. Não é tributo a chamada parcela do solo criado que representa remuneração ao Município pela utilização de área além do limite da área de edificação. Trata-se de forma de compensação financeira pelo ônus causado em decorrência da sobrecarga da aglomeração urbana. 2. Recurso extraordinário a que se nega provimento.
( RE XXXXX, Relator (a): Min. MENEZES DIREITO, Primeira Turma, julgado em 21/10/2008, DJe-089 DIVULG XXXXX-05- 2009 PUBLIC XXXXX-05-2009 EMENT VOL-02360-04 PP- 00643) (grifos nossos)

DECISÃO AGRAVO EM RECURSO EXTRAORDINÁRIO.
ADMINISTRATIVO. UTILIZAÇÃO DE ÁREA ALÉM DOS LIMITES DE EDIFICAÇÃO. OUTORGA ONEROSA.
CONSTITUCIONALIDADE. PRECEDENTES. AGRAVO AO QUAL SE NEGA SEGUIMENTO.
( ARE XXXXX, Relator (a): Min. CÁRMEN LÚCIA, julgado em 23/02/2012, publicado em DJe-043 DIVULG 29/02/2012 PUBLIC 01/03/2012 ­ Decisão Monocrática) (grifos nossos)
Estando caracterizada a doação nesses termos, foi possível acolher, em sede de tutela de urgência, a tese da Agravada que descaracterizou a doação referida como tributo, sendo certo que, nos termos do artigo 30, VIII, da Constituição Federal, compete aos Municípios "promover, no que couber, adequado ordenamento territorial mediante planejamento e controle de uso, do parcelamento e da ocupação do solo urbano".
Portanto, não se trata de valores que se destinam a ressarcir o Município de eventuais gastos decorrentes do trâmite administrativo


para fins de obtenção de alvará para construção, ou que, de maneira geral, vise remunerar a prestação de algum serviço público específico individualizado.
Noutros termos, não se trata de uma taxa (eis que esta é a definição da referida espécie tributária: a contrapartida paga por um particular em decorrência da prestação de um serviço público divisível pelo Poder Público, de seu interesse, como se verifica, por exemplo, na obtenção de um passaporte ou de um alvará, como já se fez referência). Cuida-se de importante e necessária ferramenta de política de desenvolvimento urbano, de competência municipal, nos moldes do que preceitua a Lei Maior, consoante os precedentes mencionados.
E de forma alguma, frise-se, é possível classificar a exigência em questão como ofensa ao princípio da livre iniciativa, até porque o empreendedor que não desejar acatá-la poderá explorar a potencialidade de uso do imóvel segundo os parâmetros estabelecidos para a zona. A exação questionada não se confunde com exigência de autorização para o funcionamento da atividade empresarial, tratando-se, reitere-se, de instrumento jurídico de execução da política urbana, conforme previsto nos artigos 182 e 183 da Constituição Federal.
Pontue-se, por fim, que a previsão existente no art. 23- C, § 3º, inciso I, da Lei Complementar Municipal nº 08/2006, consubstancia-se em mais uma ferramenta à disposição do ente federativo para que se desincumba do seu dever constitucional de desenvolver políticas urbanística de ordenamento nas cidades, além de que não consta dos autos prova de situação em que a alguma das empresas representadas pelo Agravante tenha-se imposta a exigência de recolhimento tanto da outorga onerosa, quanto de prestações



materiais como as elencadas na norma 1, não constando do caderno processual cópia do termo referido pelo § 4º do artigo em comento2.
Dito isso, a probabilidade de sucesso da pretensão recursal é suficiente para o deferimento do pedido de tutela de urgência, quando aliado ao já evidenciado receio de dano irreparável e de difícil reparação também identificado na decisão ora agravada, nos seguintes termos:

"A suspensão da exigibilidade da doação prevista no artigo 17-A da Lei Complementar 08/2006, alterado pela Lei Municipal 85/2013 poderá implicar em sérios prejuízos ao ente público, que precisará suportar sozinho despesas com o aparelhamento de serviços públicos essenciais decorrentes de empreendimento imobiliário de interesse exclusivamente privado.
No caso em análise está a se tratar de Mandado de Segurança coletivo, e não individual. Ou seja, o deferimento da liminar pretendida no mandamus não terá como reflexo a desnecessidade de recolhimento, ainda que eventualmente apenas de forma provisória/temporária, haja vista a natureza não definitiva do provimento antecipatório, de projetos de autoria de uma empresa tão somente, mas de centenas de empresas representadas pela entidade de classe, consoante lista por ela própria

1 Art. 23-C Os Loteamentos, Condomínios Residenciais do Grupo C e Grupo D, bem como outros estabelecidos na legislação municipal, além daqueles informados pela Unidade de Planejamento territorial na ocasião da Consulta Prévia, deverão apresentar Estudo de Impacto de Vizinhança de acordo com o Estatuto das Cidades e demais exigências da legislação municipal.
(...) § 3º Os ônus decorrentes das exigências necessárias para minorar ou mesmo eliminar os impactos negativos do projeto, deverão ser arcados pelo empreendedor através de contrapartida que poderá ser executada através de: I - implantação, produção, aquisição, construção, conclusão, melhoria, reforma e ampliação de equipamentos comunitários, tais como postos de saúde, escolas, salas de aula, canchas esportivas, praças, dentre outros; (...) 2 § 4º A forma de execução da contrapartida, em conformidade com o parágrafo anterior, será definida

pela Unidade de Planejamento territorial, pela equipe técnica da Secretaria Municipal de Urbanismo, e do Conselho Multissetorial, quando for o caso, e outras Secretarias afins, e deverá ter a anuência do Conselho Municipal de Políticas Territoriais e Ambientais - CMPTA e constará num termo de compromisso a ser assinado pelas partes.


apresentada e presente às fls. 193/229-TJ).
É de se considerar, portanto, o inequívoco impacto urbanístico e financeiro que a tutela de urgência postulada pelo Impetrante, autora do Agravo Interno ora sob análise, poderá ter com relação aos cofres públicos e a organização espacial da cidade durante todo o período necessário de tramitação da demanda, até o seu encerramento, estando perfeitamente demonstrado, por conseguinte, o perigo de dano irreparável ou de difícil reparação, especialmente no que tange a ocupação do solo urbano.
Estando preenchidos os requisitos necessários para a concessão do pedido emergencial no Agravo de Instrumento, nos termos dos artigos 995, Parágrafo Único e 1.019, Inciso I, do Código de Processo Civil, era de rigor o deferimento da tutela de urgência questionada neste agravo interno, sem embargo de que toda a questão de mérito seja amplamente apreciada no julgamento final de mérito do agravo de instrumento.
Diante de todo o exposto, o voto é no sentido de negar provimento ao agravo interno.



DECISÃO
Acordam os Desembargadores da 4ª Câmara Cível do Tribunal de Justiça do Estado do Paraná, por maioria de votos, em rejeitar a preliminar de incompetência da 4ª Câmara Cível e negar provimento ao recurso de Agravo Interno interposto pelo Sindicato da Indústria da Construção Civil no Estado do Paraná, nos moldes do voto da Relatora. Vencida a Desembargadora Astrid Maranhão de Carvalho Ruthes, que declara voto vencido em separado.
Participaram da sessão e as Excelentíssimas Senhoras Desembargadoras REGINA AFONSO PORTES, Presidente, sem voto, ASTRID MARANHÃO DE CARVALHO RUTHES e a Juíza Substituta em Segundo Grau CRISTIANE SANTOS LEITE.
Curitiba, 22 de agosto de 2017.


MARIA APARECIDA BLANCO DE LIMA Desembargadora Relatora
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