Publicação do processo nº 2024/0078766-9 - Disponibilizado em 03/05/2024 - STJ

Superior Tribunal de Justiça
há 26 dias

Órgãos oriundos do Superior Tribunal de Justiça

RECLAMAÇÃO Nº 47189 - PR (2024/0078766-9) RELATORA : MINISTRA MARIA ISABEL GALLOTTI RECLAMANTE : A M ADVOGADOS : TOMAS CHINASSO KUBRUSLY - PR117012 ANTONIO AUGUSTO LOPES FIGUEIREDO BASTO - PR016950 LUIS GUSTAVO RODRIGUES FLORES - PR027865 GABRIELA PRETURLON LOPES DE SOUZA - PR098273 JOÃO VICTOR STALL BUENO - PR114607 RECLAMADO : M P DO E DO

P DECISÃO Trata-se de reclamação interposta por ABIB MIGUEL contra o JUÍZO DA 4ª VARA CRIMINAL DA COMARCA DE CURITIBA/PR e contra o MINISTÉRIO PÚBLICO DO ESTADO DO PARANÁ (MPPR), por suposta usurpação de competência desta Corte em investigação de JORGE DE OLIVEIRA VARGAS, do Desembargador do Tribunal de Justiça do Estado do Paraná (TJPR), que, nessa condição, possui foro por prerrogativa de função. O reclamante afirma que o Desembargador é investigado em procedimentos conduzidos pelo MPPR sob a supervisão do juízo reclamado, quais sejam: PIC-MPPR nº 0046.21.06194-5 (003XXXX-68.2023.8.16.0013); busca e apreensão n.º 0013083- 921.2021.8.16.0013; quebra de sigilo bancário n.º 000XXXX-10.2022.8.16.0013; e busca e apreensão n.º 000XXXX-16.2023.8.16.0013. Sustenta que o advogado JORGE RIVADAVIA VARGAS NETO, filho do Desembargador JORGE DE OLIVEIRA VARGAS, “está sendo investigado pelo Parquet paranaense pelo suposto cometimento de lavagem de dinheiro oriundo de arrendamento de imóveis rurais do Reclamante Abib Miguel, mediante o recebimento de transferências de terceiros em sua conta bancária” (fls. 5/6). Afirma que consta da Informação de Auditoria nº 328, de 27/04/2023 (fls. 61/89) o relatório de análise das movimentações bancárias dos investigados, identificando transferências bancárias do Desembargador do TJPR para seu filho. Em razão disso, defende que o MPPR “está se valendo de artifícios ilícitos para manipular a competência desta Corte Superior para supervisionar a investigação” (fl. 7). Sustenta que se devem remeter os autos ao STJ, com a declaração da nulidade dos atos praticados pelas instâncias ordinárias após a elaboração do relatório de análise de dados da autoridade com prerrogativa de foro em razão da função. Requer, liminarmente, a suspensão do andamento, até o julgamento do mérito da presente reclamação, dos seguintes autos: PIC MPPR-0046.21.06194-5 (003XXXX-68.2023.8.16.0013); de busca e apreensão n.º 0013083-921.2021.8.16.0013; da quebra de sigilo bancário n.º 000XXXX-10.2022.8.16.0013; e da busca e apreensão n.º 000XXXX-16.2023.8.16.0013, todos em trâmite perante a 4ª Vara Criminal de Curitiba/PR. No mérito, pleiteia seja julgada procedente a presente reclamação para que, nos termos do art. 78, inciso III, do CPP, os autos mencionados sejam remetidos a esta Corte Superior, para que exerça sua jurisdição da maneira que entender mais adequada, nos termos do art. 105, inciso I, alínea a, da CRFB/88; e, cumulativamente, seja, com fundamento no art. 564, inciso I, do CPP, c./c. art. 992 do CPC, declarada a nulidade de todos os atos praticados posteriores à data de 27/04/2023. Às fls. 95/6.710, o reclamante juntou cópias dos processos mencionados na inicial. Às fls. 6.712/6.713, indeferi o pedido liminar, bem como o pedido de reconsideração (fls. 19.949), com a determinação de cumprimento d

a decisão anterior. O MPPR, nas contrarrazões, informa que “referido PIC foi instaurado para apurar possível sistema criminoso de exploração de gigantescas e lucrativas áreas rurais de Goiás por organização criminosa, cujas atividades ilícitas foram continuadas desde o esquema criminoso investigado na ‘Operação Agronautas’, iniciada no ano de 2014” (fl. 19.960). Argumenta que, “evidentemente, toda e qualquer movimentação pelos investigados realizadas passou pela análise pericial, o que não significa dizer, por outro lado, que a legalidade das transferências bancárias feitas pelo Excelentíssimo Desembargador do Egr. TJPR Jorge de Oliveira Vargas ao seu filho está sob investigação”. Ressalta que o Desembargador não é investigado nos procedimentos em questão. Pugna pela improcedência do pedido (fls. 19.958/19.966 e-STJ). Às fls. 20.071/20.073, o juízo reclamado prestou informações sobre o andamento dos procedimentos. O Ministério Público Federal manifestou-se pela improcedência da reclamação (fls. 20076/20083). Assim posta a questão, passo a decidir. A presente reclamação foi apresentada pelo reclamante, que é parte interessada, para preservar a competência do STJ e para garantir a autoridade de suas decisões. Alega, resumidamente, a usurpação de competência desta Corte devido à investigação envolvendo autoridade com foro por prerrogativa de função pelo Juízo de primeiro grau. Presentes os pressupostos de admissibilidade da reclamação, consoante os termos do art. 105, I, f, da Constituição Federal, e do art. 187 do RISTJ, merece ser conhecida. No mérito, contudo, o pedido deve ser julgado improcedente. A autoridade com prerrogativa de foro não é investigada pelo MPPR, conforme demonstrado no parecer ministerial (fls. 200709/20082): “No presente caso, o nome do Desembargador JORGE DE OLIVEIRA VARGAS foi mencionado em relatório – Informação de Auditoria nº 328, de 27/04/2023 (fls. 61/89 e-STJ) – que analisou as movimentações financeiras do investigado JORGE RIVADAVIA VARGAS NETO, filho do Desembargador, e outros investigados. Especificamente, o perito oficial do MPPR relatou a existência de 41 (quarenta e uma) transferências do Desembargador para seu filho, totalizando R$ 257.204,77 (duzentos e cinquenta e sete mil, duzentos e quatro reais e setenta e sete centavos) em um período de 5 (cinco) anos e meio (02/01/2017 a 29/07/2022), bem como diversas outras transações entre terceiros e o investigado. Em que pese tal informação, cabe destacar que não há qualquer indicativo de que o Desembargador JORGE DE OLIVEIRA VARGAS esteja envolvido nos fatos supostamente criminosos praticados pelo investigado JORGE RIVADAVIA VARGAS NETO, tampouco que o MPPR tenha, ilegalmente, investigado o Desembargador. Com efeito, trata-se de menção isolada ao nome da autoridade com foro por prerrogativa de função perante o STJ, a qual não é investigada formalmente – tampouco veladamente, como afirma o reclamante –, inexistindo indícios concretos de seu envolvimento em ilícitos penais. Nesse contexto, destaca-se que a menção a JORGE DE OLIVEIRA VARGAS foi feita em relatório técnico, elaborado por perito oficial, que analisou diversas transações realizadas pelos investigados em um período de 5 (cinco) anos e meio, constando o nome de diversas outras pessoas que, igualmente, não são investigadas. A mera menção ao Desembargador não atrai a competência do STJ para o processamento e para o julgamento do feito. A análise por peritos de certo período de tempo das transações bancárias realizadas pelos investigados com terceiros, incluindo singela menção no relatório do nome de várias pessoas, incluindo o do Desembargador, não implica que todas elas estejam sendo investigadas. A legitimidade de todas essas transações não estão a ser questionadas. As transações efetuadas pelo Desembargador para seu filho naturalmente apareceriam em um relatório em que o filho é investigado. Não há nenhum índice de abuso de direito ou de desvio de finalidade. Não há abuso de direito e nem uma pseudoinvestigação contra o filho para alcançar, por vias transversas, o pai. Ao contrário, como se destaca o MPF, além de a autoridade com prerrogativa de foro nesta Corte não ser alvo da investigação, foram tomadas várias medidas para evitar a alegada usurpação de competência (fl. 20082/20083): Além de não existir linha investigativa em desfavor do Desembargador, consta ainda que foram tomadas diversas precauções pelos órgãos investigativos a fim de evitar a realização de diligências que pudessem atingi-lo. Nesse sentido, conforme informado pelo MPPR (fls. 19.964/19.965 e-STJ: Ao longo das investigações, foi verificado que JORGE RIVADAVIA VARGAS NETO passou a atuar como administrador oculto dos bens do líder da organização criminosa, ora reclamante, ABIB MIGUEL, ultrapassando os limites de uma atuação conforme o direito que se esperaria do profissional no exercício de sua profissão. Deferido o pedido de busca domiciliar, o Ministério Público do Estado do Paraná realizou consultas em fontes abertas e fechadas de informação para, justamente, confirmar que os endereços obtidos eram exclusivamente do investigado Jorge Rivadavia Vargas Neto (cf. documentos em anexo). Recebida a informação de que um dos endereços obtidos poderia ser, na verdade, do genitor do investigado, Desembargador Jorge de Oliveira Vargas, o órgão ministerial deixou de realizar a diligência neste endereço, uma vez inexistente qualquer linha investigativa que alcançasse o membro do Tribunal de Justiça do Estado do Paraná. O que há é uma investigação contra o filho do Desembargador, que, segundo o MPPR, possivelmente estaria envolvido em uma série de infrações penais. A mera menção, em relatório de transações financeiras, a transferências que o Desembargador fez ao filho não macula, em absoluto, a conduta do Desembargador. Trata-se, portanto, de mera menção, sem qualquer desdobramento investigativo. Não há nenhuma suspeita no momento, nem mesmo indireta, de que o Desembargador teria atuado de maneira irregular – muito menos ilícita. O filho do Desembargador não pode ser juridicamente blindado pela condição jurídica de seu pai, nem pelo cargo que ocupa. Não pode servir de pretexto para atingir autoridade com prerrogativa de foro. Mas tampouco pode essa condição gerar um salvo-conduto para não ser investigado ou para só ser investigado no STJ. A prerrogativa de foro deve ser interpretada restritivamente. Protege o cargo; e não a pessoa. Logo, se o Desembargador não é investigado (e se em nenhum momento havia um intenção oculta de o fazer), o pedido da reclamação deve ser julgado improcedente. Assim, diante da absoluta falta de evidências, no momento, que relacionem o Desembargador aos fatos sob investigação e diante, ainda, das possíveis infrações penais cometidas por seu filho (que demandam efetiva apuração), não ocorreu usurpação de competência desta Corte. Não há abuso de direito e nem tentativa de atingir, por vias transversas, o Desembargador, sobre o qual não paira, no momento, nenhuma suspeita – nem mesmo em tese. Portanto, as investigações devem prosseguir no Juízo de primeira instância. Ante o exposto, julgo improcedente a presente reclamação. Intimem-se. Brasília, 02 de maio de 2024. Ministra Maria Isabel Gallotti Relatora

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