26 de Maio de 2024
- 2º Grau
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Detalhes
Processo
Órgão Julgador
Partes
Publicação
Julgamento
Relator
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Inteiro Teor
10/11/2022 PRIMEIRA TURMA
AG.REG. NO RECURSO EXTRAORDINÁRIO COM AGRAVO 1.388.007
TOCANTINS
RELATOR : MIN. DIAS TOFFOLI
AGTE.(S) : ESTADO DO TOCANTINS
PROC.(A/S)(ES) : PROCURADOR-GERAL DO ESTADO DO TOCANTINS AGDO.(A/S) : DEFENSORIA PÚBLICA DO ESTADO DO
TOCANTINS
PROC.(A/S)(ES) : DEFENSOR PÚBLICO-GERAL DO ESTADO DO
TOCANTINS
EMENTA
Agravo regimental em recurso extraordinário com agravo. Administrativo. Ação civil pública. Direito à educação. Rede pública de ensino. Alunos da zona rural. Transporte escolar. Políticas públicas. Violação do princípio da separação dos poderes. Não ocorrência. Fatos e provas. Reexame. Impossibilidade. Precedentes.
1. O Poder Judiciário, em situações excepcionais, pode determinar que a Administração Pública adote medidas assecuratórias de direitos constitucionalmente reconhecidos como essenciais, sem que isso configure violação do princípio da separação dos poderes inserto no art. 2º da Constituição Federal.
2. É inviável, em recurso extraordinário, o reexame dos fatos e das provas dos autos. Incidência da Súmula nº 279/STF.
3. Agravo regimental não provido.
4. É inaplicável o art. 85, § 11, do CPC, haja vista tratar-se, na origem, de ação civil pública (art. 18 da Lei nº 7.347/85).
ACÓRDÃO
Vistos, relatados e discutidos estes autos, acordam os Ministros da Primeira Turma do Supremo Tribunal Federal, em sessão virtual de 28/10 a 9/11/22, na conformidade da ata do julgamento e nos termos do voto do Relator, Ministro Dias Toffoli, por unanimidade de votos, em negar provimento ao agravo regimental. É inaplicável o art. 85, § 11, do CPC, haja vista tratar-se, na origem, de ação civil pública (art. 18 da Lei nº 7.347/85).
Brasília, 10 de novembro de 2022.
Ministro Dias Toffoli
Relator
10/11/2022 PRIMEIRA TURMA
AG.REG. NO RECURSO EXTRAORDINÁRIO COM AGRAVO 1.388.007
TOCANTINS
RELATOR : MIN. DIAS TOFFOLI
AGTE.(S) : ESTADO DO TOCANTINS
PROC.(A/S)(ES) : PROCURADOR-GERAL DO ESTADO DO TOCANTINS AGDO.(A/S) : DEFENSORIA PÚBLICA DO ESTADO DO
TOCANTINS
PROC.(A/S)(ES) : DEFENSOR PÚBLICO-GERAL DO ESTADO DO
TOCANTINS
RELATÓRIO
O SENHOR MINISTRO DIAS TOFFOLI (RELATOR):
Estado do Tocantins interpõe tempestivo agravo regimental contra decisão mediante a qual neguei seguimento ao recurso extraordinário devido à consonância do acórdão recorrido com a jurisprudência do Supremo Tribunal Federal acerca da possibilidade de o Poder Judiciário, em situações excepcionais, determinar que a Administração Pública adote medidas assecuratórias de direitos constitucionalmente reconhecidos como essenciais, sem que isso configure violação do princípio da separação de poderes.
Em suas razões recursais, o agravante defende a reforma da decisão agravada por violação do princípio da separação dos poderes.
Sustenta que "as questões relacionadas ao pleito estão no campo da discricionariedade administrativa, envolvendo a tomada de decisões relacionadas à gestão eficiente de recursos públicos", e, portanto, não podem ser objeto de análise do Poder Judiciário.
Destaca que
"a decisão sobre quais medidas devem ser adotadas para a execução do orçamento público, salvo casos excepcionais que envolvam risco à direitos individuais e coletivos, não está no âmbito das atribuições do Poder Judiciário, mas sim do Poder
Executivo, enquanto poder com maior capacidade institucional para realizar um juízo técnico e globalizado sobre todas as necessidades públicas que devem ser satisfeitas pelo limitado orçamento estatal".
Apresenta precedentes desta Corte sobre a questão e argumenta não ser aplicável ao caso a Súmula nº 279/STF.
Requer o agravante a reconsideração da decisão agravada ou a submissão da presente insurgência ao colegiado competente.
Em atenção ao princípio da celeridade processual e por não verificar prejuízo para a parte agravada, deixei de abrir prazo para contrarrazões.
É o relatório.
10/11/2022 PRIMEIRA TURMA
AG.REG. NO RECURSO EXTRAORDINÁRIO COM AGRAVO 1.388.007
TOCANTINS
VOTO
O SENHOR MINISTRO DIAS TOFFOLI (RELATOR):
O inconformismo não merece prosperar.
Trata-se, na origem, de ação civil pública proposta pela Defensoria Pública do Estado do Tocantins contra o Município de Ponte Alta do Bom Jesus e o Estado do Tocantins para que esses fossem compelidos a regularizar o fornecimento de transporte escolar para os alunos residentes na zona rural do município em horário compatível com o início e o término das aulas.
O Tribunal de Justiça do Estado do Tocantins, por meio da decisão impugnada no apelo extremo, deu parcial provimento à apelação manejada pelo Município de Ponte Alta do Bom Jesus, a fim de reformar a sentença recorrida tão somente para afastar a cominação de multa pessoal aos gestores públicos, e negou provimento ao apelo do Estado do Tocantins, mantendo a sentença que assentou a responsabilização solidária do Município e do Estado pelo fornecimento gratuito, integral e contínuo de transporte escolar a todos os alunos das comunidades rurais de Ponte Alta do Bom Jesus matriculados na rede pública de ensino.
Consoante expresso na decisão agravada, pacificou-se nesta Corte o entendimento de que o Poder Judiciário, em situações excepcionais, pode determinar que a Administração Pública adote medidas assecuratórias de direitos constitucionalmente reconhecidos como essenciais, como se dá no caso dos autos, sem que isso configure violação do princípio da separação dos poderes, uma vez que não se trata de ingerência ilegítima de um Poder na esfera de outro. Sobre o tema, além dos precedentes já citados, anotem-se os seguintes:
"AGRAVO REGIMENTAL EM RECURSO EXTRAORDINÁRIO COM AGRAVO. INTERPOSIÇÃO EM 14.6.2016. DIREITO CONSTITUCIONAL. IMPLEMENTAÇÃO
DE POLÍTICAS PÚBLICAS. POSSIBILIDADE. VIOLAÇÃO AO PRINCÍPIO DA SEPARAÇÃO DE PODERES. INOCORRÊNCIA. MAJORAÇÃO DE HONORÁRIOS ADVOCATÍCIOS. IMPOSIÇÃO DE MULTA. AGRAVO REGIMENTAL DESPROVIDO . 1. O Poder Judiciário, em situações excepcionais, pode determinar ao Estado a obrigação de fazer reparação em escolas, quando estas se encontrarem em condições precárias, por se relacionarem a direitos ou garantias fundamentais, sem que isso ofenda o princípio da separação dos poderes. 2. Agravo regimental a que se nega provimento, com majoração de honorários advocatícios, com base no art. 85, § 11, do CPC, e aplicação de multa, nos termos do art. 1.021, § 4º, do CPC" (ARE nº 942.573/PB-AgR, Primeira Turma, Rel. Min. Edson Fachin, DJe de 13/2/17).
"Agravo regimental no recurso extraordinário. Direito Constitucional. Ação civil pública. Reforma em escola. Implementação de políticas públicas. Possibilidade. Violação do princípio da separação dos poderes. Não ocorrência. Precedentes. 1. O Poder Judiciário, em situações excepcionais, pode determinar que a Administração Pública adote medidas assecuratórias de direitos constitucionalmente reconhecidos como essenciais, sem que isso configure violação do princípio da separação dos poderes, inserto no art. 2º da Constituição Federal. 2. Agravo regimental não provido. 3. Inaplicável o art. 85, § 11, do CPC, pois não houve fixação prévia de honorários advocatícios na causa" (ARE nº 908.670/PB-AgR, Segunda Turma, de minha relatoria, DJe de 4/5/17).
"Agravo regimental no recurso extraordinário com agravo. Direito Constitucional. Ação civil pública. Criança e adolescente. Conselho tutelar. Implementação de políticas públicas. Possibilidade. Violação do princípio da separação dos poderes. Não ocorrência. Fatos e provas. Reexame. Impossibilidade. Precedentes. 1. O Poder Judiciário, em situações excepcionais, pode determinar que a Administração pública adote medidas assecuratórias de direitos constitucionalmente reconhecidos como essenciais, sem que isso configure violação do princípio da separação dos poderes, inserto no art. 2º da Constituição Federal. 2. O recurso extraordinário não se presta para o reexame do conjunto fático- probatório da causa. Incidência da Súmula nº 279/STF. 3. Agravo regimental não provido" (ARE nº 827.568/DF-AgR, Segunda Turma, de minha relatoria, DJe de 16/5/16).
Do acórdão recorrido destaca-se a seguinte passagem:
"A Apelada, Defensoria Pública do Estado do Tocantins, segundo emerge dos autos originários, objetivou, em síntese, compelir os Apelantes ao cumprimento de seus deveres constitucionais para com os alunos da zona rural do Município de Ponte Alta do Bom Jesus, em sua esmagadora maioria carentes, os quais se encontram em enorme prejuízo, estando alguns deles na iminência de até mesmo perderem o ano letivo, já que não frequentam a escola desde o início das aulas ante a desídia dos Apelantes em fornecer transporte escolar integral, gratuito e contínuo.
(...)
A Apelada, Defensoria Pública do Estado do Tocantins, segundo emerge dos autos originários, objetivou, em síntese, compelir os Apelantes ao cumprimento de seus deveres constitucionais para com os alunos da zona rural do Município de Ponte Alta do Bom Jesus, em sua esmagadora maioria carentes, os quais se encontram em enorme prejuízo, estando alguns deles na iminência de até mesmo perderem o ano letivo, já que não frequentam a escola desde o início das aulas ante a desídia dos Apelantes em fornecer transporte escolar integral, gratuito e contínuo.
(...)
Ademais, vale destacar que o Programa Nacional de Apoio ao Transporte Escolar (PNATE) foi instituído pela Medida Provisória nº 173/2004, convertida na Lei nº
10.880/2004, e consiste na transferência, em caráter suplementar, aos Estados, ao Distrito Federal e aos Municípios, de recursos financeiros destinados a custear a oferta de transporte escolar aos alunos da educação básica pública, residentes em área rural, com os objetivos de melhorar as condições de acesso à educação e diminuição da evasão escolar, em atendimento ao princípio da isonomia e em cumprimento ao artigo 206 da Constituição Federal - CF, que estabelece a igualdade de condições para o acesso e permanência na escola.
O caráter suplementar dessa assistência financeira da União para transporte escolar, através do FNDE, para os demais Entes Federados, é reconhecido no § 4º do artigo 2º da Lei nº 10.880/2004, em razão do disposto no inciso VII do artigo 208 da CF, pelo qual é dever do Estado garantir atendimento ao educando, por meio de programas suplementares de material didático escolar, transporte, alimentação e assistência à saúde.
Assim, conclui-se pela responsabilidade dos Apelantes para o cumprimento da obrigação de fornecer o transporte escolar aos alunos das comunidades rurais do Município de Ponte Alta do Bom Jesus, afastando de plano qualquer objeção acerca da responsabilidade destes no intuito de se eximirem da obrigação legal que possuem da prestação do serviço de transporte escolar, como se registra na espécie dos autos, especialmente aos alunos menos favorecidos.
Princípio da separação dos poderes. Controle judicial sobre as políticas públicas. Teoria da reserva do possível.
Relativamente a este ponto, o Estado do Tocantins aduz em suas argumentações recursais estar ocorrendo interferência do Poder Judiciário no Poder Executivo, em ofensa ao princípio da separação dos poderes, bem ainda, não ser possível o controle do Poder Judiciário sobre as políticas públicas.
Em que pese tais alegações, sabe-se ser garantia constitucional o direito à educação, sendo dever do Poder Público seu acesso pleno, disponibilizando, inclusive, transporte escolar gratuito àqueles que necessitam, em observância ao disposto no artigo 208, inciso VII, da CF e no artigo 54, inciso VII, do Estatuto da Criança e do Adolescente - ECA; ao que configurada a inércia da Administração Pública, no caso os Apelantes, incumbe ao Poder Judiciário, quando provocado, assegurar o cumprimento do direito à educação, constitucionalmente previsto (artigo 6º da CF), sem que isso caracterize ingerência do Poder Judiciário sobre as políticas públicas.
(...)
Lado outro, referentemente à tutela do direito fundamental à educação, indubitável que esta deve prevalecer sobre a tese de limitação de recursos e da reserva do possível, situação que só se excepciona quando o Ente Público comprove objetivamente a absoluta inexequibilidade do direito social pleiteado, por insuficiência de recursos, situação não verificada no caso em exame."
Assim, é certo que, conforme consignado na decisão agravada, para se superar o entendimento da Corte de Origem acerca da responsabilidade solidária do ora recorrente e da ausência de comprovação da ausência de recursos para o atendimento do pleito formulado na petição inicial, seria necessário o reexame do conjunto fático-probatório dos autos, bem como da legislação infraconstitucional aplicada pela Corte Local, o que foge do campo do recurso extraordinário. Incidência da Súmula nº 279 do STF.
Subsistem, portanto, as razões de decidir expendidas em sede monocrática, as quais mantenho na íntegra.
Ante o exposto, nego provimento ao agravo regimental.
Não se aplica ao caso o art. 85, § 11, do Código de Processo Civil, haja vista tratar-se, na origem, de ação civil pública (art. 18 da Lei nº 7.347/85).
É como voto.
PRIMEIRA TURMA
EXTRATO DE ATA
AG.REG. NO RECURSO EXTRAORDINÁRIO COM AGRAVO 1.388.007
PROCED. : TOCANTINS
RELATOR : MIN. DIAS TOFFOLI
AGTE.(S) : ESTADO DO TOCANTINS
PROC.(A/S)(ES) : PROCURADOR-GERAL DO ESTADO DO TOCANTINS
AGDO.(A/S) : DEFENSORIA PÚBLICA DO ESTADO DO TOCANTINS
PROC.(A/S)(ES) : DEFENSOR PÚBLICO-GERAL DO ESTADO DO TOCANTINS
Decisão: A Turma, por unanimidade, negou provimento ao agravo regimental, nos termos do voto do Relator. Inaplicável o art. 85, § 11, do CPC, haja vista tratar-se, na origem, de ação civil pública (art. 18 da Lei nº 7.347/85). Primeira Turma, Sessão Virtual de 28.10.2022 a 9.11.2022.
Composição: Ministros Cármen Lúcia (Presidente), Dias Toffoli, Luiz Fux, Luís Roberto Barroso e Alexandre de Moraes.
Disponibilizou processo para esta Sessão o Ministro André Mendonça, não tendo participado do julgamento desse feito a Ministra Cármen Lúcia.
Luiz Gustavo Silva Almeida
Secretário da Primeira Turma