Se a vítima morrer instantaneamente, o autor do homicídio culposo que tiver fugido do local responde por omissão de socorro?
Todas as vezes em que houver morte instantânea da vítima ficará afastada a causa de aumento de pena prevista no § 4º do art. 121?
NÃO. No homicídio culposo, a morte instantânea da vítima não afasta a causa de aumento de pena prevista no art. 121, § 4º, do CP, a não ser que o óbito seja evidente, isto é, perceptível por qualquer pessoa.
O aumento imposto à pena decorre do total desinteresse pela sorte da vítima.
O fundamento da norma incriminadora do § 4º do art. 121 é resguardar o dever de solidariedade humana que deve reger as relações na sociedade brasileira (art. 3º, I, da CF/88). O que pretende a regra em destaque é realçar a importância da alteridade (preocupação com o outro).
Assim, o interesse pela integridade da vítima deve ser demonstrado, a despeito da possibilidade de êxito, ou não, do socorro que possa vir a ser prestado.
Dessa forma, o dever imposto ao autor do homicídio de tentar socorrer a vítima persiste, a não ser que seja evidente a morte instantânea, perceptível por qualquer pessoa. Em outras palavras, havendo dúvida sobre a ocorrência do óbito imediato, compete ao autor da conduta imprimir os esforços necessários para minimizar as consequências do fato. Ao agressor, não cabe, no momento do fato, presumir as condições físicas da vítima, medindo a gravidade das lesões que causou e as consequências de sua conduta. Tal responsabilidade é do especialista médico, autoridade científica e legalmente habilitada para, em tais circunstâncias, estabelecer o momento e a causa da morte.
STJ. 5ª Turma. HC 269.038-RS, Rel. Min. Felix Fischer, julgado em 2/12/2014 (Info 554).
Essa é também a lição de Cleber Masson:
“Não tem cabimento a causa de aumento de pena na hipótese de morte instantânea incontestável. Contudo, se houver dúvida quanto à morte, a solidariedade impõe a prestação de socorro, pois a majoração da pena se deve à moralidade da conduta do agente, e não ao resultado naturalístico, inerente a todo e qualquer homicídio.” (Direito Penal esquematizado. Vol. 2., São Paulo: Método, 2014, p. 200).
Possibilidade de o agente socorrer a vítima
Sobre o tema, é importante também lembrar que somente incidirá a causa de aumento prevista no art. 121, § 4º do CP (omissão de socorro) quando o agente possuir condições de realizar a conduta exigida, sem que isso comprometa a preservação de sua vida ou integridade física.
Assim:
“(...) não incide o aumento da pena quando o sujeito deixou de prestar socorro porque não tinha condições de fazê-lo, seja por questões físicas (exemplo: também foi gravemente ferido pela conduta que matou a vítima), seja porque o comportamento exigido em lei a ele representava risco pessoal (exemplo: ameaça de linchamento). (MASSON, Cleber., p. 201).
Fonte: dizer o direito.
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9 Comentários
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Excelentes informações, principalmente para a vida prática. continuar lendo
Muito justo. Como o causador do acidente culposo pode saber que a vítima está morta, numa aferição de segundos e à certa distância? continuar lendo
Com todo respeito João, e respondendo a sua questão lhe mostro o *exemplo da doutrina*:
João, pilotando imprudentemente sua lancha, atropela um banhista e foge sem prestar socorro.
Segundo as testemunhas, o condutor, mesmo percebendo que havia atropelado alguém, não parou nem olhou para verificar o estado da vítima, seguindo seu caminho em alta velocidade.
Depois que João foi embora, alguns banhistas ainda levaram a vítima até o hospital tentando socorrê-la, mas mediante perícia posteriormente realizada ficou provado que, na verdade, a vítima faleceu instantaneamente em virtude de traumatismo craniado causado pelo acidente. continuar lendo
No caso em que Leandro relatou, haverá agravante por omissão de socorro pois, a morte da vítima não estava evidente. continuar lendo
Leandro, mas o exemplo da doutrina vai exatamente no sentido do texto que escrevi.
Concordo com a decisão do tribunal: não há como saber, salvo circunstâncias especialíssimas, se a vítima morreu instantaneamente, pelo que o crime de omissão de socorro ocorre em casos tais, via de regra. continuar lendo
Acredito que o colega Leandro se equivocou. continuar lendo
Excelente artigo dra. Simples e extremamente construtivo, parabéns e obrigado pelas informações. continuar lendo
Os assuntos referentes ao homicídio culposo e lesão corporal culposa passaram a ser tratados no CTB, em seus arts. 302 e 303, respectivamente. O aumento de pena, em 1/3, em ambos os delitos aí está previsto a ser aplicado ao agente que tiver deixado de prestar socorro à vítima, quando puder fazê-lo sem risco pessoal. Por outro lado, veio a surgir, no art. 301, um direito premial ao condutor que tiver prestado pronto e integral socorro à vítima, ao ficar imune à prisão em flagrante e à prestação de fiança. Mas, em contrapartida, o art. 305, com evidente desrespeito ao direito ao silêncio, isto é, ao direito de não fazer prova contra si mesmo, criou um novo e autônomo delito, assim definido: "afastar-se o condutor do veículo do local do acidente, para fugir à responsabilidade penal ou civil que lhe possa ser artibuída". Ora, ninguém pode ser obrigado a permanecer em um local aguardando uma possível e indesejável prisão em flagrante e consequente prestação de fiança. Nenhuma fuga do local do delito pode ser punida. Assim como não pode - como não o é -, a fuga empreendida pelo condenado mesmo que esteja no cumprimento da pena, desde que realizada sem violência à pessoa! Cumpre dizer, finalmente, que dita afirmação de que só estará livre do aumento de pena o agente que deixar de socorrer a vitima, quando tiver certeza de sua morte instantânea, deve ser repensada, já que no direito penal e no direito processual penal a dúvida sempre deve favorecer ao réu. continuar lendo