Página 274 da Judicial - 1ª Instância - Interior - Parte III do Diário de Justiça do Estado de São Paulo (DJSP) de 27 de Julho de 2017

como não havia indicação de internação de urgência nos atendimentos do Hospital conveniado; e) uma vez indicada a internação pelo plantonista do hospital credenciado, a equipe médica foi prudente e diligente ao garantir a internação em hospital de referência do Sistema Único de Saúde; f) não existe nos autos qualquer demonstração de que a autora tenha sequer solicitado autorização para a internação no hospital conveniado; g) é beneficiária de plano coletivo datado de 01.02.2016, sendo que cumpria prazo de carência contratual para internações clínicas e cirurgias (180 dias); h) não está garantido no período de carência a cobertura para internação, mesmo que se trata de atendimento de urgência ou emergência; i) ao celebrar o contrato, o usuário opta pela modalidade de cobertura; j) inexiste ofensa ao CDC; k) inexiste danos morais a serem indenizados, sendo que, em caso de condenação, deverá ser fixado proporcionalmente (fls. 88/115). Réplica às fls. 196/199. É o relatório. Fundamento e Decido. Passo ao julgamento antecipado da lide, nos termos do artigo 355, I, do Código de Processo Civil, por se tratar de matéria de direito.Primeiramente, cumpre salientar a aplicação do Código de Defesa do Consumidor no presente caso, na medida em que a atividade desenvolvida pela ré insere-se no contexto das relações de consumo, conforme arts. e do CDC e Súmula nº 469 do C. Superior Tribunal de Justiça. Em consequência, determino a inversão do ônus da prova (art. , VIII, do CDC) dada a vulnerabilidade da consumidora.O tema levantado nos presentes autos tem relação com a preservação do direito à saúde que, devido a sua importância, muitas vezes se sobrepõe a outros. Esse direito está diretamente ligado ao direito à vida, que é superior a qualquer outro. Observe-se também que a função social do contrato de saúde (artigo 421 do Código Civil), impõe a sua preservação, sem limites unilaterais impostos pela operadora do plano de saúde e sem que o consumidor tenha que se submeter aos seus mandos e desmandos, principalmente se contrários ao ordenamento jurídico. Quando uma pessoa contrata um plano de saúde, o faz para ter a certeza de que, em um momento de necessidade, de risco para sua saúde e sua vida, não ficará desamparada, sem atendimento médico eficaz. A proteção a esses direitos, portanto, é da própria natureza do contrato de plano de saúde.Pois bem. Relata a autora em sua inicial que aderiu ao contrato de plano de saúde mantido pela ré em 07 de janeiro de 2016, sempre honrando com os respectivos pagamentos nos prazos. Em 05 de junho de 2016 dirigiu-se ao pronto atendimento de hospital conveniado acometida de dores no rim, sendo atendida, medicada e liberada. Em 08 de junho de 2016, contudo, voltou novamente ao hospital conveniado com dores, e, após reavaliação, recebeu alta e foi liberada. De igual modo procedeu-se o atendimento no dia 10 de junho de 2016. No dia 11 de junho de 2016, apesar das fortes dores e 07 dias em sofrimento, foi acomodada na observação de urgência e medicada, entretanto, constatada a existência de pedra em seu rim esquerdo, a ré não autorizou a internação e a realização do procedimento cirúrgico, sob a alegação de que não havia sido cumprido pela autora o período de carência contratual de 180 meses. A ação é procedente. Não se justifica o argumento da ré de que seu comportamento está amparado nas normas regulamentares da ANS, editadas em obediência ao comando do art. 35-C, parágrafo único da Lei 9.656/98.A Resolução nº 13 do CONSU, em seu art. , reza que a cobertura dos procedimentos de urgência e emergência “deverá reger-se pela garantia da atenção e atuação no sentido da preservação da vida, órgãos e funções, variando, a partir daí, de acordo com a segmentação de cobertura a qual o contrato esteja adstrito”. A cobertura de internação somente estaria excluída, ou melhor, limitada ao período de doze horas, se o plano da autora fosse meramente ambulatorial. Como, porém, o contrato é de plano ambulatorial e hospitalar (fls. 165/185), se aplica o disposto no art. 3º da citada Resolução 13 do CONSU, do seguinte teor: “Os contratos de plano hospitalar devem oferecer cobertura aos atendimentos de urgência e de emergência que evoluírem para internação, desde a admissão do paciente até a sua alta ou que sejam necessários à preservação da vida, órgãos e funções”. Embora reconhecida a legalidade da imposição de carência para determinados atendimentos nos contratos de planos ou seguros saúde, há que se ressaltar que os prazos de carência não são aplicados em situações de urgência ou emergência do segurado. A Lei no 9.656/98 criou no art. 12, V, prazos máximos de carência, assim fixados: (a) trezentos dias para os partos a termo; (b) cento e oitenta dias para os demais casos; (c) vinte e quatro horas para cobertura de casos de urgência e emergência. Positivou a Lei o entendimento sedimentado dos Tribunais, no sentido de que prazos muito longos de carência quebram a correspectividade das prestações, pois o consumidor durante largo período paga sem ter a correspondente garantia ou serviço. O art. 35-C da L. 9.656/98 se encarrega de definir o que são atendimentos de urgência e de emergência. De urgência são os que implicarem risco imediato de vida ou de lesões irreparáveis para o paciente, caracterizados em declaração do médico assistente. De emergência são os resultantes de acidentes pessoais, ou de complicações no processo gestacional. No caso em tela, evidente que o quadro apresentado pela paciente era típico de urgência, pois representava risco imediato de lesões irreparáveis a paciente/autora, em decorrência do cálculo renal durante 07 dias. Tal situação exigiu imediata intervenção cirúrgica realizada logo após a saída do hospital conveniado, conforme demonstra o documento de fls. 62. Conforme aresto relatado pelo Des. César Peluso, ao examinar cláusula da carência em internação urgente, “seria fraqueza de espírito insistir em que se este ou aquele fica, durante largo tempo e de modo absoluto, privado do custeio das despesas necessárias a tratamento de situação crítica, ou de necessidade aguda que, por definição, lhe ameace a sobrevivência, então está comprometido, do ângulo de seus interesses, o próprio objeto da tutela contratual, porque submete a risco insuportável a vida mesma” (TJSP, 2ª. Câmara de Direito Privado, AC 100.872-4/2-00). Cristalino, portanto, que a autora, diante da urgência de seu atendimento, estava submetida apenas à carência de atendimento de 24 horas, não havendo que se falar em carência de 180 dias para atendimento. Noutro giro, destaca-se que o artigo 51, inciso IV, do Código de Defesa do Consumidor, dispõe serem nulas de pleno direito as cláusulas contratuais referentes ao fornecimento de produtos e serviços que “estabeleçam obrigações consideradas iníquas, abusivas, que coloquem o consumidor em desvantagem exagerada, ou sejam incompatíveis com a boa-fé ou a equidade”. O § 1º, inciso II, do mesmo dispositivo, presume exagerada a vantagem que “restringe direitos ou obrigações fundamentais inerentes à natureza do contrato, de tal modo a ameaçar seu objeto ou o equilíbrio contratual”. Assim, as cláusulas contratuais que estabelecem restrições de atendimento e internação para os casos de urgência e emergência devem ser consideradas nulas, pois os pacientes não podem esperar eventual decurso de prazos de carência, sob o risco de sofrerem graves consequências em sua saúde. Nesse sentido, não resta dúvida de que deve a ré indenizar a autora pelos valores gastos com o tratamento custeado de forma particular. No tocante aos danos morais, caracterizada a abusiva recusa de internação e realização do procedimento cirúrgico, bem como considerado o sofrimento da requerente por mais de 07 dias, de rigor seu acolhimento. A conduta da requerida extrapolou os limites do mero aborrecimento. Neste sentido:”AÇÃO DE INDENIZAÇÃO POR DANOS MORAIS Plano de saúde Recusa de internação devido a cumprimento de carência Impossibilidade Situação de emergência caracterizada Inteligência do artigo 35-C da Lei nº 9.656/98 Autora que apresentava febre e fortes dores nas costas Diagnóstico de pedras no rim Negativa de tratamento adequado que causou graves transtornos aos autores Danos morais caracterizados Valor fixado com adequação Sentença mantida Apelo impróvido”.(TJSP; Apelação 001XXXX-93.2009.8.26.0554; Relator (a):Ramon Mateo Júnior; Órgão Julgador: 7ª Câmara de Direito Privado; Foro de Santo André -3ª. Vara Cível; Data do Julgamento: 07/08/2013; Data de Registro: 09/08/2013).Resta fixar o valor da indenização do dano moral. Considerando o principio da razoabilidade e de forma que a quantia arbitrada seja compatível com a reprovabilidade da conduta ilícita e a gravidade do dano produzido, fixo a indenização R$10.000,00, sabendo-se que tal verba tem por objetivo servir de punição à ré pela ofensa a bem jurídico (saúde/vida), dando-se a autora uma quantia que não é o “pretium doloris”, mas sim um meio de lhe oferecer a oportunidade de conseguir uma satisfação de qualquer espécie, seja

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