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2 de Maio de 2024

STJ Mar23- Absolvição em crime de incêndio - Prova testemunha não é suficiente para a Materialidade

há 11 meses

RECURSO ESPECIAL Nº 2025936 - RS (2022/0286872-6) RELATOR : MINISTRO JESUÍNO RISSATO (DESEMBARGADOR CONVOCADO DO TJDFT)

DECISÃO Trata-se de recurso especial interposto com fundamento nas alíneas a e c do permissivo constitucional. A recorrente foi condenada "como incursa nas sanções do art. 250, caput, do Código Penal (incêndio), à pena privativa de liberdade de 3 (três) anos de reclusão, em regime aberto, e ao pagamento de 10 dias-multa, à razão mínima legal, substituída a pena corporal por duas restritivas de direitos" (fl. 220).

Nas razões de seu recurso (fls. 242-248), aponta violação dos arts. 158 e 173 do CPP, além de dissídio jurisprudencial, afirmando, em suma, que "a perícia era imprescindível para firmar a realização dos elementos que caracterizam o tipo penal, ou seja, a prática da efetiva combustão e que tenha exposto a perigo de vida, a integridade física ou o patrimônio de outrem" (fl. 246), pugnando, ao final, pela sua absolvição.

Apresentadas as contrarrazões, manifestou-se o Ministério Público Federal pelo não conhecimento recursal.

Sobre a questão aqui trazida, extrai-se do aresto recorrido (fls. 224-226): [...] entendo que a ausência de exame pericial acerca da causa do incêndio não implica, necessariamente, inexistência de prova da materialidade do delito, que pode ser demonstrada por outros meios de prova, consonante maciça jurisprudência deste Tribunal: [...] E, na espécie, a materialidade do delito foi suficiente demonstrada pelo registro de ocorrência (fl. 01, processo 5000869-84.2017.8.21.0109/RS, evento 3, PROCJUDIC1 da ação penal de origem), pelo vídeo juntado aos autos de origem, que registra o veículo sendo consumido pelas chamas (fl. 56, dos autos físicos de 1º grau - fl. 30, processo 5000869- 84.2017.8.21.0109/RS, evento 3, PROCJUDIC2), bem como pela prova oral colhida. [...] Como se vê, quanto à alegação de inexistência de prova de materialidade do delito de incêndio, sem razão à defesa. O delito previsto no art. 250, caput, do Código Penal está inserido no título dos crimes contra a incolumidade pública, sendo de perigo comum.

No entanto, prescindível no caso concreto a juntada de laudo pericial demonstrativo da causa do incêndio, na medida em que a prova oral colhida, corroborada pelo vídeo anexado ao caderno processual do exato momento do fato (incêndio), são aptos a comprovar a materialidade do crime.

Na espécie, há outros elementos nos autos que suprem a ausência de auto subscrito por peritos oficiais, com a ressalva de que, eventual perícia não chegaria a outra conclusão que não a de que ocorreu o incêndio no veículo da vítima.

Como determina o art. 173 do CPP, com a perícia se verificaria, em tese, o motivo e o local em que iniciou o fogo, o perigo que possa ter ocorrido para a vida e para o patrimônio alheio, bem como a extensão do dano, o seu valor e outras circunstâncias que interessarem a elucidação do fato. In hoc casu, atribui-se à acusada a conduta de jogar um litro de álcool e ateado fogo no veículo que estava estacionado em via pública, em frente da sua residência e nas proximidades de outras casas.

A intensidade das chamas atingiu, inclusive, os fios da rede elétrica, o que, somado ao potencial explosivo do automóvel abastecido com combustível inflamável, caracteriza o concreto perigo. Veja-se que, ao final do vídeo juntado aos autos, observa-se que o veículo foi totalmente destruído, sendo os prejuízos comprovados nos autos a partir da juntada do CRLV e tabela de preço médio da FIPE (fls. 10 e 20, processo 5000869-84.2017.8.21.0109/RS, evento 3,PROCJUDIC1).

Pela mídia anexada ao processo, percebe-se facilmente que há moradias bastante próximas ao veículo sinistrado, que estava estacionado na frente da residência da acusada, podendo-se concluir, mesmo sem a elaboração de perícia, que houve iminente perigo ao patrimônio alheio, bem como aos moradores vizinhos.

Além do mais, a referida mídia comprova que a ré estava presente no momento do início do incêndio, assistindo a tudo e com algo na mão (pedaço de pau), como bem referiu o voto divergente. [...] Assim, não há falar em ausência de prova da materialidade do delito de incêndio, sendo dispensável, no caso concreto, a juntada de elementos outros que não os já presentes nos autos, suficientes à demonstração da ocorrência do crime.[...] Entendeu o Tribunal de origem, no seu voto condutor, que "a ausência de exame pericial acerca da causa do incêndio não implica, necessariamente, inexistência de prova da materialidade do delito, que pode ser demonstrada por outros meios de prova".

Noutra vertente, porém, ressaltou-se no voto divergente (fl. 232): [...] Consigno que não desconheço que outros elementos de prova se prestam a complementar a conclusão dos expertos. Contudo, a prova testemunhal, diante de infração que deixa vestígios, como no caso em apreço - crime de incêndio -, não é suficiente para alicerçar a materialidade, tampouco ensejar a condenação.

Nos termos do artigo 167 do Código de Processo Penal, apenas diante do desaparecimento dos vestígios e da impossibilidade de realização do laudo pericial entende-se viável a demonstração da materialidade criminosa por outros meios de prova. Entretanto, no caso dos autos, não há justificativa idônea para o exame pericial não ter sido realizado, inclusive sequer há explicação acerca de eventual impossibilidade de elaboração.

Ademais, o artigo 173 do mesmo diploma legal especifica que os peritos verificarão a causa e o lugar em que houver começado o incêndio, o perigo que dele tiver resultado para a vida ou para o patrimônio alheio, a extensão do dano e o seu valor, bem como demais circunstâncias a elucidar o fato.

Com efeito, entendo ser imprescindível a perícia para o delito de incêndio, visto que necessária, seja para elucidar a causa do incêndio, como para apurar, efetivamente e de modo concreto, o perigo proveniente. De outra banda, como referido no voto minoritário, há dúvidas acerca da materialidade delitiva, visto que as provas testemunhais, assim como vídeo demonstrando que a ré se encontrava no local tão somente atestam o objeto danificado na sua presença.

Desse modo, quiça poderia estar caracterizado o crime de dano. Portanto, diante da previsão legal a reclamar que sempre que presente o fogo haja perícia, o que não ocorreu no caso em epígrafe, com a devida vênia ao entendimento contrário, entendo não estar comprovada a materialidade delitiva.[...] Como se vê, destacou-se no voto acima, que "a prova testemunhal, diante de infração que deixa vestígios, como no caso em apreço - crime de incêndio -, não é suficiente para alicerçar a materialidade, tampouco ensejar a condenação", acrescendo-se que "não há justificativa idônea para o exame pericial não ter sido realizado, inclusive sequer há explicação acerca de eventual impossibilidade de elaboração", além de dúvidas acerca da materialidade delitiva, posicionamento esse que vai ao encontro da jurisprudência desta Corte.

Confira-se: AGRAVO REGIMENTAL NO RECURSO ESPECIAL. CRIME DE INCÊNDIO. ABSOLVIÇÃO. AUSÊNCIA DE JUSTIFICATIVA IDÔNEA PARA A NÃO REALIZAÇÃO DA PERÍCIA. NÃO COMPROVAÇÃO DA MATERIALIDADE DELITIVA. CONSTRANGIMENTO ILEGAL EVIDENCIADO. ABSOLVIÇÃO. ART. 386, INCISO II, DO CÓDIGO DE PROCESSO PENAL. RECURSO DESPROVIDO. 1. Segundo o entendimento desta Corte, a ausência de perícia no crime de incêndio somente poderá ser suprida por outros meios de prova nas hipóteses em que seja impossível a realização do exame de corpo de delito, o que não restou evidenciado no caso dos autos. 2. Não tendo sido apontado nenhum fundamento capaz de justificar a não realização da perícia no local do crime, impõe-se a absolvição do recorrente e do corréu. 3. Agravo regimental improvido. ( AgRg no REsp n. 1.916.613/RS, relator Ministro Olindo Menezes (Desembargador Convocado do TRF 1ª Região), Sexta Turma, julgado em 11/5/2021, DJe de 17/5/2021.) "No caso sob exame, não foi realizada perícia para constatar a materialidade do crime de incêndio, não existindo nos autos justificação alguma para a ausência da perícia, o que indica a presença de flagrante constrangimento ilegal. Habeas corpus não conhecido.

Ordem concedida de ofício para anular a r. sentença condenatória e o v. acórdão que a confirmou, absolvendo o paciente da prática do crime de incêndio, nos termos do art. 386, inc. II, do Código de Processo Penal, considerando a inexistência de prova da materialidade da conduta imputada"( HC n. 440.501/RS, relator Ministro Felix Fischer, Quinta Turma, julgado em 24/5/2018, DJe de 1/6/2018). Ante o exposto, dou provimento ao recurso especial para absolver C DOS S, nos termos do voto de fls. 229-232.

Publique-se. Intimem-se. Brasília, 09 de março de 2023. Ministro Jesuíno Rissato (Desembargador Convocado do TJDFT) Relator

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(Edição nº 0 - Brasília, Publicação: terça-feira, 14 de março de 2023 Documento eletrônico VDA35586774 assinado eletronicamente nos termos do Art. § 2º inciso III da Lei 11.419/2006 Signatário (a): MINISTRO Jesuíno Rissato (Desembargador Convocado do TJDFT) Assinado em: 10/03/2023 18:22:13 Publicação no DJe/STJ nº 3594 de 14/03/2023. Código de Controle do Documento: 6dc74b2e-dbe5-4f08-a52a-ac2fec0d00b8)

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