Página 232 da Judicial I - Interior SP e MS do Tribunal Regional Federal da 3ª Região (TRF-3) de 16 de Janeiro de 2018

0003079-06.2XXX.403.6XX3 - LUCIA HELENA DOS SANTOS (SP290787 - IBERE BARBOSA LIMA) X INSTITUTO BRAS DO MEIO AMBIEN E DOS REC NAT RENOVAVEIS

Trata-se de demanda, pelo procedimento ordinário, compedido de antecipação de tutela, na qual a parte autora requer a declaração de guardiã e responsável pelas quatro aves apreendidas e discriminadas no relatório da autoridade policial, bemcomo os seus cadastros e suas identificações. Alega, emapertada síntese, que gosta muito de animais e há mais de cinco anos recebeu dois papagaios, João e José, de umamigo emrazão de não ter mais condições de cuidados. Alguns meses depois, recebeu duas maritacas na mesma situação dos papagaios e cuidava das aves muito bem. Em24/02/2011 a polícia ambiental foi a sua casa para verificar uma denúncia anônima e apreenderamas quatro aves. Aduz que essas não estão preparadas para o retorno à natureza, pois não possuemcondições de encontrar alimentos, pela musculatura não desenvolvida e ausência de rigidez dos seus bicos, pois criadas emcativeiro. A tutela antecipada foi deferida, bemcomo os benefícios da assistência judiciária gratuita (fls. 47/48). Houve interposição de recurso de agravo de instrumento (fls. 160/177), ao qual foi dado negado provimento (fls. 209/211). Petição às fls. 60/61 e documentos de fls. 62/72 informaramque duas das quatro aves apreendidas foramdevolvidas, quais sejam, as maritacas. Contudo, os dois papagaios foram destinados ao zoológico de Piracicaba, que se recusa a devolvê-los semmandado judicial. Decisão à fl. 83 deferindo o pedido de expedição de mandado. Citada (fl. 90), a parte ré apresentou contestação (fls. 91/158). Pugna pela improcedência do pedido. Instadas a se manifestaremsobre a produção de provas (fl. 178), o IBAMA requereu a prova pericial (fl. 184), o que foi deferido à fl. 185. À fl. 196 houve a nomeação de perito e a fixação dos seus honorários. Apresentação de quesitos pela parte ré à fl. 198. Laudo pericial às fls. 204/206. O julgamento foi convertido emdiligência para dar ciência ao IBAMA sobre o laudo pericial (fl. 213), que se manifestou à fl. 215. A decisão de fl. 216 determinou que a parte autora esclarecesse se as duas espécimes de periquito-maracanã (aratinga leucophthalma) estavamsob sua guarda e a complementação da perícia. Intimada (fl. 216-verso), a parte autora quedou-se inerte, conforme a certidão de fl. 217. É a síntese do necessário. Fundamento e decido.Passo a sentenciar o feito, nos termos do artigo 12, inciso VII do Código de Processo Civil combinado coma Meta 2 do Conselho Nacional de Justiça, estabelecida e aprovada no 10º Encontro Nacional do Poder Judiciário/Metas Nacionais para 2017. Sempreliminares para análise, presentes os pressupostos processuais e as condições para o exercício do direito de ação, coma observância das garantias constitucionais do devido processo legal, do contraditório e da ampla defesa (artigo , incisos LIV e LV, da Constituição da República), passo a sentenciar o feito, nos termos do artigo 12, inciso VII do Código de Processo Civil combinado coma Meta 2 do Conselho Nacional de Justiça, estabelecida e aprovada no 9º Encontro Nacional do Poder Judiciário/Metas Nacionais para 2016. O pedido é parcialmente procedente. O artigo da Lei n.º 5.197/1967 dispõe: Art. 1º. Os animais de quaisquer espécies, emqualquer fase do seu desenvolvimento e que vivemnaturalmente fora do cativeiro, constituindo a fauna silvestre, bemcomo seus ninhos, abrigos e criadouros naturais são propriedades do Estado, sendo proibida a sua utilização, perseguição, destruição, caça ou apanha. 1º Se peculiaridades regionais comportaremo exercício da caça, a permissão será estabelecida emato regulamentador do Poder Público Federal. 2º A utilização, perseguição, caça ou apanha de espécies da fauna silvestre emterras de domínio privado, mesmo quando permitidas na forma do parágrafo anterior, poderão ser igualmente proibidas pelos respectivos proprietários, assumindo estes a responsabilidade de fiscalização de seus domínios. Nestas áreas, para a prática do ato de caça é necessário o consentimento expresso ou tácito dos proprietários, nos termos dos arts. 594, 595, 596, 597 e 598 do Código Civil.(grifos nossos). Verifica-se por leitura atenta da norma que a fauna silvestre constitui bemdo Estado desde que os animais vivamfora do cativeiro, de acordo como dispositivo legal. No presente feito, conforme consta na inicial, a parte autora teria a posse dos animais desde 2006, ou seja, no momento da apreensão, em2011, já não se tratavammais de animais silvestres, conforme expressão legal. Alémdisso, o artigo 29, da Lei n.º 9.605/98 prevê: Art. 29. Matar, perseguir, caçar, apanhar, utilizar espécimes da fauna silvestre, nativos ou emrota migratória, sema devida permissão, licença ou autorização da autoridade competente, ou emdesacordo coma obtida:Pena - detenção de seis meses a umano, e multa. 1º Incorre nas mesmas penas:I - quemimpede a procriação da fauna, semlicença, autorização ou emdesacordo coma obtida;II - quemmodifica, danifica ou destrói ninho, abrigo ou criadouro natural;III - quemvende, expõe à venda, exporta ou adquire, guarda, tememcativeiro ou depósito, utiliza ou transporta ovos, larvas ou espécimes da fauna silvestre, nativa ou emrota migratória, bemcomo produtos e objetos dela oriundos, provenientes de criadouros não autorizados ou sema devida permissão, licença ou autorização da autoridade competente. 2º No caso de guarda doméstica de espécie silvestre não considerada ameaçada de extinção, pode o juiz, considerando as circunstâncias, deixar de aplicar a pena. 3 São espécimes da fauna silvestre todos aqueles pertencentes às espécies nativas, migratórias e quaisquer outras, aquáticas ou terrestres, que tenhamtodo ou parte de seu ciclo de vida ocorrendo dentro dos limites do território brasileiro, ou águas jurisdicionais brasileiras....Resta claro que a norma tipifica a conduta de ter cativeiro espécimes de fauna silvestre sema devida permissão, licença ou autorização da autoridade competente. Entretanto, emseu 2º estabelece a possibilidade de não aplicação da pena quando a espécie silvestre não estiver considerada ameaçada de extinção, diante das circunstâncias concretas. No presente feito, conforme o laudo pericial realizado, das quatro aves apreendidas, apenas duas, as dos espécimes amazona amazônica, papagaios do mangue, estão sob a guarda da parte autora (fls. 204/206), a qual foi instada a esclarecer o ocorrido comos dois outros espécimes e assimnão fez. Desta forma, aplico a regra do ônus da prova, prevista no artigo 373, inciso I do Código de Processo Civil e passo a analisar o pedido no tocante aos bens descritos no laudo pericial supra mencionado. De acordo coma prova pericial realizada os espécimes não estão segundo a legislação federal entre aquelas ameaçadas de extinção, conforme resposta ao quesito 2. O IBAMA não demonstrou que os animais teriamsido objeto de maus tratos, pelo contrário, no auto de apreensão consta expressamente a informação de que estariamemboas condições (fls. 104-verso/105). Inclusive, verificaramque as aves encontravam-se emgaiolas individuais, comdisponibilidade de água e alimentação adequada, protegidas contra o ambiente exterior. Estas informações são corroboradas pelas fotos que acompanhama inicial (fls. 32/41) e pelas fotos produzidas durante a perícia (fl. 206). Tampouco fez prova, ou apresentou indícios que a parte autora desenvolvesse atividade econômica ligada a comercialização de animais silvestres. Na realidade, conforme as fotos apresentadas coma inicial, tratam-se de animais de estimação. Desta forma, mostra-se questionável a retirado dos animais do cativeiro doméstico onde estão adaptados e observado o bem-estar, semignorar o tempo de convivência coma vida doméstica, para transferi-los para a Administração Pública, a qual os colocará emoutro cativeiro, como zoológicos, umtentará uma duvidosa reintegração aos seus habitats. Nesse sentido os seguintes julgados do Colendo Superior Tribunal de Justiça, os quais adoto como fundamentação: ADMINISTRATIVO E AMBIENTAL. APREENSÃO DE PAPAGAIO. ANIMAL ADAPTADO AO CONVÍVIO DOMÉSTICO. POSSIBILIDADE DE MANUTENÇÃO DA POSSE DO RECORRIDO. REEXAME DO CONTEXTO FÁTICO-PROBATÓRIO DOS AUTOS. SÚMULA 7/STJ.1. In casu, o Tribunal local entendeu que não se mostra razoável a devolução do papagaio Tafarel à fauna silvestre, uma vez que está sob a guarda da autora há pelo menos vinte anos, sendo certa sua adaptação ao convívio comseres humanos, alémde não haver qualquer registro ou condição de maus tratos . Vale dizer, a Corte de origemconsiderou as condições fáticas que envolvemo caso emanálise para concluir que a ave deveria continuar sob a guarda da recorrido, porquanto criada como animal doméstico.2. Ademais, a fauna silvestre, constituída por animais que vivemnaturalmente fora do cativeiro, conforme expressão legal, é propriedade do Estado (isto é, da União) e, portanto, bempúblico.In casu, o longo período de vivência emcativeiro doméstico mitiga a sua qualificação como silvestre.3. A Lei 9.605/1998 expressamente enuncia que o juiz pode deixar de aplicar a pena de crimes contra a fauna, após considerar as circunstâncias do caso concreto. Não se pode olvidar que a legislação deve buscar a efetiva proteção dos animais, finalidade observada pelo julgador ordinário. Incidência da Súmula 7/STJ.4. Precedentes: AgRg no AREsp 333105/PB, Relatora Ministra ASSUSETE MAGALHÃES, SEGUNDA TURMA, DJe 01/09/2014; AgRg no AREsp 345926/SC, Rel. Ministro HERMAN BENJAMIN, SEGUNDA TURMA, DJe 15/04/2014; REsp 1085045/RS, Rel. Ministro HERMAN BENJAMIN, SEGUNDA TURMA, DJe 04/05/2011; e REsp 1.084.347/RS, Rel. Ministro HERMAN BENJAMIN, SEGUNDA TURMA, DJe 30/9/2010.5. Agravo Regimental não provido.(AgRg no REsp 1483969/CE, Rel. Ministro HERMAN BENJAMIN, SEGUNDA TURMA, julgado em25/11/2014, DJe 04/12/2014) ADMINISTRATIVO E AMBIENTAL. OFENSA AO ART. 535 DO CPC NÃO DEMONSTRADA. APREENSÃO DE ARARAS. ALEGADA VIOLAÇÃO DO ART. DA LEI 5.197/1997 E DO ART. 25 DA LEI 9.605/1998. INEXISTÊNCIA.1. Hipótese emque o recorrido ajuizou Ação Ordinária comPedido de Tutela Antecipada contra ato de apreensão de duas aves (uma arara vermelha e uma arara canindé) que viviamemsua residência havia mais de vinte anos.2. O Tribunal de origem, após análise da prova dos autos, constatou que as aves já estavamemconvívio coma família por longo período de tempo, comclaros sinais de adaptação ao ambiente doméstico (fl.252, e-STJ), a reintegração das aves ao seu habitat natural, conquanto possível, possa ocasionar-lhes mais prejuízos do que benefícios (fl. 252, e-STJ), as aves viviamsoltas no quintal (...) não sofriammaus tratos e recebiamalimentação adequada (fl. 252, e-STJ), a dificuldade que esses animais enfrentarão para adaptarem-se ao ambiente natural, pondo emxeque até o seu êxito (fl. 253, e-STJ) e já convivemhá mais de 20 anos como demandante (fl. 254, e-STJ).3. O Tribunal local julgou integralmente a lide e solucionou a controvérsia, tal como lhe foi apresentada.4. Inexiste violação do art. da Lei 5.197/1997 e do art. 25 da Lei 9.605/1998 no caso concreto, pois a legislação deve buscar a efetiva proteção dos animais. Após mais de 20 anos de convivência, sem indício de maltrato, é desarrazoado determinar a apreensão de duas araras para duvidosa reintegração ao seu habitat.5. Registre-se que, no âmbito criminal, o art. 29, 2º, da Lei 9.065/1998 expressamente prevê que, no caso de guarda doméstica de espécie silvestre não considerada ameaçada de extinção, pode o juiz, considerando as circunstâncias, deixar de aplicar a pena.6. Recurso Especial não provido.(REsp 1425943/RN, Rel. Ministro HERMAN BENJAMIN, SEGUNDA TURMA, julgado em02/09/2014, DJe 24/09/2014) Diante do exposto, julgo procedente o pedido, comresolução de mérito, nos termos do artigo 487, inciso I do Código de Processo Civil, para declarar a parte autora como guardiã e responsável pelas duas aves papagaio de mangue, espécime amazona amazônica, descritas no boletimde ocorrência ambiental/termo circunstanciado de fls. 104verso/105 e no laudo pericial de fls. 204/206. Emvirtude de os litigantes teremsido, emparte, vencedores e vencidos, serão proporcionalmente distribuídos entre eles as custas processuais e os honorários advocatícios (art. 86, caput do CPC), os quais arbitro no valor de R$ 1.000,00 (ummil reais), corrigidos monetariamente até a data do efetivo pagamento, semSelic, nos termos da tabela das ações condenatórias emgeral do Manual de Orientação de Procedimentos para os Cálculos da Justiça Federal (Resolução n.º 267/2013 do Conselho da Justiça Federal), haja vista a natureza da causa e o valor atribuído, de acordo como artigo 85, 2º, 3º e 4º, inciso III do Código de Processo Civil. No entanto, a execução destes valores emrelação à parte autora fica suspensa emrazão da assistência judiciária gratuita (artigo 98, 2º e 3º do Código de Processo Civil). A autarquia previdenciária está isenta das custas e emolumentos, nos termos do art. , inciso I da Lei n. 9.289 /96.Transitada emjulgado esta sentença, arquivem-se os autos.Registre-se. Publique-se. Intime-se.

0006470-66.2XXX.403.6XX3 - HELISSON PINHEIRO BARBOSA (SP097321 - JOSE ROBERTO SODERO VICTORIO) X UNIÃO FEDERAL

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