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6 de Maio de 2024

Realidade! Faculdades não preparam estudantes de Direito para lidar com dificuldades

Publicado por ADVOCACIA DIGITAL
há 5 anos

Os estudantes de Direito têm diante de si uma perspectiva de vida bem atraente. Nenhum curso abre tantas possibilidades de escolha e de realização pessoal.

Todavia, boa parte dos que cursam Direito, principalmente os jovens das melhores faculdades das capitais, tiveram uma educação altamente protegida. Com boas intenções, sem dúvida, os pais buscam dar aos filhos as melhores escolas e atividades paralelas, que lhes preenchem todo o tempo. Nas classes média e alta é comum a criança conhecer a Disneyworld (em Orlando, EUA), sem ter ido uma só vez ao centro da própria cidade.

Protegido de todas as formas, vivendo em ambientes restritos, o jovem ingressa na Faculdade de Direito. E daí aprende que todos os direitos possíveis estão ao seu dispor. Afinal, a Constituição assegura tudo a todos, educação, moradia, saúde, lazer, meio ambiente saudável, só falta constar a felicidade.

Tudo isto, dito e repetido, vai se tornando uma verdade absoluta e incontestável. E a formação vai direcionando a mente dele (ou dela, hoje a maioria nas classes) para um mundo que seria muito bom, mas que simplesmente não existe. A academia preocupa-se mais com doutrina, às vezes estrangeira e sem conexão com o Brasil. Não prepara os estudantes para a realidade e daí vem o choque. Vale lembrar a música de Belchior, “Apenas um rapaz latino americano”, quando diz “a vida realmente é diferente, quer dizer, ao vivo é muito pior”.

Para ficar em um só exemplo, cita-se o Direito Penal. É comum o aluno de Direito dizer que ele é lindo na teoria, mas que na prática é diferente. Com isto os interesses se voltam para temas mais amenos. O TCC certamente dirá que todos têm direito a tudo, só não dirá como isto ocorrerá, uma vez que o Estado não tem como atender todas as reivindicações feitas pela sociedade.

Ao ingressar no mundo real, como estagiária, a jovem estudante poderá ter um choque ao verificar que o seu chefe na repartição, aquele profissional fantástico e que tanto admira, dedica-lhe um especial interesse que vai bem além das teses do Direito Constitucional, mesmo sendo casado e tendo filhos da sua idade. Esta decepção pessoal poderia ser atenuada, se lhe fosse explicado que os seres humanos são imperfeitos e situações como esta existem e precisam ser bem administradas. Por exemplo, perguntando como vai a esposa do pretenso conquistador.

Ao entrar no mercado de trabalho, o jovem profissional, já munido da carteira da OAB, resolve abrir um escritório de advocacia. Só não sabia que se gasta muito com isto e que o dinheiro só vem depois de ter seu trabalho reconhecido, dois ou três anos mais tarde. Não imaginava que poderia brigar com seu sócio, o melhor amigo na faculdade, porque ele seguidamente passa o fim de semana fora, saindo na quinta à tarde e voltando segunda às 11 horas da manhã. Nem de longe supunha que um cliente pelo qual lutou e conseguiu ganho de causa poderia ser ingrato e não lhe pagar os honorários devidos.

Nas carreiras públicas, após anos de estudo e sacrifício, imaginava que não teria maiores dificuldades. Não é bem assim. Ao prestar concurso para a polícia, via-se participando de grandes operações, mas a realidade lança-o para plantões por onde passam todas as misérias humanas. Sem estrutura de trabalho, vê-se impossibilitado de resolver tantos problemas e ainda tem que ouvir o cunhado desempregado dizer que a polícia é arbitrária e que só prende os pequenos.

Na magistratura, imaginou-se proferindo grandes decisões. No entanto, frustra-se ao constatar que não tem solução alguma para uma criança vítima de atos de libidinagem por parte do padrasto, cuja mãe aceita a situação porque não quer perder o seu homem. Sentirá dificuldades para decidir um pedido de tratamento no exterior para uma criança, que importa em 20 mil dólares e, que se vier a ser deferido, resultará na impossibilidade do SUS tratar 2 mil pessoas com problemas de menor gravidade.

Mas então, será tudo assim difícil?

Não, tudo isto pode ser enfrentado. Apenas é preciso estar preparado e os professores de Direito têm um papel importante nisto, na medida em que mostrem a realidade e ensinem como enfrentar os problemas. Não é diferente na medicina, na engenharia ou no mundo artístico. Assim é a vida e é preciso estar preparado paras dificuldades.

Neste quadro, a primeira coisa que deve saber o estudante de Direito é que a realização profissional está ao seu alcance e que, na caminhada, surgirão obstáculos, mas que podem ser superados.

A segunda informação importante é que saibam que muitos profissionais que hoje brilham nas carreiras públicas, na advocacia ou no magistério superior, passaram pelo mesmo processo. Tiveram as mesmas dúvidas e dificuldades, conseguiram superá-las com grande esforço pessoal.

A terceira referência é que dificuldades ou obstáculos, profissionais ou pessoais, podem ser uma ótima oportunidade de readequar ideias e planos. Imagine-se o jovem que, depois de cinco anos de estudos, chega ao oral do concurso de promotor de Justiça, mas acaba sendo reprovado por dois décimos. Qual a reação?

Ele poderia “virar a mesa”, dizer a todos que o concurso é fraudulento, que a banca era preconceituosa, pois não gostou de seu modo de vestir-se e coisas semelhantes. Abdica de seu sonho, dedica-se a uma atividade fora do Direito e, 30 anos depois, ainda está se queixando de que foi vítima de uma injustiça.

A outra posição seria avaliar onde falhou, qual foi o seu erro. Estaria fraco em alguma matéria? Não soube expor com clareza? A partir daí, decidir se fará novamente o mesmo concurso, ou se prestará em outro estado ou mesmo para outra carreira.

Obviamente, a segunda postura é a acertada. Avaliar a própria conduta, admitir e corrigir erros é um exercício de humildade que só faz crescer a pessoa. Por outro lado, é tolice pensar que a felicidade está exclusivamente em uma única carreira. Atualmente há uma grande quantidade de profissões jurídicas que permitem a plena realização pessoal e profissional.

Outro exemplo. Ter problemas com um sócio no escritório de advocacia tira o sabor da vida, com certeza. Mas a melhor solução não será a discussão judicial, persistindo em situação de conflito por três, seis ou dez anos. O melhor caminho é a conciliação e, para isto, ninguém melhor que um antigo professor da Faculdade de Direito, que seja respeitado por ambos e que possa aplainar as divergências.

Finalmente, é preciso colocar-se diante dos problemas com maturidade. Alguns podem ser de impossível solução. Vão além dos limites de ação dos envolvidos. Por exemplo, ciúme e perseguição por parte de alguém que tem poderes para causar-lhe o mal. Para estes casos, é preciso lembrar que isto existe desde que o mundo é mundo e que a melhor forma de atenuar é contornar o problema. Não comentar o assunto com ninguém, aparentar não ter percebido, seguir a vida simplesmente. O perseguidor certamente direcionará seus maus sentimentos para outro que se atravesse no seu caminho.

Em suma, os estudantes e também os profissionais mais jovens precisam ter consciência de que o universo jurídico tem realidade própria, bem diferente do mundo de ficção que os bancos da academia insistem em exibir. No entanto, enfrentando as dificuldades com maturidade e perseverança, é possível, sim, tornar os sonhos realidade. E nenhum curso como o Direito permite tantos sonhos e tanta realização profissional.

PS: Todos os exemplos dados originam-se de casos reais dos quais tomei conhecimento em minha vida.

(Por Vladimir Passos de Freitas / Fonte: Conjur)

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20 Comentários

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Muito bom o texto. Mas, analisando melhor a questão, temos que dar um desconto às faculdades dessa acusação de que não preparam o estudantes de Direito (na verdade acho que todas as áreas, mas esse é um site jurpidico), na verdade acho que essa não é função da fculdade, ou pelo menos não só dela. O texto mesmo já faz essa ressalva, afinal, o material que as faculdades recebem para trabalhar é bem mal trabalhado já desde a infância. Se vem do ensino público, a gente sabe bem como chegam na faculdade. As famílias então, ´s um problema. Mesmo quando tem uma famíilia, mais ou menos estruturada, o jeito que as coisas são conduzidas hoje em dia não colabora para a formação de boas pessoas. Eu me lembro que eu tinha um dos professores que, depois de cada prova, ele colocava na lousa algumas correções básicas de erros de português que ele achava nas provas, coisa básica mesmo. A faculdade não é pra isso. Quando são de classe média, o texto já colocou muito bem. Para mim, que sou policial, eu sinto isso com Delegados, Juízes, Promotores, Defensores e Advogados, ou seja, pessoas que foram criadas desde bebês em um bolha e não conhecem nada da vida real das pessoas que lutam para sobreviver. Quando assumem os cargos, é um decepção total para eles e um inferno trabalhar com eles, que sabem tudo de leis, teorias e jurisprudências e não sabem que a maioria disso não funciona cá embaixo da pirâmide. É horrível trabalhar com esses semi-deuses.

Enfim, o problema não é da faculdade, é da sociedade, das famílias. Nós estamos vivendo num tempo de tamanha deterioração social que eu não sei como vai ser nos próximos vinte anos, quando essa molecada de hoje é que vai estar conduzindo toda a nação. continuar lendo

@nilorodarte concordo com o senhor. O desconhecimento ou negação de uma realidade, transforma o ser humano em algo muito triste. Essa semana realizei uma audiência com uma juíza "semi-deusa" Ainda, ela gritou, berrou , que possuía 18 anos de profissão.
O ser humano possui quase 2 décadas de magistratura é teve uma atitude lamentável, foi um dia triste. continuar lendo

Perfeita ponderação. É fato, as atividades jurídicas em geral, inclusive a advocacia, a cada dia se desmoralizam vertiginosamente. Por um lado, advogados analfabetos como eu, verdadeiros papagaios jurídicos: não leem, não estudam, não se informam em fontes fidedignas de comunicação (alguns inclusive se vangloriam de que detestam ler), mas ostentam uma "carteirinha da Ordem" que lhes conferem o direito de serem chamados de "dotô". Noutro viés, "promotores de justiça" que não entendem nada de justiça exatamente pelos motivos elencados pelo ilustre articulista ("Nas classes média e alta é comum a criança conhecer a Disneyworld (em Orlando, EUA), sem ter ido uma só vez ao centro da própria cidade"), afinal, são criados sem trabalhar, aos 16 anos vão à Europa, aos 17 aos EUA, aos 18 ganham um carro de 200 mil, e aos 25 viram justiceiros, sob o amparo de leis arcaicas voltadas para oprimir o miserável, e proteger o poderoso. Noutra ponta estão parasitas mais renumerados, justiceiros que recebem mensalmente salários nababescos para justificar o mérito de serem "bem nascidos", cujos pais passaram a vida explorando a miséria alheia, e com o lucro comprando o tempo livre deles para passarem nos melhores concursos, uma vez aprovados, viram políticos justiceiros, parciais, ao sentenciarem analisam a cor do acusado, a origem dele, o sobrenome e o local onde mora, dependendo do perfil aferido, o acusado estará condenado pra o resto da sua vida. continuar lendo

Esse texto merece ser lido por todos os estudantes de Direito! continuar lendo

Concordo com o artigo.

Praticamente, o ensino prático da advocacia é bem menosprezado, dando destaque ao enorme bojo teórico/doutrinário das matérias lecionadas, no qual, é de extrema importância e utilidade, porém, o modos operandi que se observa na vida prática torna o caminho bem dificultoso.

Eu que o diga... continuar lendo

Adorei o comentário. continuar lendo