É possível a doação de todo o patrimônio?
Em primeiro lugar, insta destacar que é NULA a doação de todos os bens, sem reserva do mínimo para a sobrevivência do doador (DOAÇÃO UNIVERSAL, conforme artigo 548 CC).
Isso porque deve ser assegurado à pessoa o mínimo para a sua sobrevivência, ou melhor, o mínimo para que possa viver com dignidade (ESTATUTO JURÍDICO DO PATRIMÔNIO MÍNIMO de Luiz Edson Fachin).
Entretanto, nota-se que pela leitura correta do art. 548 do CC traz a conclusão de que é até possível a doação de todo o patrimônio, desde que faça uma RESERVA DE USUFRUTO, de rendas ou alimentos a seu favor, visando a manutenção e a sua sobrevivência de forma digna.
Em tais casos, para esclarecer qual é o piso mínimo, recomenda-se a análise casuística.
Trazendo tal conclusão, transcreve-se julgado do STJ:
DOAÇÃO UNIVERSAL. BENS. SEPARAÇÃO. Discute-se no REsp se a proibição de doação universal de bens, óbice disposto no art. 1.175 do CC/1916 (atual art. 548 do CC/2002), incidiria no acordo da separação consensual de casal. Segundo o recorrente, da abrangência total dos bens, uns foram doados e outros ficaram para a ex-mulher na partilha. Já o Tribunal a quo posicionou-se no sentido da inaplicabilidade do art. 1.175 do CC/1916, visto que, à época das doações, o recorrente possuía partes ideais de outros imóveis e, na partilha da separação consensual, os bens que ficaram com a ex-mulher foram doados ao casal pelos pais dela. Explica o Min. Relator que a proibição do citado artigo deve incidir nos acordos de separação judicial, pois se destina à proteção do autor da liberalidade, ao impedi-lo de, em um momento de impulso ou de depressão psicológica, desfazer-se de todos seus bens, o que o colocaria em estado de pobreza. Ademais, a dissipação completa do patrimônio atenta contra o princípio da dignidade da pessoa humana (art. 1º, II, da CF/1988). Considera, ainda, o Min. Relator que os acordos realizados nas separações judiciais são transações de alta complexidade, haja vista os interesses a serem ajustados (guarda dos filhos, visitas, alimentos etc.). Por esse motivo, é corriqueira a prática de acordos a transigir com o patrimônio a fim de compor ajustes para resolver questões que não seriam solucionadas sem a condescendência econômica de uma das partes. Observa que as doações, nos casos de separação, também se sujeitam à validade das doações ordinárias; assim, a nulidade da doação dar-se-á quando o doador não reservar parte de seus bens, ou não tiver renda suficiente para a sua sobrevivência e só não será nula quando o doador tiver outros rendimentos. Diante do exposto, a Turma deu provimento ao recurso para anular o acórdão recorrido, a fim de que o tribunal de origem analise a validade das doações, especialmente quanto à existência de recursos financeiros para a subsistência do doador. REsp 285.421-SP, Rel. Min. Vasco Della Giustina (Desembargador convocado do TJ-RS), julgado em 4/5/2010.
Portanto, é sim possível a doação de todo o patrimônio, desde que faça uma RESERVA DE USUFRUTO, de rendas ou alimentos a seu favor (chamada de "usufruto deducto").
É relevante salientar que o usufruto voluntário ou convencional, que decorre da autonomia privada, podendo ter origem em testamento ou contrato, no que tange ao usufruto voluntário decorrente de CONTRATO, é admitido a seguinte subclassificação:
A) Usufruto por ALIENAÇÃO: o proprietário concede o USUFRUTO a terceiro e conserva a nua propriedade.
B) Usufruto por RETENÇÃO OU DEDUCTO: o proprietário reserva para si o usufruto e transfere a NUA PROPRIEDADE a terceiro.
4 Comentários
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E quando há herdeiros legítimos?? Mesmo assim é válida a doação? continuar lendo
Olá, Pedro!!
Sim, é possível desde que faça uma RESERVA DE USUFRUTO, de rendas ou alimentos a seu favor. continuar lendo
Obrigado Flávia!! Parabéns pelo artigo!! continuar lendo
Boa noite, este tema é pouco tratado e mesmo com pesquisas difícil de encontrar informações.
Parabéns pelo material. continuar lendo