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1 de Maio de 2024

STF Fev23 - Dosimetria Irregular - Homicídio Qualificado - Teoria Monista do Crime e Isonomia com Pena de Corréu

ano passado

Inteiro Teor

HABEAS CORPUS 212.596 ES PÍRITO SANTO

RELATOR : MIN. ANDRÉ MENDONÇA

DECISÃO

HABEAS CORPUS . DECISÃO INDIVIDUAL DE MINISTRO DO STJ. SUBSTITUTIVO DE AGRAVO. INADEQUAÇÃO DA VIA ELEITA. CONCURSO DE AGENTES. DOSIMETRIA DA PENA. CIRCUNSTÂNCIA JUDICIAL DE CARÁTER OBJETIVO: COMUNICABILIDADE. TEORIA MONISTA. ISONOMIA. ART. 580 DO CPP. ILEGALIDADE MANIFESTA. EXTENSÃO PARCIAL DE DOSIMETRIA APLICADA A CORRÉU. CONCESSÃO DA ORDEM, DE OFÍCIO.

1. Trata-se de habeas corpus impetrado contra decisão, proferida no Superior Tribunal de Justiça, pela qual a Ministra Relatora não conheceu do Habeas Corpus nº 614.046/ES.

2. Extrai-se dos autos que o paciente foi condenado a 17 anos de reclusão, no regime inicial fechado, ante o crime do art. 121, § 2º, incs. II e IV, do CP (homicídio qualificado).

3. O Tribunal de Justiça do Estado do Espírito Santo negou provimento à apelação. O acórdão transitou em julgado.

4. Neste habeas corpus , o impetrante sustenta viável a extensão dos efeitos da decisão, alcançada pelo trânsito em julgado, por meio da qual condenado o corréu XXXXXXXXXX, pelo mesmo fato, em processo desmembrado, a pena inferior - 14 anos. Diz não se tratar de pronunciamento lastreado em circunstâncias de caráter pessoal. Alega inobservados a isonomia processual e o art. 580 do Código de Processo Penal, uma vez imposta ao paciente sanção mais gravosa.

5. Requer, no âmbito liminar e no mérito, a definição da pena no patamar imposto ao corréu.

É o relatório.

Decido.

6. O presente habeas corpus volta-se contra decisão individual de Ministro do Superior Tribunal de Justiça. Inexistindo pronunciamento colegiado do STJ, não compete ao Supremo Tribunal Federal examinar a questão de direito versada na impetração ( CRFB, art. 102, inc. I, al. i). O caso é de habeas corpus substitutivo de agravo regimental, cabível na origem. Nesse sentido: HC nº 115.659/PR, Rel. Min. Luiz Fux, Primeira Turma, j. 02/04/2013, p. 25/04/2013; HC nº 197.645-AgR/RJ, Rel. Min. Roberto Barroso, Primeira Turma, j. 08/04/2021, p. 16/04/2021; e HC nº 199.029-AgR/MA, Rel. Min. Edson Fachin, Segunda Turma, j. 16/04/2021, p. 29/04/2021.

7. Ademais, o título condenatório transitou em julgado em 24/09/2018 , tendo sido formalizada esta impetração apenas em 03/03/2022. A jurisprudência desta Suprema Corte consolidou-se no sentido da inviabilidade de utilização do habeas corpus como sucedâneo de revisão criminal, ressalvados os casos de ilegalidade sucedâneo de revisão criminal, ressalvados os casos de ilegalidade manifesta ( RHC nº 203.506-AgR/ES, Rel. Min. Cármen Lúcia, Primeira manifesta ( RHC nº 203.506-AgR/ES, Rel. Min. Cármen Lúcia, Primeira Turma, j. 23/08/2021, p. 25/08/2021; HC nº 154.106-ED/MS, Rel. Min. Turma, j. 23/08/2021, p. 25/08/2021; HC nº 154.106-ED/MS, Rel. Min. Roberto Barroso, Primeira Turma, j. 29/06/2018, p. 06/08/2018; HC nº

8. Verificada a inadequação da via eleita, eventual concessão da ordem de ofício é providência excepcional , a ser implementada somente quando constatada flagrante ilegalidade, abuso de poder ou mesmo teratologia na decisão impugnada. Da análise das peças que instruem a impetração, vislumbro situação a autorizá-la.

9. O paciente e o corréu XXXXXXXXXX foram denunciados, em coautoria, ante o cometimento do crime de homicídio qualificado, sendo o processo- crime, quanto ao último, desmembrado.

10. Sobrevindo condenações pelo Tribunal do Júri, o Juízo, considerados o mínimo de 12 e o máximo de 30 anos previsto para o tipo (homicídio qualificado), fixou a pena-base do paciente em 17 anos , assentando desfavoráveis as seguintes circunstâncias judiciais: culpabilidade, conduta social, personalidade, motivos, contornos e consequências do crime . Destacou que, embora negativos os motivos, não seriam sopesados, pois já considerados a título de qualificadora - motivo fútil. Por sua vez, a pena-base do corréu XXXXXXXXXXXX , em sentença proferida no processo desmembrado, foi definida em 14 ano s, ante a qualificação negativa dos contornos do crime e da culpabilidade.

11. O Tribunal de Justiça, no julgamento da apelação interposta em favor do paciente, deixou de acolher o pedido de redimensionamento da pena a fim de equipará-la a que imposta ao corréu XXXXXXXXXXX, a partir das seguintes razões:

"Por fim, no tocante ao pedido de diminuição da pena imposta, em decorrência do princípio da isonomia, posto que o terceiro acusado do delito - julgado em Tribunal do Júri diverso - foi condenado a pena de 14 (quatorze) anos de reclusão, tal pleito não merece prosperar.

Isso porque, conforme o princípio da individualização da pena, insculpido no inciso XLV, artigo , da Carta Magna, o indivíduo, no momento da condenação, terá sua reprimenda devidamente individualizada, considerando as peculiaridades do caso concreto e seu histórico pessoal. Destarte, mesmo que os agentes tenham praticado ilícito penal idêntico, a pena a eles imputada não necessariamente será a mesma.

Ademais, conforme bem explanado pela d. Procuradoria de Justiça, em seu parecer,"a sentença do corréu XXXXXXXXXXXXXX foi proferida por magistrado diverso do que condenou os ora apelantes, sendo de conhecimento acadêmico que cada juiz tem liberdade, de acordo com as circunstâncias do caso concreto e com seu livre convencimento motivado, de fixar a reprimenda que achar a mais justa e adequada frente ao caso concreto ."(e-doc. 3, p. 31).

12. No STJ, a Relatora do HC nº 614.046 confirmou esse entendimento, salientando:

"Além disso, inexiste patente ilegalidade a ser sanada. Com efeito, conforme consta às fls. 193-194 e 325-329, a pena relativa ao Corréu XXXXXXXXXXXXXX foi dosada com base em circunstâncias a ele inerentes, em respeito ao princípio da individualização da pena, tendo sido valorados negativamente, na primeira fase da dosimetria, os vetores da culpabilidade, motivos e circunstâncias do crime . Por outro lado, no que se refere ao ora Paciente (fls. 46-47), foram consideradas desfavoráveis as circunstâncias judiciais da culpabilidade, conduta social, personalidade, circunstâncias e consequências do crime . Desse modo, não há similitude fática apta a ensejar a aplicação do art. 580 do Código de Processo Penal."(decisão acessada por meio de consulta ao site do STJ).

13. De fato, o paciente não faz jus à pena exatamente no mesmo patamar do corréu, especialmente pelo fato de terem sido consideradas - apenas em seu desfavor , na primeira etapa da individualização da pena - como desfavoráveis, a personalidade e a conduta social, circunstâncias judicias de natureza subjetiva (pessoal) que não se comunicam, a teor do que versado no art. 30 do CP, in verbis:

" Art. 30 - Não se comunicam as circunstâncias e as condições de caráter pessoal, salvo quando elementares do crime. "

14. Ou seja, a existência de um número maior de vetores negativos justifica, em princípio, a pena mais elevada do paciente.

15. Não obstante, há ilegalidade pontual a ser sanada. Conforme se verifica, embora tratando-se de contexto e crime únicos, presente o concurso de agentes, a circunstância judicial consequências do crime foi valorada negativa apenas em relação ao paciente, revelando-se, assim, conflitantes as dosimetrias das penas.

16. Observadas a teoria unitária ou monista - art. 29 do Código Penal -, segundo a qual, na codelinquência, há delito único, e a isonomia processual , descabe impor ao paciente condenação mais gravosa, assentando-se, em relação a ele, que as consequências do delito foram graves e, no tocante ao corréu, que foram normais. Ademais, a exegese do art. 30 do CP, a versar a incomunicabilidade das circunstâncias de caráter pessoal, nos revela que, a contrario sensu , como regra, as circunstâncias de natureza objetiva (a exemplo da c ircunstância judicial consequências do crime) se comunicam a coautores e partícipes.

17. Insisto, mostra-se incongruente que um mesmo delito tenha consequências graves, de modo a justificar a exasperação da pena, quanto a um dos agentes, e sejam normais no tocante ao outro. Dessa forma, o pronunciamento mais favorável deve prevalecer e ser estendido ao paciente, presente o disposto no art. 580 do CPP.

18. A conclusão está em consonância com o entendimento do Supremo. A esse respeito, colaciono os seguintes precedentes, aplicáveis mutatis mutandis ao caso concreto:

"HABEAS CORPU S. DIREITO PENAL E PROCESSUAL PENAL. IMPETRAÇÃO CONTRA DECISÃO MONOCRÁTICA DO SUPERIOR TRIBUNAL DE JUSTIÇA. NÃO ESGOTAMENTO DE JURISDIÇÃO. CONCURSO DE AGENTES. RECONHECIMENTO DE DELITOS DISTINTOS PARA CORRÉUS QUE COOPERARAM PARA O MESMO FATO CRIMINOSO. ORDEM CONCEDIDA DE OFÍCIO. EXTENSÃO DE DOSIMETRIA APLICADA A CORRÉU. IMPOSSIBILIDADE. 1. Há óbice ao conhecimento de habeas corpus impetrado contra decisão monocrática do Superior Tribunal de Justiça, cuja jurisdição não se esgotou. Precedentes. 2. Diante do reconhecimento de que o paciente e os corréus "agiram em concurso e unidade de propósitos", com relevância causal para produção do resultado criminoso, imprescindível, segundo a Teoria Monista adotada pelo art. 29 do Código Penal, a imputação criminosa uniforme a todos os envolvidos. Precedentes. 3. Inaplicável o disposto no art. 580 do Código de Processo Penal, porquanto diversa a dosimetria para a fixação da pena do ora paciente e de corréu, conforme análise das circunstâncias judiciais engendrada pela Corte Estadual. 4. Habeas corpus extinto sem resolução de mérito, com a concessão da ordem de ofício para cassar o ato dito coator, restabelecendo os efeitos do acórdão exarado pela Corte Estadual."

( HC nº 123.068/SP, Rel. Rosa Weber, Primeira Turma, j.

03/02/2015, p. 19/02/2015; grifos nossos).

"Habeas Corpus . Direito Penal e Processual Penal. Concurso de pessoas. Reconhecimento de delito em modalidades de consumação distintas para co-réus que praticaram o mesmo fato criminoso em unidade de desígnios. Impossibilidade. Aplicação da teoria monista. Tratando-se de concurso de pessoas que agiram com unidade de desígnios e cujas condutas tiveram relevância causal para a produção do resultado, é inadmissível o reconhecimento de que um agente teria praticado o delito na forma tentada e o outro, na forma consumada. Segundo a teoria monista ou unitária, havendo pluralidade de agentes e convergência de vontades para a prática da mesma infração penal, como se deu no presente caso, todos aqueles que contribuem para o crime incidem nas penas a ele cominadas ( CP, art. 29), ressalvadas as exceções para as quais a lei prevê expressamente a aplicação da teoria pluralista. Ordem concedida."

( HC nº 97.652/RS, Rel. Min. Joaquim Barbosa, Segunda Turma, j. 04/08/2009, p. 18/09/2009; grifos nossos).

"PENAL. HABEAS CORPUS . CONHECIMENTO. LIMITES MATERIAIS DA IMPUGNAÇÃO. CRITÉRIO DE AFERIÇÃO. QUALIFICADORA OBJETIVA. COMUNICABILIDADE. CORREUS. QUESITO FORMULADO COM REFERENCIA APENAS A UM DOS REUS. APLICAÇÃO DA PENA. PARTICIPAÇÃO DE MENOR IMPORTANCIA. O critério para a demarcação dos limites materiais da impugnação recursal e fixado pela petição ou termo de interposição, de modo que a falta de desenvolvimento da matéria nas razoes não pode reduzir o alcance do exame do mérito pela instância superior, mesmo porque nenhuma relevância tem, para efeito de prejudicar o julgamento, a omissão da parte no arrazoamento do seu recurso (art. 601 do CPP). Conhecimento parcial da apelação que, na espécie, configura omissão ilegal. Precedentes. A natureza objetiva da qualificadora relativa a surpresa (art. 121, par.2., IV, do CP), que e, além do mais, elementar do tipo qualificado, impede que se deixe de estender ao paciente as consequências da decisão pronunciada pelo Júri em relação ao co-réu. . Reconhecida a participação de menor importância, incumbe ao Juiz definir os limites da diminuição da pena a luz das circunstancias da ação. Se a cominação se encontra fundamentada, descabe questionar- lhe a validade. Habeas corpus conhecido por todos os seus fundamentos, mas, no mérito, indeferido."

( HC nº 70.589/SP, Rel. Min. Ilmar Galvão, Primeira Turma,

j. 21/06/1994, p. 16/09/1994; grifos nossos).

19. Ante o exposto, nego seguimento ao habeas corpus, porém, com fundamento no art. 192 do RISTF, concedo a ordem, de ofício, para, afastada a valoração negativa do vetor judicial consequências do crime, determinar seja refeita a dosimetria da pena imposta ao paciente (processo nº 0021048-29.2013.8.08.0012, da 4a Vara Criminal da Comarca de Cariacica/ES).

Comunique-se, com urgência, ao Tribunal de Justiça do Espírito Santo.

Publique-se.

Brasília, 26 de janeiro de 2023.

Ministro ANDRÉ MENDONÇA

Relator

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(STF - HC: 212596 ES, Relator: ANDRÉ MENDONÇA, Data de Julgamento: 26/01/2023, Data de Publicação: PROCESSO ELETRÔNICO DJe-s/n DIVULG 26/01/2023 PUBLIC 27/01/2023)

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