Página 1450 do Diário de Justiça do Distrito Federal (DJDF) de 25 de Setembro de 2020

o autor e a primeira ré requereram a produção de prova oral. 19. Proferida decisão saneadora, a preliminar de ilegitimidade passiva e a produção de prova oral foram rejeitadas (id. 65064804). 20. Em seguida, os autos vieram conclusos. Fundamentação Revelia 21. Embora a segunda ré, regularmente citada, tenha deixado transcorrer in albis o prazo para contestar, incabível a ocorrência dos efeitos materiais da revelia, dado que os fatos objeto da presente ação são comuns a todos os réus, de modo que, juntada a contestação por um deles, afasta-se a presunção de veracidade, nos termos do art. 345, inciso I, do Código de Processo Civil[1]. Julgamento Antecipado do Mérito 22. Não havendo necessidade de produção de outras provas, como destacado em decisão anterior (id. 65064804), cabível o julgamento antecipado do mérito, consoante o art. 355, inciso I, do Código de Processo Civil[2]. 23. Tal medida não constitui cerceamento de defesa, representando, ao contrário, a consagração dos princípios da economia e da celeridade processuais, sendo certo, ademais, que o juiz deve indeferir as diligências inúteis ou meramente protelatórias, consoante o disposto no art. 370, parágrafo único, do Código de Processo Civil[3]. Preliminares 24. A preliminar de ilegitimidade já foi rejeitada (id. 65064804). 25. Não foram suscitadas outras questões preliminares e não se vislumbram quaisquer vícios que possam macular o regular andamento do feito. Assim, estão atendidos os pressupostos processuais de existência e de validade da relação processual, as partes são legítimas e há interesse processual na solução da controvérsia. Mérito 26. O deslinde do feito passa pelo exame da causa de pedir e do objeto da ação. Assim, emoldurado o quadro fático no relatório, cumpre analisar os pedidos deduzidos na proemial à luz das questões prejudiciais aventadas. 27. De início, cumpre salientar que a relação jurídica discutida em juízo se sujeita à legislação consumerista, haja vista que a primeira ré desenvolve atividade fornecida no mercado de consumo, mediante remuneração, e o autor dela se valeu como destinatário final, consoante o disposto nos arts. e , caput e §§ 1º e , do Código de Defesa do Consumidor[4]. 28. A legislação consumerista, vale frisar, consubstancia um microssistema jurídico de matiz principiológico, por meio do qual se buscam equalizar as relações jurídicas ? assimétricas ? entre consumidores e fornecedores. 29. Pois bem. 30. Colhe-se dos autos que o autor firmou contrato de venda de veículo com a ré, em 21.07.2017, tendo por objeto o automóvel descrito no instrumento, pelo valor de R$ 65.900,00, que seria pago por meio de carta de crédito do Consórcio Pan (id. 8586203). 31. A nota fiscal foi emitida pela primeira ré em 24.07.2017, às 10h15min39 (id. 8586264), o que gerou no autor a legítima expectativa de que a carta de crédito era real e o levou a transferir o valor acordado com o fraudador às 14h42min22 do mesmo dia (id. 8586265). 32. Por conseguinte, ao contrário do defendido em contestação, deveria a primeira ré, e não o consumidor, certificar-se da legitimidade da carta de crédito antes de emitir a nota fiscal, o que evitaria o dano causado ao autor. 33. Com efeito, nos termos do art. 12 do Código de Defesa do Consumidor, o fabricante, o produtor, o construtor, nacional ou estrangeiro, e o importador respondem, independentemente da existência de culpa, pela reparação dos danos causados aos consumidores por defeitos decorrentes de projeto, fabricação, construção, montagem, fórmulas, manipulação, apresentação ou acondicionamento de seus produtos, bem como por informações insuficientes ou inadequadas sobre sua utilização e riscos. 34. O artigo transcrito trata da responsabilidade objetiva do fornecedor, fundada na teoria do risco da atividade, sendo suficiente, para que surja o dever de indenizar, que o consumidor demonstre o dano ocorrido e a relação de causalidade entre este e o serviço prestado ? nexo causal. 35. Por sua vez, o art. 12, § 3º, do Código de Defesa do Consumidor enumera as hipóteses excludentes de responsabilidade, afastando a teoria do risco integral. Consoante o citado dispositivo legal, basta ao fornecedor demonstrar que não colocou o produto no mercado, que o defeito inexiste ou que houve culpa exclusiva do consumidor ou de terceiro, para que fique isento de responsabilidade. 36. Trata-se de inversão do ônus da prova ope legis ? decorrente da lei; que independe de manifestação do julgador, pois a própria lei distribui o ônus da prova de forma diversa daquela prevista no art. 373 do Código de Processo Civil. 37. Na hipótese dos autos, porém, a primeira ré não se cercou dos cuidados necessários antes de emitir a nota fiscal de venda do veículo, fato que induziu o autor em erro e deu azo ao substancial prejuízo. 38. Nesse sentido: CONSUMIDOR, CIVIL E PROCESSUAL CIVIL. APELAÇÃO CÍVEL. COMPRA E VENDA DE VEÍCULO. CARTA DE CRÉDITO. FRAUDE. EMISSÃO DE NOTA FISCAL MEDIANTE GOLPE. RESPONSABILIDADE DA CONCESSIONÁRIA PELO DANO AO COMPRADOR. BOA-FÉ OBJETIVA DO CONSUMIDOR. DANO MATERIAL. REPARAÇÃO. HONORÁRIOS ADVOCATÍCIOS. IMPOSSIBILIDADE DE COMPENSAÇÃO. RECURSO DA RÉ CONHECIDO E DESPROVIDO. RECURSO DO AUTOR CONHECIDO E PROVIDO. 1. Possível constatar que tanto o autor quanto a ré foram vítimas de estelionatários que engendraram um golpe para induzir a concessionária a emitir a nota fiscal de venda de veículo automotor ao autor, apoderandose da quantia paga pelo demandante. Apesar disso, embora tenha atuado sem saber que participava do golpe, a concessionária ré agiu de modo culposo e negligente, sendo de rigor a sua condenação a indenizar o autor. 2. A ré, ao negociar uma carta de crédito com suposto gerente de banco por telefone, sem certificar-se da veracidade das informações prestadas, emitindo nota fiscal e confirmando o recebimento do numerário que, na verdade, não tinha sido efetuado, colaborou de forma decisiva para a ocorrência da fraude envolvendo a venda do veículo automotor em questão e com o consequente prejuízo suportado pelo autor. 3. O art. 422 do CC estabelece que "os contratantes são obrigados a guardar, assim na conclusão do contrato, como em sua execução, os princípios de probidade e boa-fé". No caso em análise, não há que se falar em ausência de boa-fé do autor, uma vez que o dever de conduta e comportamento leal e honesto foi observado. 4. O CPC de 2015, em seu art. 85, § 14, prevê expressamente que os honorários constituem direito do advogado e têm natureza alimentar, com os mesmos privilégios dos créditos oriundos da legislação trabalhista. Por esta razão, o mesmo dispositivo legal veda expressamente a compensação em caso de sucumbência parcial. 5. RECURSO DA RÉ CONHECIDO E DESPROVIDO. RECURSO DO AUTOR CONHECIDO E PROVIDO. Sentença reformada. (Acórdão 1162729, 20160410041736APC, Relator: ROBSON BARBOSA DE AZEVEDO, 5ª TURMA CÍVEL, data de julgamento: 27/3/2019, publicado no DJE: 8/4/2019. Pág.: 543/548) 39. Portanto, embora não seja possível determinar a entrega do veículo ao autor ? o que ensejaria o seu enriquecimento sem causa; a segunda ré, receptora do dinheiro, e a primeira ré devem indenizar o autor pelo valor que despendeu com a aquisição da falsa carta de crédito. 40. O dano moral, por seu turno, resulta da violação a um direito extrapatrimonial juridicamente tutelado ? a exemplo dos direitos da personalidade ? e tem sede constitucional no art. , incisos V e X, da Constituição[5]. 41. Na espécie, não há falar em dano moral, uma vez que a primeira ré não participou da fraude que lesou o autor e não está clara a participação da segunda ré no golpe ? mesmo tendo recebido o dinheiro, não é possível afirmar o seu conhecimento acerca da prática delituosa. 42. Logo, merece parcial guarida o pleito autoral. Dispositivo Principal 43. Ante o exposto, julgo parcialmente procedentes os pedidos formulados na inicial para condenar as rés, solidariamente, a pagarem ao autor a quantia de R$ 45.900,00 (quarenta e cinco mil e novecentos reais), sobre a qual incidirão correção monetária, pelo INPC, a contar de 24.07.2017, e juros de mora, de 1% (um por cento) ao mês, desde a citação. 44. Resolvo o mérito, nos termos do art. 487, inciso I, do Código de Processo Civil. Despesas Processuais 45. Em face da sucumbência recíproca, ficam rateadas entre as partes as despesas processuais, na proporção de 50% (cinquenta por cento) para o autor e 50% (cinquenta por cento) para as rés[6]. Honorários Advocatícios 46. Os honorários advocatícios devem ser fixados de acordo com o grau de zelo do profissional, o lugar de prestação do serviço, a natureza e a importância da causa, o trabalho realizado pelo advogado e o tempo exigido para o seu serviço. 47. Em conformidade com as balizas acima, arcarão as partes com o pagamento de honorários advocatícios ? fixados em 10% (dez por cento) sobre o valor da condenação; na mesma proporção de 50% (cinquenta por cento) a cargo do autor, em favor do patrono da primeira ré, e 50% (por cento) a cargo das rés, em favor do patrono do autor, com espeque no arts. 85, § 2º e 86 do Código de Processo Civil[7]. Disposições Finais 48. Sentença proferida pelo Núcleo Permanente de Gestão de Metas do Primeiro Grau ? NUPMETAS-1, instituído pela Portaria Conjunta nº. 33, de 13 de maio de 2013. 49. Após o trânsito em julgado, pagas as custas processuais e não havendo outros requerimentos, remetam-se os autos ao arquivo, observados os arts. 100 e 101 do Provimento Geral da Corregedoria[8]. 50. Publique-se. Intimem-se. Sentença registrada eletronicamente. Pedro Oliveira de Vasconcelos Juiz de Direito Substituto * documento datado e assinado eletronicamente [1] CPC. Art. 345. A revelia não produz o efeito mencionado no art. 344 se: I - havendo pluralidade de réus, algum deles contestar a ação; [2] CPC. Art. 355. O juiz julgará antecipadamente o pedido, proferindo sentença com resolução de mérito, quando: I - não houver necessidade de produção de outras provas; II - o réu for revel, ocorrer o efeito previsto no art. 344 e não houver requerimento de prova, na forma do art. 349. [3] CPC. Art. 370. Caberá ao juiz, de ofício ou a requerimento da parte, determinar as provas necessárias ao julgamento do mérito. Parágrafo único. O juiz indeferirá, em decisão fundamentada, as diligências inúteis ou meramente protelatórias. [4] CDC. Art. 2º Consumidor é toda pessoa física ou jurídica que adquire ou utiliza produto ou serviço como destinatário final. Art. 3º Fornecedor é toda pessoa física ou jurídica, pública ou privada, nacional ou estrangeira, bem como os entes despersonalizados, que desenvolvem atividade de produção, montagem, criação, construção, transformação, importação, exportação, distribuição ou comercialização de produtos ou prestação de serviços. §

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