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6 de Maio de 2024

Assistência Judiciária a Agentes Públicos e Arquivamento do Inquérito nos moldes da Lei nº 13.964/19

A presente resenha tem por objetivo o estudo pormenorizado do artigo 14-A e artigo 28, ambos do Código de Processo Penal, nos termos do Pacote Anticrime.

Publicado por Bruna Camila Advogada
há 4 anos

A Lei 13.964/19 trouxe grandes inovações à Legislação Criminal Brasileira, dando especial atenção aos agentes de segurança pública. Os pontos vetados no Pacote Anticrime eram ainda mais "maternais" com esses agentes, no entanto, a presente resenha tem por objetivo o estudo pormenorizado do texto legal. Nesta oportunidade, será tratado duas novidades processuais destacadas nos artigos 14-A e 28 do Código de Processo Penal.

Contudo, antes de adentrar aos temas principais torna-se oportuno o estudo do Inquérito Policial em minucias. O referido ato é o conjunto de diligências realizadas pela polícia, a fim de apurar a ocorrência de uma infração penal e a autoria da mesma, nos termos do artigo do Código de Processo Penal.

Em que pese algumas exceções, tem-se que o Inquérito Policial é de competência dos Delegados de Polícia de carreira, autoridades policiais, essa atribuição poderá ser fixada tendo como base o local de consumação do delito ou pela natureza deste. Todavia, entende a jurisprudência que, os atos praticados por autoridade policial carente de atribuição para aquele ato não é causa de invalidá-lo, tendo em vista que a polícia não exerce atividade jurisdicional.

Fernando Capez bem destaca que o artigo , LIII, da CF/88 não se aplica às autoridades policiais, uma vez que essas não processam e nada sentenciam. O Inquérito Policial tem por finalidade apurar o fato tipificado na legislação criminal, bem como sua autoria, o que servirá de base para uma eventual ação penal. Ressalta-se que, há outras formas de investigação criminal, como as Comissões Parlamentares de Inquérito (CPI) e o Inquérito Policial Militar (IMP), por exemplo.

Apesar de não ser um procedimento jurisdicional, o inquérito policial possui características que devem ser observadas, dentre elas estão a necessidade de ser ato escrito, haja vista que não se concebe a ideia de uma investigação verbal (art. , CPP); a investigação será sigilosa, objetivando a melhor elucidação dos fatos (art. 20, CPP); a oficialidade do ato se dá por ser uma atividade investigatória realizada por órgãos oficiais, ou seja não cabe ao particular.

O Inquérito Policial é oficioso, por tal motivo as atividades da autoridade investigativa independem de provocações externas, sendo a instauração do inquérito obrigatória sempre que noticiada uma infração penal. Para tanto, é necessário que o feito seja presidido por autoridade pública; é indisponível, após sua instauração o inquérito não poderá ser arquivado pela autoridade policial.

Destaco a característica mais marcante do Inquérito Policial, a inquisitoriedade, os atos persecutórios se concentram nas mãos de um só agente/órgão, aqui não se aplica o contraditório e a ampla defesa, a investigação não é uma acusação, portanto não necessita de defesa. Seu valor probatório é relativo, uma vez que sua finalidade principal é de fornecer informações à acusação e defesa. Para que seja levado em consideração para sentença é necessário que haja outras provas no processo corroborando com as informações da investigação.

Com tais observações acerca do Inquérito Policial (I.P), será analisado as mudanças provocadas pela Lei 13.964/19 nesse instituto.

Assistência Judiciária a Agentes Públicos.

O popularmente conhecido como Pacote Anticrime, como já dito, trouxe inúmeras inclusões à legislação criminal, uma delas é o artigo 14-A do Código de Processo Penal. Veja o dispositivo:

Art. 14-A. Nos casos em que servidores vinculados às instituições dispostas no art. 144 da Constituição Federal figurarem como investigados em inquéritos policiais, inquéritos policiais militares e demais procedimentos extrajudiciais, cujo objeto for a investigação de fatos relacionados ao uso da força letal praticados no exercício profissional, de forma consumada ou tentada, incluindo as situações dispostas no art. 23 do Decreto-Lei nº 2.848, de 7 de dezembro de 1940 (Código Penal), o indiciado poderá constituir defensor.

Conforme se observa, o artigo supracitado aborda sobre o direito de defesa conferido aos agentes públicos enumerados no artigo 144 da Constituição Federal: Polícia Federal, Polícia Rodoviária Feral, Polícia Ferroviária Federal, Polícias Civis, Policia Militar, Corpo de Bombeiros, polícias penais federal, estaduais e distrital. Curioso é que esse direito de defesa se confere aos agentes públicos na fase investigativa.

Nas palavras de Nucci, “agentes policiais passam a gozar de assistência judiciária na fase do inquérito, cuja característica é ser inquisitivo e não contraditório”. Conforme o artigo 14-A do Código de Processo Penal, nos casos em que servidores das instituições elencadas no artigo 144 da CF/88 forem alvo de qualquer modalidade investigativa, sobre fatos relacionados ao uso da força letal praticados no exercício da profissão, na forma tentada ou consumada, poderá o indiciado constituir defensor.

Para além disso, o parágrafo 1º do art. 14-A do Código de Processo Penal, ainda, destaca que os sujeitos do caput quando investigados deverão ser citados da instauração do procedimento investigatório, podendo constituir defensor no prazo de 48 horas, a contar da citação.

No mesmo sentido, prevê o parágrafo 2º do artigo analisado, que esgotado o prazo de 48 horas, sem que haja nomeação de defensor pelo investigado, a autoridade policial deverá citar a instituição em que o agente se vinculava à época dos fatos, para que essa, no prazo de 48 horas, indique defensor para representação do investigado.

Os parágrafos 3º, 4º e 5º do art. 14-A foram vetados, por esses a defesa dos agentes públicos, na fase investigativa, se daria preferencialmente pela Defensoria Pública, em caso de indisponibilidade do órgão seria disponibilizado profissional para proceder a defesa do investigado, nessa hipótese, os custos da defesa correriam por conta da instituição que o agente se vinculava ao tempo dos fatos. Ressalta-se que os parágrafos foram vetados.

O parágrafo 6º do artigo 14-A do Código de Processo Penal estende a aplicação das disposições do caput aos servidores vinculados às instituições das Forças Armadas: Marinha, Exército e Aeronáutica (art. 142 da CF/88), quando os fatos investigados se refiram as missões para a Garantia da Lei e da Ordem.

Por tudo que foi exposto é obvio que a inclusão desse dispositivo provocou e provocará inúmeras discussões acerca de sua constitucionalidade, tendo em vista que ao cidadão comum segue a regra de que a investigação é inquisitiva, não há possibilidade de defesa. O princípio constitucional da isonomia fora atropelado nesse artigo, Nucci fala em uma defesa especial e questiona sobre transformarem o inquérito em procedimento contraditório, defendendo que, se assim for, o ideal é aplicar o disposto a todos os investigados.

Certamente se vislumbra várias discussões sobre a possibilidade de defesa na fase investigatória, por enquanto, o agente público especificado em epígrafe, deverá ser citado quando instaurada investigação em seu desfavor, para que, em 48 horas, constitua defensor. Na falta disso, deverá ser citada a instituição a que se vinculava o investigado ao tempo dos fatos para que esta constitua defensor ao agente.

Do Arquivamento do Inquérito Policial

O artigo 28 do Código de Processo Penal sempre foi alvo muito estimado pelas bancas examinadoras de concursos públicos e no Exame de Ordem, tanto é que muitos estudantes e operadores do direito já o tinham decorado. Todavia, o referido dispositivo sofreu profunda alteração com a Lei n 13.964/19, desta forma o arquivamento do Inquérito Policial ganha novos contornos, observe a nova redação.

Art. 28. Ordenado o arquivamento do inquérito policial ou de quaisquer elementos informativos da mesma natureza, o órgão do Ministério Público comunicará à vítima, ao investigado e à autoridade policial e encaminhará os autos para a instância de revisão ministerial para fins de homologação, na forma da lei.

Extremamente didática a nova redação do artigo 28, agora quando do arquivamento do Inquérito Policial o Ministério Público comunicará a vítima, o investigado e a autoridade policial, encaminhando os autos para instância de revisão ministerial, que homologará ou não o arquivamento do I.P.

Note que os atos de arquivamento não passam pelas mãos do magistrado, que seria o de garantias. Anteriormente, a requisição de arquivamento da investigação era apreciada pelo juiz e, caso o magistrado não concordasse, remetia os autos ao procurador-geral para que este: oferecesse a denúncia, designasse outro órgão do Ministério Público para oferecer a denúncia ou pugnasse pelo arquivamento (coadunando com o primeiro pedido) e só então o juiz estaria obrigado a arquivar a investigação.

Afastada a figura do juiz para que se proceda o arquivamento do I.P caberá Ministério Público praticar todos os atos para o feito. A competência para analisar o cabimento do arquivamento é do órgão Superior do Ministério Público, desta forma, o promotor ou Procurador da República, ao propô-lo encaminhará os autos para instância revisora ministerial para homologação.

Caso a instância superior do Ministério Público não concorde com o arquivamento do feito, deverá remeter os autos ao Procurador Geral de Justiça, este designará outro promotor para oferecer a denúncia.

Destaca-se que, antes de serem adotados os procedimentos supramencionados deverá o Ministério Pública comunicar, oficialmente, a vítima do crime, o investigado e a autoridade policial. A vítima poderá manifestar-se contra ou a favor do arquivamento, podendo recorrer ao órgão superior do Ministério Público, no prazo de trinta dias. Somente após o fim desse prazo será apreciado o arquivamento.

O parágrafo 2º do art. 28, do Código de Processo Penal, por sua vez permite que a revisão do arquivamento dos autos de investigação, referentes as ações penais de delitos cometidos contra a União, Estados e Municípios, seja provocada pela chefia do órgão a quem couber a sua representação judicial. Em tese, o promotor notificaria o órgão do arquivamento e este realizaria a análise do cabimento do encerramento da investigação.

Pois bem, pode-se dizer que o arquivamento do inquérito, pela nova redação, reafirma o sistema acusatório do processo penal. Restringe-se o papel do juiz na fase investigativa, sendo o Ministério Público e suas instâncias, em regra, competente para analisar a possibilidade do arquivamento, ressalvando que a notificação e possível manifestação da vítima deverá ser observada para o encerramento da investigação.

Ressalto que as alterações na forma de arquivamento do Inquérito Policial e outa peças de investigação, nos termos da Lei 13.964/19, estão suspensas por decisão do Ministro Luiz Fux do Supremo Tribunal Federal. Logo, por enquanto, o arquivamento do Inquérito Policial segue as regras antigas.





Bibliografia.

Nucci, Guilherme de Souza

Pacote Anticrime comentado: Lei 13.964, de 24.12.2019 / Guilherme de Souza Nucci. – 1. Ed. – [2. Reimpr.] Rio de Janeiro: Forense, 2020.

Capez, Fernando

Curso de Processo Penal/ Fernando Capez. – 22 ed. – São Paulo: Saraiva, 2015.

1 Processo Penal 2. Processo Penal – Jurisprudência – Brasil I. Título.

Lima, Renato Brasileiro de

Manual de Processo Penal: Volume Único/ Renato Brasileiro de Lima – 7 ed. rev., ampl. e atual.- Salvador: Ed. JusPodvim, 2019.

http://www.planalto.gov.br/ccivil_03/decreto-lei/del3689compilado.htm

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