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5 de Maio de 2024

STJ Out22 - Depoimentos de Policiais Não Bastam para Condenar - Desclassificação do Tráfico (Art. 33) para Uso (Art.28) da Lei de Drogas

há 2 anos

AgRg no HABEAS CORPUS Nº 685391 - SP (2021/0250141-8) DECISÃO Trata-se de recurso de agravo regimental interposto por CAIO JEAN PEREIRA DE FRANÇA, contra decisão desta Corte Superior em habeas corpus, que não conheceu da impetração apenas por ser substitutiva de revisão criminal (fls. 452-454).

Neste recurso, o agravante busca a reconsideração da decisão anterior, com a aplicação da atipicidade da conduta, afirmando que o agravante é mero usuário de drogas. Ressalta que a quantidade de drogas apreendidas foi ínfima - 21g de maconha. Destaca que não houve apreensão de considerável quantia em dinheiro ou de outro objeto ilícito comumente utilizado na prática da traficância.

Subsidiariamente, aduz que, na primeira etapa da dosimetria das penas, houve a valoração das circunstâncias do crime de forma genérica e abstrata. Argumenta que o paciente faz jus à benesse prevista no § 4º do art. 33 da Lei n. 11.343/06. Invoca que é primário, tem bons antecedentes e não se dedica a atividades criminosas.

Alega que o regime inicial de cumprimento de pena do paciente foi fixado com base em fundamentação genérica e abstrata e que o montante de pena atribuído enseja a aplicação de regime semiaberto. Requer, assim a reconsideração da decisão anterior ou o provimento de seu recurso, para que o agravante obtenha a desclassificação da conduta para o art. 28 da Lei n. 11.343/2006; subsidiariamente, pugna pelo afastamento da circunstância do crime utilizada pelo d. Juízo sentenciante na primeira etapa da dosimetria da pena; pelo reconhecimento da causa de diminuição de pena prevista no § 4º do art. 33 da Lei n. 11.343/2006, em seu patamar máximo; realizando-se, por conseguinte, a nova dosimetria das penas.

O d. Ministério Público Federal manifestou-se anteriormente pelo não conhecimento ou denegação da ordem de do writ, nos termos da ementa abaixo (fls. 446-450): "PENAL. PROCESSO PENAL. HABEAS CORPUS SUBSTITUTIVO. DESCABIMENTO. NARCOTRÁFICO. PENA-BASE ACIMA DA MÍNIMALEGAL. CIRCUNSTÂNCIA JUDICIAL DESFAVORÁVEL. INAPLICABILIDADE DA REDUTORA DO ARTIGO 33, § 4º DA LEI DE DROGAS. ASSENTES PROVAS DE HABITUALIDADE NA PRÁTICA DELITIVA. TESE DEFENSIVA QUE DEMANDA DILAÇÃO PROBATÓRIA INFENSA À VIA OPTATA. REGIME INICIAL FECHADO. FUNDAMENTAÇÃO CONCRETA. VALORAÇÃO NEGATIVA DE CIRCUNSTÂNCIA JUDICIAL. PARECER PELO NÃO CONHECIMENTO OU DENEGAÇÃO DO WRIT."

É o relatório. Decido. Recebo o presente recurso como pedido de reconsideração. Passo a apreciar seu mérito. Ora, ainda que inadequada a impetração de habeas corpus em substituição à revisão criminal ou ao recurso constitucional próprio, diante do disposto no art. 654, § 2º, do Código de Processo Penal, este Superior Tribunal de Justiça considera passível de correção de ofício o flagrante constrangimento ilegal.

Aqui, constata-se flagrante ilegalidade que autoriza a atuação ex officio. Explico. O eg. Tribunal de origem, ao manter a sentença que condenara o ora agravante pela prática do crime de tráfico de drogas, consignou que o contexto fático-probatório não deixava margens para dúvidas de que o fato narrado na denúncia não comportava a absolvição ou a desclassificação para o delito de uso de entorpecentes, destacando os depoimentos dos policiais.

Veja-se o v. acórdão (fls. 39-40): "De proêmio, conhece-se do pedido de recurso em liberdade como preliminar, para rejeitá-lo, pois, a esta altura, está prejudicado pelo julgamento colegiado. A acusação é de que, segundo a denúncia, aos '16 de julho de 2020, por volta das 18h20, na Vicinal Mysés Justino da Silva, nesta cidade e comarca de Adamantina, CAIO JEAN PEREIRA DE FRANÇA trazia consigo16,9g de Cannabis Sativa L, droga vulgarmente conhecida por maconha, bem como guardava/matinha em depósito, na R. Eisuke Gushiken, n. 716, Vila Caires, na cidade e comarca de Lucélia, 3 porções com 5,02g de Cannabis Sativa L, droga vulgarmente conhecida por maconha, tudo para entrega a consumo de terceiros, sem autorização e em desacordo com determinação legal'.

Materialidade comprovada pelo laudo pericial definitivo (fls. 144/146), a autoria é inconteste. Na fase policial, alegou ter sido agredido. Em juízo, se disse mero usuário e que estava indo a Adamantina encontrar o amigo Nandinho, também viciado e, ao chegar na cidade, um policial apontou-lhe uma arma e outro o enquadrou, mesmo sem tentar fugir ou resistir, permanecendo calado o tempo todo. Mostrou onde as drogas estavam. Foi colocado na viatura e levado a uma" estradinha ", onde foi zombado e ameaçado.

Explicou que a droga era apenas para seu uso, assim como aquelas que estavam na sua residência e que o dinheiro encontrado proveniente do auxílio emergencial recebido por sua mãe, para pagar as contas. A escusa não convenceu. Os PMs Fernando e Fabiano receberam informação de que um sujeito, morador de Lucélia, frequentemente se deslocava a Adamantina, em uma motocicleta preta de aros laranjas, por volta das 18 horas, para entrega de drogas a terceiros.

Em razão disso, iniciaram patrulhamento e, ao avistarem a moto, efetuaram a abordagem. Ao parar o veículo, o apelante tentou empreender fuga a pé, contudo, fora detido. Em revista pessoal, em suas vestes íntimas, encontraram um invólucro plástico com 16,9g de maconha, cujo destino seria a entrega a terceiros, como explicou. Ato contínuo, se dirigiram à sua casa, cujo acesso a moradora autorizou, procedendo a busca domiciliar. Acharam outras três porções, com5,02g daquela substância e R$ 504, na cômoda de seu quarto. Prova suficiente." (grifei)

In casu, como se observa, o agravante foi preso na posse de poucos entorpecentes (16g de maconha) sem que houvesse qualquer diligência prévia que atestasse qualquer das condutas aptas à configuração do delito de tráfico de drogas.

Importante consignar que, embora a palavra dos policiais mereça credibilidade e fé-pública inerente ao depoimento de qualquer agente estatal e que o delito de tráfico de drogas sequer exige provas da efetiva mercancia para a sua configuração, é o caso concreto aqui exposto, de pouca quantidade de drogas (16 g e de 5 g de maconha), somada à falta de apreensão de petrechos, anotações ou da existência de outros elementos que possam trazer a certeza necessária à condenação mais gravosa, que autoriza a desclassificação da conduta típica.

Sobre o dinheiro encontrado na casa do agravante, explica-se que esta Corte Superior de Justiça, há muito, firmou a sua orientação no sentido de que a dedicação à narcotraficância não é presumível nas hipóteses em que o agente está desempregado ou não comprovou o exercício de ocupação lícita.

Aliás, entendimento contrário redundaria em ofensa ao sistema acusatório e indicaria a indevida incidência do direito penal do autor ( AgRg no HC 586.631/SP, Quinta Turma, Rel. Min. Reynaldo Soares da Fonseca, DJe de 30/6/2020). Como ressaltado na dosimetria das penas, o agravante sequer tinha maus antecedentes ou era reincidente (fl. 41).

Nesse contexto: "PROCESSUAL PENAL. HABEAS CORPUS. TRÁFICO DE ENTORPECENTES. LITISPENDÊNCIA. NÃO OCORRÊNCIA. CONDENAÇÃO. LASTRO PROBATÓRIO INSUFICIENTE. DESCLASSIFICAÇÃO. ART. 28 DA LEI N. 11.343/2006. 1. Tratando-se de fatos distintos veiculados em ações penais diversas, não há que se falar em litispendência. 2. É possível examinar em habeas corpus a legitimidade da condenação imposta desde que não seja necessário que se proceda à dilação probatória. 3. Para a imposição de uma condenação criminal, faz-se necessário que seja prolatada uma sentença, após regular instrução probatória, na qual haja a indicação expressa de provas suficientes acerca da comprovação da autoria e da materialidade do delito, nos termos do art. 155 do Código de Processo Penal. 4. Insta salientar, ainda, que a avaliação do acervo probatório deve ser realizada balizada pelo princípio do favor rei. Ou seja, remanescendo dúvida sobre a responsabilidade penal do acusado, imperiosa será a sua absolvição, tendo em vista que sobre a acusação recai o inafastável ônus de provar o que foi veiculado na denúncia. 5. A apreensão da droga no domicílio do acusado, por si só, insta consignar, não indica a realização do tipo inserto no art. 33 da Lei de Drogas, notadamente se considerada a pouca quantidade que foi encontrada. Além disso, não foram localizados petrechos comuns a essa prática (balança de precisão, calculadora, recipientes para embalar a droga, etc). Ademais, os policiais, únicas testemunhas do fato, ao serem questionados, nada acrescentaram sobre a apuração dos fatos. Em suma, não foram encontradas evidências do comércio ilícito. 6. Ordem concedida, para desclassificar a imputação contida na denúncia para o tipo inserto no art. 28 da Lei n. 11.343/2006, devendo o Magistrado da 5ª Vara Criminal de Serra/ES aplicar as penas nele cominadas como entender de direito"( HC n. 497.023/ES, Sexta Turma, Rel. Min. Ministro Antônio Saldanha Palheiro, DJe de 21/6/2019, grifei).

Ante o exposto, em sede de juízo de retratação neste recurso de agravo regimental, mantenho o não conhecimento do habeas corpus. Porém, concedo a ordem, de ofício, a fim de desclassificar a conduta imputada ao agravante para a do art. 28 da Lei de Drogas e determinar, ao eg. Tribunal de origem, que fixe a sanção correspondente, como entender de direito. Recomenda-se celeridade. Intime-se, com urgência, a origem. P. I. Brasília, 29 de setembro de 2022. Ministro Jesuíno Rissato (Desembargador Convocado do TJDFT) Relator

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(STJ - AgRg no HC: 685391 SP 2021/0250141-8, Relator: Ministro JESUÍNO RISSATO (DESEMBARGADOR CONVOCADO DO TJDFT), Data de Publicação: DJ 03/10/2022)

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