Página 162 da Judicial - 1ª Instância - Interior - Parte II do Diário de Justiça do Estado de São Paulo (DJSP) de 18 de Agosto de 2014

Municipalidade emitiu cheques sem fundos. Pede a expedição de ofício à Municipalidade. Juntou documentos (fls. 1325/1336 e 1365/1370). Recebida a petição inicial, com o afastamento das preliminares e indeferimento do pedido de justiça gratuita formulado pela ré MR, foi determinada a citação dos réus no endereço aonde receberam a notificação, sob pena de presunção da citação, nos termos do artigo 238, parágrafo único, do Código de Processo Civil (fls. 1371/1373). Os réus não foram encontrados no local aonde receberam a notificação, em razão de mudança de endereço sem indicação nos autos (fls. 1377). Os réus foram intimados do recebimento da petição inicial por seus patronos (fls. 1382/1384). O réu José apresentou contestação (fls. 1396/1440), na qual sustenta, preliminarmente, carência da ação em razão da inaplicabilidade da Lei de Improbidade Administrativa a agentes públicos, falta de interesse processual por inadequação da via eleita, argui inconstitucionalidade da Lei de Improbidade Administrativa e sustenta a impossibilidade de “cumulação de improbidades”, e, no mérito, a improcedência dos pedidos iniciais sob a alegação de que os fatos narrados em relação ao réu José não caracterizam violação dos princípios da moralidade e impessoalidade. Afirma que a devolução dos valores pagos a título de entrega de gêneros alimentícios efetivamente prestados acarreta enriquecimento sem causa à municipalidade. Sustenta ausência de dolo. Alega que foi realizado procedimento licitatório, e, apenas em alguns casos foram adquiridos produtos em caráter eventual, para atender fato incerto, após a devida cotação de preços, não havendo violação ao limite de gastos no qual é permitida a compra sem licitação. O autor apresentou réplica (fls. 1442/1447). É o relatório. Fundamento e decido. 1. A lide comporta julgamento antecipado, nos termos do art. 330, I, do Código de Processo Civil. A despeito de se tratar de matéria de fato, não há provas capazes de alterar o conjunto probatório e o resultado da demanda. Ademais, a única forma de provar tais fatos é através de documentos que deveriam ser juntados na petição inicial ou na contestação, sob pena de preclusão da prova, nos termos do artigo 396, do Código de Processo Civil, salvo se aplicável as exceções previstas no artigo 397, do mesmo diploma processual. Ainda que não concorde com a juntada de documento após o momento previsto na norma processual para a produção da prova documental, salvo nas hipóteses das exceções previstas expressamente em lei, admito a juntada e produção da prova documental até, no máximo, antes da prolação da sentença, conforme jurisprudência majoritária. Logo, não produzida a prova até este momento, houve a preclusão. Assim, a prova produzida é suficiente para o julgamento da lide, motivo pelo qual desnecessária a abertura de fase probatória, devendo a lide ser julgada antecipadamente, ante a preclusão das provas ou a sua desnecessidade. 2. Afasto a preliminar de carência da ação em razão da inaplicabilidade da Lei de Improbidade Administrativa a agentes públicos, pois é matéria pacificada nos Tribunais a aplicabilidade desta lei a agentes públicos, dentre eles prefeito municipal, como o caso. Afasto a preliminar de falta de interesse processual por inadequação da via eleita, pois a ação civil pública de improbidade administrativa é a via processual adequada para apurar atos de improbidade administrativa e, eventualmente, aplicar a respectiva sanção prevista na Lei nº 8.429/1992. Afasto a preliminar de impossibilidade de “cumulação de improbidades”, já que não há qualquer vedação legal, sendo, portanto, viável a cumulação, em uma única ação civil pública, das espécies de improbidade administrativa previstas na Lei nº 8.429/1992. Afasto a preliminar de inconstitucionalidade da Lei de Improbidade Administrativa, pois a matéria alegada a título de preliminar trata, em realidade, do mérito, e nesta sede será apreciada. 3. Primeiramente, vale ressaltar que os réus foram notificados, mas, após o recebimento da petição inicial, não foram encontrados no local aonde receberam a notificação, em razão de mudança de endereço sem indicação nos autos (fls. 1377). Caberia aos réus indicar o novo endereço para a realização do seguinte ato processual de cientificação processual, pois o atual direito processual não admite tal espécie de máfé processual, no qual, após ser encontrado e tomar ciência da existência da demanda, o réu muda de endereço para fugir da atuação do Poder Judiciário. Sendo assim, o artigo 238, parágrafo único, do Código de Processo Civil, prevê que, havendo a mudança de endereço sem a informação no processo, há presunção da ciência da parte. Desta forma, considero válida a citação de fls. 1377. Inclusive, os réus ainda foram intimados do recebimento da petição inicial por seus patronos (fls. 1382/1384), tomando ciência de que iniciaria o prazo para apresentar resposta também por esta via processual. Sendo assim, por qualquer ângulo, os réus foram cientificados do prazo para resposta, mas somente o réu José apresentou resposta, devendo o trâmite processual prosseguir em seus ulteriores termos, a despeito da ausência de resposta dos réus Comércio e MR. 4. No mérito, os pedidos iniciais são procedentes. O Tribunal de Contas do Estado julgou irregulares e desfavoráveis as contas do executivo referente ao ano de 2008, quando o réu José figurava na condição de prefeito de São Lourenço da Serra. Isto porque foram realizadas compras de alimentos de forma direta pelo réu José na qualidade de prefeito de São Lourenço da Serra, sem qualquer procedimento de licitação. Além disso, apesar da existência de licitações contratos para a entrega de merenda escolar e fornecimento de alimentos perecíveis, o réu José, na qualidade de prefeito, pagou por compras diretas de mercadorias e alimentos efetuados em outros estabelecimentos, às rés Comércio e MR, sendo que estes não participaram de qualquer licitação nem tiveram contrato firmado com a Municipalidade de São Lourenço da Serra. Para a entrega desses insumos, uma representante da Prefeitura solicitava entrega de mercadorias em determinada escola, a empresa entregava e apresentava nota fiscal, recebendo pelo pagamento do serviço. Não há sequer comprovante de entrega dos alimentos. A ré MR recebeu o valor de R$ 922.822,94 (novecentos e vinte e dois mil oitocentos e vinte e dois reais e noventa e quatro centavos) pelas compras sem licitação nem contrato, entre janeiro de 2008 e dezembro de 2008. A ré MR recebeu o valor de R$ 9.998,67 (nove mil novecentos e noventa e oito reais e sessenta e sete centavos) pelas compras sem licitação nem contrato, em 2006, e R$ 23.000,00(vinte e três mil reais) em 2007. A ré Comércio recebeu o valor de R$ 104.513,07 (cento e quatro mil quinhentos e treze reais e sete centavos) pelas compras sem licitação nem contrato, em 2008. Assim, o réu José não cumpriu os artigos 14 e 15, da Lei nº 8.666/1993. Agindo assim, houve a prática de ato de improbidade administrativa, pois ocorreu a facilitação e concorrência por qualquer forma para a incorporação ao patrimônio particular, de pessoa física ou jurídica, de bens, rendas, verbas ou valores integrantes do acervo patrimonial público (artigo 10, inciso I, da Lei nº 8.429/1992). Também restou configurada a frustração a licitude de processo licitatório ou dispensa indevida (artigo 10, inciso VIII, da Lei nº 8.429/1992), bem como ocorreu a prática de ato visando fim proibido em lei ou regulamento ou diverso daquele previsto na regra de competência (artigo 11, inciso I, da Lei nº 8.429/1992). 5. Os réus sustentam que houve a entrega das mercadorias. Todavia, não produziu qualquer prova neste sentido. Como já diziam os romanos allegare nihil et allegatum non probare paria sunt, vale dizer alegar e não provar equivale a nada alegar. Assim, a parte ré não logrou produzir prova que respaldasse quaisquer de suas alegações, não tendo, pois se desincumbido de seu ônus probatório (Código de Processo Civil, art. 333). Sobre o tema, preleciona Nelson Nery Júnior (in “Código de Processo Civil Comentado e legislação extravagante”, 9ª ed., RT., p, 530/531), nos seguintes termos: “Ônus de provar. A palavra vem do latim, ônus, que significa carga, fardo, peso, gravame. Não existe obrigação que corresponda ao descumprimento do ônus. O não atendimento do ônus de provar coloca a parte em desvantajosa posição para a obtenção do ganho de causa. A produção probatória, no tempo e na forma prescrita em lei, é ônus da condição de parte”. Assim, se a parte ré não faz prova boa e cabal do fato modificativo, impeditivo ou extintivo do direito do autor, este fato deve ser considerado como não existente, conforme dispõe o artigo 333, II, do Código de Processo Civil. Assim, havendo a contratação e pagamento pela contratação sem a entrega das mercadorias, resta caracterizada a prática de ato de improbidade administrativa prevista no artigo 10, inciso I, da Lei nº 8.429/1992. Agindo assim, houve a prática de ato de improbidade administrativa, pois ocorreu a facilitação e concorrência por qualquer forma para a incorporação ao patrimônio particular, de pessoa física ou jurídica, de bens,

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