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6 de Maio de 2024

STJ: Informativo 700

Conteúdo pertinente às Ciências Criminais.

Publicado por Daniele Augusto
há 3 anos

1. Compete à Justiça Federal processar e julgar o crime de esbulho possessório de imóvel vinculado ao Programa Minha Casa Minha Vida.

Crime de esbulho possessório. Art. 161, II, do Código Penal. Imóvel do Programa Minha Casa Minha vida. Vítima. Possuidor direto. Alienação fiduciária. Caixa Econômica Federal. Possuidora indireta. Reintegração de posse. Legitimação ativa concorrente. Art. 109, IX, da CF. Recursos orçamentários Federais. Interesse da União. Competência da Justiça Federal.

Inteiro teor:

O art. 161, inciso II, do Código Penal, incrimina a conduta de invadir terreno ou edifício alheio, para o fim de esbulho possessório, com violência a pessoa ou grave ameaça, ou mediante concurso de mais de duas pessoas. O crime de esbulho possessório pressupõe uma ação física de invadir um terreno ou edifício alheio, no intuito de impedir a utilização do bem pelo seu possuidor. Portanto, tão-somente aquele que tem a posse direta do imóvel pode ser a vítima, pois é quem exercia o direito de uso e fruição do bem.

No que diz respeito ao contrato de alienação fiduciária, o art. 23, parágrafo único, da Lei n. 9.514/1997, estabelece que "[c]om a constituição da propriedade fiduciária, dá-se o desdobramento da posse, tornando-se o fiduciante possuidor direto e o fiduciário possuidor indireto da coisa imóvel."

Assim, na hipótese de imóvel alienado fiduciariamente, enquanto o devedor fiduciário permanecer na posse direta do bem, tão-somente ele pode ser vítima do crime de esbulho possessório. Apenas se, por alguma razão, passar o credor fiduciário a ter a posse direta do bem é que será ele a vítima.

Entretanto, o fato de o credor fiduciário não ser a vítima do crime, não retira o seu interesse jurídico no afastamento do esbulho ocorrido, uma vez que o possuidor indireto, no âmbito cível, da mesma forma que o possuidor direto, possui legitimidade para propor a ação de reintegração de posse, prevista no art. 560 do atual Código de Processo Civil, cuidando-se de hipótese de legitimação ativa concorrente.

No caso, além da vítima do crime de esbulho possessório, ou seja, a possuidora direta e devedora fiduciária, a Caixa Econômica Federal, enquanto credora fiduciária e possuidora indireta, também possui legitimidade para, no âmbito cível, propor eventual ação de reintegração de posse do imóvel esbulhado. Essa legitimação ativa concorrente da empresa pública federal, embora seja na esfera civil, é suficiente para evidenciar a existência do seu interesse jurídico na apuração do referido delito. E, nos termos do art. 109, inciso IV, da Constituição da República, a existência de interesse dos entes nele mencionados, é suficiente para fixar a competência penal da Justiça Federal.

Há, ainda, outro aspecto da situação em exame, que evidencia a existência de interesse jurídico, agora da União, e que também instaura a competência federal, nos termos do artigo mencionado.

Com efeito, o imóvel objeto do esbulho foi adquirido pela vítima, no âmbito do programa governamental "Minha Casa Minha Vida", criado pela Lei n. 11.977/2009. Nele, nos termos do arts. 2.º, inciso I, e 6.º da referida Lei, os imóveis são subsidiados pela União, a qual efetiva parte do pagamento do bem, com recursos orçamentários, no momento da assinatura do contrato com o agente financeiro.

Saliente-se que o fato de o bem ter sido adquirido, em parte, com recursos orçamentários federais, não leva à permanência do interesse da União, ad aeternum, na apuração do crime de esbulho possessório em que o imóvel esbulhado tenha sido adquirido pelo Programa Minha Casa Minha Vida. Contudo, ao menos enquanto estiver o imóvel vinculado ao mencionado Programa, ou seja, quando ainda em vigência o contrato por meio do qual houve a sua compra e no qual houve o subsídio federal, persiste o interesse da União.

CC 179.467-RJ, Rel. Min. Laurita Vaz, Terceira Seção, por unanimidade, julgado em 09/06/2021

2. As sucessivas revisões dos quantitativos máximos de receita bruta para enquadramento como ME ou EPP, da Lei Complementar n. 123/2006, para fazer frente à inflação, não descaracterizam crimes de inserção de informação falsa em documento público, para fins de participação em procedimento licitatório, cometidos anteriormente.

Inserção de informação falsa, para fins de participação em procedimento licitatório. Enquadramento como ME ou EPP. Quantitativos máximos de receita bruta. Posterior elevação de valores pela LC n. 139/2011. Aplicação retroativa. Descabimento.

Inteiro teor:

A controvérsia é definir se ocorreu abolitio criminis quanto à conduta de (possível) inserção de informação falsa em documento público, para fins de participação em procedimento licitatório em decorrência da Lei Complementar n. 139/2011.

No caso, a licitação na qual competiram as sociedades empresárias era restrita àquelas enquadráveis como ME ou EPP, nos termos da Lei Complementar n. 123/2006, segundo os limites de receita bruta indicados no art. do referido diploma.

O texto normativo foi alterado pela Lei Complementar n. 139/2011.

É necessário lembrar que a previsão de tratamento mais benéfico às MEs e EPPs tem a finalidade constitucional (ex vi dos arts. 146, III, d, 170, IX, e 179 da CF/1998) de criar um ambiente jurídico favorável aos empreendimentos que, por seu tamanho reduzido, não detém a estrutura para competir em condições de igualdade com todos os gigantes do mercado.

A forma encontrada pela legislação para tornar objetiva esta condição foi a fixação de um limite de receita bruta, em dinheiro, e como tal suscetível às variações inflacionárias. A propósito, a atualização do teto de receita bruta das EPPs, dos R$ 2.400.000,00 fixados em 2006 para os R$ 3.600.000,00 da Lei Complementar n. 139/2011, corresponde a pouco mais do que a inflação acumulada no período (30,78%, conforme o IPCA).

Esta constatação é fundamental, porque demonstra que as sucessivas revisões dos quantitativos máximos da Lei Complementar n. 123/2006, para fazer frente à inflação, não se aplicam a anos anteriores - ainda que para fins criminais -, sob pena de instituir uma grave distorção concorrencial e atentar contra os próprios objetivos do Estatuto. Afinal, a obtenção de uma receita bruta de R$ 3.600.000,00 no ano de 2012 representa, na prática, um poder aquisitivo menor do que o auferimento, em 2011, do mesmo montante.

No caso, a acusação não diz que as duas empresas não são, hoje, MEs ou EPPs, mas sim que, no específico ano-calendário de 2011, não tinham essa qualificação, falsamente atestada por seus dirigentes. Como se percebe, alterações legais posteriores são incapazes de modificar a dinâmica fática já ocorrida, porque a conduta delitiva imputada aos réus é a falsa declaração de uma situação fático-jurídica então inexistente. Uma modificação legislativa que dê novo enquadramento ao atual regime das empresas não muda o fato de que, em 2011, a informação prestada à Administração Pública foi, em tese, falsa.

Fonte: Informativo nº. 700 do STJ.


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