Da Inconstitucionalidade da Penhora On-line - Amanda Galvão Ferreira Tabosa
Como citar este artigo: TABOSA, Amanda Galvão Ferreira. Da Inconstitucionalidade da Penhora On-line. Disponível em http://www.lfg.com.br. 05 junho. 2009.
1. INTRODUÇÃO
O Congresso Nacional decretou e o Presidente da República sancionou, em 6 de dezembro de 2006, a Lei n.º 11.382 que alterou substancialmente o processo de execução brasileiro.
Concedeu ao judiciário o direito de utilizar um instrumento novo, conhecido como "Penhora on-line ", que lhe possibilita garantir a execução judicial, promovida pelos credores, por intermédio de bloqueio dos valores existentes em contas bancárias de titularidade do devedor.
2. DESENVOLVIMENTO
Em 6 de dezembro de 2006, foi publicada a Lei n.º 11.382 que "altera dispositivos da Lei no 5.869 , de 11 de janeiro de 1973 - Código de Processo Civil , relativos ao processo de execução e a outros assuntos".
Uma das principais alterações é a que cria a modalidade de penhora por meio eletrônico, mais conhecida como penhora on-line .
A referida lei disponibilizou ao magistrado a oportunidade de promover a penhora, em garantia à execução, de "dinheiro, em espécie ou em depósito ou aplicação em instituição financeira ". Acrescentou, ainda, que essa penhora deve ser realizada por meio eletrônico, provocando, conseqüentemente, a intitulação de penhora on-line .
A alteração promovida pela lei que alterou os ritos do processo de execução e criou a modalidade de penhora on-line foi a seguinte:
"Art. 655 - A. Para possibilitar a penhora de dinheiro em depósito ou aplicação financeira, o juiz, a requerimento do exeqüente, requisitará à autoridade supervisora do sistema bancário, preferencialmente por meio eletrônico, informações sobre a existência de ativos em nome do executado, podendo no mesmo ato determinar sua indisponibilidade, até o valor indicado na execução. § 1º As informações limitar-se-ão à existência ou não de depósito ou aplicação até o valor indicado na execução. § 2º Compete ao executado comprovar que as quantias depositadas em conta corrente referem-se à hipótese do inciso IV do caput do art. 649 desta Lei ou que estão revestidas de outra forma de impenhorabilidade. § 3º Na penhora de percentual do faturamento da empresa executada, será nomeado depositário, com a atribuição de submeter à aprovação judicial a forma de efetivação da constrição, bem como de prestar contas mensalmente, entregando ao exeqüente as quantias recebidas, a fim de serem imputadas no pagamento da dívida ".
O legislador pretendeu facilitar o trabalho dos magistrados concedendo-lhes um meio mais eficaz à consecução do objeto de um processo de execução. Entendeu que estaria colocando nas mãos do juízo de execuções uma garantia maior de êxito em sua atuação.
2.1. DA INICIATIVA E DO PEDIDO
A iniciativa partirá sempre da expressão de vontade do autor da execução no ato da redação e apresentação da petição inicial. Este requererá ao Juiz da Vara de Execuções a penhora de valores constantes de depósitos bancários ou aplicações financeiras.
Ou seja, o juiz determinará, por decisão fundamentada e por intermédio de autoridade competente, que, com auxílio de um sistema bancário eletrônico, sejam concedidas informações sobre a existência de ativos financeiros em nome do executado.
No mesmo ato decisório, o juiz tem a competência de determinar a imediata indisponibilidade desses ativos em montante até o valor da causa da Ação de Execução.
Ressaltamos que, de acordo com o texto do parágrafo 1º, as informações que a autoridade deverá fornecer, por força da decisão judicial, deverão limitar-se exclusivamente sobre a existência ou não de depósito ou aplicação até o valor indicado na execução e nada mais.
2.2. DA AUTORIDADE COMPETENTE
Há, nesse caso, a discriminação de uma autoridade competente à acessar as informações constantes do sistema bancário. Isso porque esse sistema, conhecido como "BACEN JUD", exige senha para o seu acesso, ou seja, não é acessível para qualquer cidadão, só uma pessoa anteriormente credenciada terá acesso e poderá efetivar o bloqueio de ativos financeiros.
Isso acontece porque o "BACEN JUD" é um meio eletrônico altamente sigiloso e com restrições de segurança. Nem mesmo os serventuários da justiça e o magistrado têm acesso às informações constantes desse sistema.
Somente um número restrito de funcionários do Banco Central é credenciado para acessar esse sistema bancário.
2.3. DO PARÁGRAFO 2º, DO ART. 655-A
Após a efetivação do bloqueio de dinheiro em depósito ou aplicação financeira, cabe ao executado comprovar, por intermédio de um advogado e com a apresentação de documentos que fundamentem sua alegação, que as quantias depositadas em conta corrente referem-se à hipótese do inciso IV , caput do art. 649 , do Código de Processo Civil :
"Art. 649. São absolutamente impenhoráveis:
(...)
IV - os vencimentos, subsídios, soldos, salários, remunerações, proventos de aposentadoria, pensões, pecúlios e montepios; as quantias recebidas por liberalidade de terceiro e destinadas ao sustento do devedor e sua família, os ganhos de trabalhador autônomo e os honorários de profissional liberal, observado o disposto no § 3o deste artigo ".
Logo, o que primeiro ocorrerá será o bloqueio dos valores constantes de depósito bancário do executado para depois ser-lhe concedido o direito de defesa dos valores penhorados.
3. DA SITUAÇÃO - PROBLEMA
Os problemas desse tipo de procedimento são os excessos na execução, como: a atuação arbitrária do magistrado; o constrangimento ilegal do executado; irrazoabilidade na sua aplicação; extremado desvio dos limites impostos pela norma legal; deve ser considerado um ato ilícito, já que se converte em um meio de coerção ilegal e desmedida, a teor do art. 187 CC .
Em outra dimensão, devemos tratar sobre o bloqueio das contas de uma empresa executada provoca inúmeros prejuízos. O primeiro deles é a impossibilidade de movimentação de seu capital de giro e bloqueia também o seu faturamento. Isso inviabiliza o pagamento de folha salarial e o investimento na produção, o que, por conseguinte, diminui a sua oferta de empregos e provoca prejuízos à economia nacional.
3.1. DOS DIREITOS DO EXECUTADO
Antes mesmo de conceder o direito ao executado de nomear bens à penhora, o magistrado já determina pela indisponibilidade dos valores depositados em conta, bloqueando a sua renda e tornando inviável o seu sustento e o de sua família.
Haverá, então, a necessidade do executado impetrar Mandado de Segurança, para suspender os efeitos da decisão proferida pela autoridade coatora, com fundamento no disposto no art. 1º , da Lei n.º 1.533 , de 31 de dezembro de 1951:
"Art. 1º - Conceder-se-á mandado de segurança para proteger direito líquido e certo, não amparado por habeas-corpus, sempre que, ilegalmente ou com abuso do poder, alguém sofrer violação ou houver justo receio de sofrê-la por parte de autoridade, seja de que categoria for e sejam quais forem as funções que exerça ".
Ocorre que o bloqueio dos valores constantes de conta bancária mantém-se até a sentença da Ação de Mandado de Segurança. Aqueles valores bloqueados até o momento da concessão da segurança continuarão retidos em face da decisão de penhora, o que se suspende são os bloqueios futuros de novos valores debitados em conta.
Nesse caso, devemos afirmar que está sendo violado o princípio da ampla defesa e do devido processo legal, conforme o inciso LV , do art. 5º , da Constituição Federal brasileira. Afirmamos isso porque é concedido legalmente ao executado o direito de apresentar, em 48 (quarenta e oito) horas, bens suficientes à penhora, conforme disposição do art. 652 , do Código de Processo Civil .
Mas o que ocorre é que, antes mesmo de exercer esse direito, o magistrado já determina pelo bloqueio do dinheiro constante de sua conta bancária. Até mesmo quando são apresentados bens à penhora, o magistrado dá preferência à penhora desses valores, munindo-se da alegação de que é respeitada a ordem de bens discriminada no art. 655 , do CPC .
3.2. DA INCONSTITUCIONALIDADE
Já em outra esfera doutrinária, podemos ressaltar que essa modalidade de penhora viola princípios constitucionais. Dentre eles, alertamos para o art. 5º , incisos LIV e LV , da Constituição Federal :
"Art. 5º Todos são iguais perante a lei, sem distinção de qualquer natureza, garantindo-se aos brasileiros e aos estrangeiros residentes no País a inviolabilidade do direito à vida, à liberdade, à igualdade, à segurança e à propriedade, nos termos seguintes:
(...) LIV - ninguém será privado da liberdade ou de seus bens sem o devido processo legal;
LV - aos litigantes, em processo judicial ou administrativo, e aos acusados em geral são assegurados o contraditório e ampla defesa, com os meios e recursos a ela inerentes ".
Há, ainda, outro dispositivo constitucional violado, qual seja aquele que visa assegurar a existência digna de todo cidadão:
"Art. 170. A ordem econômica, fundada na valorização do trabalho humano e na livre iniciativa, tem por fim assegurar a todos existência digna, conforme os ditames da justiça social (...) ".
4. CONCLUSÃO
O Congresso Nacional decretou e o Presidente da República sancionou, em 6 de dezembro de 2006, a Lei n.º 11.382 que alterou substancialmente o processo de execução brasileiro. Concedeu ao judiciário o instrumento conhecido como "Penhora on-line ", que lhe possibilita garantir a execução judicial promovida pelos credores.
Dessa forma, o magistrado, "a requerimento do exeqüente, requisitará à autoridade supervisora do sistema bancário, preferencialmente por meio eletrônico, informações sobre a existência de ativos em nome do executado, podendo no mesmo ato determinar sua indisponibilidade".
Ocorre que tal instrumento vem sendo utilizado de maneira indiscriminada e com excessos. Arbitrariamente, os juízes oficiam à autoridade competente determinando o bloqueio dos valores constantes de conta e depósitos em nome dos executados, antes mesmo de garantir-lhes o direito de indicar bens à penhora. Com esse procedimento, o executado não é ouvido e o seu direito de apresentação de bens suficientes à penhora é aviltado.
Ou seja, o devido processo legal é desrespeitado aleatoriamente, caracterizando iminente violação ao direito social constante do artigo 5º , inciso LIV , da Constituição Federal . Ademais, há ainda a violação do disposto no inciso LV do referido artigo, por deixar de conceder às partes integrantes da lide o direito ao contraditório e à ampla defesa.
Portanto, ante os argumentos expostos acima, podemos concluir que há a possibilidade de apresentação, perante a Corte Suprema brasileira, de Ação Direta de Inconstitucionalidade Ação Direta de Inconstitucionalidade em face da Lei n.º 11.382 , de 6 de dezembro de 2006, que acrescentou os arts. 655 e 655-A ao Código de Processo Civil , com fulcro art. 102 , inciso I , alínea a , da Constituição Federal , por ferir diretamente os princípios constitucionais constantes do art. 5º , incisos LIV e LV , da Carta Magna brasileira.
Bibliografia:
- Normas abordadas in http://www.planalto.gov.br/legislacao;
- VIANA, Marcelo Soares. "O novo art. 655-A do CPC e a penhora on-line", Artigo Científico in http://www.tex.pro.br/wwwroot/00/070314onovoartigo655A.php;
- GÓMES, Lineu Miguel. "Penhora on line", Artigo Científico in http://jus2.uol.com.br/doutrina/texto.asp?id=4861;
- Autor desconhecido. "Penhora on-line bloqueia capital de giro e faturamento", Reportagem in http://www.ciesp.org.br/hotsite_dejur/pdf/cons_fev_06/Pagina3.pdf
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