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5 de Maio de 2024
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    Justiça de Sertãozinho autoriza conversão de união estável homossexual em casamento

    C O N C L U S Ã O

    Em 19 de agosto de 2011, faço estes autos conclusos a Exma. Sra. Dra. Mayra Callegari Gomes de Almeida , MMa. Juíza de Direito. Eu, ___________ , Escrevente Técnico Judiciário, digitei.

    Vistos, V.L.F.S e C.K.K, ambas qualificadas nos autos, requereram a conversão da união estável em que vivem, em casamento. O pedido inicial foi acompanhado dos documentos pessoais das partes envolvidas; do contrato de união estável registrado em Cartório, em 18 de março de 2010; de declarações de testemunhas.

    Publicou-se edital de proclamas e expediu-se certificado de habilitação.

    O I. Representante do Ministério Público, em parecer muito bem fundamentado, opinou favoravelmente ao pedido.

    É o relatório.

    DECIDO.

    O pedido inicial é no sentido de se converter união estável em casamento.

    É sabido que a conversão de união estável em casamento é permitida juridicamente, bem como seu procedimento administrativo se encontra regulamentado pelas Normas de Serviço da Corregedoria Geral da Justiça de São Paulo.

    Com efeito, para o deferimento de referida conversão, necessária a instauração de procedimento de habilitação, através de pedido formulado por ambos os conviventes, dirigido ao Oficial do Registro Civil das Pessoas Naturais de seu domicílio.

    Trata-se de procedimento simples. Vale dizer, com o recebimento do pedido, o Sr. Oficial de Cartório providencia a publicação de editais e, estando em termos o pedido (inexistentes impedimentos legais para o casamento), lavra-se o assento de conversão de união estável em casamento, sem necessidade de qualquer solenidade de celebração.

    No caso, os requisitos objetivos e formais, exigidos para a conversão da união estável em casamento foram absolutamente cumpridos, restando à análise a peculiaridade de serem os requerentes da conversão da união estável em casamento, pessoas do mesmo sexo.

    Referida particularidade, nos dias atuais, não pode configurar óbice para a formalização de união entre pessoas, com intenção de formar um núcleo familiar, como no caso.

    Não obstante não haja norma expressa a permitir que se formalize a união homoafetiva e se passe a denominá-la casamento, há dispositivos legais e constitucionais que tendem a esta permissão.

    E mais, a somatória de referidos dispositivos e princípios legais e constitucionais, com a evolução das relações sociais, obriga ao reconhecimento e formalização das uniões entre pessoas do mesmo sexo, porque não, denominando-as de casamento.

    O princípio constitucional da igualdade; o impedimento constitucional da manifestação de qualquer tipo de preconceito; a equiparação constitucional da união estável ao casamento; o reconhecimento constitucional da entidade familiar como a entidade formada pelos pais e seus descendentes, ou apenas um daqueles e estes, são regras que, interpretadas, podem dar fundamento legal à formalização do casamento homoafetivo.

    Esta evolução legislativa é daquelas que adveio da evolução da própria sociedade, suas relações e comportamentos.

    E, em razão desta evolução comportamental, houve evoluções na forma de decidir-se, judicialmente, seguida da lenta adequação legislativa.

    Deste modo, é de crer-se que o reconhecimento expresso da formalização do casamento homoafetivo advenha da evolução, muito mais dinâmica, da sociedade e das decisões judiciais favoráveis.

    Sem adentrar na discussão acerca da homossexualidade - suas causas, razões e conseqüências -, já que é questão posta e, seu reconhecimento e respeito são, inclusive, imposição constitucional, de rigor o deferimento da conversão da união estável entre Vera Lúcia e Cátia, em casamento.

    Diante do exposto, HOMOLOGO a declaração de vontades das requerentes e CONVERTO a união estável em que vivem, em CASAMENTO , pelo regime de bens escolhido, qual seja, o da COMUNHÃO PARCIAL DE BENS , sendo que, por força do casamento, V.L.F.S. passa a chamar-se V.L.F.K., e, por sua vez, C. K.K. manterá seu nome inalterado.

    A presente decisão tem efeitos imediatos, já que substitui o ato de celebração.

    Lavre-se o registro de casamento e providencie-se as averbações pertinentes nos registros de nascimento das partes.

    Nada sendo requerido em 30 dias, arquivem-se.

    Int.

    Sertãozinho, 29 de agosto de 2011

    Mayra Callegari Gomes de Almeida

    Juíza de Direito

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    Protocolo nº 180/2011.

    Senhora Magistrada:

    Vera Lúcia Ferreira Silva e Cátia Keiko Koto se amam e, por isso, pretendem ver o Estado, enquanto ordem jurídica organizada, reconhecendo a união advinda deste sentimento mais nobre, e o proteger, sob a veste do casamento. Buscam, assim, a conversão da união estável, já registrada em cartório, neste. Renato Manfredini Junior , bissexual assumido (Wikipédia acessada em 12.08.2011), legou-nos, embora em prosa, poesia das mais belas, inesquecível, nas letras de "Pais e Filhos": É preciso amar as pessoas como se Não houvesse amanhã. Porque se você parar para pensar, Na verdade não há . O Senhor Ministro Ayres Brito, no julgamento da ADI 4277 em conjunto com a ADPF 132 (publicamente conhecida como ADPF da união estável homoafetiva), enfatizou: "...Trata-se, isto sim, de uma união essencialmente afetiva ou amorosa,a implicar um voluntário navegar emparceirado por um rio sem margens fixas e sem outra embocadura que não seja a confiante entrega de um coração aberto a outro. E não compreender isso talvez comprometa por modo irremediável a própria capacidade de interpretar os institutos jurídicos há pouco invocados, pois - é Platão quem o diz -, “quem não começa pelo amor nunca saberá o que é filosofia" . É a categoria do afeto como pré-condição do pensamento, o que levou Max Scheler a também ajuizar que "O ser humano, antes de um ser pensante ou volitivo, é um ser amante” ..." O Estado, enquanto ordem jurídica soberana, em determinado território, e jungido a um determinado povo, foi concebido para, em síntese,três tarefas básicas: a) organizar; b) assegurar meios necessários à formação e constituição humana; e,c) promover a segurança de todos. O Estado Moderno, outrossim, cuja data de nascimento dá-se no século XV, evoluiu para o Estado Constitucional, sobremodo, com as Revoluções Inglesa, Americana e Francesa; inegavelmente, em todas as três, sob a égide do Iluminismo, pregou-se a necessidade de se valorizar o humano frente ao Estado, impedindo-o de abusar do cidadão, por isso prestações negativas do Estado, de se abster de importunar a liberdade do homem, todos iguais; é, nesta época, em que nascem os Direitos de Igualdade e Liberdade; mais à frente, diante das necessidade sociais eclodidas na revolução industrial, surgem os Direitos Sociais, as prestações positivas do Estado, garantindo o Bem Estado dos cidadãos; com as atrocidades do século XX, ingressamos neste primeiro quartel do século XXI sob a égide da alteridade Estatal, social, constitucional. É hora do ser humano importar-se com o outro, e, não, apenas consigo mesmo e suas idiossincrasias. Infelizmente, a dogmática jurídica brasileira preocupa-se demais com o postulado democrático da "soberania popular", e, esquece-se que, em verdade, a democracia não é, e não se aprofunda tão somente em eleições. A democracia grega sobreviveu mais de vinte séculos na medida em que é o único regime de sociedade a permitir e garantir liberdade e igualdade. Não por menos, é na Democracia que se garantem os direitos e deveres da maioria, mas, sobretudo, na garantia de respeitar-se as minorias. Excluindo as minorias, voltamos à tirania ou oligarquia ou aristocracia. É, por conseguinte, em preservando as minorias e seus direitos que garantimos a existência da Democracia. Este regime é, por natureza, único apto aceitar e apaziguar em seu seio as tensões próprias, típicas e atípicas, da sociedade humana. Sim, porque viver em sociedade, fato cultural por excelência, é viver sob tensões constantes, de todas as ordens; talvez, gostariam que outro fosse o regime, impondo o seu modo de vida, suas ambições, excluindo obstáculos adversos, com destaque, excluindo as minorais do quadrante e do horizonte. Mas pergunto, o que são maioria e minoria? É posição imutável? Não! Mão é. A Tensão social é tamanha que, em certa oportunidade pode-se dizer ingressar no grupo da maioria, contudo, em oportunidade distinta, a depender do assunto e das relações havidas, aquela mesmo pessoa, maioria outrora, vê-se em desvantagem, neste novo assunto e relação social, ingressando na condição de minoria. Nesta medida, e breves palavras, é, na Democracia, que nos refugiamos, enquanto seres humanos, para nos vermos protegidos, organizados e em desenvolvimento. A Democracia, por conseguinte, imbrica-se numa categorial jurídica essencial para valer-se desta falada elasticidade aglutinativa; são os direitos fundamentais. Direitos Fundamentais devem estar expressos ou decorrer dos Princípios acolhidos pela ordem Constitucional de uma nação democrática. São, em suma, expressões que revelam "posições jurídicas das pessoas enquanto tais, com eficácia no âmbito das relações com o Estado ou entre particulares, consubstanciados ou não na Constituição" . Sobre as posições jurídicas, três estágios é de se asseverar: a) Liberdade jurídica que, segundo a obra citada "concerne à esfera de ação pessoal imprescindível ao asseguramento da dignidade da pessoa humana; b) direito a ação negativa -" necessidade de abstenção de interferências ilegítimas "e, c) direito a ações positivas -" à possibilidade de serem exigidas prestações positivas do sujeito passivo ".

    De parte disso, infere-se das lições do Professor Luís Roberto Barroso, da Universidade Estadual do Rio de Janeiro, na clássica obra" Curso de Direito Constitucional Contemporâneo ", o âmbito subjetivo e objetivo dos Direitos Fundamentais, sendo que, sob o prisma subjetivo, revela-se em direito de defesa dos indivíduos em face do estado, e, sob o objetivo:"a de instituir uma ordem objetiva de valores. O sistema jurídico deve proteger determinados direitos e valores, não apenas pelo eventual proveito que possam trazer a uma ou algumas pessoas, mas pelo interesse geral da sociedade na sua satisfação"; nesta linha, tomo emprestado nota de rodapé do citado livro, bem a calhar no presente, sobre precedente do Tribunal Constitucional Alemão"Os direito fundamentais são antes de tudo direitos de defesa do cidadão contra o Estado; sem embargo, nas disposições de direitos fundamentais da lei Fundamental se incorpora também uma ordem objetiva de valores, que como decisão constitucional fundamental é válida para todas as esferas do direito. (...) Esse sistema de valores - que encontra seu ponto central no seio da comunidade social, no livre desenvolvimento da personalidade e na dignidade da pessoa humana...- oferece direção e impulso para o legislativo, a administração e o judiciário, projetando-se, também, para o direito civil. Nenhuma disposição do direito civil pode estar em contradição com ele, devendo todas ser interpretadas de acordo com seu espírito...". Nesta linha, é até mesmo de se indagar da necessidade do Estado regulamentar o Casamento, se não seria de sua índole normativa, normatizar apenas os efeitos da união entre pessoas. Todavia, o que se busca, em ultima análise, na autorização deste procedimento é a segurança jurídica da união homoafetiva, e os efeitos dela decorrente em beneficio dos conviventes, bem ainda, proteger e ressaltar a dignidade da pessoa humana; de efeito, não é tarefa das mais fáceis pontuar-se como" minoria "; como assinalado supra, não fossem a soma de Constitucionalismo (limitação do poder e Supremacia da Constituição) e Democracia (soberania popular e governo da maioria), não haveria espaço para os Direitos Fundamentais. Por certo, estes, como posições jurídicas a tutelar as liberdades, e limitar a atuação estatal, autoriza pensar que, viver em sociedade, é viver entre diferentes; garantir-lhes a existência, expressão e dignidade é objetivo de uma ordem constitucional justa. Não por menos, todas as" fobias "- xenofobia, homofobia, etc, - possuem na violência, discriminação e preconceito o alvo de suas necessidades; em recente e lamentável episodio, cidadão norueguês expôs sua especial maneira de pensar as relações sociais, matando mais de 100 pessoas em seu pacifico país, por trás, ataques embalados pela xenofobia; no Brasil, não é diverso, tão somente, a" fobia "almejada - homofobia -, ocorrendo, com freqüência, ataques brutais, covardes e desprovidos de quaisquer justificativas legais, contra pessoas que nutrem relações de afeto homoafetivas; o padrão é o mesmo: violência gratuita. É, portanto, dever do Estado assegurar aos homossexuais que possam desenvolver, enquanto cidadãos como qualquer outro, seus afetos e carinhos, cabendo a todos nós respeitá-los. Dar-se-á, tal estágio quase inimaginável há poucas décadas passadas, passando-o para realidade concreta e social cotidiana, com o asseguramento de direitos, mormente, pelo Poder Judiciário, ante a omissão legislativa. De efeito, conforme observado na obra Sociologia do Direito: "O Direito é fato social (...). A norma jurídica, portanto, é um resultado da realidade social. Ela emana da sociedade, por seus instrumentos e instituições destinados a formular o direito, refletindo o que a sociedade tem como objetivos, bem como suas crenças e valorações, o complexo de seus conceitos éticos e finalísticos (...) Os condicionamentos socioculturais da normatividade jurídica, destarte, se mostram claros e indiscutíveis. Às modificações do complexo cultural de uma sociedade correspondem, a seguir, alterações na sua ordem jurídica. Tais modificações são verificadas com maior ou menor celeridade, dependendo de diversos fatores incidentes sobre o processo social...". Os mais ferrenhos, conservadores da tradição passada, não pouparam críticas à decisão da Corte Suprema do Brasil, brilhante jurista chegou a pública em Jornal de Grande Circulação �- FSP �-que família só é aquela formada por homem e mulher com capacidade de gerar prole (excluiu, portanto, de seu conceito, casais heteroafetivos sem condições de prole); De parte disso, insuperável a lição do Professor Luís Roberto Barroso, na obra supra citada : "As constituições têm vocação de permanência. Idealmente, nelas têm abrigo as matérias que, por sua relevância e transcendência, devem ser preservadas da política ordinária. A constitucionalização retira determinadas decisões fundamentais do âmbito de disposições das maiorias eventuais. Nada obstante, isso, as Constituições não são eternas nem podem ter a pretensão de ser imutáveis. Uma geração não pode submeter a outra aos seus desígnios. Os mortos não podem governar os vivos". Logo, todos os sistemas constitucionais prevêem mecanismos de reformas constitucionais, quer formais (procedimento) quer informais (interpretação); de efeito, a informalidade da alteração através " da transformação do sentido e do alcance de normas constitucionais, sem que se opere, no entanto, qualquer modificação do seu texto ". Especificamente, a mutação constitucional dar-se-á quando ocorrer" ...uma mudança da realidade fática ou de uma nova percepção do direito, uma releitura do que deve ser considerado ético ou justo ", conforme Barroso nos ensina, e ainda: "A conclusão a que se chega é a de que além do poder constituinte originário e do poder de reforma constitucional existe uma terceira modalidade de poder constituinte: o que se exerce em caráter permanente, por mecanismos informais, não expressamente previstos na Constituição, mas indubitavelmente por ela admitidos, como são a interpretação de suas normas e o desenvolvimento de costumes constitucionais. Essa terceira via já foi denominada por célebre publicista francês poder constituinte difuso, cuja titularidade remanesce no povo, mas que acaba sendo exercido por via representativa pelos órgãos do poder constituído, em sintonia com as demandas e sentimentos sociais, assim como em casos de necessidades de afirmação de certos direitos fundamentais". Nossa Suprema Corte, doravante, analisando o processo objetivo (a lei em si, inexistindo caso concreto) de controle de constitucionalidade de legislação ordinária, mormente o novo Código Civil, em seu artigo 1723, julgou procedente a ADI 4277 - DF e a ADPF 132-RJ para, na iluminada sabedoria do Ministro Relator Ayres Brito: " ...para dele excluir qualquer significado que impeça o reconhecimento da união contínua, pública e duradoura entre pessoas do mesmo sexo como "entidade familiar" , entendida esta como sinônimo perfeito de "família". Reconhecimento que é de ser feito segundo as mesmas regras e com as mesmas conseqüências da união estável."Importante, desde já ressaltar, que o pedido principal das ações de controle de constitucionalidade referidas, jungia-se em dar interpretação conforme a constituição; tal pleito é previsto no Regimento Interno do STF e autoriza reconhecer que a norma infraconstitucional não é inconstitucional, ao revés, um dos significados que lhe querem impor é que, sim, revela-se contrário à Lei Fundamental; ou seja, o artigo 1723 do CC não foi extirpado do ordenamento jurídico, apenas deixa-se de ter validade ou eficácia qualquer interpretação que restrinja a correta aplicação do citado artigo legal, conforme determinado pela Colenda Corte. A Interpretação Conforme a Constituição, em singelas linhas: "Destina-se ela à preservação da validade de determinadas normas suspeitas de inconstitucionalidade, assim como à atribuição de sentido às normas infraconstitucionais da forma que melhor realizem os mandamentos constitucionais. Como se depreende da assertiva precedente, o principio abriga, simultaneamente, uma técnica de interpretação e um mecanismo de controle de constitucionalidade. Como técnica de interpretação, o princípio impõe a juízes e tribunais que interpretem a legislação ordinária de modo a realizar, da maneira mais adequada, os valores e fins constitucionais. Vale dizer: entre interpretações possíveis, deve-se escolher a que tem mais afinidade com a Constituição. Um exemplo: depois de alguma hesitação, a jurisprudência vem reconhecendo direitos previdenciários a parceiros que vivem em união estável homoafetiva (i.e., entre pessoas do mesmo sexo). Mesmo na ausência de norma expressa nesse sentido, essa é a inteligência que melhor realiza a vontade constitucional, por impedir a desequiparação de pessoas em razão de sua orientação sexual. Como mecanismo de controle de constitucionalidade, a interpretação conforme a Constituição permite que o intérprete, sobretudo o tribunal constitucional, preserve a validade de uma lei que, na sua leitura mais óbvia, seria inconstitucional. Nessa hipótese, o tribunal, simultaneamente, infirma uma das interpretações possíveis, declarando-a inconstitucional, e afirma outra, que compatibiliza a norma com a Constituição. Trata-se de uma atuação � corretiva� , que importa na declaração de inconstitucionalidade sem redução de texto. Figura próxima, mas não equivalente, é a da interpretação conforme a Constituição para declarar que uma norma válida e em vigor não incide sobre determinada situação de fato. Em qualquer caso, o princípio tem por limite as possibilidades semânticas do texto". Da Jurisprudência do Pretório Excelso já se retirava os seguintes julgados sobre o tema: ADIn 581/DF, Rel. Min. Março Aurélio, voto do Ministro Celso de Mello -"A incidência desse postulado permite, desse modo, que, reconhecendo-se legitimidade constitucional a uma determinada proposta interpretativa, excluam-se as demais construções propiciadas pelo conteúdo normativo do ato questionado. Não é o caso, até porque já decidido pelo STF, em caráter vinculante, imiscuir sobre a diferença entre regra e principio constitucional, ambas espécie do gênero norma constitucional; contudo, de rigor, fugazmente, mencionar que a regra é aplicada sob a técnica da subsunção, enquanto o principio, a da ponderação. De efeito, o artigo 1723 do CC, de inicio, encontra no § 3º do artigo 226 sua fonte de legitimidade; contudo, fora contrastado com o principio constitucional previsto no artigo 5º, caput; com o previsto no inciso III do artigo da CF/88 e com o inciso IV do artigo 3º da mesma Lei Fundamental; ou seja, com os princípios da igualdade; liberdade; dignidade da pessoa humana e, ao fim, com a explícita previsão constitucional dos objetivos fundamentais deste País: Promover o bem de todos, sem qualquer forma de preconceito. Nesta baila, em sendo articulados princípios constitucionais a enfrentar o tema, nada impede de, pela técnica da ponderação, restringir o alcance daquele previsto no § 3º do artigo 226, para, em interpretação conforme, autorizá-la a que garante equiparação, para efeitos de proteção do Estado e da ordem jurídica, a união estável heteroafetiva e homoafetiva. A restrição da eficácia e aplicação de um principio, num determinado caso, não impede revigorá-lo em outro; ou seja, ele não foi revogado, apenas cedeu força frente a outros, pela ponderação de todos, diante do caso concreto. É preciso, pois, ainda, destacar que, ao reconhecer como objetivo fundamental (inciso IV do artigo 3º) a promoção de todos - promover o bem de todos, sem preconceitos de origem, raça, sexo, cor, idade e quaisquer outras formas de discriminação �- nossa Carta maior está a indicar que, das tensões tipicamente sociais, a serem regidas pela ordem constitucional, emergem preconceitos de raça, sexo, etc... ou seja, a Constituição Federal ao pregar que sejam eliminadas, assim o faz porque sabe que preexistem à ela. É, pois, nosso dever, e, quem sabe, nossa salvação, comungar de uma sociedade livre de preconceitos de qualquer origem, espécie, sobretudo, daqueles cujas origens repousam em padrões morais duvidosos, permitindo manter a afetividade e o amor das pessoas, que mal algum faz a quem quer que seja, em posição de inferioridade ao seu juízo moral suspeito; pois o ser humano é ser humano pelo simples fato de existir, não escolhe ser. A Decisão do STF, ao contrário do que muitos dizem por ai, permite, sim, a conversão de união estável homoafetiva em casamento e, também, o casamento direto. Ao equiparar a figura da união estável homoafetiva àquela formada por homem e mulher, explicitamente, garantiu a proteção do Estado e a garantia de todos os efeitos desta decorrente. Oras, há, assim, uma única união estável, seja formada por pessoas de mesmo sexo, seja aquela por sexos opostos; independente, qualquer que seja, pode-se, à luz § 3º do artigo 226, conforme a interpretação dada pelo STF, convertê-la em casamento! Ou seja, expressa-se através desta conversão a equiparação entre ambas uniões estáveis e isto ficou claríssimo no voto condutor do Ministro Ayres Brito que, por ser elucidativo, transcrevo seus três últimos parágrafos: “ II.4. que as diferenças nodulares entre “união estável” e “casamento civil” já são antecipadas pela própria Constituição, como, por ilustração, a submissão da união estável à prova dessa estabilidade (que só pode ser um requisito de natureza temporal), exigência que não é feita para o casamento. Ou

    quando a Constituição cuida da forma de dissolução do casamento civil (divórcio), deixando de fazê-lo quanto à união estável (§ 6º do art. 226). Mas tanto numa quanto noutra modalidade de legítima constituição da família, nenhuma referência é feita à interdição, ou à possibilidade,de protagonização por pessoas do mesmo sexo. Desde que preenchidas, também por evidente, as condições legalmente impostas aos casais heteroafetivos. Inteligência

    que se robustece com a proposição de que não se proíbe nada a ninguém senão em face de um direito ou de proteção de um interesse de outrem .E já vimos que a contraparte específica ou o focado contraponto jurídico dos sujeitos homoafetivos

    só podem ser os indivíduos heteroafetivos, e o fato é que a

    tais indivíduos não assiste o direito à não-equiparação jurídica com os primeiros. Visto que sua heteroafetividade em si não os torna superiores em nada. Não os beneficia com a titularidade exclusiva do direito à constituição de uma

    família. Aqui, o reino é da igualdade pura e simples, pois não se pode alegar que os heteroafetivos perdem se os homoafetivos ganham . E quanto à sociedade como um todo, sua

    estruturação é de se dar, já o dissemos, com fincas na fraternidade, no pluralismo e na proibição do preconceito, conforme os expressos dizeres do preâmbulo da nossa Constituição do inciso IV do seu art. ; III �- salto para o § 4º do art. 226, apenas para dar conta de que a família também se forma por uma terceira e expressa modalidade, traduzida na concreta existência de uma “comunidade formada por qualquer dos pais e seus descendentes”. É o que a doutrina entende por “família monoparental”, sem que se possa fazer em seu desfavor, pontuo, qualquer inferiorizada

    comparação com o casamento civil ou união estável. Basta pensar no absurdo que seria uma mulher casada enviuvar e manter consigo um ou mais filhos do antigo casal, passando a ter que suportar o rebaixamento da sua família à condição de “entidade familiar”; ou seja, além de perder o marido, essa mulher perderia o status de membro de uma consolidada família. Sua nova e rebaixada posição seria de membro de uma simplória “entidade familiar”, porque sua antiga família morreria com seu antigo marido. Baixaria ao túmulo com ele. De todo modo, também aqui a Constituição é apenas enunciativa no seu comando, nunca taxativa, pois não se pode recusar a condição de família monoparental àquela constituída, por exemplo, por qualquer dos avós e um ou mais netos, ou até mesmo por tios e sobrinhos. Como não se pode pré-excluir da candidatura à adoção ativa pessoas de qualquer preferência sexual, sozinhas ou em regime de emparceiramento . Por último, anoto que a Constituição Federal remete à lei a incumbência de dispor sobre a assistência do Poder Público à adoção, inclusive pelo estabelecimento de casos e condições da sua (dela, adoção)

    efetivação por parte de estrangeiros (§ 5º do art. 227); E também nessa parte do seu estoque normativo não abre distinção entre adotante “homo” ou “heteroafetivo”. E como possibilita a adoção por uma só pessoa adulta, também sem distinguir entre o adotante solteiro e o adotante casado, ou então em regime de união estável, penso aplicar-se ao tema o mesmo raciocínio de proibição do preconceito e da regra do inciso II do art. da CF, combinadamente com o inciso IV do art. e o § 1º do art. da Constituição. Mas é óbvio que o mencionado regime legal há de observar, entre outras medidas de defesa e proteção do adotando, todo o conteúdo do art. 227, cabeça, da nossa Lei Fundamental . Parece-me obvio que, a partir desta decisão, os doutrinadores deverão corrigir seus manuais e cursos para uma nova definição de “família”! Por fim, retomo Renato Manfredini Junior que, na letra de “Monte Castelo”, reafirmou e popularizou o Pai-Poeta Lusitano Luís Vaz de Camões: “Ainda que eu falasse a língua dos homens. E falasse a língua dos anjos, sem amor eu nada seria. É só o amor, é só o amor. Que conhece o que é verdade. O amor é bom, não quer o mal. Não sente inveja ou se envaidece. O amor é o fogo que arde sem se ver. É ferida que dói e não se sente. É um contentamento descontente. É dor que desatina sem doer” . (sublinhado, trecho da poesia de Luís Vaz de Camões). E, parafraseando Vinícius, que o amor entre Vera Lúcia e Cátia seja eterno e dure para sempre, agora, casadas. É o parecer.

    Sertãozinho, 15 de agosto de 2011.

    FERNANDO ANTONIO ABUJAMRA

    2º Promotor de Justiça

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