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16 de Junho de 2024
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    Juíza anula eleições para cargos diretivos da Associação dos Delegados de Polícia do Pará (ADEPOL)

    há 14 anos

    A juíza da 1ª Vara do Juizado Cível de Belém, Luana de Nazareth Santalices, julgou procedente, na manhã desta sexta-feira, 29, a ação movida por Luiz Fernandes Rocha, que pedia a anulação das eleições gerais para os cargos de direção da Associação dos Delegados de Polícia do Pará (ADEPOL). A juíza determinou que seja publicado novo edital com convocação de assembléia geral afim de eleger uma junta provisória para administrar a ADEPOL e convocar novas eleições dentro das regras do Estatuto. Além disso, a junta terá que publicar no site da associação, os textos O avesso do avesso e A verdade sobre as eleições da ADEPOL 2009.

    O autor da ação, que concorreu a cargo de direção nas últimas eleições da ADEPOL, em outubro passado, pela chapa Transparência e Modernização, reclamou que o processo eletivo havia sido irregular à medida que feriu as regras estabelecidas pelo Estatuto da categoria. Fernando denunciou que houve divergência entre o número de cédulas e a quantidade de votantes nas eleições.

    A infração ao Estatuto da associação foi de fato constatada pela juíza. Não se discute se a chapa vencedora teve número bastante superior de votos do que as demais, o que ficou constatado após a abertura da urna eleitoral, e se isso bastaria para legitimá-la a ser proclamada como vencedora no pleito. O que se quer afirmar é que a urna sequer deveria ter sido aberta, pois a eleição, por força de disposição estatutária, já estava comprometida irremediavelmente.

    A juíza também considerou irregular convocação de assembléia posterior as eleições, que teve como objetivo homologar o pleito em questão. Diante de tudo o que se expôs, dos documentos e provas produzidos pelo autor nos autos, entendo que houve, de fato, irregularidades na conduta dos réus, de forma que o reclamante logrou êxito na comprovação do direito pleiteado, conforme determina o artigo 333, inciso I, do Código de Processo Civil. Confira abaixo a íntegra do despacho. (Texto: Vanessa Vieira)

    Processo nº.: 2009.1.001014-5

    Reclamante: LUIZ FERNANDES ROCHA

    Reclamado: ASSOCIAÇAO DOS DELEGADOS DE POLÍCIA DO PARÁ ADEPOL, DILERMANO GOMES TAVARES e MARIA DO PEROÉTUO SOCORRO REBELO DE ANDRADE PICANÇO

    Sentença

    Vistos,etc.

    Dispenso o relatório, com espeque no art. 38 da lei 9099/95, e decido.

    O reclamante ingressou com ação pleiteando a condenação dos requeridos em obrigações de fazer e não fazer, cumulada com pedido de antecipação de tutela.

    Alega que concorreu, como candidato a Presidente da ADEPOL pela chapa Transparência e Modernização, nas eleições que se realizaram no dia 15 de outubro de 2009. Além desta, mais duas chapas concorreram ao pleito: Avançar ainda mais nas conquistas e Coragem de vencer.

    Alega que, em razão da divergência existente entre o número de cédulas e a quantidade de votantes, apurada na lista de presentes à assembléia, a eleição foi anulada, de ofício, pela Mesa da Assembléia, conforme consta do documento de fls. 32/33 dos autos.

    Na ocasião da contagem das assinaturas constantes da lista de votação foi constatada a existência de uma assinatura a mais do que o número de cédulas. A Mesa anulou a eleição, tendo a chapa Avançar ainda mais nas conquistas recorrido, no ato, contra a decisão, requerendo que fosse realizada a contagem dos votos, pedido este que foi imediatamente negado pela Mesa. As outras duas chapas concorrentes, por seu turno, concordaram com a decisão. Salienta o autor que a urna, contendo os votos da eleição foi guardada.

    Após, a diretoria da ADEPOL, na pessoa dos réus, acima indicados, convocou assembléia geral para o dia 12 de novembro de 2009, sendo que foi indicado, como pauta da mesma a frase Eleições ADEPOL.

    Afirma o autor que muitos dos associados entenderam que se tratava, no caso, de uma assembléia para discutir o modo como seria organizado o novo processo eleitoral, uma vez que o anterior havia sido anulado e que muitos associados deixaram de comparecer ao ato. Segundo o autor, uma quantidade ínfima de associados compareceu à reunião, na qual se aprovou, pelo voto da maioria simples, que seria desconstituída a decisão da Mesa que havia anulado a eleição. Em seguida, procedeu-se à contagem das cédulas, tendo ao final se apurado que a chapa Avançar ainda mais nas conquistas havia obtido o maior número de votos na eleição.

    Neste sentido, requereu o autor a declaração da nulidade da eleição realizada no dia 15 de outubro de 2009, tendo requerido a concessão de tutela antecipada, a fim de impedir que os integrantes da chapa Avançar ainda mais nas conquistas tomassem posse, bem como para que fosse determinada a instauração de uma junta de governo provisória, responsável pela direção da associação e convocação e gerência das novas eleições, pedido este reiterado, a fim de que fosse mantido a determinação constante da tutela antecipada, no mérito da sentença a ser prolatada por este juízo.

    Ainda, requereu o autor a condenação dos requeridos em obrigação de fazer concernente à concessão de direito de resposta, mediante a veiculação de matéria de sua lavra no sítio eletrônico da ADEPOL, em razão da publicação de matéria, segundo o autor, de cunho ofensivo, a ele direcionada, elaborada pelos diretores da ADEPOL e veiculada no endereço eletrônico da própria entidade social.

    Preliminarmente, alegam os reclamados a incompetência deste Juizado Especial para o julgamento da lide proposta, alegando dever ser a matéria julgada na Justiça Comum . No pedido, os reclamados juntam vários julgados, referentes a ações que possuem semelhante causa de pedir à versada nos autos, as quais foram processadas perante a Justiça Comum.

    No entanto, em nenhum dos julgados os reclamados demonstraram haver determinação legal no sentido de impedir o processamento de tais demandas, em sede de Juizados Especiais.

    A sistemática adotada nos Juizados permite o ajuizamento de demandas cíveis de menor complexidade, elencadas no artigo , da Lei 9099/95. O inciso I deste artigo apresenta a regra geral, que abarca a competência dos Juizados Especiais em âmbito estadual, ao prever que estes são competentes para o processo e julgamento das ações cujo valor da causa não exceda a 40 (quarenta) salários mínimos.

    Ressalte-se que ficam excluídas da competência dos Juizados Especiais as causas que impliquem na adoção de procedimento especial, previstas no Código de Processo Civil, nos artigos 890 a 1.210.

    Permite-se esta conclusão, mediante interpretação, a contrario sensu, do Enunciado nº 08 do FONAJE, abaixo transcrito:

    Enunciado nº. 08 do FONAJE : As ações cíveis sujeitas aos procedimentos especiais não são admissíveis nos Juizados Especiais.

    A ação versa sobre pedido de condenação em obrigação de fazer e não fazer. Não se trata, portanto, de ação que possua procedimento especial, com regramento próprio no Código de Processo Civil, razões pelas quais não há qualquer óbice ou vedação legal à sua tramitação nos Juizados Especiais, pelo rito do procedimento comum sumário.

    Quanto à preliminar de complexidade da causa , manifesto-me pela sua rejeição. Observo que a demanda proposta não exige a realização de perícia técnica ou a realização de provas de difícil realização.

    A complexidade da causa deve ser aferida em razão da dificuldade da prova a ser produzida e não da matéria de direito em si. A alta complexidade jurídica da questão, por si só, não afasta a competência dos Juizados Especiais. Neste sentido, o seguinte Enunciado do FONAJE:

    Enunciado nº 54 : A menor complexidade da causa para a fixação da competência é aferida pelo objeto da prova e não em face do direito material.

    A preliminar de falta de capacidade processual da reclamada ADEPOL , em virtude de ser ela sociedade civil sem fins lucrativos, também não procede.

    O artigo da lei 9099/95 prevê quem não poderá ser parte nos Juizados Especiais. O mencionado dispositivo em nenhum momento alude às associações civis, de modo que basta uma análise perfunctória da norma para se afastar a preliminar argüida.

    Uma associação civil não poderia figurar no processo como autora, em razão da falta de previsão legal, pois o parágrafo 1º do artigo 8º da Lei dos Juizados não prevê esta possibilidade. No entanto, nada obsta a que a mesma seja demandada como ré, eis que o simples fato de não poder ser autora não implica na impossibilidade de atuar no pólo passivo da demanda.

    A afirmação de que uma associação civil poderia ser demandada apenas no caso de uma relação típica de consumo, não possui nenhum fundamento jurídico ou amparo legal, motivo pelo qual não merece maiores considerações.

    Por fim, suscitam os reclamados preliminar de incompetência dos Juizados em relação ao direito de resposta. Alegam que o direito de resposta versa sobre matéria de natureza eminentemente criminal, o que afastaria a competência deste Juizado Especial Cível, para processar e julgar o feito.

    Tal assertiva não merece acolhida. O direito de resposta tem assento constitucional, consoante se depreende da leitura do artigo , V, da Constituição da República: É assegurado o direito de resposta, proporcional ao agravo, além da indenização por dano material, moral ou à imagem.

    Trata-se de direito relacionado aos direitos da personalidade, tais como a honra, a intimidade, o nome etc.

    Tendo em vista a declaração de inconstitucionalidade da Lei de Imprensa, o único fundamento legal específico a tratar da matéria passou a ser a Constituição Federal. Tendo em vista que a norma constitucional ora versada tem lugar no artigo 5º, a mesma goza de aplicabilidade imediata, pois se trata de direito fundamental do cidadão, senão vejamos:

    TJRS COMARCA DE PELOTAS

    APELAÇAO Nº. 70029052743

    APELAÇAO CÍVEL. RESPONSABILIDADE CIVIL. VINCULAÇAO DO NOME DO AUTOR À COLUNA DO CAPITAO GAY, DE CUNHO HOMOSSEXUAL. NEGLIGÊNCIA DO VEÍCULO DE INFORMAÇAO E DO COLUNISTA EM DIVULGAR E-MAIL SUPOSTAMENTE ENVIADO PELO DEMANDANTE SEM VERIFICAR A PROCEDÊNCIA. DANOS MORAIS. PRELIMINARES.

    (...)

    7. DIREITO DE RESPOSTA. O direito de resposta está previsto como um direito fundamental na Constituição Federal e, como tal, não pode sofrer restrição por lei infraconstitucional. Nesse contexto, a propositura pelo ofendido, no juízo cível, de ação de indenização por danos morais com fundamento na nota publicada, não acarreta a extinção do direito de resposta (...).

    Ademais, uma vez declarada a sua inconstitucionalidade, a Lei de Imprensa perdeu sua validade, tendo sido retirada do ordenamento jurídico. Em vista disso, o entendimento de que o direito de resposta deveria ser requerido na esfera criminal, com base naquele diploma leal, deixou de ser verdadeiro. A partir da declaração da inconstitucionalidade daquela lei, cada juiz singular passou a ter competência para apreciar os pedidos de concessão de direito de resposta.

    Outrossim, nem sempre este pedido tem, em sua origem, reflexos na esfera penal. Nem sempre as informações veiculadas pelo ofensor caracterizam ilícito penal, mas podem ter repercussão, especificamente, na seara do Direito Civil.

    Vejamos o seguinte julgado:

    O direito de resposta - que não tem natureza penal e que não objetiva a aplicação de qualquer sanção criminal ao jornal ou periódico ou ao autor do escrito ofensivo - é uma típica ação de reparação de dano moral, de natureza eminentemente cível, limitada, porém, ao objetivo único de retificar a acusação ou a inverdade divulgada, em relação à qual se aplicam, por conseqüência, no que concerne à competência, as regras do Código de Processo Civil (TJRJ. AC - 2007.050.01924. JULGADO EM 25/09/2007. PRIMEIRA CÂMARA CRIMINAL - Unanime. RELATOR: DESEMBARGADOR MOACIR PESSOA DE ARAUJO) .

    O direito de resposta pode ter, portanto, natureza cível ou criminal. No presente caso, conforme, por diversas vezes, ressaltou o autor, é de se reconhecer que o intuito do mesmo, ao requerer a proteção jurisdicional, consiste unicamente em obter o direito de resposta, sem imputar à parte contrária a prática de nenhum crime contra a sua honra. O autor busca, tão somente, o direito a se manifestar acerca das alegações que foram feitas contra si, no sítio eletrônico da associação, razão pela qual rejeito a preliminar oposta.

    Superadas as preliminares opostas, passo a analisar o mérito da demanda.

    Quanto ao direito de resposta pleiteado , entendo que a decisão concedida em sede de tutela antecipada, merece ser confirmada.

    Vale ressaltar, por oportuno, o mau uso que fez a direção da ADEPOL do sítio da associação, com o objetivo de responder a um texto, de autoria do reclamante e veiculado no blog da sua chapa.

    O sitio da associação deve servir para a veiculação de matérias de conteúdo informativo, relacionadas à própria associação, sendo um instrumento a ser utilizado em prol da coletividade, e não em benefício de uma minoria, ainda mais no caso de ser esta minoria a detentora da direção da associação.

    O sítio da associação não se presta à divulgação de manifestações de cunho pessoal, em especial se estas manifestações puderem influir no resultado de uma eleição, tal como se verificou no presente caso.

    O mais grave é que a notícia veiculada no sítio da associação é de autoria do, à época, Secretário Geral da Associação e candidato a tesoureiro nas eleições, pela chapa que representa a situação, qual seja, Avançar ainda mais nas conquistas.

    O autor publicou nota no blog da sua chapa, Transparência e Modernização, intitulada A verdade sobre a isonomia dos delegados de polícia do Pará. Trata-se de manifestação legítima, dentro do regular processo eleitoral.

    Entendo que a resposta da chapa concorrente, Avançar ainda mais nas conquistas, intitulada A verdade sobre a isonomia dos delegados de polícia do Pará revisitada, caso houvesse sido veiculada em sítio eletrônico próprio, representaria legítima manifestação, em um processo eleitoral democrático.

    No entanto, a direção da ADEPOL, que fazia parte da chapa Avançar ainda mais nas conquistas fez uso do sítio eletrônico da associação para responder ao texto do autor. Além disso, a resposta apresenta argumentos capazes de influir na eleição que se avizinhava, como se demonstra, exemplificativamente, da transcrição da seguinte passagem:

    Então, pensem, nobres colegas delegados e delegadas, será que diante de tantos desatinos, esse grupo que no momento se candidata a dirigir a ADEPOL, merece nosso voto? Vocês imaginaram se numa peça de interesse dos delegados, um dirigente classista viesse a cometer tamanhos erros? No mínimo passaríamos vergonha perante a opinião pública e a outros operadores do Direito.

    Resta claramente demonstrado o caráter ofensivo do texto publicado no sítio da ADEPOL, importando em prejuízo à imagem do reclamante, o qual era candidato a presidente da ADEPOL.

    Segundo o autor, por duas vezes o mesmo encaminhou nota para ser publicada no sítio da ADEPOL, buscando se defender, mas não obteve o mesmo direito oportunizado à chapa da qual fazem parte os dirigentes, à época, da associação.

    A atitude da direção da ADEPOL atenta contra a democracia e à igualdade, além de ferir o regular desenvolvimento do processo eleitoral, ao fazer mau uso da máquina administrativa.

    O simples fato de ter a publicação do texto pela direção da ADEPOL veiculado notícia capaz de influir no resultado da eleição é suficiente para atribuir ao reclamante o direito de ter a sua manifestação publicada, no mesmo endereço eletrônico no qual foi publicado o texto que se pretende atacar, por igual período em que este foi mantido no sítio eletrônico, e no mesmo local do sítio.

    Trata-se de uma forma de assegurar, em tese, que o texto contendo a resposta do autor, será lido ou, ao menos, ficará acessível por um universo semelhante de pessoas que tiveram acesso ao texto impugnado, de forma a prestigiar a norma constitucional inscrita no inciso quinto, do artigo quinto da Constituição da República.

    Assim, entendo que, em conformidade com os chamados princípios da igualdade de armas ou princípio da equivalência, a resposta deve ser formulada nas mesmas condições do texto que a desencadeou, notadamente na sua extensão, inserção e forma de apresentação, dado que se pretende conferir-lhe o mesmo relevo, para que possa atingir, com a mesma intensidade, sensivelmente o mesmo universo de pessoas que teve acesso ao texto contraposto.

    Trata-se, tão somente, da aplicação do artigo , V da Carta Magna, ao presente caso: "É assegurado o direito de resposta , proporcional ao agravo (...)" . Neste sentido:

    Ainda que inexistente o animus injuriandi, é princípio ético oferecer, a quem tenha sido afetado, o direito de resposta, a ocorrer, no mesmo horário e dia correspondente àquele em que foi enunciado o comentário - Recurso provido. (Tribunal de Justiça de São Paulo. Apelação Cível n. 258.854-1 - Lins - 4ª Câmara de Direito Privado - Relator: Fonseca Tavares - 08.08.96 - V. U.)

    Por outro lado, ressalto que a resposta deve se circunscrever ao objeto da réplica, sem exceder ao necessário para corrigir os fatos inexatos ou inexistentes da informação.

    Não pode, portanto, o autor fazer uso do seu direito de resposta para ofender, nem atacar a honra ou imagem dos autores do texto impugnado. Não se trata de direito de vingança, sob pena de prestigiarmos e estimularmos a conservação de uma situação litigiosa.

    O direito de resposta deve ser usado de forma razoável, de modo que a resposta guarde relação de proporcionalidade com a ofensa. Deve a resposta se restringir unicamente a refutar as ofensas, deve ser proporcional ao agravo, não podendo servir de retorsão. Neste sentido, vejamos:

    No que tange ao processo eleitoral para indicação da nova direção da associação , os reclamados sustentam a legalidade de todos os atos praticados no decorrer do processo, que se concluiu com a eleição da chapa Avançar ainda mais nas conquistas.

    Alegam que a Mesa da Assembléia, responsável pelas eleições, na decisão que declarou a nulidade destas deixou consignado em ata que aquela decisão seria válida, até ulterior deliberação, consoante se depreende da ata daquela assembléia, juntada aos autos.

    Para os reclamados, tal fato relegou a decisão final da questão ao órgão soberano da associação, ou seja, a Assembléia Geral, a qual se deu em 12 de novembro de 2009. Na ocasião, foi aprovada, após votação realizada entre os presentes, a proposta de se contar os votos constantes da uma eleitoral e proclamar os eleitos.

    Conforme antes já se afirmou, a chapa vencedora foi a Avançar ainda mais nas conquistas, tendo a mesma tomado posse no dia 14 de dezembro de 2009.

    Entendo que a validade das decisões tomadas pela direção da associação, após a realização das eleições, inclusive a pertinente à convocação de uma assembléia para deliberar sobre a possibilidade de se apurar o resultado da votação, depende, necessariamente, da apreciação da legalidade do ato da Mesa eleitoral.

    Invocando o dispositivo contido no artigo 70, parágrafo 3º, do estatuto da ADEPOL, a Mesa da Assembléia optou por anular o pleito eleitoral, em razão de restar constatada uma divergência entre o número de cédulas e a quantidade de eleitores votantes.

    Perfeita foi a decisão tomada pela Mesa. Vivemos sob a égide de um Estado Democrático de Direito, o qual tem como um dos seus princípios o da legalidade. Este atua não só como um meio de ordenação racional, com regras, formas e procedimentos que excluem o arbítrio e a prepotência, mas como a busca efetiva de concretização da igualdade social.

    Outro postulado do Estado Democrático de Direito é a igualdade. Todos são iguais perante a lei. As regras existem e devem ser obedecidas por todos, sob pena de subvertermos a ordem jurídica em benefício de uma minoria, capaz de impor a sua força através da manipulação do poder, em detrimento de toda uma classe.

    O estatuto da associação previa a hipótese de anulação das eleições, na hipótese versada no parágrafo 3º do artigo 70, adequável à presente discussão. Vale ressaltar que em nenhum momento o estatuto dá margem a interpretação diversa ou a uma possibilidade de convalidação da situação.

    Negar aplicação a esta regra, previamente discutida, votada e aprovada, mediante assembléia integrada pelos próprios membros da associação, implicaria uma séria ameaça à segurança jurídica e à estabilidade das relações entre os associados.

    A alegação dos reclamados, de que a decisão da Mesa eleitoral condicionou a anulação das eleições, ao dispor que aquela decisão seria válida até ulterior deliberação, não possui lógica. A regra prevista no parágrafo 3º do artigo 70 do estatuto não permite condicionantes e tem força por si só, para determinar a nulidade da eleição, caso ocorra a hipótese nela versada.

    Não prospera, igualmente, o argumento de que a expressão até ulterior deliberação teria atribuído a decisão final do pleito a uma assembléia geral, por se considerar que esta é o órgão soberano da associação.

    Ora, em nenhum momento ali se disse que a decisão teria de ser convalidada em assembléia geral ou que se submetia a análise judicial ou qualquer outra deliberação. A eleição foi declarada nula, sem condicionantes. A expressão até ulterior deliberação, a meu ver, pode ser caracterizada como uma expressão infeliz, que simplesmente não disse a que veio e não merece ser considerada.

    Com relação ao procedimento previsto no parágrafo 1º, do artigo 72 do estatuto, observo que o mesmo diz respeito apenas ao resultado de uma eleição que tenha ocorrido o empate, o que não guarda relação com o caso sob apreciação.

    Ainda que se considerasse aplicável o dispositivo supramencionado, é de se atentar que o procedimento correto, nele apontado, indica a realização de nova votação no mesmo dia, por meio de uma assembléia permanente e contínua, a fim de se garantir que os associados que votaram no pleito inicial estejam presentes para participar da segunda votação, fato este que não ocorreu, tendo sido, em verdade, convocada nova assembléia, não para deliberar sobre a realização de uma nova eleição, mas sim para determinar, simplesmente, a contagem dos votos e proclamar o vencedor.

    A afirmação de que houve a incoincidência de apenas um voto, que em nada interferiu no resultado da eleição merece severas críticas. O fato de não coincidir a quantidade de votos com o número de votantes macula a eleição, traz suspeitas, faz presumir a existência de irregularidades, que não podem ser sanadas. O processo eleitoral deve ser realizado da forma mais escorreita possível, de modo a não deixar dúvidas sobre a sua regularidade. A vitória a qualquer custo, ignorando a disposições legais atenta contra a democracia, desprestigia a classe, torna ilegítimos os vencedores.

    Não se discute se a chapa vencedora teve número bastante superior de votos do que as demais, o que ficou constatado após a abertura da urna eleitoral, e se isso bastaria para legitimá-la a ser proclamada como vencedora no pleito. O que se quer afirmar é que a urna sequer deveria ter sido aberta, pois a eleição, por força de disposição estatutária, já estava comprometida irremediavelmente, tanto é que fora declarada nula pela Mesa. Assim, o ato de abertura da urna não tem repercussão nenhuma no resultado da eleição, eis que o pleito já havia sido anulado.

    Ademais, entendo que o procedimento para a convocação da assembléia que deliberaria sobre o resultado das eleições também foi irregular. Não restou explicitado aos associados o real objeto daquela assembléia. Na convocação dos associados, foi apresentada a seguinte pauta: ELEIÇÕES ADEPOL, o que contraria o dispositivo contido no artigo 40, parágrafo 1º, do estatuto, a seguir transcrito:

    Art. 40. (...)

    1º. A convocação será feita, obrigatoriamente, mediante edital de convocação, do qual especificamente constará a pauta dos trabalhos a serem realizados na sessão, distribuída aos associados ou afixada em lugar próprio e visível, em dependência acessível ao corpo social da Sede Social e na Secretaria de Estado de Segurança Pública, com, no mínimo, cinco (05) dias de antecedência.

    Deste modo, ainda que não viesse a ser declarada nula a eleição, restaria irregular o procedimento adotado pela direção da associação, por desobediência ao estatuto, tornando ilegítimo o resultado final do pleito.

    Diante de tudo o que se expôs, dos documentos e provas produzidos pelo autor nos autos, entendo que houve, de fato, irregularidades na conduta dos réus, de forma que o reclamante logrou êxito na comprovação do direito pleiteado, conforme determina o artigo 333, inciso I, do Código de Processo Civil.

    Isto posto, julgo PROCEDENTE os pedidos do autor, para, confirmando os efeitos nos quais foi concedida a decisão antecipatória de tutela, condenar os reclamados nas seguintes obrigações de fazer: a) publicar edital para a convocação de uma assembléia geral, a fim de eleger uma junta provisória para realizar a administração da ADEPOL e ficar responsável pela convocação de novas eleições gerais para os cargos de direção da referida associação, obedecendo-se, para tanto, as regras e prazos previstos no Estatuto da entidade, no prazo já fixado na tutela antecipada concedida, observando-se que, em caso de descumprimento, incidirá a multa diária ali estipulada; b) fazer publicar, no endereço do sítio eletrônico da ADEPOL dos textos O avesso do avesso e A verdade sobre as eleições da ADEPOL 2009, também sendo obedecidos os prazos já determinados na decisão concedida nos autos, em sede de tutela antecipada, inclusive com a incidência da multa diária, em caso de descumprimento.

    Resta, portanto, extinto, o presente processo com resolução do mérito, com esteio no inciso I do art. 269 do Código de Processo Civil.

    Sem condenação em custas ou honorários advocatícios, nos termos do art. 54, caput e 55 da Lei 9099/95 P. R. I.

    Belém, 29 de janeiro de 2010.

    LUANA DE NAZARETH A.H. SANTALICES

    Juíza de Direito

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