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5 de Junho de 2024
  • 1º Grau
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TJMG • XXXXX-25.2015.8.13.0713 • Tribunal de Justiça de Minas Gerais - Inteiro Teor

Tribunal de Justiça de Minas Gerais
há 8 anos

Detalhes

Processo

Juiz

GIOVANNA TRAVENZOLLI ABREU LOURENÇO
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Autos do processo n.º 15/9035-3

Mandado de Segurança

Impetrante: Maria de Fátima Ferreira

Impetrados: Prefeito Municipal de Viçosa







SENTENÇA





Vistos.



I - RELATÓRIO

MARIA DE FÁTIMA FERREIRA, qualificada nos autos, impetrou MANDADO DE SEGURANÇA contra ato ilegal ou abusivo praticado pelo PREFEITO MUNICIPAL DE VIÇOSA alegando, em síntese, que é portadora de glaucoma primário de ângulo aberto (CID 40.1) e que em virtude desta patologia, o único tratamento capaz de melhorar sua qualidade de vida é o uso do fármaco Duotravatan que deverá ser utilizado de forma contínua, sob pena de perder a visão.

Verberou que o valor de cada caixa do referido medicamento custa aproximadamente R$112,85 (cento e doze reais e oitenta e cinco centavos), sendo que para cumprir o tratamento seriam necessárias duas caixas por mês, totalizando o valor de R$225,70 (duzentos e vinte e cinco reais e setenta centavos).

Assim, afirmando não possuir condições financeiras de arcar com o tratamento por auferir renda mensal equivalente a um salário mínimo narrou que a Secretaria Municipal de Saúde fornecia o referido medicamento, mas que em agosto de 2015 deixou de fazê-lo, o que ensejou a propositura do presente mandado de segurança, ante a urgência da situação.

Assim, com fundamento na responsabilidade do ente municipal requereu, liminarmente, a suspensão do ato que cessou o fornecimento do medicamento à impetrante, sob pena de fixação de multa diária em caso de descumprimento.

Requereu o benefício da gratuidade da justiça e atribuiu à causa o valor de R$ 1.000,00 (mil reais).

A inicial veio com os documentos à f. 09/17.

Decisão interlocutória de f. 19/21 que deferiu a liminar pleiteada e o benefício da gratuidade da justiça à parte autora.

Devidamente notificada (f. 23-23-v;24/24-v), a autoridade coatora ofereceu contestação à f. 26/30 sustentando, preliminarmente, a incompetência absoluta do juízo para julgar a matéria em apreço, visto que a Lei 12.153/2009 teria estabelecido a competência dos Juizados Especiais da Fazenda Pública para solucionar o feito.

No mérito, aduziu que o caso em comento não seria hipótese de cabimento de Mandado de Segurança, visto que “o Município não possui obrigatoriedade de fornecer medicamentos” e que não houve comprovação da recusa administrativa de fornecimento do fármaco.

Ademais, verberou que os laudos médicos que fundamentam o mandado de segurança foram realizados unilateralmente por médicos particulares, o que os tornaria questionáveis, sendo imperiosa a ocorrência de dilação probatória na hipótese.

Por estes motivos, requereu a revogação da liminar concedida, vez que a escolha da via do Mandado de Segurança impediria o contraditório, bem como, ao final pleiteou a extinção do processo sem julgamento do mérito.

Agravo de Instrumento à f. 34/41.

Manifestação da autoridade coatora à f. 45/46.

Parecer do Ministério Público informando a necessidade de sua intervenção no feito (f. 56/57).

Após, os autos vieram conclusos para sentença.

É o relatório. Decido.



II – FUNDAMENTAÇÃO

Cuida-se de Mandado de Segurança impetrado pela MARIA DE FÁTIMA FERREIRA contra suposto ato ilegal ou abusivo praticado pelo PREFEITO MUNICIPAL DE VIÇOSA consistente no suposta cessação imotivada de fornecimento do fármaco Duotravatan (Travoprosta 0,04 mg/ml solução oftálmica – frasco de 2,5 ml), único medicamento compatível ao tratamento de sua patologia Glaucoma Primário de Ângulo Aberto (CID 40.1), sob pena de perda definitiva de sua visão.

A autoridade coatora, a seu turno, sustentou a preliminar de incompetência absoluta, bem como a incompatibilidade da via eleita, visto que a matéria demandaria dilação probatória.

Cinge-se a controvérsia, portanto, em averiguar se no caso em apreço deverá ser concedida a segurança para compelir a autoridade coatora a fornecer o medicamento pleiteado.

Pois bem.

Inicialmente, faz-se mister afastar a preliminar suscitada pela autoridade coatora no que diz respeito à competência absoluta dos juizados especiais da Fazenda Pública na hipótese, visto que o § 1º, inciso I, do artigo da Lei 12.153/2009 excluiu expressamente da competência dos Juizados Especiais da Fazenda Pública ações de mandado de segurança.

Quanto a alegação da autoridade coatora quanto a inadequação da via eleita, tal análise se confunde com o mérito e como tal, será enfrentada:

Inicialmente, alegou a autoridade coatora que “o município não possui obrigatoriedade de fornecer os medicamentos”. Tal alegação não prospera, visto que a Constituição Federal no artigo 23, II estabeleceu a competência comum e solidária dos entes federativos em matéria de saúde pública.

Dessa forma, sendo o acesso à saúde um direito constitucionalmente assegurado, constatada patologia que acomete a impetrante (f.15), bem como a sua hipossuficiência financeira (f. 14) para adquirir o fármaco indispensável ao tratamento, torna-se legítima a pretensão da impetrante, sendo dever do município fornecê-lo.

No que diz respeito ao fato de que a impetrante não teria comprovado a negativa do município de fornecimento da medicação, conforme aduzido na decisão que deferiu a liminar pleiteada (f. 19/21), as máximas da experiência revelam ser notória a dificuldade na obtenção de medicamentos, insumos e procedimentos cirúrgicos na rede pública de saúde, sendo o Poder Judiciário diuturnamente acionado para solucionar tais controvérsias.

Finalmente, os documentos acostados constituem prova pré-constituída do direito líquido e certo da impetrante, visto que ela foi diagnosticada como portadora de Glaucoma Primário Ângulo Aberto (H40.1), e em virtude dessa patologia, lhe foi receitado por médico especialista o uso crônico e ininterrupto do medicamento pleiteado, conforme documentos de f. 15/16.

Destarte, não há que se falar em necessidade de dilação probatória nos autos, conforme pleiteou a autoridade coatora sob a alegação de que “o Município fica impossibilitado de discutir a substituição do medicamento pleiteado por algum similar fornecido pelo SUS” (f.29), visto o fármaco foi receitado por profissionais especializados em oftalmologia, que assistem a impetrante, o que faz presumir que este seria o melhor indicado para o tratamento da patologia.

Sobre a questão, decidiu o E. Tribunal de Justiça de Minas Gerais:


MANDADO DE SEGURANÇA. DIREITO À SAÚDE. SUS. PACIENTE. GLAUCOMA. MEDICAMENTO NECESSÁRIO À MANUTENÇÃO DA PRESSÃO OCULAR NORMAL. CUSTO ELEVADO. IMPOSSIBILIDADE DE CUSTEIO PARTICULAR. PROVAS PRÉ-CONSTITUÍDAS. DIREITO LÍQUIDO E CERTO. DECISÃO LIMINAR CONFIRMADA. MULTA COMINATÓRIA DIÁRIA. POSSIBILIDADE. APRESENTAÇÃO DE RECEITA MÉDICA ATUALIZADA. SEGURANÇA PARCIALMENTE CONCEDIDA.
Demonstrado, mediante prova pré-constituída, que o impetrante, paciente portador de glaucoma, hipossuficiente segundo as regras ordinárias de experiências, não dispõe de recursos suficientes para custear, integralmente, o seu tratamento de saúde mediante uso de fármaco tio, atualmente, como mais eficaz, é de se conceder a segurança, reconhecendo-se a obrigação do Estado de Minas Gerais de fornecê-lo, gratuitamente, ao paciente, sob pena de multa cominatória diária, visando garantir o seu bem-estar mínimo, cumprindo-se, assim, o disposto no artigo 196 da Constituição da Republica, que assegura a todos os cidadãos o direito social à saúde digna, sobretudo por se tratar de fármaco que já é disponibilizado aos usuários do SUS. Ressalva-se, apenas, que o impetrante deverá apresentar à autoridade da rede pública de saúde prescrição médica atualizada como condição ao recebimento do referido medicamento.> (TJMG - Ap Cível/Reex Necessário XXXXX-0/001, Relator (a): Des.(a) Armando Freire , 1ª CÂMARA CÍVEL, julgamento em 11/06/2013, publicação da sumula em 20/06/2013)

Por todo o exposto, a negativa de fornecimento do fármaco pela autoridade coatora constitui violação de direito líquido e certo da impetrante à saúde, constitucionalmente garantido.

Com efeito, a segurança deve ser concedida, em caráter definitivo, para determinar que a autoridade coatora continue a fornecer a aludida medicação ao impetrante, a tempo e modo prescritos.

III. DISPOSITIVO

ISSO POSTO, CONCEDO A SEGURANÇA, em caráter definitivo, para determinar que a autoridade coatora continue a fornecer o colírio DUOTRAVATAN (Travoprosta 0,04 mg/ml solução oftálmica – frasco de 2,5 ml) à impetrante, a tempo e modo prescritos, ficando, pois, confirmada a tutela liminar, razão pela qual julgo extinto o processo, com resolução do mérito, nos termos do art. 485, VI, CPC.

A impetrante deverá apresentar à autoridade da rede pública de saúde prescrição médica atualizada como condição ao recebimento do referido medicamento.

Custas na forma da lei e sem condenação ao pagamento de honorários advocatícios, por força do art. 25, da Lei n.º 12.016/09 e Súmula 512, do STF.

Transmita-se em ofício, nos termos do art. 13, da Lei n.º 12.016/2009, por intermédio do oficial do juízo, ou pelo correio, mediante correspondência com aviso de recebimento, o inteiro teor da sentença à autoridade coatora e à pessoa jurídica interessada.

Remetam-se os autos ao Egrégio Tribunal de Justiça do Estado de Minas Gerais, para exercício do duplo grau de jurisdição obrigatório na espécie, nos termos do art. 14, § 1º da Lei n. 12.016/2009.

Publique-se. Registre-se. Intimem-se.



Viçosa, 23 de junho de 2016.





GIOVANNA TRAVENZOLLI ABREU LOURENÇO

Juíza de Direito









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