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18 de Maio de 2024
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    Corretacar Corretora e Locadora de Veiculos é condenada pela juiza Marielza Brandão Franco, da 29ª Vara Cível de Salvador

    Publicado por Direito Legal
    há 13 anos
    Inteiro teor da decisão:

    0112225-48.2000.805.0001 – PROCEDIMENTO ORDINARIO

    Apensos: 14001809433-8

    Autor (s): Alberto Maciel Parente

    Advogado (s): Wallace Oliveira Sertório de Souza

    Reu (s): Corretacar Corretora E Locadora De Veiculos Ltda

    Advogado (s): Márcio Duarte Miranda, Manoel Monteiro Filho

    Sentença: Vistos, etc.,

    ALBERTO MACIEL PARENTE, devidamente qualificados nos presentes autos, por advogado legalmente habilitado, propôs Ação Ordinária de Rescisão Contratual cumulada com indenização por perdas e danos, contra CORRETACAR CORRETORA E LOCADORA DE VEICULOS LTDA., aduzindo, em síntese que realizou um contrato de compra e venda de um automóvel, marca CHAYLER, tipo PICAP, modelo CHEROKEE LIMITED, pelo preço ajustado de R$40.000,00 (quarenta mil reais).A forma de pagamento estava condicionada a entrega pelo Autor, de um automóvel marca chevrolet, modelo Vectra, no valor de R$ 20.000,00(vinte mil reais), acrescidos de dois JET SKY, o primeiro 1.100KAVASAKY 97ZX, no valor de R$10.000,00(dez mil reais) e o segundo,750 KAVASAKY 23, no valor de R$ 5.000,00(cinco mil reais), entregando ainda, um cheque, nº 000580, no valor de R$5.000,00 (cinco mil reais), banco CEF, a ser compensado 90 (noventa dias) após a compra.
    Relata, ainda, que surgiram defeitos de ordem técnica no segundo JET SKY,, que fora de logo solucionado, com a substituição do referido bem, por dois cheques pré-datados: um, no valor de R$1.000,00(mil reais), sob o nº 000772, para o dia 20 de setembro do ano da compra e outro no valor de R$4.000,00(quatro mil reais), sob o nº 605123, ambos do CEF, com data de compensação para 20 de outubro também do mesmo ano.
    No que se refere a documentação do veículo, o autor questionou ao representante legal da Ré, o Sr. PAULO SERGIO DE MENEZES SILVA, que lhe assegurou que os referidos documentos não tardariam a chegar de SÃO PAULO, cidade de origem do veículo, assumindo todas as providências e garantias para esse fim. Como se tratava de ordem provisória, o autor aceitou uma cópia do Certificado de Registro e Licenciamento de Veículo, em nome do antigo proprietário- Francisco Cardoso Filho, cujo exercício era 1999 (conforme documento em anexo).
    Informa, o autor que fez inúmeros pedidos ao representante legal da Ré e que sempre era informado, que havia dificuldades na obtenção do documento original do veículo,e por isso, resolveu obter informações junto aos órgãos competentes, na cidade de São Paulo, sendo informado,que o veículo não estava licenciado para o exercício do ano de 1999, como demonstrava o documento fornecido pela empresa Ré. Diante deste fato, procurou novamente o representante legal da Ré, indagando da existência daquele documento e, o mesmo assegurou, mais uma vez, que tudo se normalizaria, bastando a quitação do débito referente ao licenciamento.
    Na tentativa de vender o veiculo, verificou que existia sobre o bem, uma Restrição Judicial. E como já se passaram mais de nove meses e em face essa Restrição Judicial, ficara impossível a transferência do veículo para seu nome, ou mesmo venda a terceiro, pelo que requereu a rescisão do contrato e a devolução do valor pago acrescido de juros e correção monetária e danos morais e materiais suportados. Com a inicial foram juntados os documentos de fls.19 a 25.

    Citada, a requerida apresentou a contestação aduzindo que realmente o veiculo fora vendido pela empresa Ré em 11 de setembro de 1999 e que o autor ficou ciente de que o documento encontrava-se em atraso e que ele deveria atualizar o DUT, conforme consta no recibo, assim prova-se que era de responsabilidade do comprador efetuar a atualização do documento do veículo.
    Relata, ainda, que conforme pesquisa no cadastro de veículos do DETRAN SP, que o bem, foi bloqueado judicialmente no dia 31/07/2000.

    Assim, a parte ré por entender indevido o pleito da requerente pediu ao final a improcedência da ação com as conseqüentes cominações legais. Com a contestação foram juntados os documentos de fls. 41a 48.

    A parte autora replicou às fls. 50 e 56, rebatendo as argumentações trazidas na contestação.

    Realizada audiência de conciliação às fls. 63 dos autos, não houve possibilidade de transação, as partes não manifestaram o interesse em produzir provas, tendo o juiz responsável pelo feito determinado o julgamento antecipado da lide.

    É O RELATÓRIO

    POSTO ISSO. DECIDO.

    O presente processo traz a lide, pedido de declaração de nulidade contratual cumulada com indenização por danos morais e materiais com fundamento no Código de Defesa do Consumidor. Assim, a controvérsia gira em torno da ilegalidade do ato jurídico praticado pela parte Ré, e a possibilidade de devolução da quantia paga na compra do bem, atualizada e acrescida de juros de mora.

    As novas normas que regem os contratos, que foram trazidas por concepção contida do CDC, optam por proteger não só a vontade das partes, mas principalmente os legítimos interesses e expectativas dos consumidores.

    O Art. 54, § 2º, do CDC estabelecem que o consumidor deve dispor na confecção do contrato cláusulas que possam permitir ao consumidor de produtos ou serviços, a rescisão do contrato, não restringindo este direito apenas a pessoa do fornecedor. Assim, dispõe o § 2º do referido artigo:

    “§ 2º Nos contratos de adesão admite-se cláusula resolutória, desde que a alternativa, cabendo a escolha ao consumidor, ressalvando-se o disposto no § 2º do artigo anterior.”

    Da mesma forma regra o art. 51, do CDC estabelece um rol exemplificativo de cláusulas contratuais abusivas,considerando estas nulas de pleno direito, nos contratos que se inserirem, tendo, no caso da lide, a configuração dos incisos IX e XI, do referido artigo:

    “Art. 51. São nulas de pleno direito, entre outras, as cláusulas contratuais relativas ao fornecimento de produtos e serviços que:
    IX – deixem ao fornecedor a opção de concluir ou não o contrato, embora obrigando o consumidor. ….
    XI – autorizem o fornecedor a cancelar o contrato unilateralmente, sem que igual direito seja conferido ao consumidor;”

    Assim, com razão, a parte autora quanto a alegação de não ter o bem transferido para o seu domínio, pelo já exposto, por não haver o documento (CRV), devidamente assinado pelo proprietário anterior. Documento este, que já deveria está em posse da empresa Ré, antes da contratação do negócio jurídico.

    A questão, não versa somente quanto ao pagamento do IPVA, é preciso, como já mencionado, que o bem em questão, já tivesse livre e desimpedido para transferência de propriedade. O art. 123 do CTB, diz:

    Art. 123. Será obrigatória a expedição de novo Certificado de Registro de Veículo quando:

    I – for transferida a propriedade;

    § 1º. No caso de transferência de propriedade, o prazo para o proprietário adotar as providências necessárias à efetivação da expedição do novo Certificado de Registro de Veículo é de trinta dias, sendo que nos demais casos as providências deverão ser imediatas.
    A não realização da transferência pela empresa ré, compradora direta, do Sr. Francisco Cardoso Filho (antigo proprietário do veículo), para seu nome, junto ao DETRAN que, além de configurar como objetiva a responsabilidade (art. 14 do CODECON), caracteriza culpa, dada à evidente negligência da empresa, que ainda forneceu cópia do documento imprestável para efeito de circulação do veículo e portanto, ineficaz a parte autora.
    “Art. 14. O fornecedor de serviços responde, independentemente da existência de culpa, pela reparação dos danos causados aos consumidores por defeitos relativos à prestação dos serviços, bem como por informações insuficientes ou inadequadas sobre sua fruição e riscos.”
    O IPVA, Imposto sobre a Propriedade de Veículo automotor, tem como fato gerador a propriedade do veículo automotor. Logo, os contribuintes do imposto são os proprietários de veículos automotores. E, como ainda não haviam documentos caracterizadores de transferência de propriedade, mesmo porque, o DUT (documento único de transferência), é repassado pelo proprietário do veículo, quando o vende, o que não ocorreu na hipótese em discussão. Logo, não há que falar em responsabilidade do comprador em efetuar a atualização do documento.
    A tese abarcada pela empresa ré quanto a obrigatoriedade do contrato, o pacta sunt servanda, cedeu lugar a luz dos princípios e regras dispostos no CDC.
    O Código de Defesa do Consumidor dispõe de regras que visam proteger a relação jurídica de consumo e prevê também uma situação de desequilíbrio nestas relações, com a vulnerabilidade e hipossuficiência dos consumidores em relação ao fornecedor. Essa idéia de “fraqueza” do consumidor fez com que o CDC desse uma nova interpretação às regras dispostas em outros códigos, adaptando-as e modificando-as conforme a extensão de seus próprios princípios e regras de forma que, sem prejudicar qualquer uma das partes, possa equilibrar a relação outrora formada.
    Visto isso, a figura dos contratos de adesão, fruto do desenvolvimento de uma produção de massa, cujas cláusulas contratuais redigidas unilateralmente por uma das partes, ou seja, essa modalidade de contrato se caracteriza pela falta de manifestação da vontade por parte do consumidor durante a confecção do contrato, conforme o art. 54 do Código do Consumidor. Por esta razão o CDC não abarca o principio contratual do pacta sunt servanda, visão esta defendida pelo eminente jurista Rizzatto Nunes em sua obra:
    “A Lei n. 8.078 rompe de vez com o principio do pacta sunt servanda. Ao reconhecer que em matéria de relação de consumo vige a regra da oferta que vincula e os contratos são elaborados unilateralmente (contratos de adesão) ou nem sequer são apresentados (verbais, comportamento socialmente típico, cláusulas gerais), estabelece que não vige regra milenar representada no brocardo latino. Esta, claro, continua a ter validade para as relações da órbita privada, mas tem aplicação nas relações de consumo, mesmo quando for elaborada cláusula contratual negociada em separado.” (Rizzatto Nunes, Curso de Direito do Consumidor, 4ª Edição-2009, Editora Saraiva, p. 600 e 601).
    Com isso, a obrigatoriedade dos contratos prevista no Código Civil pátrio não pode ser aplicada em casos onde presente a relação jurídica de consumo, tanto que o art. , do CDC, ao estabelecer que as normas de proteção ao consumidor, são de ordem pública e interesse social, permitiu ao julgador a possibilidade de intervenção nos contratos que, em suas cláusulas, imponham ao consumidor excessiva onerosidade ou vantagem exagerada ao credor, por se caracterizarem como abusivas e afastadas do princípio da boa-fé objetiva que deve nortear os contratos, visando restabelecer o equilíbrio contratual e financeiro.
    Quanto, ao dano moral, pela angustia e sofrimento impostos à autora, que ao comprar o veículo para sua comodidade, trabalho e lazer, viu-se impossibilitado de nele circular em conseqüência da falta de documentação pertinente e também o iminente risco de incorrer em perda do veículo, bem como outras sanções e por caracterizar também como medida de caráter compensatório e punitivo contra a pratica abusiva e ilegal. Porém, é bom lembrar da necessidade de que a indenização não seja forma de enriquecimento sem causa da vitima, mas não impede que, na tendência moderada do STJ, seja fixada a indenização em quantia razoável a evitar a continuidade de praticas dessa natureza.

    Conseqüentemente, pela verificação de que o contrato de compra e venda contem vícios insanáveis conforme acima aferidos e por não ter a parte Ré adimplido com sua obrigação, qual seja, entrega do documento assinado, para que se operasse a transferência de propriedade do veículo, e por tudo que acima foi exposto, hei por bem julgar procedente o pedido da parte autora, para declarar a rescisão contratual com fulcro nos arts. 39, inc. VIII, 51, inc. II; III, IV e IX, do Código de Defesa do Consumidor e condenar a parte ré a restituir o valor pago pelas autora, acrescido de juros de 1% ao mês e correção monetária pelo INPC desde a época do fato até a data do reembolso e a condenação no valor equivalente a vinte salários mínimos, a título de indenização pelos danos morais sofridos pela parte autora, com fulcro nos art. 269,I do CPC c/c art. ,VI e art. 14 da lei 8078/90, também corrigido desde a época do fato até o pagamento e acrescido de juros de mora a partir da citação válida.

    Por força do princípio da sucumbência, condeno o Réu ao pagamento das despesas processuais e honorários advocatícios que ora fixo na conformidade do art. 20, § 3º CPC, em razão do zelo e cuidados profissionais em 15% sobre o valor total da condenação.

    Publique-se. Registre-se. Intime-se.

    Salvador, 24 de maio de 2011

    MARIELZA BRANDÃO FRANCO
    JUÍZA DE DIREITO

    Fonte: DJE BA

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