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1 de Junho de 2024
  • 2º Grau
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Detalhes

Processo

Órgão Julgador

PRIMEIRA CAMARA CÍVEL

Publicação

Relator

PILAR CELIA TOBIO DE CLARO
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Inteiro Teor

PODER JUDICIÁRIO

TRIBUNAL DE JUSTIÇA DO ESTADO DA BAHIA

Primeira Câmara Cível


Processo: APELAÇÃO CÍVEL n. XXXXX-92.2014.8.05.0001
Órgão Julgador: Primeira Câmara Cível
APELANTE: MUNICIPIO DE SALVADOR
Advogado (s):
APELADO: MARIA LUCIA DE JESUS MELO
Advogado (s):

ACORDÃO

APELAÇÃO CÍVEL E REEXAME NECESSÁRIO. GRATUIDADE NO TRANSPORTE COLETIVO. RELATÓRIO MÉDICO QUE INDICA CLARAMENTE A MOBILIDADE REDUZIDA DA PACIENTE. INTERPRETAÇÃO SISTEMÁTICA E CONJUGADA DA LEI ORGÂNICA DO MUNICÍPIO DO SALVADOR, DA LEI MUNICIPAL Nº 7.201/2007 E DO DECRETO FEDERAL Nº 5.296/2004. PESSOA CARENTE. HONORÁRIOS ADVOCATÍCIOS A SEREM ARCADOS PELO MUNICÍPIO DE SALVADOR EM PROL DA DEFENSORIA PÚBLICA. VIABILIDADE. SENTENÇA CONFIRMADA. APELO CONHECIDO E NÃO PROVIDO.

A C Ó R D Ã O

Vistos, relatados e discutidos os autos da apelação nº 0502195-92.2014.805.0001, oriundos da comarca de Salvador, em que figuram, como apelante, Município de Salvador, e, como apelada, Maria Lucia de Jesus Melo.

A C O R D A M os Senhores Desembargadores integrantes da Turma Julgadora da Primeira Câmara Cível do Tribunal de Justiça do Estado da Bahia, por unanimidade, em CONHECER e, no mérito, NEGAR PROVIMENTO à apelação, pelas razões contidas no voto condutor.

Sala de Sessões, _____ de __________________ de 2022.

Presidente

Desª. Pilar Célia Tobio de Claro

Relatora

Procurador (a) de Justiça

5

PODER JUDICIÁRIO

TRIBUNAL DE JUSTIÇA DO ESTADO DA BAHIA

PRIMEIRA CÂMARA CÍVEL

DECISÃO PROCLAMADA

Conhecido e não provido Por Unanimidade

Salvador, 14 de Março de 2022.


PODER JUDICIÁRIO

TRIBUNAL DE JUSTIÇA DO ESTADO DA BAHIA

Primeira Câmara Cível

Processo: APELAÇÃO CÍVEL n. XXXXX-92.2014.8.05.0001
Órgão Julgador: Primeira Câmara Cível
APELANTE: MUNICIPIO DE SALVADOR
Advogado (s):
APELADO: MARIA LUCIA DE JESUS MELO
Advogado (s):

RELATÓRIO

Cuida-se de recurso de apelação interposto pelo Município de Salvador contra sentença proferida pelo juízo da 5ª Vara Fazenda Pública da comarca de Salvador, que, nos autos da ação ordinária nº 0502195-92.2014.805.0001, movida por Maria Lucia de Jesus Melo em face da municipalidade, julgou procedente o pedido da exordial, para autorizar a concessão do benefício da gratuidade no transporte coletivo em favor da autora, com direito a acompanhante, condenando o réu ao pagamento de honorários advocatícios, no importe de R$1.500,00 (hum mil e quinhentos reais). Sem custas.

Nas razões recursais (id. XXXXX), o apelante alegou, em síntese, que a necessidade de deslocamento a unidades de saúde e a carência de recursos financeiros não são, por si só, motivos suficientes para deferimento do benefício, sob pena de quebra da legalidade e violação ao princípio da isonomia. Sustentou que, no âmbito do Município do Salvador, a gratuidade nos transportes coletivos destina-se à promoção social das pessoas portadoras de deficiência.

Pontuou que, de acordo com a Lei Municipal nº 7.201/2007, o passe livre deve ser concedido às pessoas com deficiências desde que: i) satisfaçam, após perícia médica, os critérios previstos no Decreto Federal nº 5.296/2004, e; ii) possuam renda familiar de até 03 (três) salários-mínimos, apurada após a devida investigação social do administrado, requisitos que não foram cumpridos pela apelada.

Alegou que a citada Lei não garante aos portadores de mobilidade reduzida o direito ao passe livre nos transportes. Assinalou que o direito ao acompanhante “encontra-se condicionado à necessidade de locomoção do titular do benefício”.

Destacou que o Plenário desta Corte de Justiça, nos autos do processo nº XXXXX-05.2010.8.05.0001, declarou a constitucionalidade do art. da Lei Municipal nº 7.201/2007, devendo tal precedente ser aplicado à espécie por ter um caráter vinculante.

Afirmou, ainda, que o Município é isento do pagamento de honorários advocatícios sucumbenciais em favor da Defensoria Pública Estadual.

Pugnou, ao final, pelo provimento do apelo, a fim de que seja reformada a sentença para julgar improcedente o pedido formulado na inicial. Subsidiariamente, requereu que fosse reconhecido a isenção do Município ao pagamento da verba honorária.

Certificou-se no id. XXXXX que, embora tenha sido devidamente intimada, a apelada deixou transcorrer in albis o prazo para apresentar contrarrazões.

Determinada a remessa dos autos ao Tribunal de Justiça do Estado da Bahia, o feito fora distribuído à Primeira Câmara Cível, cabendo-me, por sorteio, exercer a relatoria.

É o que me cumpre relatar.

Salvador/BA, 15 de fevereiro de 2022.


Desa. Pilar Célia Tobio de Claro

Relator

5


PODER JUDICIÁRIO

TRIBUNAL DE JUSTIÇA DO ESTADO DA BAHIA

Primeira Câmara Cível


Processo: APELAÇÃO CÍVEL n. XXXXX-92.2014.8.05.0001
Órgão Julgador: Primeira Câmara Cível
APELANTE: MUNICIPIO DE SALVADOR
Advogado (s):
APELADO: MARIA LUCIA DE JESUS MELO
Advogado (s):

VOTO

O recurso de apelação é cabível (art. 1.009 do CPC/2015), o apelante possui legitimidade e interesse recursal, e não há fato aparente impeditivo ou extintivo do direito de recorrer; além de se constatar a isenção do preparo em benefício da Fazenda Pública (art. 10, inciso IV, da Lei Estadual nº 12.373/2011), a tempestividade e a regularidade formal das insurgências; de sorte que, presentes os requisitos intrínsecos e extrínsecos de admissibilidade, conheço do recurso interposto.

Saliente-se, que, por se tratar de decisão ilíquida, a sentença proferida pelo juízo a quo está sujeita ao reexame necessário, nos termos do art. 496 do Código de Processo Civil.

Após detido exame dos autos, tenho que não assiste razão ao Município apelante.

Afigura-se juridicamente inquestionável a obrigatoriedade do Município do Salvador em assegurar gratuidade no Sistema de Transporte Coletivo por Ônibus de Salvador (STCO) aos deficientes físicos e mentais, e às pessoas com mobilidade reduzida, carentes de recursos financeiros, nos termos do art. 247, inciso III, da Lei Orgânica do Município do Salvador c/c arts. e da Lei Municipal nº 7.201/2007 c/c art. do Decreto Federal nº 5.296/2004:

Lei Orgânica do Município do Salvador:

Art. 247. Fica assegurada a gratuidade nos transportes coletivos urbanos:

(...)

III – às pessoas com deficiência, visual, mental e física, de coordenação motora, comprovadamente carentes, previamente autorizadas pelo Conselho Municipal de Pessoas com Deficiência e o Órgão Gestor dos Transportes Urbanos.

Lei Municipal nº 7.201/2007:

Art. 1º O acesso pela porta de desembarque dos ônibus urbanos convencionais será permitido, exclusivamente, ao policial militar fardado, limitado ao número de 02 (dois) por veículo, ao idoso com mais de 65 (sessenta e cinco) anos com apresentação da carteira de identidade civil original, à pessoa com deficiência e acuidade visual nula bilateral, aos deficientes físicos com dificuldade de locomoção, atestada por perito médico e comprovada sua carência econômica.

Parágrafo Único - O acesso pela porta de desembarque também será facultado a gestante e ao obeso que não tiverem condições de passar pela catraca, devendo estes pagar e registrar as suas passagens junto ao cobrador.

Art. 2º As demais pessoas com deficiência, desde que comprovada sua carência econômica, e outras categorias de beneficiários de gratuidade que venham a ser instituídas legalmente, com a correspondente cobertura dos custos, terão acesso aos ônibus convencionais de Salvador, através da porta de embarque, utilizando o cartão eletrônico, emitido pelo Sindicato das Empresas de Transporte de Passageiros de Salvador - SETPS, passando pela catraca e registrando a passagem no validador dos ônibus.

§ 1º Será considerada pessoa com deficiência, para efeito de gratuidade no Sistema de Transporte Coletivo por ônibus de Salvador - STCO, o previsto no art. 247, da Lei Orgânica do Município em combinação com os critérios dispostos no art. do Decreto Federal nº 5.296/2004.

Decreto Federal nº 5.296/2004:

Art. 5º. Os órgãos da administração pública direta, indireta e fundacional, as empresas prestadoras de serviços públicos e as instituições financeiras deverão dispensar atendimento prioritário às pessoas portadoras de deficiência ou com mobilidade reduzida.

§ 1º Considera-se, para os efeitos deste Decreto:

I - pessoa portadora de deficiência, além daquelas previstas na Lei no 10.690, de 16 de junho de 2003, a que possui limitação ou incapacidade para o desempenho de atividade e se enquadra nas seguintes categorias:

a) deficiência física: alteração completa ou parcial de um ou mais segmentos do corpo humano, acarretando o comprometimento da função física, apresentando-se sob a forma de paraplegia, paraparesia, monoplegia, monoparesia, tetraplegia, tetraparesia, triplegia, triparesia, hemiplegia, hemiparesia, ostomia, amputação ou ausência de membro, paralisia cerebral, nanismo, membros com deformidade congênita ou adquirida, exceto as deformidades estéticas e as que não produzam dificuldades para o desempenho de funções;

(...)

II - pessoa com mobilidade reduzida, aquela que, não se enquadrando no conceito de pessoa portadora de deficiência, tenha, por qualquer motivo, dificuldade de movimentar-se, permanente ou temporariamente, gerando redução efetiva da mobilidade, flexibilidade, coordenação motora e percepção.

Diante desse contexto normativo, que deve ser interpretado sistematicamente, e examinado em consonância com o princípio da dignidade da pessoa humana, julgo que a dificuldade de locomoção referenciada pelo art. da Lei Municipal nº 7.201/2007 como albergada pela gratuidade no transporte coletivo de Salvador deve ser compreendida de acordo com a definição de pessoa com mobilidade reduzida prevista no art. , § 1º, inciso II, do Decreto Federal nº 5.296/2004, transcrita acima.

No caso sob análise, a autora/apelada comprovou que possui sequelas decorrentes de transtornos de discos lombares e de outros discos intervertebrais com radiculopatia (Cid 10 M51.1), agravada pela presença de outras gonatroses (CID10 M17.4), diabetes mellitus insulino-dependente (CID10 E.10), disfunção do labirinto (CID10 H83.2) e perda de audição (CID10 H90.5), necessitando de acompanhamento clínico contínuo, consoante relatório médico juntado com exordial (id. XXXXX).

No meu sentir, tais elementos afiguram-se suficientes para demonstrar que a autora/apelada possui dificuldade de se movimentar, enquadrando-se no conceito de pessoa com mobilidade reduzida estampado no art. , § 1º, inciso II, do Decreto Federal nº 5.296/2004, fazendo jus à gratuidade no Sistema de Transporte Coletivo por Ônibus de Salvador (STCO), tal como consignado pelo juízo sentenciante.

Em complemento, julgo que a autora/apelada comprovou a contento sua hipossuficiência financeira, já que é processualmente representada pela Defensoria Pública do Estado da Bahia.

Outrossim, possuindo a autora/apelada enfermidade que acarreta limitações à sua locomoção diária, revela-se fundamental a concessão de passe livre para transporte municipal a seu acompanhante, sob pena de frustrar o próprio tratamento médico de que necessita.

E nem se cogite em infringência à declaração de constitucionalidade do art. da Lei Municipal nº 7.201/2007, consignada pelo Tribunal Pleno incidentalmente no julgamento da apelação nº XXXXX-05.2010.8.05.0001, tendo em vista que o benefício em questão está sendo deferido em consonância com a interpretação sistemática e conjugada da Lei Orgânica do Município do Salvador, da Lei Municipal nº 7.201/2007 e do Decreto Federal nº 5.296/2004, sem afastar em absoluto a validade do dispositivo legal reputado constitucional.

Por fim, no tocante à condenação do Município ao pagamento de honorários advocatícios, importa salientar que a atuação da Defensoria Pública do Estado da Bahia, no caso em tela, se deu em face de ente federativo diverso da qual é parte integrante, revelando-se cabível a condenação da municipalidade ao pagamento dos honorários.

Neste sentido, o STJ, no REsp XXXXX/RJ, submetido à sistemática dos recursos repetitivos, firmou a seguinte tese:

PROCESSUAL CIVIL. RECURSO ESPECIAL SUBMETIDO À SISTEMÁTICA PREVISTA NO ART. 543-C DO CPC. HONORÁRIOS ADVOCATÍCIOS. DEFENSORIA PÚBLICA. CÓDIGO CIVIL, ART. 381 (CONFUSÃO). PRESSUPOSTOS.

1. Segundo noção clássica do direito das obrigações, ocorre confusão quando uma mesma pessoa reúne as qualidades de credor e devedor.

2. Em tal hipótese, por incompatibilidade lógica e expressa previsão legal extingue-se a obrigação.

3. Com base nessa premissa, a jurisprudência desta Corte tem assentado o entendimento de que não são devidos honorários advocatícios à Defensoria Pública quando atua contra a pessoa jurídica de direito público da qual é parte integrante.

4. A contrario sensu, reconhece-se o direito ao recebimento dos honorários advocatícios se a atuação se dá em face de ente federativo diverso, como, por exemplo, quando a Defensoria Pública Estadual atua contra Município.

5. Recurso especial provido. Acórdão sujeito à sistemática prevista no art. 543-C do CPC e à Resolução nº 8/2008-STJ.

( REsp XXXXX/RJ, Rel. Ministra ELIANA CALMON, CORTE ESPECIAL, julgado em 03/06/2009, DJe 22/06/2009 – grifos aditados)

O entendimento firmado pelo STJ em sede de recurso repetitivo vem sendo reiterado em julgados mais recentes da própria Corte da Cidadania. A título exemplificativo, colaciona-se o seguinte precedente:

“[…] Por sua vez, em relação aos honorários advocatícios, destaque-se que, conforme consignado na decisão agravada, o STJ assentou o entendimento, no Resp XXXXX/RJ (Tema 129), de que os honorários advocatícios para a Defensoria Pública só são devidos quando esse órgão litiga contra ente diverso do qual faz parte, para evitar a confusão entre credor e devedor. Assim, a pretensão recursal do Estado de Pernambuco, contrária à não imposição de condenação à União ao pagamento dos honorários advocatícios, contraria referido entendimento firmado pelo STJ.

Ademais, nota-se, pela leitura dos autos, que não houve apreciação pelo Tribunal de origem sobre a tese, relativa ao artigo 85 do CPC, de que a União, apesar de também ser sucumbente na ação, foi indiretamente beneficiária dos honorários advocatícios a que o Estado de Pernambuco foi condenado a pagar. Assim sendo, ausente o prequestionamento da tese, nos termos das Súmulas XXXXX/STF e 211/STJ.

4. Agravo interno não provido“. ( AgInt no AgInt no REsp XXXXX/PE, Rel. Ministro MAURO CAMPBELL MARQUES, SEGUNDA TURMA, julgado em 06/05/2020, DJe 08/05/2020 – excerto da ementa com grifos aditados)

Corroborando este entendimento, segue julgado oriundo deste Tribunal de Justiça:

APELAÇÃO CÍVEL. AÇÃO DE OBRIGAÇÃO DE FAZER. GRATUIDADE NO TRANSPORTE PÚBLICO. AUTORA PORTADORA DE TRANSTORNOS MENTAIS. SENTENÇA DE PROCEDÊNCIA. DEMANDA EM FACE DO MUNICÍPIO DE SALVADOR. DEFENSORIA PÚBLICA. HONORÁRIOS ADVOCATÍCIOS. CABIMENTO DA CONDENAÇÃO EM HONORÁRIOS ADVOCATÍCIOS EM FACE DA MUNICIPALIDADE. ENTENDIMENTO FIRMADO PELO EGRÉGIO STJ NOS TEMAS Nº 128 E 129. CABIMENTO. O Egrégio STJ firmou entendimento, ao julgar o recurso paradigma ( Resp XXXXX/RJ – TEMA 128 e 129), no sentido de que são devidos honorários advocatícios à Defensoria Pública quando sua atuação se dá em face de ente federativo diverso do qual é parte integrante. É a hipótese dos autos, motivo pelo qual o apelo deve ser provido. APELAÇÃO PROVIDA. (TJ-BA - APL: XXXXX20128050001, Relator: CASSINELZA DA COSTA SANTOS LOPES, QUARTA CÂMARA CÍVEL, Data de Publicação: 04/03/2020 – grifos aditados)


Ante o exposto, voto no sentido de CONHECER e, no mérito, NEGAR PROVIMENTO ao recurso de apelação, majorando os honorários de sucumbência devidos pela municipalidade para R$1.800,00 (um mil e oitocentos reais), nos termos do art. 85, § 11º, do CPC/2015.

Salvador, _____ de __________________ de 2022.

Desª. Pilar Célia Tobio de Claro

Relatora

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Disponível em: https://www.jusbrasil.com.br/jurisprudencia/tj-ba/1752400355/inteiro-teor-1752400356