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18 de Maio de 2024
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    As nuanças jurídicas da decisão do STJ que diminuiu a pena imposta a Pimenta Neves

    há 16 anos

    A DECISÃO ( www.stj.jus.br )

    CONDENAÇÃO É MANTIDA E PIMENTA NEVES VAI CUMPRIR PENA DE 15 ANOS PELA MORTE DE JORNALISTA

    Está mantida a condenação do jornalista Antônio Marcos Pimenta Neves, que cumprirá pena de 15 anos de reclusão pela morte da jornalista Sandra Gomide, ocorrida em agosto de 2000. A decisão é da Sexta Turma do Superior Tribunal de Justiça, que conheceu, por unanimidade, o recurso especial da defesa de Pimenta Neves e deu parcial provimento apenas para reduzir a pena. O cálculo da pena se deu pelo voto médio dos integrantes da Turma, tendo como resultado o calculado pela relatora, ministra Maria Thereza de Assis Moura.

    O jornalista foi condenado pelo Tribunal do Júri, no ano passado, a 19 anos e dois meses de reclusão. A defesa apelou, pedindo a anulação do julgamento que o condenou, mas o Tribunal de Justiça de São Paulo (TJSP) apenas reconheceu a atenuante da confissão espontânea e reduziu a pena para 18 anos. A defesa recorreu, então, ao STJ, apontando nulidades que, se fossem reconhecidas, implicariam novo julgamento pelo júri.

    Ao votar, a relatora do caso considerou exagerada a majoração da pena-base em um terço, pois o juiz teria observado, no aumento da pena, fatores externos ao fato em si, como a alegação de grande trauma à família da vítima ou o conhecimento do condenado sobre a depressão da mãe de Sandra. Ao reduzir a pena para 15 anos, a ministra levou em conta apenas a qualificadora de impossibilidade de defesa da vítima, atingida por tiros nas costas e na cabeça. Segundo a ministra, o aumento da pena pela segunda qualificadora (motivo torpe) pode ser compensado pela diminuição da pena em razão da atenuante de confissão espontânea.

    O ministro Og Fernandes, que havia pedido visto do processo, afirmou não haver nenhuma das nulidades apontadas pela defesa tanto em relação ao questionário respondido pelo júri quanto na discussão sobre o exame de sanidade mental do condenado, que poderia ser reconhecido como inimputável. Para ele, não é necessária uma equivalência entre a agravante e a atenuante, sendo possível percentual diferenciado. Votou, então, pela pena-base de 14 anos, somados a 1/5 da qualificadora de motivo torpe, o que daria uma pena de 16 anos, 9 meses e 17 dias de reclusão.

    Terceira a votar, a desembargadora convocada Jane Silva observou que, se uma circunstância serve para qualificar o crime, não pode figurar como agravante sob pena de bis in idem (dupla penalidade). Ela recusou, então, a tese da compensação e retirou um ano da pena-base proposta pela relatora, por causa da atenuante da confissão espontânea. O ministro Nilson Naves concordou com os 14 anos. Último a votar, o ministro Paulo Gallotti concordou com o voto do ministro Og Fernandes.

    Como não houve maioria para nenhum dos votos, ficando os quatro ministros vencidos parcialmente na proporção de seus votos, o resultado que prevaleceu foi o voto médio caracterizado pelo tempo calculado pela relatora, ministra Maria Thereza de Assis Moura.

    NOTAS DA REDAÇÃO

    Em análise ao Recurso Especial interposto pela defesa de Pimenta Neves, o STJ decidiu pelo seu provimento parcial, afastando o reconhecimento de eventual nulidade, de forma a manter o julgamento e a decisão condenatória, determinando, apenas, a diminuição da pena imposta.

    Analisemos os argumentos apresentados pela defesa.

    a) cerceamento de defesa: pedidos de produção de provas elaborados pela defesa não teriam sido atendidos. Para a defesa, as provas suprimidas levariam à exclusão de qualificadoras, como o motivo torpe e a utilização de recurso que teria impossibilitado a defesa de vítima.

    b) violação aos artigos 251 , 416 e 425 parágrafo único do CPP , uma vez que o julgamento ocorreu sem que o processo estivesse pronto, em razão da pendência de providências pleiteadas pela defesa;

    c) violação aos artigos 458 , 4262 , parágrafo único , 464 cc artigos 112 , 252 incisos I e III , todos do CPP , em razão da ausência de imparcialidade dos jurados, que se mostraram influenciados pela atuação da mídia;

    d) divergência em relação à aplicação de uma das circunstâncias, considerada, ao mesmo tempo, como qualificadora para a majoração da pena, e, como agravante. No julgamento realizado nas instâncias inferiores aplicou-se entendimento segundo o qual, na concorrência de duas qualificadoras em homicídio qualificado, uma se aplica na fixação da pena-base e a outra, como agravante para o cálculo da pena definitiva.

    Para a defesa, o entendimento a ser considerado é o firmado pelo próprio STJ, no sentido de que, na incidência de duas qualificadoras, no homicídio qualificado, não pode uma delas ser considerada como agravante, e, ao mesmo tempo, como agravante, em razão da caracterização do chamado "bis in idem".

    e) nulidade na elaboração dos quesitos, no que se refere à inimputabilidade de Pimenta Neves;

    e) redução da pena em razão da atenuante genérica

    De todas as teses apresentadas, apenas uma foi acatada pelo STJ: a incidência da atenuante genérica da confissão.

    Analisemos o posicionamento do Tribunal da Cidadania. De acordo com os Ministros julgadores, não há fundamento para o reconhecimento de qualquer nulidade no processo.

    Em seu voto, a Ministra Maria Thereza de Assis Moura considerou, apenas, a qualificadora relacionada à utilização de recurso que teria impossibilitado a defesa da vítima, não reconhecendo o motivo torpe, que, a seu ver, na equivalência com a atenuante da confissão, restaria anulada.

    Aqui, uma importante observação se impõe. Poderia a Ministra relatora desqualificar a circunstância do motivo torpe, considerando-o mera agravante? A nosso ver, não.

    Durante todo o processo, tal circunstância foi tratada como qualificadora, não cabendo ao Tribunal ad quem alterar a sua natureza, agora, em grau de recurso.

    Estamos diante de hipótese de concorrência entre qualificadoras (recurso que impossibilita defesa da vítima e motivo torpe), situação em que o delito é qualificado pela circunstância mais gravosa, restando à outra natureza distinta.

    Sobre o tema, contamos atualmente com duas correntes. A primeira entende que as qualificadoras excedentes funcionam como circunstância desfavorável. Em contrapartida, há quem defenda que assumiriam a natureza de agravante.

    Para a jurisprudência do STF, a partir da segunda qualificadora, sendo essa também considerada, o que se verifica são circunstâncias judiciais desfavoráveis.

    Partindo dessa premissa, considerando-se o entendimento firmado pela nossa Suprema Corte, ainda que, no caso concreto, o motivo torpe perdesse a natureza de qualificadora, somente seria correto considerá-lo circunstância desfavorável, o que evidencia a impossibilidade de compensá-lo com a atenuante da confissão.

    Nesse sentido, a Ministra Jane Silva afastou a compensação entre tais circunstâncias, considerando a atenuante da confissão como fundamento para a diminuição da pena base aplicada a Pimenta Neves.

    Com a diminuição da pena base, uma conseqüência automática: a redução da pena definitiva. Trata-se de realidade que se extrai do artigo 68 do CP , in verbis:

    Art. 68 - A pena-base será fixada atendendo-se ao critério do Art. 59 deste Código; em seguida serão consideradas as circunstâncias atenuantes e agravantes; por último, as causas de diminuição e de aumento.

    Art. 59 - O juiz, atendendo à culpabilidade, aos antecedentes, à conduta social, à personalidade do agente, aos motivos, às circunstâncias e conseqüências do crime, bem como ao comportamento da vítima, estabelecerá, conforme seja necessário e suficiente para reprovação e prevenção do crime: I - as penas aplicáveis dentre as cominadas;

    II - a quantidade de pena aplicável, dentro dos limites previstos;

    III - o regime inicial de cumprimento da pena privativa de liberdade;

    IV - a substituição da pena privativa da liberdade aplicada, por outra espécie de pena, se cabível.

    Da leitura das normas em destaque, verifica-se que a fixação da pena, no ordenamento jurídico brasileiro se divide em três fases: pena-base, pena intermediária e pena definitiva. Para a fixação da pena-base, o juiz, de acordo com o artigo 68 do CP , que nos remete ao artigo 59 do mesmo diploma, considera, apenas, as chamadas circunstâncias judiciais. Na seqüência, a pena intermediária, que se forma da incidência das circunstâncias atenuantes e agravantes sobre a pena-base. Por fim, a pena definitiva, que resulta da aplicação, sobre a pena intermediária, das causas de diminuição e aumento de pena.

    Nessa linha de raciocínio, verifica-se que, na verdade, o reconhecimento da atenuante da confissão não atingiu diretamente a pena-base, mas sim, a pena intermediária, visto que é nessa que as circunstâncias atenuantes são efetivamente consideradas. Trata-se de distinção técnica posto que a conseqüência continua a mesma: com a redução da pena intermediária, diminui-se a pena-definitiva.

    Com isso, Pimenta Neves, que havia sido condenado a 18 anos de reclusão, teve sua pena diminuída para 15 anos. Como sempre afirmamos, o nosso papel não é fomentar discussões midiáticas em torno de casos que chocam a sociedade, mas, apenas, levar aos nossos leitores as nuanças jurídicas que os envolvem.

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