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25 de Maio de 2024
  • 2º Grau
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Detalhes

Processo

Órgão Julgador

Décima Nona Câmara Cível

Publicação

Julgamento

Relator

Voltaire de Lima Moraes

Documentos anexos

Inteiro TeorTJ-RS_AC_70075503268_e079f.doc
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Inteiro Teor

VLM

Nº 70075503268 (Nº CNJ: XXXXX-10.2017.8.21.7000)

2017/Cível

DIREITO PRIVADO NÃO ESPECIFICADO. AÇÃO DE INDENIZAÇÃO A TÍTULO DE DANOS MATERIAIS E MORAIS. ENSINO À DISTÂNCIA. ADEQUAÇÃO CARGA HORÁRIA.

Tendo o processo seletivo para o curso de administração à distância ocorrido em 20 de maio de 2007, e sobrevindo a Resolução nº 2 de 18 de junho de 2007 do Ministério da Educação, que regulamentaria a sua carga horária, evidentemente não tinha a recorrida como saber que o período de realização do referido curso seria estendido, devendo ela, em razão disso, adaptar a grade curricular, sob pena, inclusive, desse curso não ser reconhecido. Logo, não há falar em indenização a título de danos materiais.

O fato de a ré levar ao conhecimento do autor, somente após mais de 2 anos da vigência da Resolução nº 2 de 18 de junho 2007 do Ministério da Educação, que a carga horária do curso à distância de administração seria ampliada, ultrapassa os meros dissabores da vida cotidiana, pois não observou o dever de informação (art. , III, do CDC) que deveria ser o mais breve possível, restando, em razão disso, frustrada a expectativa de colação de grau em menor prazo, assim como retardou o ingresso do aluno no mercado de trabalho, sendo que tal fato gera a indenização a título de danos morais pleiteada pelo autor, pois, com isso, resta configurada ofensa a direitos da personalidade.

Ônus sucumbenciais redimensionados.

Apelação provida parcialmente.

Apelação Cível

Décima Nona Câmara Cível

Nº 70075503268 (Nº CNJ: XXXXX-10.2017.8.21.7000)

Comarca de Canoas

ALEXANDRE MENEZES DA SILVA

APELANTE

COMUNIDADE EVANGéLICA LUTERANA SÃO PAULO - CELSP

APELADa

ACÓRDÃO

Vistos, relatados e discutidos os autos.

Acordam os Desembargadores integrantes da Décima Nona Câmara Cível do Tribunal de Justiça do Estado, à unanimidade, em dar parcial provimento à apelação.

Custas na forma da lei.

Participaram do julgamento, além do signatário (Presidente), os eminentes Senhores Des. Marco Antonio Angelo e Des. Eduardo João Lima Costa.

Porto Alegre, 07 de dezembro de 2017.

DES. VOLTAIRE DE LIMA MORAES,

Relator.

RELATÓRIO

Des. Voltaire de Lima Moraes (RELATOR)

Trata-se de apelação interposta por ALEXANDRE MENEZES DA SILVA, na ação de indenização a título de danos materiais e morais que movem contra a COMUNIDADE EVANGÉLICA LUTERANA SÃO PAULO – CELSP, inconformado com a sentença que julgou o pedido nos seguintes termos:

“1. Julgo EXTINTO o processo, sem resolução de mérito, quanto a VICTOR HUGO FERREIRA SILVEIRA, forte no art. 485, VIII, do CPC.

CONDENO a parte desistente ao pagamento de 50% das custas e honorários ao patrono da requerida, que fixo em R$1.500,00, atendidos os critérios do art. 85, parágrafos 2º e , do CPC, especificamente o tempo de tramitação e a natureza da controvérsia. Suspendo a exigibilidade das verbas por causa da AJG deferida na decisão inaugural.

2. Julgo IMPROCEDENTES os pedidos ventilados por ALEXANDRE DE MENEZES DA SILVA em face de UNIVERSIDADE LUTERANA DO BRASIL - ULBRA.

CONDENO a parte autora ao pagamento de 50% das custas e honorários ao patrono da ré, que fixo em R$1.500,00, atendidos os critérios do art. 85, parágrafos 2º e , do CPC, especificamente o tempo de tramitação e a natureza da controvérsia. Suspendo a exigibilidade das verbas por causa da AJG deferida na decisão inaugural.”

Em razões recursais, sustenta o apelante, em síntese, que apesar de a apelada ter conhecimento da mudança do tempo de integralização do curso de administração, na modalidade de ensino à distância, e que em função disso seriam necessárias mudanças no calendário das turmas iniciadas em XXXXX-3, a coordenação do referido curso apenas ocupou-se de tal situação no ano de 2010.

Alega que a atitude da recorrida somente teve a finalidade de obter lucro.

Aduz que “pouco diligente também foi o comportamento da apelada em relação ao local de realização da solenidade de colação de grau, bem como do culto previsto para a data. Veja-se que, mesmo com as referidas cerimônias agendadas com a devida antecedência e, ressalta-se, confirmadas pela coordenação da ULBRA, dias antes da formatura, já com os convites impressos e distribuídos aos convidados, a presidente da comissão de formatura, Cleusa Ventura, foi informada pela produtora ST PRODUÇÕES que o horário e locais previstos haveria outras formaturas.” (fls. 108/109).

Ressalta que faz jus ao pagamento das indenizações pleiteadas.

Prequestiona a matéria, requerendo, a final, o provimento do recurso.

Sem o preparo, em razão de o apelante litigar ao abrigo da gratuidade da justiça (fl. 99v.).

Em contrarrazões, a apelada pede a confirmação da sentença, subindo os autos a este Tribunal.

Distribuídos, vieram-me conclusos para julgamento.

É o relatório.

VOTOS

Des. Voltaire de Lima Moraes (RELATOR)

Preenchidos os pressupostos de admissibilidade recursal, recebo a apelação e passo ao seu exame.

Narra o autor que em 2007 realizou inscrição para participar do processo seletivo, conforme o Edital nº 181 de 30 de março de 2007.

Contudo, quando os alunos da turma 185 completaram 2 anos e 6 meses do curso de administração, somente no ano de 2009 foram comunicados, através de um e-mail da coordenação, que de acordo com o Decreto nº 5.622/2005 o referido curso não poderia apresentar período inferior a 4 anos e que a carga horária mínima deveria ser entre 3.000 e 3.200 horas/aulas, informação totalmente contrária ao edital.

Alega, ainda, que teve prejuízos em razão das modificações da carga horária e realização de formatura.

De outro lado, dispõe o art. , § 1º, do Decreto nº 5.622/2005 que (fls. 34/35):

“3º A criação, organização, oferta e desenvolvimento do cursos e programas a distância deverão observar ao estabelecido na legislação e em regulamentações em vigor, para os respectivos níveis e modalidades da educação nacional.

§ 1º Os cursos e programas a distância deverão ser projetados com a mesma duração definida para os respectivos cursos da modalidade presencial.”

Por sua vez, a Resolução nº 2 de 18 de junho de 2007, emitida pelo Ministério da Educação em seu art. 2º, III, item c, refere que que:

“III- os limites de integralização dos cursos devem ser fixados com base na carga horária total, computada nos respectivos Projetos Pedagógicos do curso, observados os limites estabelecidos nos exercícios e cenários apresentados no Parecer CNE/CES nº 8/2007, da seguinte forma:

c) Grupo de Carga Horária Mínima entre 3.000h e 3.200h: Limite mínimo para a integralização de 4 (quatro) anos;”

Logo, tendo o processo seletivo ocorrido em 20 de maio de 2007 e a Resolução nº 2 de 18 de junho de 2007, que regulamentava a carga horária do curso, evidentemente, não poderia a recorrida saber que o período de realização do curso de administração seria estendido.

Todavia, ela não foi diligente ao comunicar os alunos, o mais breve possível, após o conhecimento da referida resolução, que a carga horária do curso de administração deveria ser ampliada.

Ademais, verifica-se, à fl. 31, que os alunos somente foram informados, por e-mail datado de 14.09.2009, ou seja, após mais de 2 (dois) anos da vigência da referida resolução que a duração do curso seria ampliada.

Dessa forma, houve frustração na expectativa do término do curso, aliada à falta de informação que deveria ter sido prestada pela recorrida (art. , III, do CDC).

Nesse sentido, cabe destacar ainda a lição de Sérgio Cavalieri Filho (in Programa de Responsabilidade Civil, ed. Malheiros, 4ª edição, p. 102):

“Se a ofensa é grave e de repercussão, por si só justifica a concessão de uma satisfação de ordem pecuniária ao lesado. Em outras palavras, o dano moral existe in re ipsa; deriva inexoravelmente do próprio fato ofensivo, de tal modo que, provada a ofensa, ipso facto está demonstrado o dano moral à guisa de uma presunção natural (...) o dano moral está in re ipsa; decorre inexoravelmente da gravidade do próprio fato ofensivo, de sorte que, provado o fato, provado está o dano moral”.

Por fim, peço vênia para transcrever parte da fundamentação constante da APC nº 70066786310, da relatoria da eminente Desa. Mylene Maria Michel, cuja sessão de julgamento ocorreu em 10.03.2016, da qual participei, levando ainda em conta que constam como recorrentes, na apelação supra citada, alunas que se formaram juntamente com o autor deste feito, conforme se verifica da Ata de Formatura nº 403/2011 (fls. 67/73), sendo assim, com a finalidade de evitar decisões conflitantes acrescento tal fundamento às minhas razões de decidir, in verbis:

“Inevitável, assim, que se procedesse à adequação do currículo, conforme os ditames estabelecidos pelo Ministério da Educação. E não restam dúvidas de que a alteração do limite de integralização do curso é superveniente ao ingresso dos alunos na graduação, e que tal alteração não pode ser imputada à apelada.

Contudo, revela-se evidente a quebra da boa-fé objetiva, na medida em que, ao que transparece da prova colhida dos autos, a entidade recorrida ocultou a informação a respeito da alteração curricular por mais de dois anos após o início da contratualidade.

Somente na data de 14/09/2009, sobreveio email da Sra. Fabiana Tramontin aos alunos do curso alertando sobre as modificações, com o seguinte teor (fl. 48):

“Por determinação do MEC o curso de administração, conforme Decreto nº 5.622/2005, em seu artigo , inciso 1º expressa ‘os cursos e programas a distância deverão ser projetados com a mesma duração definida para os respectivos cursos na modalidade presencial, isto é, não poderá ser ofertado com um período de duração menor que 04 anos e carga horária mínima entre 3.000 e 3.200 horas/aulas (Resolução CNE 2/2007, em seu art. 2º, item III que os limites de integração dos cursos devem ser fixados com base na carga horária total), como a turma 2007/3 não contempla este período e a carga horária mínima exigida, se faz necessário que curso sofra uma ampliação na sua oferta contemplando este limite de integração.

Os compromissos financeiros assumidos permanecem inalterados.”

A corroborar, o informante Cirino Bittencourt Carvalho Neto, coordenador do Curso de Administração EAD da instituição ré, reconheceu em audiência que os “os autores tiveram a informação de que o curso seria prorrogado por mais um ano, no final do ano de XXXXX/início do ano de 2010” (fl. 149)

Referida falha no dever fundamental de informação frustrou a legítima expectativa da colação de grau em 36 meses, conforme havia sido anunciado. Acarretou, no meu sentir, danos de ordem extrapatrimonial à esfera dos direitos da personalidade dos autores.

A boa-fé objetiva, em sua função integrativa , constitui fonte de direitos e deveres para ambas as partes. É o que enunciam os artigos 422 do Código Civil e 4º, III, da Lei nº 8.078/1990:

Art. 422. Os contratantes são obrigados a guardar, assim na conclusão do contrato, como em sua execução, os princípios de probidade e boa-fé.

Art. 4º A Política Nacional das Relações de Consumo tem por objetivo o atendimento das necessidades dos consumidores, o respeito à sua dignidade, saúde e segurança, a proteção de seus interesses econômicos, a melhoria da sua qualidade de vida, bem como a transparência e harmonia das relações de consumo, atendidos os seguintes princípios: (Redação dada pela Lei nº 9.008, de 21.3.1995)

(...)

III - harmonização dos interesses dos participantes das relações de consumo e compatibilização da proteção do consumidor com a necessidade de desenvolvimento econômico e tecnológico, de modo a viabilizar os princípios nos quais se funda a ordem econômica (art. 170, da Constituição Federal), sempre com base na boa-fé e equilíbrio nas relações entre consumidores e fornecedores;

Dentre outros, desponta o dever anexo de informação como um inafastável elemento de toda relação contratual, a teor, inclusive, do que prescreve o artigo , III, do Código de Defesa do Consumidor (redação em vigor à época dos fatos):

Art. 6º São direitos básicos do consumidor:

(...)

III - a informação adequada e clara sobre os diferentes produtos e serviços, com especificação correta de quantidade, características, composição, qualidade e preço, bem como sobre os riscos que apresentem;

O descumprimento deste dever caracteriza a violação positiva do contrato , definida pela doutrina como o inadimplemento que, embora não ocasionando mora absoluta ou relativa, implica descumprimento de um dever anexo ao contrato. A respeito do tema, ensina Carlos Roberto Gonçalves que tais deveres anexos ou secundários “excedem o dever de prestação e derivam diretamente do princípio da boa-fé objetiva, tais como os deveres laterais de esclarecimento (...), de conservação (...), de lealdade (...), de cooperação (...), etc” .

A conduta da recorrida, observada no caso concreto, é fato gerador de danos morais, visto que os transtornos dela decorrentes excedem o mero descontentamento ou desconforto.

Não é excesso inferir que, se comunicada imediatamente, a alteração da grade curricular poderia ter ocasionado a desistência de alguns alunos, na medida em que a promessa de graduação em prazo reduzido constituía um atrativo àqueles que não pudessem dedicar mais tempo aos estudos.

E, nos demais casos, a súbita notícia da postecipação da obtenção do diploma é, a qualquer pessoa, causa inviabilizadora planejamento profissional e pessoal, e frustra a legítima expectativa de inserção no mercado de trabalho dentro do prazo inicialmente previsto.

Vale destacar que a responsabilidade civil da instituição de ensino, na qualidade de prestadora de serviço, é na modalidade objetiva, dispensando prova da culpa ou dolo. Basta averiguar a presença dos demais elementos – dano, ato ilícito e nexo de causalidade – para se proceder à responsabilização.

O ato ilícito está delineado na ocultação de dado relevante acerca da duração do curso, em patente violação ao dever satelitário de informação; o dano aos direitos da personalidade jaz na frustração da legítima expectativa de colar grau no prazo previamente anunciado; e o nexo de causalidade entre os elementos está suficientemente demonstrado nos autos.

Justifica-se, assim, a imposição de indenização por danos morais no montante de R$ 5.000,00 (cinco mil reais), para cada um dos autores.

Dessa forma, plenamente caracterizados os danos morais, pois tal situação ultrapassa os meros dissabores.

Por derradeiro, ainda, não há falar em indenização a título de danos materiais, pois conforme acima exposto, em face do disposto na Resolução nº 2/2007, a instituição de ensino estava obrigada a se adequar ao novo regramento, até mesmo para que o curso frequentado pelo apelante pudesse ser reconhecido pelo Ministério da Educação.

Restam prequestionados os dispositivos legais informados pelo apelante à fl. 101 dos autos.

Por tais razões, dou parcial provimento à apelação para condenar a ré a pagar autor a título de danos morais o montante de R$5.000,00, corrigido pelo IGP-M a partir desta decisão e com juros moratórios a contar da citação, pois no caso, trata-se de relação contratual, nos termos acima explicitados.

Tendo em vista o provimento parcial da apelação, fica a sucumbência assim redimensionada:

Caberá às partes o pagamento das custas processuais, 50% a cargo do autor e 50% a cargo da ré. Em decorrência, a demandada pagará honorários advocatícios em favor do patrono do autor de 20% calculados sobre o proveito econômico que este obteve com a presente demanda e o demandante pagará verba honorária ao procurador da parte adversa, em igual percentual, sobre a parcela de que decaiu, inadmitida a compensação (art. 85, parágrafos 2º e 14, c/c o art. 86, caput, ambos do CPC), devendo referida verba ser corrigida monetariamente pelo IGP-M a partir desta decisão colegiada.

A exigibilidade dos ônus da sucumbência quanto ao autor fica suspensa, pois litiga ao abrigo da gratuidade da justiça (fl. 40).

É o voto.

Des. Marco Antonio Angelo - De acordo com o (a) Relator (a).

Des. Eduardo João Lima Costa - De acordo com o (a) Relator (a).

DES. VOLTAIRE DE LIMA MORAES - Presidente - Apelação Cível nº 70075503268, Comarca de Canoas: "DERAM PARCIAL PROVIMENTO À APELAÇÃO. UNÂNIME."

Julgador (a) de 1º Grau: SANDRO ANTONIO DA SILVA

� GONÇALVES, Carlos Roberto. Direito civil brasileiro, vol. 3. 11ª Ed. São Paulo: Saraiva, 2014, p. 59.

Disponível em: https://www.jusbrasil.com.br/jurisprudencia/tj-rs/530623822/inteiro-teor-530623849