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30 de Abril de 2024

Discricionariedade judicial: os limites da atuação jurisdicional e os poderes do magistrado no processo

Publicado por Wellington Maia
há 5 anos

RESUMO: O presente trabalho analisa os limites e poderes-deveres do magistrado no âmbito processual englobando de forma minuciosa o campo discricionário e poder-dever deste, tema de grande interesse atualmente com o advento do Novo Código de Processo Civil. Com pesquisa bibliográfica e referentes artigos, aborda a necessidade de implementação dos direitos fundamentais de forma eficaz e se fundamentando no estado democrático de direito. A análise do presente estudo é focada na adoção do poder discricionário e seus limites, bem como analisar de forma conjunta os seus deveres e com complementação dos poderes instrutórios do NCPC que lhe são admitidos para busca da verdade real. A eficácia da prestação jurisdicional é de grande importância, razão pela qual, trataremos da efetividade processual em relação aos atos e omissão do magistrado. Em um segundo momento, os limites serão locomovidos para o âmbito da atuação jurisdicional e o fenômeno do Poder Judiciário positivo tanto na esfera processual como substancial (mérito) e suas possibilidades.

Palavras-chave: Discricionariedade. Limites. Poderes. Poder Judiciário. Poder-dever. Efetividade.

1 INTRODUÇÃO

O presente trabalho tem como tema primordial a discricionariedade judicial no que tange a limitabilidade e poder-dever do magistrado e posteriori uma análise do Poder Judiciário positivo, ou seja, atuando atipicamente no âmbito legislativo.

A Administração Pública é dotada de certos poderes para exercer plenamente sua função que está prevista na Constituição Federal, sendo uma delas o Poder Discricionário. Denomina-se poder discricionário a possibilidade de escolher uma das várias providências que possa adotar no caso concreto, pautada no binômio conveniência e oportunidade, diante de situação não prevista expressamente em lei.

No entanto, devemos de início ressaltar que tal premissa não é absoluta, mas sim relativa, uma vez que o agente público não pode escolher nem decidir como bem entender. O agente deve de forma oportuna e adequada escolher baseando-se na finalidade do interesse público.

Há controvérsia na doutrina sobre a distinção entre poder discricionário e conceito jurídico indeterminado, o qual vem ganhando peso no Novo CPC, e também o princípio do livre convencimento motivado. Todavia, ainda que relevante ao nosso estudo, não abordaremos tais tópicos no presente trabalho.

O tempo configura um atraso de grande escala no processo, pois ainda que o juiz deva prosseguir e decidir em concordância com a duração razoável do processo, este não pode violar os princípios fundamentais do contraditório e ampla defesa.

Daí, entramos na figura do novo juiz, aquele que detém técnica e habilidade para exercer as suas atividades e funções de forma eficaz, sem abster de responsabilidade ética e social. Devemos afirmar que o processo e a morosidade da prestação jurisdicional clamam por um juiz com ampliação de poderes e até mesmo atuar de forma atípica, em outras palavras, um Poder Judiciário positivo.

Contudo, toda ampliação e extensão não configuram apenas aspectos positivos. Assim, veremos no presente trabalho os limites dessa atuação jurisdicional e as possibilidades que podem advir desse poder. É, porém, de fácil entendimento que, todo e qualquer ato que advém do poder público deve ser ético, progressivo e em prol da sociedade.

Para tanto, faremos uma breve análise dos pronunciamentos judiciais do magistrado no processo com o intuito de expor os juízos de admissibilidade e mérito em relação ao tema, para consequentemente adentrarmos no âmbito discricionário, poderes, limites, busca da verdade real e efetividade. Tudo a fim de que o processo civil caminhe ao seu ideal de efetividade e justiça.

2 PRONUNCIAMENTOS JUDICIAIS NO PROCESSO

Para iniciar com o presente estudo, é imperioso compor algumas considerações acerca dos pronunciamentos judiciais do juiz de primeiro grau com o propósito de distinguir com clareza sentenças, decisões interlocutórias e despachos e suas consequências daí decorrentes.

Os atos do juiz que a lei chama de “pronunciamentos do juiz” encontra-se fundamento no art. 203 do NCPC: sentenças, decisões interlocutórias e despachos.

No processo, incumbe ao juiz duas modalidades de comando: de dar solução à lide, e o de conduzir e dar andamento ao feito segundo o procedimento legal.

Durante o exercício de seus poderes e enquanto perdura o processo, o juiz pratica atos processuais de duas naturezas: decisórios e não decisórios. Nos primeiros, deve-se considerar como os atos que contêm pronunciamentos do juiz a respeito de questões que surgem dentro do processo havendo como exemplos as sentenças e decisões interlocutórias. Nos últimos, são pronunciamentos em que o juiz nada decide, apenas aperfeiçoa negócios processuais e impulsiona o processo predominando a função administrativa, bem como o despacho.

É de suma importância aludir à utilização do termo “dos pronunciamentos do juiz” no caput da Seção IV do NCPC, uma vez que pode sugerir a interpretação equivocada de que a atividade do juiz só comporta aqueles atos mencionados no art. 203 do NCPC. Em verdade, várias são as atividades que podem ser praticadas pelo juiz além das sentenças, decisões interlocutórias e despachos, como, por exemplo, a tentativa de conciliação e mediação e os atos instrutórios. O rol nele contido, portanto, não é taxativo.

Assim sendo, utilizaremos a correta denominação de “pronunciamentos judiciais” para nos referir àqueles mencionados no art. 203 do NCPC.

2.1 Sentença

Sentença na dicção do art. 203, § 1, é “o pronunciamento por meio do qual o juiz, com fundamento nos arts. 485 e 487, põe fim à fase cognitiva do procedimento comum, bem como extingue a execução”.

São elas, divididas em: sentenças terminativas e definitivas. As primeiras encontram-se respaldo no art. 485 do NCPC que põem fim ao processo, sem lhe resolverem o mérito (casos de extinção do processo). As últimas são as sentenças que decidem o mérito da causa em primeiro grau de jurisdição e conclui a fase cognitiva do processo, e, por isso, extinguem o próprio direito de ação.

Outra relevante distinção é atribuída às sentenças: as definitivas fazem coisa julgada, ao passo que as terminativas não fazem coisa julgada.

O recurso cabível para ser interposto contra sentença proferida por juiz de primeiro grau que encerra o processo com ou sem resolução de mérito é a apelação.

2.2 Decisão Interlocutória

A decisão interlocutória com fulcro no § 2 do art. 203 dispõe do seguinte conceito: “Decisão interlocutória é todo pronunciamento judicial de natureza decisória que não se enquadre no § 1”. Trata-se, portanto, de uma definição residual em relação à sentença.

As decisões interlocutórias possuem, como regra, conteúdo decisório relevante e apto a trazer prejuízo para alguma das partes, partilhando a carga decisória com a sentença, mas que não põe fim ao processo.

O agravo de instrumento é o recurso cabível contra as decisões interlocutórias. O art. 1015 do NCPC veicula um elenco de decisões que comportam o recurso em foco. As hipóteses de cabimento são taxativas, embora não estejam todas elas contidas nesse dispositivo.

Interessante observar, ainda, que o novo código de processo civil admitiu expressamente a existência e a possibilidade de decisões parciais de mérito, isto é, é possível o julgamento de mérito mediante decisão interlocutória. Ocorre nas hipóteses em que não há extinção do processo como um todo. O NCPC admite julgamentos parciais por meio de decisão interlocutória, logo, nem sempre procedência ou improcedência se trata de sentença. A decisão interlocutória que julga parcialmente o mérito é denominada pela doutrina de “decisão interlocutória de mérito”, ou, erroneamente por alguns doutrinadores de “sentença parcial”.

Em suma, julgamento parcial de mérito tem pronunciamento de decisão interlocutória, por conseguinte, o recurso cabível é o agravo de instrumento fazendo coisa julgada de execução definitiva. Por esse motivo, a utilização do termo “sentença parcial” nos leva ao pensamento equivocado de que caberia apelação para esse instituto.

2.3 Despacho

Em conformidade com o § 3 do art. 203 do NCPC, “despachos são todos os demais pronunciamentos do juiz praticados no processo, de ofício ou a requerimento da parte”. Nota-se que, conforme apontado apriori, são aqueles que não têm nenhum conteúdo decisório e, por isso, não provocam prejuízo às partes. Tem como finalidade única impulsionar o processo e impedir eventuais irregularidades de procedimento.

São exemplos de despacho: designação de audiência, intimação das partes e dos peritos e testemunhas, etc.

Os despachos meramente ordinatórios e sem qualquer conteúdo valorativo, o NCPC previu no art. 203, § 4, que incumbe ao escrivão ou secretário praticarem tais atos.

Em razão de sua natureza não decisória, os despachos são irrecorríveis conforme art. 1001 do NCPC.

3 JUÍZO DE ADMISSIBILIDADE NO NOVO CÓDIGO DE PROCESSO CIVIL

O Novo CPC inovou o sistema processual brasileiro em relação às “condições da ação”. No código de 1973, as “condições da ação” eram requisitos processuais, quais sejam: legitimidade, interesse de agir e possibilidade jurídica do pedido. O NCPC aboliu como categoria as condições da ação, no entanto, apenas como espécie, pois seus requisitos permaneceram.

Além das condições da ação, para o processo ser válido deverá ser complementado por alguns requisitos denominados de “pressupostos processuais”. Antes de tudo, o juiz deve analisar tais requisitos para posteriormente enfrentar os pedidos das partes.

Como o magistrado realiza juízo de admissibilidade e mérito no processo, o NCPC inovou de forma que, dividiu os requisitos da condição da ação e os colocou em “pressupostos processuais” que são admitidos dentro do campo do juízo de admissibilidade da ação. Assim, interesse de agir e legitimidade são verificados como pressupostos processuais, consoante art. 17 do NCPC. A possibilidade jurídica do pedido, por sua vez, adentrou-se na questão de mérito.

Diante o exposto, tais requisitos são imprescindíveis para o regular trâmite de um processo válido e consequentemente julgamento da lide. Por se tratar de requisitos no plano da existência e validade, casos os requisitos são preenchidos, o juiz deverá, por meio de decisão interlocutória, admitir a ação e que o processo se desenvolva determinando a citação do réu. Todavia, ausentes os requisitos, o juiz deverá, por meio de sentença, indeferir a petição inicial com fulcro no art. 330 do atual código. Ainda, é importante observar que o juiz tem uma atividade neutra, no sentido de que caso houver imperfeições na demanda, o juiz determina que o autor emende ou complete a petição, no prazo de quinze dias.

Note-se, portanto, que no juízo de admissibilidade, estamos diante de plano de existência e validade do processo, e sendo assim, não há de se falar em discricionariedade judicial como veremos a seguir, haja vista que o juiz não tem a faculdade de escolha entre admitir ou não a demanda, se preenchidos os requisitos ou não. Requisitos são previstos para serem cumpridos. Decisões interlocutórias e sentenças detém carga decisória e, consequentemente, causa prejuízo às partes. Dessa forma, a discricionariedade nesse campo seria somente admitida na hipótese do juiz atuar de forma intermediária ou neutra, eis que imperfeição ou vício na demanda poderá ou não causar prejuízo ao desenvolvimento do processo, e não às partes. Mas, ainda, toda e qualquer diligência pelo juiz deverá estar dentro da legalidade e respeitando o contraditório. Assim nos ensina Humberto Theodoro Junior:

“Convém ressaltar que o poder do juiz de indeferir a petição inicial é limitado pelo princípio do contraditório que obriga todos os sujeitos do processo, inclusive o magistrado. É por isso que qualquer decisão que afete o interesse da parte não poder ser tomada sem antes ser-lhe dada oportunidade de manifestação e defesa, ainda quando se trate de matéria conhecível de ofício pelo juiz. Assim, sendo sanável o defeito é dever, e não faculdade do juiz, ensejar à parte a emenda ou corrigenda a petição inicial, antes de indeferi-la (art. 321), sob pena de, não o fazendo, cometer ilegalidade e violar o devido processo legal”.

Assim, não há de se falar em discricionariedade quando se tratar de princípio constitucional, uma vez que este deve ser priorizado e fazendo com que o juiz seja incumbido de dever processual, não lhe cabendo usufruir de discricionariedade nestes casos.

Destarte, estamos no âmbito dos poderes do juiz incumbidos de dever processual e longe da discricionariedade do magistrado conforme veremos as possibilidade e hipóteses no tópico a seguir.

4 DISCRICIONARIEDADE

O poder discricionário trata-se de uma função que, em determinado caso concreto, é concedido ao agente público, neste caso, o magistrado, para escolher, segundo critérios da binômia conveniência e oportunidade, um entre mais comportamentos, todos igualmente nos limites da legalidade e atendendo à finalidade da lei.

O juiz é um agente da administração pública incumbido de julgar os conflitos sociais em conformidade com as normas atuais vigentes e, subordinado às limitações da organização estatal. Por ser um funcionário público, deve pautar-se pelos princípios da legalidade, da impessoalidade, da moralidade, da publicidade e da eficiência.

É de suma importância salientar que o processo civil clássico afastava qualquer possibilidade de o juiz agir discricionariamente, haja vista que deveria estar somente atrelado à lei, não cabendo interpreta-la, mas tão somente aplica-la.

Porém, cabe ao juiz, diante de lacunas, a função de adequar a norma ao caso concreto e dando-lhe a forma mais próxima à situação em pauta. Contudo, conforme iremos vislumbrar a seguir, essa discricionariedade deve ser controlada e não absoluta. Todavia, não cabe ao presente estudo entrar em pesquisa aprofundada sobre o controle da discricionariedade.

A discricionariedade judicial, noção imprescindível no Estado Democrático de Direito, não existe sem a legalidade, então, advém do princípio da legalidade, como faculdade inerentes à atividade judicial, de extrema imprescindibilidade à resolução de casos concretos que não se encontram previsão normativa, ou que são postos de forma diversa com a justiça do caso em pauta.

Ademais, o Novo Código de Processo Civil vem de forma reiterada adotando “cláusulas geras e conceitos jurídicos indeterminados”, ou seja, expressões cuja exata definição do sentido exige interpretação valorativa do juiz para serem aplicadas.

Percebe-se que ambas as técnicas legislativas trabalham com a indeterminação e vagueza, todavia não se confunde com ato discricionário, como se fosse dado ao juiz o poder de atribuir qualquer sentido ao texto. Isso é posto pelo fato de o magistrado estar vinculado ao princípio da legalidade e, orientar-se pelos princípios e regras constitucionais, isto é, reger-se pelo neoprocessualismo – com a observância do modelo constitucional do Direito Processual civil – com fundamento no art. do Novo Código de Processo Civil.

A discricionariedade ganha relevo nesse aspecto, no momento em que se depara o julgador com conceitos legislativos mais vagos, pois, quanto mais vagueza se encontra na lei, mais amplo torna-se o espaço para a atuação discricionário nas decisões judiciais.

Diante todo o exposto, passaremos a tratar a seguir sobre o aprimoramento da prestação jurisdicional sob a ótica de um novo juiz em relação à busca da verdade no processo e seu poder discricionário instrutório, além da efetividade processual em conflito com a morosidade e lentidão da justiça, tudo sob o prisma da discricionariedade do magistrado.

4.1 Busca da Verdade Real

É importante ressaltar de início que a legislação civil brasileira autoriza o juiz a julgar convencido apenas da verossimilhança das alegações, contudo, esta afirmação é objeto de controvérsia, uma vez que o processo civil não deve ser regido apenas pela verdade formal, mas, pelo contrário, adequar-se ao processo penal e procurar a verdade real.

Assim, cabe unicamente ao magistrado para adotar tal medida e, reclama-se, portanto, que o juiz não seja mais um sujeito passivo diante do caso concreto na relação processual tripartite; autor, réu e juiz. Na busca da verdade, deve o juiz disponibilizar de poderes maiores, a fim de que eventualmente supra a insuficiência de uma das partes.

Pensemos que se o juiz se contenta apenas com a verossimilhança dos fatos, a verdade real não será atingida e a descoberta da verdade material leva a justificação do livre convencimento motivado, destarte, muitas provas podem ser mal avaliadas e, por conseguinte, prolação de sentenças errôneas ou inexatas.

Trata-se, portanto, de um poder-dever do magistrado e não poder discricionário. O Novo Código de Processo Civil concedeu ao juiz maiores poderes instrutórios com a finalidade de autorizar o julgador a se utilizar de diversos meios, permitidos em lei, para se atingir o mais próximo possível da verdade absoluta dos fatos.

Logo, admitindo-se que a verdade absoluta é algo inalcançável, o dever do magistrado é alcançar o mais próximo da verdade e não deve se contentar e se satisfazer apenas com verossimilhanças.

Podemos, então, entender que é necessário uma relação linear entre os sujeitos do processo em que o juiz se encontre no mesmo nível das partes para desenvolver a sua função constitucional e dever de zelar pela igualdade processual, ainda que tenha que se inclinar para um dos lados. Muitas vezes há um desiquilíbrio na relação processual e essa inclinação para uma das partes com a finalidade de buscar a verdade não viola o princípio da isonomia. Pelo contrário, trata-se de um dever para equilibrar e melhor resolver a lide.

Note-se a repetição da palavra “dever”. Entendemos que não estamos diante de poder discricionário, em que o juiz poderá optar por uma de suas escolhas, mas sim de “deveres do juiz”, uma vez que a busca da verdade real deve-se encontrar berço neste e não naquele.

4.2 Poderes Instrutórios do Juiz

Os poderes instrutórios do juiz são de suma importância para o tema em tela, uma vez que há inovações no novo CPC.

Conforme Marinoni, na obra “O Novo Processo Civil”, publicado pela Revista dos Tribunais, São Paulo, 2015:

“O juiz tem o poder – de acordo com o sistema do Código de Processo Civil brasileiro -, quando os fatos não lhe parecerem esclarecidos, de determinar a prova de ofício, independentemente de requerimento da parte ou de quem quer que seja que participe do processo, ou ainda quando estes outros sujeitos já não tem mais a oportunidade processual para formular esse requerimento.” (pag. 269).

Por conseguinte, o juiz poderá determinar a realização de provas no processo ex officio, com a finalidade de alcançar a verdade real como previamente mencionado e, ainda, que o faça, não fere a igualdade processual.

Nesse contexto, o juiz deixou de ser apenas destinatário da prova, mas também exerce a função ativa no processo no que tange à produção probatória, podendo, quando julgar viável, determinar, de ofício, a produção de provas.

Por se falar em “viabilidade e necessidade”, voltamos à discricionariedade do juiz, eis que não é dever do magistrado aplicar essa medida, sendo lhe concedida mera faculdade de produção probatória. Ademais, o poder discricionário nesse tema específico é dotado de certa restrição, uma vez que o princípio da isonomia assegura igualdade de tratamento às partes no processo, sendo vedadas as decisões surpresas conforme se vê no art. 9 do CPC/15. Ainda, o juiz ao determinar a realização de provas, deverá observar as regras do art. 373 do mesmo código.

Assim, podemos concluir que os poderes instrutórios do juiz se tratam de discricionariedade, nunca absoluta, em que é facultada a ele adotar ou não a produção de prova ex officio, sendo que adotando, não viole a isonomia processual, e não adotando, não deixa de buscar a verdade absoluta dos fatos, uma vez que tal medida é oferecida na forma de “poder” e não “dever”.

A discricionariedade se mudará para dever caso o juiz vislumbre necessidade para tal medida. Situação pela qual saímos da esfera da faculdade e entramos no aspecto do poder-dever, pois, não adotando, estará voltando à figura do juiz clássico, inerte, inativo e omisso.

Mister salientar que se tratando de discricionariedade ou poder-dever, as ações do juiz devem andar sempre nos limites da legalidade processual.

4.3 Da Efetividade Processual

O presente tópico tem como foco um esboço do papel do juiz no método de solução de conflitos através do processo, com objetivo voltado à sua efetividade processual e caminhando junto o poder discricionário, com o mesmo intuito.

Quando a parte busca a satisfação de seu direito pela via judiciária, encontra-se diante de um problema notório que é a duração para atingir o que lhe é devido. É no espaço entre o início e o fim do processo que os sujeitos praticarão seus atos processuais e formar a convicção do juiz, porém, esse mesmo espaço é considerado um problema no nosso ordenamento jurídico.

Nos ensinamentos do professor Humberto Theodoro Junior:

“A jurisdição deixa de ser vista como simples poder e assume a categoria de função (poder-dever); e como tal, o que caracteriza a função jurisdicional é o papel da Justiça prestadora da tutela (defesa) ao direito material, que hoje não poder ser senão efetiva e justa.”

Deverá, sempre que puder prestar pela maior efetividade processual possível de maneira que exerça a Justiça de forma célere e visando o interesse das partes que, claramente não é a morosidade do processo.

Embora o legislador estabeleça prazos para os atos processuais, não há disposição legal que regula os critérios para computar ou quantificar “celeridade” ou “duração razoável do processo”, o que demanda a análise de caso a caso, levando-se em consideração, sobretudo, a complexidade do caso e os comportamentos das partes e do juiz.

O que se vê são juízes saindo da legalidade desobedecendo e desrespeitando os prazos processuais que a eles são auferidos, dando maior morosidade à prestação jurisdicional. Assim, a desigualdade processual é configurada mediante desleixo destes.

Destarte, cria-se uma ideia de que os prazos processuais dirigidos aos magistrados são dotados de poder discricionário, ou seja, proferir sentença no prazo de trinta dias se trata de mera faculdade, uma vez que no art. 226 do CPC/15 não faz uso do verbo “dever”. A propósito, trata-se de um ônus processual, uma vez que a duração razoável do processo é de cunho constitucional e o juiz deve respeitar os prazos e andar com a legalidade processual.

É nítido e talvez dispensável mencionar que as partes são dotadas de ônus processuais, bem como os juízes. Todavia, o descumprimento daqueles não configuram as mesmas consequências destes.

Um processo em que se respeitem todos os prazos processuais tanto pelas partes quanto pelo juiz é considerado um processo “célere” em comparação com aquele que não é executado e julgado com prioridade, mas sim com negligência. Dessa maneira, o magistrado deve sempre buscar a celeridade e eficácia do processo.

A discricionariedade dada ao juiz jamais, em nenhum caso, deverá ser usada para prejudicar, retroceder ou dilatar.

Busca-se, assim, uma efetividade processual, consolidada na prestação célere, justa e eficaz, materializada através de decisões judiciais justas e em conformidade com a legalidade.

5 LIMITES DA ATUAÇÃO JURISDICIONAL

O presente tópico investiga a possibilidade do Poder Judiciário atuar como Poder Legislativo positivo no âmbito formal (processual) e substancial (mérito), bem como para resoluções de lides e efetivar direitos fundamentais sociais, englobando o ativismo jurídico como um todo e suas consequências. Analisa-se a admissibilidade do Poder Judiciário adentrar no campo legislativo diante de omissão deste.

Ainda há uma grande divergência e discussão acerca das funções atribuídas e desempenhadas pelos juízes de Direito, sobre estes possuindo poder além do que lhes cabe.

Em razão da teoria da separação dos poderes disposto no art. da Constituição Federal de 1988, a função típica atribuída ao Poder Judiciário é a interpretação e aplicação das leis, em outras palavras, o limite de sua atuação é imposto pela lei.

Assim, o Poder Judiciário deve atuar em conformidade e em respeito com a legalidade e que sua função típica seja a de resolver conflitos, observando as normas constituídas.

Contudo, os direitos fundamentais sociais são de extrema importância no tocante à função judiciária, pois cabe aos juízes resguardar e proteger tais direitos. O Poder Judiciário não tem a faculdade de apreciar direitos fundamentais sociais. Incumbe a ele o dever de proteger os direitos dos indivíduos e estes não poderão ser afastados da apreciação do Poder Judiciário.

A questão que surge no que tange a esse tópico vem à tona: poderá o Poder Judiciário usufruir do ativismo judicial quando na relação processual as demandas sociais não serem atendidas efetivamente? Ou, é possível a interpretação extensiva da Constituição, que é usada pelos magistrados, na busca da resolução das lides? E no âmbito do mérito da demanda, incumbe ao juiz a discricionariedade de atuar fora de seus limites para garantir direitos fundamentais sociais?

Buscaremos no presente estudo as respostas e as divergências acerca do tema e, ainda, posição firmada e consolidada.

É necessário ressalvar, todavia, de que os juízes são – e devem ser – limitados processual e substancialmente, apesar de sua discricionariedade, adiante explicitadas.

5.1 Limites processuais

Os juízes possuem deveres e obrigações positivas no processo e, ainda que não haja leis para o caso concreto, o direito deve ser dito. Isso encontra fundamento no art. 140 do CPC/15 que dispõe: “Art. 126: O juiz não se exime de decidir sob a alegação de lacuna ou obscuridade do ordenamento jurídico.”.

Assim, o juiz não pode deixar de pronunciar sob a mera alegação de lacunas ou obscuridade da lei, cabendo-lhe aplicar conforme a analogia, os costumes e os princípios gerais do direito.

Destarte, enquanto que o juiz, frente a uma omissão legislativa, supre essa lacuna, usando de sua criatividade para criação de lei em consonância com a legalidade, não há de se falar em interferência no poder legislativo. Na verdade, o que o magistrado está fazendo está absolutamente em conformidade com o ordenamento jurídico e constitucional, haja vista que buscou fundamentos para concretizar a norma que necessitava de complementação para estar em vigor e suprir a omissão pelo legislador.

Diante de todo o exposto, passamos a analisar minuciosamente a questão do Poder Judiciário como legislador positivo.

6 A FUSÃO DO PODER JUDICIÁRIO E LEGISLADOR POSITIVO

Mister frisar a priori que há uma proibição da atuação do Poder Judiciário no âmbito legislativo positivo em razão do art. da Constituição Federal, a famosa teoria da separação dos poderes. Em contrapartida, a possibilidade dos juízes atuarem como legislador positivo com o intuito de resguardar e proteger direitos fundamentais sociais é expressamente permitido. Inicia-se assim a polêmica acerca do tema, pois quem defende a proibição dizem que tais práticas vão além do que é permitido pela Carta Magna.

Nas lições de Sérgio de Andréa Ferreira:

“É certo que o juiz não vai substituir ao legislador, ao administrador, no núcleo do poder discricionário. Mas não o estará fazendo se verificar que, diante de uma aparente legalidade extrínseca, na verdade esteja diante de uma grande injustiça, de um procedimento administrativo, desarrazoado, ilógico, contrário à técnica, à economicidade, à logicidade, que são os parâmetros do controle jurisdicional, neste campo específico da chamada legitimidade”.

Assim, é inquestionável que não pode haver uma substituição do Poder Judiciário pelo Poder Legislativo.

Outra questão a ser enfrentada diante da presente divergência é que a própria Constituição Federal não veda, mas também não permite expressamente a supressão de omissões.

Sempre que há a aplicação da lei pelo magistrado, está exercendo discricionariedade que lhe é admitida, e assim, havendo lacunas deixadas pelo legislador, estas deverão ser preenchidas pelo Poder Judiciário. Note-se que, neste caso específico, trata-se de poder-dever do magistrado em atuar como legislador positivo. Pensemos que nessa ocasião se fosse uma faculdade e nos depararmos com uma situação do juiz não preencher a lacuna, poderá ocorrer a violação ou a não satisfação dos direitos fundamentais sociais.

De acordo com Sérgio Moro, a possibilidade da atuação do juiz como legislador positivo está em conformidade com o Princípio da Supremacia da Constituição e ao Princípio da Efetividade. Segundo o autor, não é possível se esperar ad eternum que uma norma seja criada pelo Poder Legislativo, se já houve recusa em fazê-la.

7 CONCLUSÃO

O presente trabalho teve como função analisar diversas situações de limites do poder do juiz, bem como o fenômeno do poder discricionário englobando os institutos da busca da verdade real, poderes instrutórios do juiz e, por último, mas não menos importante, a efetividade processual.

Em um primeiro momento os pronunciamentos judiciais serviram como pilar para avançar nos juízos de admissibilidade, contudo, o trabalho em pauta abordou unicamente o juízo de admissibilidade processual. Concluiu-se que o juízo de admissibilidade da ação, configurando-se plano de existência, contém três modalidades de atuação do magistrado nesse campo, sendo a positiva, a negativa e a intermediária ou neutra.

Diante disso, incumbe ao juiz usufruir de poder discricionário isoladamente na esfera intermediária, uma vez que não há risco certo e determinado para às partes, tanto é assim que é confeccionada por despacho, que não detém carga decisória.

Em suma, é com facilidade consolidar o entendimento de que o poder discricionário não é absoluto, mas sim relativo. Há situações de clara observância de este poder, no entanto, o poder-dever do juiz é imprescindível para distinguir e demonstrar as hipóteses onde deverá ser usado este e não aquele. Deverá, ainda, adotando qualquer dos institutos, caminhar com a legalidade e garantir os direitos fundamentais para atingir o estado ideal de efetividade e justiça.

No mesmo sentido, o Poder Judiciário atuando de forma atípica como legislador positivo, não poderá em qualquer hipótese substituir o Poder Legislativo, haja vista que a separação dos poderes é norma que deve ser respeitada. Todavia, na obscuridade da lei, ou lacuna, cabe ao Judiciário atuar como Legislador positivo com o intuito, novamente, de garantir a justiça e não se abster de resolver a lide, eis que não estamos diante de discricionariedade, uma vez que solução da lide é dever máximo do juiz, podendo inclusive atuar de forma atípica, nas hipóteses citadas, para o pleno cumprimento de seus deveres.

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DINAMARCO, Cândido Rangel. Teoria Geral do Novo Código de Processo Civil. Ed. Malheiros, 2016.

MARINONI, Luiz Guilherme. A legitimidade da atuação do juiz a partir do direito fundamental à tutela jurisdicional efetiva. Disponível em: <http://www.professormarinoni.com.br>; Acesso em: 01/05/18

FERREIRA, Sérgio de Andrea. Ximena Cardozo. Disponível em: <http://www.mp.rs.gov.br/ambiente/doutrina/id376.html>; Acesso em: 01/05/18

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