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Eficácia erga omnes X Efeito vinculante: há diferença?
Breves apontamentos.
Por vezes, alunos questionam a diferença entre os dois institutos constantes do título, não somente porque inexiste qualquer preceito legislativo explícito acerca da aludida distinção, mas também porque a doutrina nem sempre consegue ser exata acerca desse ponto. O único dispositivo constitucional que aborda concomitantemente ambos os institutos é o § 2º do art. 102. A matéria, entretanto, não está circunscrita à jurisdição constitucional do Supremo Tribunal Federal, mas se insere, mormente, na disciplina processual.
Para começar, é válido estabelecer que a eficácia erga omnes é uma característica geral das normas jurídicas: segundo a qual se estabelece que qualquer pessoa ou ente que se encontre enquadrado na conjectura de incidência deverá observar aquele regramento. A lei tem eficácia erga omnes, bem como “a sentença entre A e B vale com respeito a todos enquanto é sentença entre A e B” (SILVA, Ovídio A. Baptista da. Sentença e coisa julgada: ensaios e pareceres. 4. Ed. Rev. E ampl. Rio de Janeiro: Forense, 2006. P. 72). Tanto a lei quanto a sentença, entretanto, poderão ter sua incidência afastada de dado caso concreto quando, por exemplo, forem inconstitucionais ou, em decorrência de conflito de normas. O efeito vinculante, por outro lado, é o atributo de dada norma jurídica que a torna de observância obrigatória, cogente. Uma súmula vinculante, v. G., jamais terá sua incidência afastada por conflitar com uma lei ordinária, nem poderá deixar de ser aplicada quando se estiver diante de uma situação fática que demande sua imposição.
A eficácia erga omnes e o efeito vinculante podem ser observados de maneira dissociada, eis que constituem institutos independentes. Assim, enquanto as súmulas persuasivas podem deixar de ser aplicadas pelos magistrados a elas subordinados, simplesmente porque estes adotam interpretação distinta do preceito jurídico no qual se fundou o enunciado, as decisões vinculativas não comportam tal possibilidade. A grande diferença, na prática processual, entre a inobservância de uma norma com efeito erga omnes e outra com eficácia vinculante é que: no caso da primeira, o prejudicado terá de percorrer o caminho ordinariamente prescrito pelo Direito Processual para a reforma; todavia, no segundo caso, há um atalho processual para fustigar a desobediência a uma norma dotada de efeito vinculante, a reclamação.
A reclamação é o remédio jurídico que assegura especificamente o efeito vinculante e é exatamente o atalho processual — já que observa regramento processual paralelo ao da Via Crúcis ordinária — que caracteriza a cogência das decisões vinculativas. Com efeito, e para esclarecer esse particular, se o juiz de primeira instância, na sentença, deixar de observar dado preceito constitucional — permitindo, por exemplo, o usucapião de terras públicas (em violação direta ao § 3º do art. 183 e ao parágrafo único do art. 191 da CF)— caberá ao prejudicado: interpor apelação e, se for o caso, seguir recorrendo pelas instâncias até o Supremo Tribunal Federal, o que pode envolver, excetuados os embargos de declaração, pelo menos cinco outros recursos na segunda instância (agravo regimental, recurso extraordinário, recurso especial, e agravos contra a inadmissão dos dois outros), fora as impugnações eventualmente cabíveis perante o STJ. Por outro lado, uma vez desobedecido entendimento consubstanciado em enunciado de súmula vinculante, o prejudicado poderá ajuizar reclamação diretamente no STF (desde que também interponha apelação, impedindo o trânsito em julgado da decisão reclamada, conforme a súmula 734/STF), abreviando, sobremaneira, o trâmite processual.
A existência da reclamação e o seu cabimento para salvaguardar a autoridade das decisões é o fator processualmente palpável de maior distinção entre as normas dotadas de efeito vinculante e aquelas permeadas de eficácia erga omnes. Vale lembrar, entretanto, que este texto pretende apenas conferir uma noção geral sobre a distinção entre os aludidos institutos: há muito mais detalhamentos que podem ser observados, principalmente no que se refere às decisões vinculativas de segunda instância.
6 Comentários
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Bastante esclarecedor. Deixa ver se eu entendi direito: Se a matéria afrontar a CF, eu, cidadã comum, terei que enfrentar a via crucis de um processo da vara até o RE. Todavia, se houver súmula vinculante a respeito, eu posso reclamar diretamente ao STF sem passar antes por mais ninguém? continuar lendo
Prezada Rosimary, sim. É basicamente isso! Se a sentença violar somente o texto expresso da Constituição, não há qualquer atalho processual: você terá de interpor todos os recursos cabíveis até o STF (caso a decisão não seja reformada por outro órgão judicial). No entanto, se a sentença contrariar súmula vinculante ou decisão dotada de efeito vinculante (como aquelas proferidas em ADI, ADC e ADPF), você poderá ajuizar reclamação diretamente no STF (tomando o cuidado de não deixar a sentença transitar em julgado, o que impediria o conhecimento da sua reclamação, conforme o enunciado 734/STF).
Obrigado pela leitura. Abraço! continuar lendo
Olá, Rosimary!
Infelizmente, o STF possui entendimento de que a reclamação só pode ser utilizada quando se esgotar as vias judiciais ordinárias. Ou seja, mesmo que haja súmula vinculante, você deve interpor todos os recursos disponíveis e eles serem negados para, só então, poder propor reclamação ao STF.
(...) O remédio constitucional da reclamação não pode ser utilizado como um (inadmissível) atalho processual destinado a permitir, por razões de caráter meramente pragmático, a submissão imediata do litígio ao exame direto do Supremo Tribunal Federal. Precedentes. - A reclamação, constitucionalmente vocacionada a cumprir a dupla função a que alude o art. 102, I, ‘l’, da Carta Política (RTJ 134/1033), não se qualifica como sucedâneo recursal nem configura instrumento viabilizador do reexame do conteúdo do ato reclamado, eis que tal finalidade revela-se estranha à destinação constitucional subjacente à instituição dessa medida processual. Precedentes. (...) (Rcl 4.381-AgR, Relator o Ministro Celso de Mello, Plenário, DJe 5.8.2011). continuar lendo
Muito bom , obrigado pelo ensinamento! continuar lendo
Não esclarece se o efeito erga omnes é restrito a decisões do STF ou se outras cortes podem aplica-lo continuar lendo
Eficácia erga omnes - atinge a todos dentro do ordenamento jurídico.
Eficácia inter partes - atinge só as pessoas do processo judicial.
Súmulas - qualquer tribunal pode.
Súmula vinculante - Só o STF pode. continuar lendo