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5 de Maio de 2024

STJ 2022 - Prisão Preventiva Decretada Oralmente em Audiência de Custódia

ano passado

Decisão Monocrática

RECURSO EM HABEAS CORPUS Nº 171517 - AL (2022/0311747-9)

DECISÃO

XXXXXXXXXX alega sofrer coação ilegal pelo Tribunal de Justiça do Estado de Alagoas ( HC n. 0803711-80.2022.8.02.0000).

Nesta Corte, sustenta a defesa a falta de motivação idônea para a mantença da prisão processual do acusado, pela suposta prática do crime previsto no art. 121, caput , c/c o art. 14, II, ambos do Código Penal. Suscita o princípio da presunção de não culpabilidade.

Requer, liminarmente e no mérito, a expedição de alvará de soltura ou a fixação de providências alternativas.

Indeferida a liminar e prestadas as informações, opinou o Parquet Federal pelo não provimento do recurso (fls. 92-94; 98-100; 105-109).

Decido.

Expõem os autos que, na audiência de custódia, o Magistrado de primeiro grau converteu o flagrante do ora recorrente em prisão preventiva, nestes termos (fl. 34, grifei):

ABERTA AUDIÊNCIA, pelas partes foi dito o que se encontra gravado na mídia inserida aos autos, bem como em HD externo no cartório deste Juízo, ficando facultado às partes a gravação em PEN DRIVE, tudo de acordo com o artigo 475 do CPP e a resolução 213/2015 do CNJ. Iniciada a audiência de custódia, foi esclarecido o (a)(s) flagrado (a)(s) o objetivo do ato processual, bem como informado que ele tinha o direito de permanecer em silêncio. Em seguida, foram formulados questionamentos acerca de sua qualificação pessoal, antecedentes criminais e circunstâncias objetivas em que foi realizada a prisão, facultando-se a defesa técnica e ao Ministério Público perguntas compatíveis com a natureza do ato, conforme se verifica na mídia em anexo. Encerrada a oitiva, o Ministério Público opinou pela homologação da prisão e decretação da prisão preventiva do flagrado. A defesa, por sua vez, requereu a concessão da liberdade provisória do flagrado, com ou sem a imposição de medidas cautelares diversas da prisão, cujas manifestações constam em mídia anexa. Por fim, o

Juízo proferiu DECISÃO ORAL cujo dispositivo ora se segue: "Ante o exposto, HOMOLOGO a prisão em flagrante de XXXXXXXXXXXXX e, em contínuo CONVERTO-A em prisão preventiva, com fulcro nos art. 312 e art. 313 do CPP, a fim de garantir a ordem pública, além do perigo gerado pelo estado de liberdade dele (a)".

O Tribunal a quo denegou o mandamus lá impetrado, em acórdão assim ementado (fl. 60):

HABEAS CORPUS. HOMICÍDIO TENTADO (ART. 121, CAPUT , C/C ART. 14, II, AMBOS DO CÓDIGO PENAL). ALEGAÇÃO DE AUSÊNCIA DE FUNDAMENTAÇÃO IDÔNEA BEM COMO DOS REQUISITOS PARA A PRISÃO PREVENTIVA. NECESSIDADE DE GARANTIR A ORDEM PÚBLICA. CIRCUNSTÂNCIAS DO FLAGRANTE. GRAVIDADE DO DELITO. MODUS OPERANDI . IMPOSSIBILIDADE DE APLICAÇÃO DE MEDIDAS CAUTELARES DIVERSAS DA PRISÃO. CONSTRANGIMENTO ILEGAL NÃO CARACTERIZADO. REMÉDIO CONSTITUCIONAL CONHECIDO E DENEGADO.

Feitos esses registros, passo ao exame do recurso.

Primeiramente, faço lembrar que uma das finalidades precípuas da audiência de custódia é salvaguardar os direitos fundamentais daquele que foi preso em flagrante. Entre esses direitos, insere-se a avaliação da legalidade do ato restritivo e a necessidade de manutenção da constrição, cujo juízo valorativo, segundo precisas ponderações de Gustavo Badaró, pode ser considerado bifronte ou complexo, na medida em que "não se destina apenas a controlar a legalidade do ato já realizado, mas também valorar a necessidade de adequação da prisão cautelar para o futuro" (Prisão em flagrante delito e direito à audiência de custódia . Disponível em: . Acesso em 15/10/2021).

Sob os auspícios das diretrizes traçadas pela Convenção Americana de Direitos Humanos - CADH (Pacto de San Jose da Costa Rica) -, o Conselho Nacional de Justiça - CNJ aprovou a Resolução n. 213/2015, na qual detalha o procedimento de apresentação de presos em flagrante ou pelo cumprimento de mandado à autoridade judicial competente.

O art. 8º da referida Resolução prevê o seguinte (destaquei):

Art. 8º. Na audiência de custódia , a autoridade judicial entrevistará a pessoa presa em flagrante, devendo:

[...]

§ 2º. A oitiva da pessoa presa será registrada, preferencialmente, em mídia , dispensando-se a formalização de termo de manifestação da pessoa presa ou do conteúdo das postulações das partes, e ficará arquivada na unidade responsável pela audiência de custódia.

§ 3º. A ata da audiência conterá, apenas e resumidamente, a deliberação fundamentada do magistrado quanto à legalidade e manutenção da prisão , cabimento de liberdade provisória sem ou com a imposição de medidas cautelares diversas da prisão, considerando-se o pedido de cada parte, como também as providências tomadas, em caso da constatação de indícios de tortura e maus tratos.

§ 4º. Concluída a audiência de custódia, cópia da sua ata será entregue à pessoa presa em flagrante delito, ao Defensor e ao Ministério Público, tomando-se a ciência de todos, e apenas o auto de prisão em flagrante, com antecedentes e cópia da ata, seguirá para livre distribuição.

Ao que se vê, conquanto o dispositivo faculte a gravação audiovisual da oitiva do preso e das manifestações das partes, não permite ao magistrado desincumbir-se de fazer constar, por escrito, os fundamentos quanto à legalidade e à preservação da cautela mais onerosa, bem como de fornecer cópia da ata ao custodiado e a seu defensor.

Aliás, não poderia ser de outra forma. Como excepcional instrumento de restrição da liberdade do indivíduo, a prisão preventiva se sujeita a permanente controle judicial, seja para determiná-la, seja para permitir sua continuidade.

Tal garantia fundamental - prevista no art. , LXI, da Constituição da Republica, e reproduzida no art. 283 do Código de Processo Penal - pressupõe, por certo, a existência de ordem constritiva escrita e fundamentada da autoridade judiciária competente. Vale dizer, a determinação judicial há de ser representada por palavras externadas por meio de letras (sinais gráficos), traçadas em papel ou em outra superfície de leitura. Esse é o método de comunicação linguística escolhida pela norma constitucional para a contenção da liberdade, a fim de que se submeta a controle do Poder Judiciário.

Dessarte, reitero, não se admite a prisão provisória de alguém, decretada por decisão proferida oralmente, em audiência de custódia, cujo conteúdo se encontra registrado apenas em mídia audiovisual, sem que tenha sido reduzido a termo e sem a consignação, em ata, dos fundamentos que ensejaram o cárcere (ou mesmo a sua degravação), cuja cópia deve ser entregue ao preso, à defesa e ao Ministério Público, tal qual estabelece o art. 8º, §§ 3º e 4º, da Resolução n. 213/2015, do CNJ.

Não olvido que, in casu , a Corte estadual, ao mencionar elementos acerca do modus operandi das ações delituosas e do risco de reiteração delitiva, trouxe novos elementos para justificar a persistência da segregação cautelar do acusado. Sem embargo, a jurisprudência deste Superior Tribunal é firme em assinalar que os fundamentos trazidos pelo órgão de segundo grau, tendentes a justificar a cautela máxima, não se prestam a suprir a ausente motivação do Juízo singular, sob pena de, em ação concebida para a tutela da liberdade humana, legitimar-se o vício do ato constritivo ao direito de locomoção do paciente. A propósito: RHC n. 107.832/SP, Rel. Ministro Antonio Saldanha Palheiro, 6a T., DJe 23/4/2019, e HC n. 361.385/RS, Rel. Ministro Sebastião Reis Júnior, 6a T., DJe 19/2/2019.

Nesse sentido, em hipótese em que sustentou o Parquet que "a impetrante, em momento algum, suscitou qualquer tipo de cerceamento de defesa ou restrição de acesso aos fundamentos do decreto de prisão preventiva, por não terem sido transcritos na ata de audiência de custódia" (excerto do relatório), assim concluiu a Sexta Turma desta Corte Superior, há menos de um mês, em acórdão da minha relatoria:

AGRAVO REGIMENTAL EM HABEAS CORPUS. [...] PRISÃO PREVENTIVA. DECISÃO PROFERIDA ORALMENTE. REGISTRO EM MÍDIA AUDIOVISUAL. AUSÊNCIA DE REDUÇÃO A TERMO. NÃO INDICAÇÃO DOS FUNDAMENTOS. TRIBUNAL AGREGA FUNDAMENTOS. VEDAÇÃO. LIBERDADE CONCEDIDA. AGRAVO NÃO PROVIDO.

1. Não é admissível que alguém tenha a prisão preventiva decretada, por força de decisão proferida oralmente na audiência de custódia, cujo conteúdo se encontra apenas registrado em mídia audiovisual, sem que tenha sido reduzido a termo, e sem que haja indicação dos fundamentos que ensejaram a constrição consignados em ata (ou mesmo a sua degravação), como prevê o art. 8º, § 3º, da Resolução n. 213/2015 do CNJ, cuja cópia deve ser entregue ao preso, ao Ministério Público e à defesa (art. 8º, § 4º, da referida resolução). Nesse mesmo sentido: RHC 77.014, Rel. Ministro Rogerio Schietti Cruz, DJe 9/8/2017.

2. O Tribunal a quo, ao mencionar elementos acerca do modus operandi das ações delituosas, trouxe novos elementos para justificar a manutenção da prisão cautelar do paciente. Porém, a jurisprudência desta Corte Superior é firme em assinalar que o acréscimo de fundamentos, pelo Tribunal local, não se presta a suprir a ausente motivação do Juízo natural, sob pena de, em ação concebida para a tutela da liberdade humana, legitimar-se o vício do ato constritivo ao direito de locomoção do paciente.

3. Agravo regimental não provido. ( AgRg no HC n. 765.867/SP, Rel. Ministro Rogerio Schietti, 6a T.,

DJe 26/9/2022.)

À vista do exposto, concedo a ordem , para tornar sem efeito o decreto preventivo, ressalvada a possibilidade de nova avaliação, mediante decisão fundamentada, sobre a necessidade de imposição de medida de natureza cautelar.

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(STJ - RHC: 171517 AL 2022/0311747-9, Relator: Ministro ROGERIO SCHIETTI CRUZ, Data de Publicação: DJ 17/11/2022)

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