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23 de Maio de 2024
  • 2º Grau
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Tribunal de Justiça de São Paulo
há 10 meses

Detalhes

Processo

Órgão Julgador

Câmara Especial

Publicação

Julgamento

Relator

Daniela Cilento Morsello

Documentos anexos

Inteiro TeorTJ-SP_CJ_00189661120238260000_70a47.pdf
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Inteiro Teor

Registro: 2023.0000644907

ACÓRDÃO

Vistos, relatados e discutidos estes autos de Conflito de Jurisdição nº XXXXX-11.2023.8.26.0000, da Comarca de Mauá, em que é suscitante MM JUIZ DE DIREITO DA 1a VARA CRIMINAL DE MAUÁ, é suscitado MM JUIZ DE DIREITO DA VARA DO JUIZADO ESPECIAL CÍVEL E CRIMINAL DE MAUÁ.

ACORDAM , em sessão permanente e virtual da Câmara Especial do Tribunal de Justiça de São Paulo, proferir a seguinte decisão: Conheceram do conflito de jurisdição para reconhecer a competência do Juízo da 1a Vara Criminal da Comarca de Mauá, ora suscitante, para apreciar do feito. V.U. , de conformidade com o voto do relator, que integra este acórdão.

O julgamento teve a participação dos Desembargadores GUILHERME GONÇALVES STRENGER (VICE PRESIDENTE) (Presidente sem voto), BERETTA DA SILVEIRA (PRES. DA SEÇÃO DE DIREITO PRIVADO) E WANDERLEY JOSÉ FEDERIGHI (PRES. DA SEÇÃO DE DIREITO PÚBLICO).

São Paulo, 31 de julho de 2023.

DANIELA CILENTO MORSELLO

Relatora

Assinatura Eletrônica

CONFLITO DE JURISDIÇÃO Nº XXXXX-11.2023.8.26.0000

SUSCITANTE: MM. Juiz de Direito da 1a Vara Criminal

SUSCITADO: MM. Juiz de Direito do Vara do Juizado Especial Cível e Criminal

COMARCA: Mauá

INTERESSADO: N.D. e Ministério Público do Estado de São Paulo

VOTO Nº 10.874

CONFLITO NEGATIVO DE JURISDIÇÃO. TERMO CIRCUNSTANCIADO. MAUS-TRATOS PRATICADOS CONTRA CRIANÇA NO ÂMBITO DOMÉSTICO. COMPETÊNCIA DO JUÍZO COMUM. Fatos ocorridos no ano de 2015. Autos em trâmite perante Vara do Juizado Especial Cível e Criminal. Declinação de competência e determinação de redistribuição dos autos a uma das Varas Criminais da Comarca, após a entrada em vigor da Lei nº 14.344/2022, que acrescentou o § 1º ao art. 226 do ECA. Cabimento. Afastamento da aplicação da Lei nº 9.099/95 aos crimes cometidos contra criança e adolescente que é norma de natureza híbrida. Alteração da competência em razão da matéria que é regra processual de aplicação imediata. Inteligência dos art. , do CPP. Competência do Juízo Comum. Institutos despenalizadores previstos na Lei nº 9.099/95, no entanto, aplicáveis ao caso, pois os fatos são anteriores à vigência da Lei nº 14.344/2022. Irretroatividade da lei penal mais grave.

Precedentes desta C. Câmara Especial. Conflito conhecido. Competência do Juízo da 1a Vara Criminal da Comarca de Mauá.

Trata-se de conflito negativo de jurisdição suscitado pelo MM. Juiz de Direito da 1a Vara Criminal em face do MM. Juiz de Direito do Vara do Juizado Especial Cível e Criminal, ambos da Comarca da Mauá, nos autos da ação penal nº XXXXX-68.2018.8.26.0288.

O incidente foi regularmente processado, tendo sido designado o Juízo Suscitante para apreciar as medidas urgentes (fls. 07/08) .

A Procuradoria Geral de Justiça opinou pelo conhecimento do conflito, declarando-se a competência do Juízo da 1a Vara Criminal da Comarca de Mauá para o processamento e julgamento do feito (fls. 13/17).

Este é o relatório.

O conflito negativo de jurisdição está configurado, nos termos do artigo 114, inciso I, do Código de Processo Penal, uma vez que ambas as autoridades judiciárias se reconhecem incompetentes para conhecer do mesmo fato criminoso.

Cuida-se de termo circunstanciado instaurado em 24 de abril de 2019 para apurar o delito de maus-tratos (artigos

136, § 3º, do Código Penal) supostamente praticado pela investigada N .D.L. contra o seu filho de 10 anos de idade à época dos fatos.

Os autos foram distribuídos, inicialmente, ao Juízo da Vara do Juizado Especial Cível e Criminal da Comarca da Mauá, o qual, em audiência preliminar, acolheu a proposta de transação penal oferecida pelo Ministério Público e aceita pela averiguada (fls. 71 dos autos de origem). No entanto, as condições estabelecidas no acordo não foram por ela cumpridas (fls. 95 dos autos de origem), de modo que o feito prosseguiu, com deferimento da produção antecipada de prova requerida pelo Parquet para colheita de depoimento especial da vítima (fls. 101 dos autos de origem) .

Após a entrada em vigor da Lei nº 14.344/2022 (Lei Henry Borel), que alterou o artigo 226, § 1º, do Estatuto da Criança ou Adolescente - Lei nº 8.069/90, o Juízo do Juizado Especial Criminal de Mauá, acolhendo o parecer ministerial, declinou de sua competência, ao argumento de que é inaplicável a Lei nº 9.099/95 aos crimes praticados contra crianças ou adolescentes no contexto de violência doméstica e familiar (fls. 158 dos autos de origem).

Os autos foram, então, redistribuídos ao Juízo da 1a Vara Criminal da Comarca de Mauá, que também se considerou incompetente, por entender que os fatos ocorreram em 22 de abril de 2019, anteriormente à Lei nº 14.344/2022 (Lei Henry Borel), que entrou em vigor no dia 09 de julho de 2022. Acrescentou que a alteração legislativa configura novatio legis in pejus , porque inviabiliza a aplicação dos institutos jurídicos despenalizadores previstos na Lei nº 9.099/95, logo a sua retroação aos fatos anteriores à sua entrada em vigor violaria flagrantemente os artigos , inciso XL, da Constituição Federal, e 2º do Código Penal.

Pois bem.

Estabelece o artigo 226, § 1º, do Estatuto da Criança e do Adolescente que: "§ 1º Aos crimes cometidos contra a criança e o adolescente, independentemente da pena prevista, não se aplica a Lei nº 9.099, de 26 de setembro de 1995." .

A Lei nº 14.344/2022, que acrescentou o supramencionado parágrafo ao artigo 226, entrou em vigor em 09 de julho de 2022, portanto posteriormente aos fatos investigados, ocorridos no ano de 2019.

Note-se que não há controvérsia acerca da não incidência da Lei nº 9.099/95 ao crime que ora se apura, relativo a maus-tratos praticados contra criança no âmbito doméstico, mas apenas sobre a possibilidade de aplicação da Lei nº 14.344/2022 aos fatos anteriores à sua vigência.

É certo que, conforme bem apontado pelo Juízo Suscitante, a não aplicação da Lei nº 9.099/95 aos crimes cometidos contra a criança e o adolescente enseja, por via de consequência, a inaplicabilidade dos institutos despenalizadores nela previstos aos autores dos fatos, de modo que a Lei Henry Borel possui conteúdo penal prejudicial aos infratores.

Contudo, não se pode olvidar que se trata de norma híbrida, que também possui conteúdo processual, uma vez que exclui da competência dos Juizados Especiais Criminais a apreciação dos referidos crimes, tratando-se de regra de competência absoluta.

E o artigo , do Código de Processo Penal

estabelece que a lei processual penal tem aplicação imediata.

Não bastasse isso, o artigo 43 do Código de Processo Civil dispõe que:

"Art. 43 Determina-se a competência no momento do registro ou da distribuição da petição inicial, sendo irrelevantes as modificações do estado de fato ou de direito ocorridas posteriormente, salvo quando suprimirem órgão judiciário ou alterarem a competência absoluta." (destaque nosso).

Destarte, em face da aplicação imediata da regra de alteração da competência absoluta, o Juízo Suscitante é o competente para a apreciação do feito.

Por outro lado, em relação ao aspecto material, de fato, o artigo 226, § 1º, do Código de Processo Penal configura novatio legis in pejus, uma vez que veda a aplicação dos institutos despenalizadores previstos na Lei nº 9.099/95 aos autores do fato criminoso.

Assim, considerando a irretroatividade da lei penal mais grave, a teor do que preconizam os artigos , XL, da Constituição Federal e artigo do Código Penal, aplicáveis ao caso concreto aludidos institutos despenalizadores, não obstante o deslocamento da competência ao Juízo Comum.

Neste ponto, vale transcrever trecho do brilhante acórdão da lavra do Ilustre Desembargador Guilherme

Gonçalves Strenger, julgado em 26 de junho de 2023, envolvendo caso semelhante:

"A respeito, vale destacar que o Superior Tribunal de Justiça enfrentou, recentemente, situação assemelhada ao tratar da Lei nº 13.491/2017, que, ao trazer nova definição de crime propriamente militar, ampliou a competência da Justiça Castrense, o que trouxe situação prejudicial ao status libertatis dos agentes de crimes antes sujeitos à Justiça Comum.

Com efeito, ao analisar a aplicabilidade do novo diploma aos fatos ocorridos antes de sua vigência, o C. STJ expressou entendimento de que o novo regramento, por alterar norma de competência absoluta, deveria ter aplicação imediata, com deslocamento dos feitos para a Justiça Militar, sem prejuízo da aplicação da lex mitior pelo Juízo de Direito Militar. Confira-se:

(...)

Noutro giro, o Supremo Tribunal Federal também já enfrentou caso semelhante, ao tratar da aplicação da Lei nº 9.839/99, que inseriu o artigo 90-A na Lei nº 9.099/95, para dispor que as disposições da Lei dos Juizados não se aplicam no âmbito da Justiça Militar.

Na oportunidade, o Pretório Excelso consignou que aos crimes de competência da Justiça Militar praticados antes do advento da Lei nº 9.839/99 continuam aplicáveis as medidas despenalizadoras da Lei nº 9.099/95, justamente por se tratar de norma processual de natureza híbrida:

Referido voto restou assim ementado:

"CONFLITO NEGATIVO DE JURISDIÇÃO Ação Penal para apuração da prática, em tese, do crime de maus tratos (art. 136 do CP) contra criança Feito iniciado pelo rito sumaríssimo da Lei nº 9.099/95 Superveniência da Lei nº 14.344/2022 (Lei Henry Borel) Norma que incluiu o § 1º no art. 226 do ECA, para afastar a aplicação da Lei nº 9.099/95 aos crimes cometidos contra criança e adolescente Divergência sobre o alcance da norma Adoção do entendimento de que a novel legislação excluiu do âmbito de incidência da Lei nº 9.099/95 os crimes contra a criança e adolescente, desde que cometidos no contexto de violência doméstica e familiar, previstos no ECA, no Código Penal ou na legislação esparsa, independentemente do quantum de pena previsto Alteração de competência absoluta Aplicação imediata aos processos em andamento Inteligência do art. do CPP c/c art. 43, in fine, do CPC Deslocamento do feito para a Justiça Comum, sem prejuízo da aplicação dos institutos despenalizadores previstos na Lei nº 9.099/95 ao caso, pois o suposto crime foi cometido antes da vigência da Lei nº 14.344/2022 Norma de natureza híbrida Irretroatividade da lei penal mais gravosa Precedentes do Supremo Tribunal Federal e do Superior Tribunal de Justiça Conflito conhecido Competência do MM. JUÍZO DE DIREITO DA 2a VARA CRIMINAL DA COMARCA DE PRAIA GRANDE, suscitante."(Conflito de Jurisdição nº XXXXX-74.2023.8.26.0000; Relator Guilherme Gonçalves Strenger; j. 26.06.2023).

Pelo exposto, conheço do conflito de jurisdição para reconhecer a competência do Juízo da 1a Vara Criminal da Comarca de Mauá, ora suscitante, para apreciar do feito.

DANIELA CILENTO MORSELLO

Relatora

Disponível em: https://www.jusbrasil.com.br/jurisprudencia/tj-sp/1917226367/inteiro-teor-1917226380

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