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23 de Maio de 2024
  • 2º Grau
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Detalhes

Processo

Órgão Julgador

3ª Turma

Julgamento

Relator

MARIA MADALENA TELESCA
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Inteiro Teor

PODER JUDICIÁRIO
JUSTIÇA DO TRABALHO
TRIBUNAL REGIONAL DO TRABALHO DA 4ª REGIÃO
Identificação

PROCESSO nº XXXXX-35.2021.5.04.0384 (ROT)
RECORRENTE: MUNICIPIO DE TRES COROAS
RECORRIDO: ELIANE TERESINHA CANDIDO DA SILVA, A. S. RIBAS SERVICOS LTDA
RELATOR: MARIA MADALENA TELESCA

EMENTA

RESPONSABILIDADE SUBSIDIÁRIA DO TOMADOR DO SERVIÇO. ENTE PÚBLICO. Não havendo comprovação da efetiva fiscalização pelo ente público, tomador do serviço, quanto ao cumprimento do contrato de prestação de serviços, em especial no que concerne às normas trabalhistas pela prestadora de serviços, tem-se por configurada a culpa in vigilando, devendo o tomador responder subsidiariamente pelas verbas trabalhistas inadimplidas pela empregadora. Recurso do segundo reclamado não provido.

ACÓRDÃO

Vistos, relatados e discutidos os autos.

ACORDAM os Magistrados integrantes da 3ª Turma do Tribunal Regional do Trabalho da 4ª Região: por unanimidade, negar provimento ao recurso do segundo reclamado, Município de Três Coroas.

Intime-se.

Porto Alegre, 25 de setembro de 2023 (segunda-feira).

Cabeçalho do acórdão

Acórdão

RELATÓRIO

Inconformado com a sentença proferida pelo Juiz Charles Lopes Kuhn (Id. 8c4d366), o segundo reclamado, Município de Três Coroas, interpõe recurso ordinário (Id. 4d32482).

Suscita a ilegitimidade passiva, insurge-se contra a responsabilidade subsidiária que lhe foi atribuída e busca a reforma do julgado no que diz respeito à condenação ao pagamento de saldo de salário, aviso prévio, férias, décimo terceiro salário, FGTS, auxílio alimentação, cesta básica, multas dos arts. 467 e 477 da CLT, adicional de insalubridade, indenização por danos morais e honorários advocatícios.

Sem contrarrazões, sobem os autos a este Tribunal.

O Ministério Público do Trabalho manifesta-se pelo prosseguimento do feito, na forma da lei (Id. 824e10e).

É o relatório.

FUNDAMENTAÇÃO

CONHECIMENTO.

Sendo tempestivo o apelo do segundo reclamado, Município de Três Coroas, regular a representação (mandato tácito - Id. 5cfad50 e Súmula 436 do TST) e dispensado o preparo por força de lei (art. 790-A, I, da CLT), encontram-se preenchidos os pressupostos extrínsecos de admissibilidade do recurso.

MÉRITO.

RECURSO DO SEGUNDO RECLAMADO, MUNICÍPIO DE TRÊS COROAS.

1. CARÊNCIA DE AÇÃO. ILEGITIMIDADE PASSIVA.

O segundo reclamado, Município de Três Coroas, suscita a sua ilegitimidade passiva. Alega ter contratado a primeira demandada por meio de licitação, contrato que perdurou por quase 6 anos, até tomar conhecimento da inadimplência da empresa para com os empregados. Menciona que o fato de ter sido um contrato longo e de o Ente Municipal ter efetuado o pagamento direto aos trabalhadores, só demonstra que o Município não pode ser condenado por culpa in vigilando ou in eligendo, uma vez que jamais compactuou com as ações da primeira reclamada. Explica que a primeira reclamada, após tomar ciência de que o contrato não mais perduraria, decidiu despedir todos os seus trabalhadores sem justa causa, não podendo o Município ser responsabilizado pelos atos da empresa terceirizada. Invoca o disposto no art. 71 da Lei 8.666/93, reafirmando que não existe responsabilização da Administração Pública quanto aos encargos trabalhistas e lembrando que o § 1º deste dispositivo foi objeto da ADC 16 junto ao STF. Tece considerações acerca dos convênios administrativos, sobre a aplicabilidade, por analogia, da OJ 185 da SDI-1 do TST e sobre a previsão do art. 44, § 1º, da Lei 13.019/14, para fins de não caracterização da responsabilidade da Administração Pública. Pede a sua exclusão da lide, ante a manifesta carência de ação, referindo que a autora foi contratada pela primeira reclamada, a qual deve arcar e responder pelos encargos eventualmente correspondentes.

A carência de ação é verificada quando ausentes as condições da ação, quais sejam, a legitimidade das partes, interesse de agir e possibilidade jurídica do pedido. A ilegitimidade se concretiza quando não se mostra cabível a presença da parte em qualquer dos polos da demanda.

A relação de direito material não se confunde com a relação jurídica processual, porquanto nela basta a indicação pela autora de que o segundo reclamado é devedor do direito material para legitimá-lo a responder à ação. Entende-se que a análise da questão relativa à ilegitimidade passiva como condição da ação, deve se dar a partir das informações em abstrato feitas pela reclamante em sua petição inicial, de acordo com a teoria da asserção. Assim, o simples fato de a demandante formular pedido de responsabilização subsidiária do segundo reclamado, já o legitima a figurar no polo passivo da presente relação processual. Por outro lado, a procedência ou não da pretensão é questão afeta ao mérito dos pedidos e no tópico pertinente será analisada. Portanto, sendo as partes legítimas, os pedidos juridicamente possíveis e havendo nítido interesse processual, não há carência de ação, pois presentes todas as suas condições.

Negado provimento.

2. RESPONSABILIDADE SUBSIDIÁRIA.

Não se conforma o Município demandado com a responsabilidade subsidiária que lhe foi atribuída pelos créditos decorrentes desta ação. Alega que não existe qualquer liame empregatício entre a autora e o Ente Público, bem como que a reclamante não preenche as condições estabelecidas para o reconhecimento da relação de emprego com o Município, razão pela qual seus pedidos devem ser julgados improcedentes. Diz ser inverídico o fato de que a autora sempre prestou serviços em prol do Município, salientando que, embora o ente público mantivesse contrato de empreitada com a primeira demandada, não tinha qualquer relação ou interferência na contratação do pessoal utilizado no cumprimento das cláusulas avençadas. Acresce que ficou estabelecido no contrato com a primeira reclamada, que a responsabilidade é totalmente da empresa contratada. Argumenta que não há falar em culpa in eligendo e in vigilando, mencionando que a primeira reclamada ganhou a licitação porque preenchia os requisitos requeridos pela lei. Registra ter acordado com a primeira reclamada contrato que perdurou por quase 6 anos e, ao longo deste tempo, a primeira demandada jamais deu indícios de não se tratar de empresa idônea. Explica que alguns fatos ocorridos no último ano, foi verificado pelo Tesoureiro Municipal que as devidas negativas não estavam sendo apresentadas, mostrando irregularidades nos pagamentos dos obreiros; que, diante de tal situação, adotou todas as medidas necessárias para a fiscalização e correta execução do contrato; que tão logo tomou conhecimento das irregularidades, passou a alcançar os valores a serem pagos à primeira reclamada diretamente aos seus trabalhadores, o que ocorreu até a rescisão total do contrato. No que diz respeito à culpa in vigilando, sustenta que sempre atuou como fiscalizador da primeira reclamada. Acentua que o STF, ao julgar a ADC 16, passou a exigir prova de culpa em responsabilidade subsidiária da Fazenda Pública. Impugna a alegação de que o contrato de prestação de serviços é nulo, pois não há nos autos qualquer dúvida acerca da regular realização de licitação, nos termos da Lei 8.666/93.

Registra-se, de início, que não foi reconhecido vínculo de emprego entre a autora e o segundo reclamado - tampouco houve pedido em tal sentido na petição inicial -, sendo o ente público apenas responsabilizado subsidiariamente pelas obrigações decorrentes da presente ação.

A reclamante foi admitida pela empresa A.S. Ribas Serviços Ltda., primeira reclamada, em 14.01.2016, para exercer as funções de auxiliar de limpeza (Id. a93eff9) em prol da Prefeitura Municipal de Três Coroas, como dão conta os recibos de pagamento de salário (Id. eae245f, por exemplo), e despedida sem justa causa pela empregadora em 30.12.2020 (TRCT - Id. XXXXXd), contudo, consta como data de saída na CTPS 11.01.2021 (Id. ad8787e - Pág. 3).

A primeira reclamada, A.S. Ribas Serviços, foi declarada revel e confessa quanto à matéria fática, ante a não apresentação de defesa (Id. 953a62e).

Além disso, não há controvérsia acerca da prestação de serviços da primeira reclamada, A.S. Ribas Serviços Ltda., para o segundo demandado, Município de Três Coroas (contrato e aditivos - Id. 4e4763f), caso em que é presumido que este se beneficiou da força de trabalho da autora.

Evidentemente, a questão da constitucionalidade do art. 71, § 1º, da Lei 8.666/93 não foi objeto da presente reclamatória trabalhista e, em momento algum, foi questionada sua validade. A questão, não raramente invocada pela Administração Pública quanto à aplicação do dispositivo referido, representa colisão aparente de normas. Aparente porque, em verdade, não existe a derrogação de um dos diplomas em prestígio ao outro, mas sim, a prevalência de aplicação de um deles ao caso concreto. A doutrina alemã, que há muito explora o tema, ensina que, havendo esse conflito aparente, impõe-se aplicar o princípio da proporcionalidade, com o fito de estabelecer qual norma confere maior preservação dos preceitos contidos na Constituição Federal.

No caso em exame, em primeiro plano, existem direitos fundamentais da trabalhadora sendo questionados, como, por exemplo, a dignidade da pessoa humana e os valores sociais do trabalho. Por sua vez, a Administração Pública procura preservar-se alheia à relação de trabalho entre a prestadora de serviços e a obreira. Fazendo o cotejo entre as normas aplicáveis, de um lado a Constituição Federal e de outro a Lei 8.666/93, é inquestionável a preponderância daquela em detrimento desta. Caso contrário, estar-se-ia permitindo que o tomador, ente público, pudesse se beneficiar diretamente da mão de obra da trabalhadora, ficando, injustificadamente, isento de quaisquer ônus decorrentes do inadimplemento de direitos trabalhistas. Nesse sentido, a previsão contida no item IV da Súmula 331 do TST:

O inadimplemento das obrigações trabalhistas, por parte do empregador, implica a responsabilidade subsidiária do tomador dos serviços quanto àquelas obrigações, desde que haja participado da relação processual e conste também do título executivo judicial.

Ademais, adota-se a orientação jurisprudencial consubstanciada no item V da Súmula 331 do TST:

Os entes integrantes da Administração Pública direta e indireta respondem subsidiariamente, nas mesmas condições do item IV, caso evidenciada a sua conduta culposa no cumprimento das obrigações da Lei n.º 8.666, de 21.06.1993, especialmente na fiscalização do cumprimento das obrigações contratuais e legais da prestadora de serviço como empregadora. A aludida responsabilidade não decorre de mero inadimplemento das obrigações trabalhistas assumidas pela empresa regularmente contratada.

No mesmo sentido, o entendimento consagrado na Súmula 11 deste Tribunal, segundo o qual:

RESPONSABILIDADE SUBSIDIÁRIA DA ADMINISTRAÇÃO PÚBLICA DIRETA E INDIRETA. CONTRATOS DE PRESTAÇÃO DE SERVIÇOS. LEI 8.666/93. A norma do art. 71, § 1º, da Lei nº 8.666/93 não afasta a responsabilidade subsidiária das entidades da administração pública, direta e indireta, tomadoras dos serviços.

Não se trata de negar vigência ao artigo 71 da Lei 8.666/93, tampouco de declaração de sua inconstitucionalidade, mas apenas de interpretação em consonância com o ordenamento jurídico pátrio. Ademais, sublinha-se que, por ocasião do julgamento da ADC 16 pelo STF, jamais foi assentada a isenção total de responsabilidade por parte da Administração Pública.

Não importa para o Direito do Trabalho se o tomador dos serviços contratou a empresa prestadora invocando apenas o Direito Civil ou o Direito Administrativo. É relevante, isto sim, que o tomador tenha se beneficiado com a força de trabalho da autora, porquanto não há como deixar de assegurar os direitos trabalhistas à empregada. Deste modo, o fato do recorrente ter contratado a prestadora por meio de contrato de prestação de serviços não afasta a sua responsabilidade subsidiária pelo inadimplemento das obrigações trabalhistas. Tal entendimento fundamenta-se, ainda, no Princípio da Proteção, informador do Direito do Trabalho.

Ressalta-se também que a garantia subsidiária dos direitos trabalhistas pelo tomador se impõe, não apenas em virtude da responsabilização mínima por ato de terceiro, como, também, pela vedação jurídica ao abuso de direito, harmonizando os dois princípios, com a prevalência hierárquica dos direitos laborais na ordem jurídica do país. Não se pode esquecer, ainda, que o fundamento da subsidiariedade não é apenas legal, mas se vincula aos princípios gerais do Direito, cuja inserção na área trabalhista é admitida pelo art. da CLT.

Convém salientar que a responsabilidade subsidiária não retira a obrigação da real empregadora pelo pagamento das parcelas oriundas do contrato de trabalho, mas afasta a possibilidade de a reclamante se ver impedida de obter o cumprimento de dívidas trabalhistas, na eventualidade de se frustrar a execução contra a empresa prestadora de serviços.

A imputação da responsabilidade do segundo reclamado encontra respaldo, também, na culpa in vigilando, que consiste na obrigação do tomador dos serviços em verificar se os encargos trabalhistas estão sendo devidamente cumpridos pela prestadora.

Outrossim, em que pese tenham sido juntados documentos pelo segundo reclamado consistentes em notas de empenho, listagem da folha de pagamento e recibos de pagamento de salário (Ids. 9f124d2, 98c1e2e, 851a947, 356e595, c5e4542, c1f647a, 3e8eb59, 1774783, 545a6c4, 65c597e, 4bd3143, 4b3a0f2, 3223929, ee3be9f e f2672b7), não há prova robusta de que o Município de Três Coroas tenha exercitado o seu poder fiscalizador e averiguado o cumprimento das normas trabalhistas pela prestadora de serviços que indubitavelmente contratou, notadamente no que diz respeito às parcelas salariais deferidas na presente ação. Nem mesmo o parecer sobre pagamento de serviços elaborado pelo Procurador Interino (Id. 3537b23) se presta para o fim colimado. Frisa-se que o pagamento direto de valores à autora, conforme noticiado na petição inicial e na contestação do segundo reclamado, só vem a confirmar que a atuação do Município se deu no sentido de reparação do prejuízo causado pela empresa contratada, mas não no sentido de fiscalizá-la para que mantivesse os pagamentos. Repete-se que não houve medida de precaução a fim de evitar o inadimplemento, uma vez que o segundo reclamado tinha condições de fiscalizar através de seus prepostos, o cumprimento das obrigações trabalhistas, o que faz com que se reconheça a sua culpa in vigilando. Frisa-se que o ônus da prova incumbia aos demandados, de acordo com o princípio da maior aptidão para a prova da empregadora, levando-se em consideração que é inviável à trabalhadora constituir prova de inexistência de fato.

Importante ser ressaltado que a garantia subsidiária dos direitos trabalhistas pela tomadora do serviço se impõe, não apenas em virtude da responsabilidade mínima por ato de terceiro, como, também, pela vedação jurídica ao abuso de direito, harmonizando os dois princípios, com prevalência hierárquica dos direitos laborais na ordem jurídica do país.

Finalmente, a decisão exarada pelo Supremo Tribunal Federal, no julgamento do RE XXXXX/DF, com repercussão geral reconhecida (tese fixada em 26.04.2017), igualmente não veda a possibilidade de responsabilização do ente público, impondo apenas que tal seja precedida do exame de culpa:

O Tribunal, por maioria e nos termos do voto do Ministro Luiz Fux, que redigirá o acórdão, vencido, em parte, o Ministro Marco Aurélio, fixou a seguinte tese de repercussão geral: "O inadimplemento dos encargos trabalhistas dos empregados do contratado não transfere automaticamente ao Poder Público contratante a responsabilidade pelo seu pagamento, seja em caráter solidário ou subsidiário, nos termos do art. 71, § 1º, da Lei nº 8.666/93". Ausente, justificadamente, o Ministro Celso de Mello. Presidiu o julgamento a Ministra Cármen Lúcia. Plenário, 26.4.2017

Demais disso, a decisão conferida em sede de embargos de declaração do RE XXXXX/DF esclareceu que a responsabilização subsidiária do poder público não é automática, dependendo de comprovação de culpa "in eligendo" ou "in vigilando", o que decorre da inarredável obrigação da administração pública de fiscalizar os contratos administrativos firmados sob os efeitos da estrita legalidade. Também se observa que não foi fixada tese jurídica quanto à distribuição do ônus da prova.

Por todo o exposto, impõe-se a manutenção da sentença, no particular.

Recurso não provido.

3. SALDO DE SALÁRIO. AVISO PRÉVIO. FÉRIAS. DÉCIMO TERCEIRO SALÁRIO. FGTS. AUXÍLIO ALIMENTAÇÃO. CESTA BÁSICA. MULTAS DOS ARTS. 467 E 477 DA CLT.

O segundo reclamado renova o argumento de que nunca possuiu vínculo com a recorrida, o que, por si só, já impede a cobrança das verbas em epígrafe. Por cautela, impugna as alegações e aduz que a relação que o Município tem com seus servidores não admite tais pagamentos, o que também corrobora a alegação de que não tem responsabilidade com a presente relação. Explica que, quando tomou conhecimento de que a primeira reclamada não estava cumprindo com as obrigações de depositar o FGTS, passou imediatamente a fazê-lo, com acréscimo da multa de 40%, até o final do ano, estando quitada a rubrica. Menciona, ainda, ter juntado comprovação de que pagou a primeira parcela do décimo terceiro salário, a qual deve ser deduzida em eventual condenação.

Reitera-se o quanto expendido no tópico anterior, de que não houve nem pedido de reconhecimento de vínculo entre a autora e o Município demandado, nem condenação nesse sentido.

Quanto às verbas rescisórias, aí incluídas as diferenças de FGTS com acréscimo de 40%, não havendo prova do seu adimplemento, correta a sentença que determinou o seu pagamento, autorizada a dedução do valor reconhecido na petição inicial como quitado pelo Município. Quanto à primeira parcela do décimo terceiro salário, ao contrário do alegado, não há prova da sua quitação, cabendo referir que o Id. indicado no recurso não pertence a esse processo.

A responsabilidade subsidiária anteriormente analisada alcança todas as verbas decorrentes da condenação referentes ao período da prestação laboral, abarcando as deferidas na sentença, inclusive as multas previstas nos arts. 467 e 477 da CLT, por adoção dos entendimentos expressos no item VI da Súmula 331 do TST e na Súmula 47 deste Tribunal.

Provimento negado.

4. ADICIONAL DE INSALUBRIDADE.

Sustenta o segundo reclamado que as informações prestadas nas perícias se desencontram e se contradizem e, tendo em vista a incongruência em suas versões, entende que não se pode dizer que o laudo é conclusivo. Transcreve excerto da cláusula 59ª da Convenção Coletiva de Terceirizados do Estado do Rio Grande do Sul, integrada pelo município reclamado, que dá conta de que para a categoria profissional da autora, o adicional de insalubridade é em grau médio. Acrescenta que o STF validou jurisprudência reconhecendo que os acordos ou convenções coletivas que limitam ou suprimem direitos trabalhistas são válidos, desde que assegurado um patamar civilizatório mínimo ao trabalhador.

A perícia técnica foi realizada na modalidade de teleconferência (Id. db7562e), da qual participaram a autora e representante do segundo reclamado, não tendo o perito relatado divergências entre as informações prestadas pelas partes, notadamente no que diz respeito às atividades realizadas pela reclamante. E quanto a estas, restou incontroverso que as tarefas consistiam, dentre outras, na varrição de ruas e calçadas, recolhendo lixo urbano, além da limpeza de sanitários públicos nas praças do município, bem como, nas férias de sua colega, fazia a limpeza do Ginásio Municipal, o que também incluía a higienização de banheiros de uso dos atletas e do público, constituindo-se em atribuição normal, não sendo, portanto, eventual o contato com os agentes insalubres.

Não obstante inovatória a tese de que à categoria profissional da autora caberia o pagamento de adicional de insalubridade em grau médio - eis que sua contestação foi por demais genérica, no tópico (item III.IV - Id. 8bbd8da - Pág. 14), o segundo reclamado não trouxe aos autos a convenção coletiva que anuncia nas razões recursais, não podendo se socorrer do julgado do STF no Tema 1046.

O entendimento que se adota, então, é de que a limpeza de sanitários e o recolhimento de lixo - tarefas realizadas pela autora -, gera direito à percepção de adicional de insalubridade em grau máximo, pois incontestável que tal serviço importa na exposição da trabalhadora a agentes biológicos nocivos (vírus, bactérias e/ou fungos), resultantes do contato com dejetos humanos, os quais podem ser considerados como uma das frações do lixo urbano mais contaminados por micro-organismos.

O contato com agentes biológicos, mesmo que de forma intermitente (Súmula 47 do TST), ocorrido por meio da coleta de papéis higiênicos e da limpeza do banheiro, incluídos "aparelhos sanitários" (que embora não consistam em tanques e galerias de esgoto, são, indubitavelmente, os primeiros receptáculos do esgoto cloacal), determina a exposição da empregada a fontes de contágio extremamente danosas, tendo em vista o contato com detritos e materiais passíveis de serem classificados como "lixo urbano" e "esgoto", e que constituem verdadeiros meios de cultura de agentes patológicos, presentes e oriundos dos resíduos fecais, urinários e de outras secreções humanas.

Os dejetos humanos constituem potenciais fontes de patogenias, visto que pessoas portadoras de agentes biológicos patogênicos, inclusive aquelas que não apresentam qualquer sintoma, estão presentes em todas as camadas sociais e em todos os locais, sendo que, muitas vezes, basta exposição mínima aos micro-organismos infectantes para que se promova o contágio e o desenvolvimento de doenças. Logo, o contato com os agentes biológicos insalubres se dá de forma qualitativa e não quantitativa, de forma a caracterizar a referida condição insalubre em grau máximo, de acordo com o Anexo 14, da NR -15, da Portaria 3.214/78 do MTE.

De sublinhar que há registro de fornecimento de EPI"s apenas quando da admissão da autora (1 loção protetora, 1 par de luvas e 1 par de botas de borracha - Id. f72e81b - Pág. 1) e que a reclamante relatou ao perito que jamais recebeu equipamentos de proteção individual. Ainda que tivessem sido fornecidas luvas apropriadas, em número suficiente e com aprovação pelo Ministério do Trabalho e Emprego, estas não eliminariam por completo a insalubridade decorrente da atividade, agindo, inclusive, como meio transmissor dos agentes patogênicos.

Logo, faz jus a reclamante ao pagamento de adicional de insalubridade em grau máximo, de acordo com o Anexo 14, da NR-15, da Portaria 3.214/78 do MTE, tal como reconhecido na origem.

Mantém-se a sentença, pelos seus próprios fundamentos.

Recurso não provido.

5. DANOS MORAIS.

O Município adverte que não agiu de nenhuma forma na ilicitude e muito menos atingiu o íntimo da reclamante, não havendo danos morais. Acentua que a finalidade do pleito é exclusivamente lucrativa. Observa que a prova do dano deve ser inequívoca, não bastando meras alegações, e cujo ônus incumbe ao ofendido. Diz que a demandante não demonstrou faticamente quais atitudes praticadas pelo município que ofenderam sua moral ou que lhe causaram tamanho prejuízo. Menciona que, não havendo culpa do recorrente, o dano a ser reparado deve ser indeferido, por absolutamente indevido e absurdo. Retoma o argumento de que não possui vínculo de emprego com o reclamante, não existindo qualquer fator que pudesse ensejar a condenação por danos morais. Por cautela, postula a redução do valor arbitrado.

É incontroverso o atraso no pagamento das verbas rescisórias.

Constitui dano moral o evento apto a produzir efeitos na órbita interna do ser humano, causando-lhe dor, tristeza ou qualquer outro sentimento capaz de lhe afetar o lado psicológico, sem qualquer repercussão de caráter econômico. São, pois, lesões sofridas pelas pessoas, em certos aspectos de sua personalidade, que atingem somente a esfera íntima e valorativa, pois a dor e a angústia são apenas formas pelas quais o dano moral se exterioriza.

Ainda, o ordenamento jurídico pátrio impõe a responsabilidade civil somente quando configurada a hipótese do art. 186 do Código Civil, in verbis: Aquele que, por ação ou omissão voluntária, negligência ou imprudência, violar direito e causar dano a outrem, ainda que exclusivamente moral, comete ato ilícito.

De outra parte, ensina Sérgio Cavalieri Filho, acerca da responsabilidade civil,que: Em seu sentido etimológico, responsabilidade exprime a ideia de obrigação, encargo, contraprestação. Em sentido jurídico, o vocábulo não foge dessa ideia. Designa o dever que alguém tem de reparar o prejuízo decorrente da violação de um outro dever jurídico. Em apertada síntese, responsabilidade civil é um dever jurídico sucessivo que surge para recompor o dano decorrente da violação de um dever jurídico. (In Programa de Responsabilidade Civil, São Paulo: Malheiros Editores, 2005, 6ª ed., p.24).

Embora a legislação trabalhista contenha previsão de sansão pecuniária para a hipótese de não pagamento das parcelas rescisórias no prazo legal, está configurado o ato ilícito ensejador do dever de indenizar, independentemente das multas contidas nos arts. 467 e 477 da CLT, pois, ainda que não provado, é presumível que a demandante tenha sido tolhida em seu meio de subsistência, sobretudo considerando o caráter alimentar das parcelas rescisórias.

Entende-se, por conseguinte, configurado o dano moral suscetível de ser indenizado.

Quanto ao valor, importância fixada na sentença, R$ 3.906,00, mostra-se razoável, considerando o binômio compensação da vítima/punição da ofensora, além do disposto no art. 223-G da CLT, não comportando a redução pretendida.

Ainda, como já expendido em tópico anterior, a responsabilidade subsidiária alcança todas as verbas decorrentes da condenação e referentes ao período da prestação laboral, inclusive no que tange à indenização por danos morais. Exegese das Súmulas 47 deste Regional e 331, VI, do TST.

Nega-se provimento ao recurso.

6. HONORÁRIOS ADVOCATÍCIOS.

O segundo reclamado recorre do percentual fixado a título de honorários assistenciais sob a alegação de que ausentes os requisitos da Lei 5.584/70, especialmente quanto à assistência da parte autora por sindicato profissional da mesma base territorial dos reclamados. Por cautela, requer seja a verba honorária fixada em consonância com a atual legislação.

Adota-se quanto à matéria referente aos honorários advocatícios, o disposto no art. 6º da IN 41/2018 do TST:

Na Justiça do Trabalho, a condenação em honorários advocatícios sucumbenciais, prevista no art. 791-A, e parágrafos, da CLT, será aplicável apenas às ações propostas após 11 de novembro de 2017 (Lei nº 13.467/17). Nas ações propostas anteriormente, subsistem as diretrizes do art. 14 da Lei nº 5.584/1970 e das Súmulas nºs 219 e 329 do TST.

Ajuizada a ação trabalhista em 07.01.2021, não há falar em honorários advocatícios assistenciais, mas honorários de sucumbência.

No que diz respeito ao percentual, não há falar em redução, porquanto observado o caput do art. 791-A da CLT e em consonância com o usualmente arbitrado nesta Justiça Especializada.

Negado provimento.

PREQUESTIONAMENTO.

Apenas para que não se tenha a presente decisão por omissa, cumpre referir que a matéria contida nas disposições legais e constitucionais invocadas foi devidamente apreciada na elaboração deste julgado.

Nesse sentido, a Orientação Jurisprudencial nº 118 da SDI-1 do TST: PREQUESTIONAMENTO. TESE EXPLÍCITA. INTELIGÊNCIA DA SÚMULA Nº 297. Havendo tese explícita sobre a matéria, na decisão recorrida, desnecessário contenha nela referência expressa do dispositivo legal para ter-se como prequestionado este.

Assinatura

MARIA MADALENA TELESCA

Relator

VOTOS

PARTICIPARAM DO JULGAMENTO:

DESEMBARGADORA MARIA MADALENA TELESCA (RELATORA)

DESEMBARGADOR GILBERTO SOUZA DOS SANTOS

DESEMBARGADOR RICARDO CARVALHO FRAGA

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