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Pedido de demissão de gestante não afasta direito à estabilidade provisória
"A mãe dá a vida por seu filho, como não renunciaria ao emprego?", indagou o Desembargador, David Alves de Mello Junior, ao relatar o processo de uma empregada grávida que apresentou pedido de demissão durante o período de agravamento da pandemia de Covid-19, em Manaus/AM. Em julgamento colegiado, a 1ª Turma do Tribunal Regional do Trabalho da 11ª Região - Amazonas e Roraima (TRT-11) deu provimento ao Recurso Ordinário da trabalhadora, reformando a sentença proferida pelo juízo a quo.
Em 1º grau, a 3ª Vara do Trabalho de Manaus/AM havia julgado improcedentes os pedidos da Reclamante, por compreender que a empregada renunciou à estabilidade provisória ao pedir o seu desligamento da empresa. Entretanto, como dito, em 2º grau, a turma julgadora firmou outro entendimento e concluiu pelo reconhecimento do direito à indenização consubstanciada na estabilidade provisória da gestante.
A Reclamante exerceu a função de operadora de caixa de uma rede de lojas que atua no comércio de marcenaria e ferragens. Em dezembro de 2020, descobriu que estava grávida e, no mês seguinte, soube que a gravidez era de risco. Relatou que o colapso do sistema de saúde em Manaus/AM, em razão do aumento alarmante do números de casos com internações e óbitos por Covid-19 no início de 2021, bem como a falta de transporte público adequado, a fizeram temer por sua própria vida e, principalmente, pela vida do bebê que esperava.
Assim, em conformidade com o narrado na petição inicial, observa-se que, primeiramente, a trabalhadora apresentou um atestado médico e solicitou transferência para a filial mais próxima de sua casa. Porém, o pedido foi negado pelo empregador. Por consequência, a Autora alegou que não teve outro caminho a seguir, a não ser apresentar um pedido de demissão.
A empresa, por sua vez, sustentou em defesa que a Reclamante não comprovou a gravidez de risco e que seu pedido de demissão ocorreu por livre e espontânea vontade, sem qualquer vício de consentimento, caracterizando renúncia ao direito à estabilidade provisória. Complementando ainda, que chegou a assegurar à Reclamante o trabalho em atividades internas do financeiro, em posto de trabalho mais tranquilo e seguro.
Isto posto, no tocante aos dispositivos legais relacionados à estabilidade provisória da gestante, cumpre mencionar que existe previsão no artigo 10, inciso II, alínea b, do Ato das Disposições Constitucionais Transitórias da Constituição Federal, vedando a dispensa sem justa causa da empregada gestante, desde a confirmação da gravidez até cinco meses após o parto.
Art. 10.
II - fica vedada a dispensa arbitrária ou sem justa causa:
a) - do empregado eleito para cargo de direção de comissões internas de prevenção de acidentes, desde o registro de sua candidatura até um ano após o final de seu mandato;
b) - da empregada gestante, desde a confirmação da gravidez até cinco meses após o parto.
E, no mesmo sentido, o artigo 391-A da CLT estabelece que a confirmação do estado de gravidez advindo no curso do contrato de trabalho, ainda que durante o prazo do aviso prévio trabalhado ou indenizado, garante à empregada gestante a estabilidade provisória prevista no referido dispositivo acima transcrito.
Art. 391-A. A confirmação do estado de gravidez advindo no curso do contrato de trabalho, ainda que durante o prazo do aviso prévio trabalhado ou indenizado, garante à empregada gestante a estabilidade provisória prevista na alínea b do inciso II do art. 10 do Ato das Disposições Constitucionais inciso II do art. 10 do Ato das Disposições Constitucionais Transitórias.
Dessa forma, ao analisar o caso, o relator do processo ressaltou que a análise da controvérsia, na realidade, tem como ponto crucial a validade (ou não) do pedido de demissão da Reclamante, sendo tal pedido anulável nas hipóteses em que se constatar erro, dolo, coação, estado de perigo, lesão ou fraude contra credores.
Sendo de conhecimento da empresa o desejo da empregada em trabalhar mais perto de sua casa e estando grávida, independentemente de sua gravidez ser de risco ou não, configurou-se o estado de perigo. A mãe, que dá a vida por seu filho, como não renunciaria seu emprego. Esta demanda judicial demonstra a verdade desta afirmativa. O estado de perigo como modalidade de defeito do negócio jurídico, se configura quando alguém assume obrigação muito onerosa, acima da normalidade, para salvação a si mesmo ou de pessoa de sua família de dano, sendo do conhecimento da outra pessoa.
(...)
Patente e caracterizado o vício do negócio jurídico. Anula-se o pedido de demissão formulado pela trabalhadora, para deferir-lhe: o pagamento da indenização substitutiva correspondente aos salários do período de estabilidade, com reflexos em aviso prévio, férias + 1/3, 13º salário e FGTS (+ 40%); mais os salários meses de janeiro e fevereiro/2021; justiça gratuita já reconhecida em 1º Grau.
Portanto, o colegiado concluiu que restou devidamente comprovado o estado de perigo previsto no artigo 171 do Código Civil e anulou o pedido de demissão da empregada, condenando a empresa empregadora ao pagamento de indenização substitutiva referente ao período de estabilidade provisória, com reflexos em aviso prévio, férias, 13º salário e FGTS. Participaram do julgamento os Desembargadores David Alves de Melo Junior, Solange Maria Santiago Morais e Francisca Rita Alencar Albuquerque.
(Processo nº 0000360-60.2021.5.11.0003)
Fonte: https://www.facebook.com/yagodiasdeoliveiraadvocacia/photos/a.722790727924005/1840120432857690/
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