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28 de Maio de 2024

Não há possibilidade de assistência em inquérito policial

Publicado por Rogério Tadeu Romano
há 7 meses

NÃO HÁ POSSIBILIDADE DE ASSISTÊNCIA EM INQUÉRITO POLICIAL

Rogério Tadeu Romano

Segundo nos informa o portal Poder 360, em 30.10.23, a PGR (Procuradoria Geral da República) se manifestou contrária à inclusão do ministro do STF (Supremo Tribunal Federal) Alexandre de Moraes como assistente de acusação no caso da suposta hostilização sofrida por ele em um aeroporto de Roma, na Itália, em 14 de julho. No recurso –assinado pela procuradora-geral da República interina Elizeta Ramos e pela vice-procuradora-geral da República Ana Borges Santos–, o órgão afirma que decisão de Dias Toffoli, relator do caso, dá “privilégio incompatível” a Moraes.

A manifestação se deu nos autos do INQUÉRITO Nº 4.940/DF.

Em nova decisão, desta feita exarada em 23 de outubro de 2023, o d. Ministro Relator deferiu pedido formulado pelo Ministro Alexandre de Moraes e por Viviane Barci de Moraes, Gabriela Barci de Moraes, Alexandre Barci de Moraes e Giuliana Barci de Moraes (Petição STF nº 100.408/202320), potenciais vítimas dos supostos ilícitos apurados, admitindo-os no presente inquérito, “na qualidade de assistentes, nos termos do art. 268, CPP”.

Segundo a dicção do artigo 268 do Código de Processo Penal, somente se admite no curso da ação penal pública a intervenção da vítima ou de seu representante legal, ou, na sua ausência, do cônjuge supérstite, ascendente, descendente ou irmão. Reza o aludido preceito legal: Art. 268. Em todos os termos da ação pública, poderá intervir, como assistente do Ministério Público, o ofendido ou seu representante legal, ou, na falta, qualquer das pessoas mencionadas no art. 31.

Correto o entendimento do Parquet.

A propósito:

“Na fase de inquérito, não há autorização legal para a assistência e o alargamento do plexo de legitimados para as ações persecutórias, até porque se trata de procedimento inquisitório, por excelência, voltado única e exclusivamente a subsidiar a formação da opinio delicti pelo Ministério Público, titular da ação penal pública. A esse respeito, sedimentou-se a jurisprudência do Supremo Tribunal Federal: O inquérito policial qualifica-se como procedimento administrativo, de caráter pré-processual, ordinariamente vocacionado a subsidiar, nos casos de infrações perseguíveis mediante ação penal de iniciativa pública, a atuação persecutória do Ministério Público, que é o verdadeiro destinatário dos elementos que compõem a "informatio delicti". ( HC 90099, Rel. Min. Celso de Mello, 2ª Turma, julgado em 27/10/2009, DJe de 03/12/2009).

Como acentuou a PGR, ensinaram Douglas Fischer e Eugênio Pacelli (Comentários ao Código de Processo Penal e sua Jurisprudência. 13ª edição. São Paulo: Atlas, 2021, p. 462 ) sobre o destinatário dos elementos de informação obtidos durante o inquérito e a impossibilidade de seu uso exclusivo como único instrumento de formação da culpa, ipsi litteris: A fase de investigação, como se sabe, é destinada à formação do convencimento do órgão de acusação e não do magistrado. Na aludida fase, não há preocupação com o contraditório, até mesmo porque sequer se exerce a defesa do acusado. Não há ali, à evidência, ampla defesa. A partir de uma notitia criminis, avança-se para uma apuração sumária de seus elementos comprobatórios, sempre voltado para o convencimento do órgão responsável pelo juízo acusatório. Esse, o juízo acusatório, pode ser positivo, em que há o oferecimento de denúncia ou queixa, ou negativo, hipótese em que se requer o arquivamento da investigação, quaisquer que sejam seus fundamentos. Apenas o material produzido em Juízo é que, a rigor, constituiria prova, abrindo-se necessariamente o contraditório e à ampla defesa, com efetiva participação da defesa. Em princípio, portanto, apenas a prova se prestaria ao convencimento judicial, não cumprindo essa missão os chamados elementos informativos da fase investigatória.

O artigo 269 do Código de Processo Penal determina que, a partir do recebimento da denúncia e até o trânsito em julgado da decisão, poderá haver o ingresso do assistente, mas sem qualquer tipo de regressão no desenvolvimento regular da instrução.

Assim incabíveis o ingresso do assistente durante o inquérito policial e ainda na ação penal privada propriamente dita.

Por sua vez, não há cabimento, como se vê da leitura do artigo 270, na atuação do corréu como assistente.

Observa-se que o artigo 273 do Código de Processo Penal determina que do despacho que admitir ou não o assistente não caberá recurso. No entanto, já se admitiu o mandado de segurança (RT 577;3866, do despacho o despacho de indeferimento ou reclamação ou correição (RT 505:392).

De acordo com o disposto no artigo 271 do Código de Processo Penal, ¨ao assistente será permitido propor meios de prova, requerer as perguntas às testemunhas, aditar o libelo e os articulados, participar do debate oral e arrazoar os recursos interpostos pelo Ministério Público ou por ele próprio.¨ Digo isso, insistindo que em face da redação da Lei 11.689/2008 não se pode mais falar em libelo acusatório, não se podendo concluir pela existência de peça processual de aditamento pelo assistente do Parquet.

Em resumo: pode o assistente arrolar testemunhas (respeitado o número legal para a parte acusatória, podendo ser peticionado que o juiz ouça alguém como testemunha do juízo); direito de reperguntar; produzir alegações finais; manifestar-se sobre os recursos interpostos pelo Parquet; recorrer autonomamente.

Entendeu Júlio Fabbrini Mirabete (Processo Penal. 1991. Ed. Atlas, pág. 337) que a enumeração do artigo 271 do Código de Processo Penal é taxativa, não se podendo falar em recursos: em caso de sentença de pronúncia, absolvição sumária, do despacho que concede fiança, de decisão que concede desaforamento, da decisão em revisão criminal.

Ensinou ainda Mirabete (obra citada, pág. 331) que predomina o entendimento que, “no processo penal brasileiro, o assistente não é “parte civil, nem litisconsorte, mas sim parte contingente (adjunta ou adesiva), desnecessária e eventual, que tem como finalidade, em princípio, obter a condenação do acusado com fins à reparação civil. Mas como observa Marcelo Fortes Barbosa: “A assistência de acusação, nosso Direito Processual Penal não é um mero correlativo direito do direito à reparação do dano.”

Sua função é auxiliar, ajudar, assistir o Ministério Público a acusar e, secundariamente garantir seus interesses reflexos quanto à indenização civil dos danos causados pelo crime.

Tem o assistente o direito de propor provas, e, uma vez admitido no processo, deve o assistente, através de seu advogado, ser intimado de todos os atos que devam ser realizados no feito, como, por exemplo, a audiência de instrução.

Se deixar de comparecer aos atos processuais, sem justificação, não mais será intimado, uma vez que sua presença é dispensável.

A atuação do assistente será admissível nos seguintes casos:

a) Contra a sentença de impronúncia (recurso de apelação);

b) Contra a sentença proferida no âmbito do tribunal do júri, quando não for interposta apelação pelo Ministério Público no prazo legal.

Se isso não bastasse, à luz da Lei 12.403/2011, tem o assistente na fase processual, a legitimidade para requerer a prisão preventiva e ainda de recorrer das decisões concessivas de liberdade provisória, de medidas cautelares diversas da prisão (artigo 319 do CPP), das decisões que relaxem a prisão ou que defiram o habeas corpus.

Pode o assistente, nos processos de competência do tribunal do júri, requerer o desaforamento, quando, por interesse de ordem pública, havendo dúvida sobre a imparcialidade do júri, do que se lê do artigo 427 do Código de Processo Penal, na redação dada pela Lei 11.689/2008.

Da mesma forma pode o assistente arrolar testemunhas, desde que não ultrapassado o número máximo reservado á acusação.

No entanto, não pode o assistente aditar a denúncia. Isso é faculdade do Estado-Acusação e não de um terceiro que intervém no feito.

Mas, poderá, diante da inércia do Ministério Público, impugnar a sentença absolutória e extintiva da punibilidade (artigo 386, art. 397 combinado com o artigo 598, todos do Código de Processo Penal), bem como os de decisões de impronúncia (artigo 414 e 416 do Código de Processo Penal), na linha do artigo 271 do Código de Processo Penal.

Se houver recurso do Parquet, ao assistente caberá apenas oferecer as suas razões. Se não houver impugnação do Ministério Público, o assistente poderá fazê-lo com relação às decisões já mencionadas.

Assim poderá opor embargos de declaração, apelação e até recurso especial ou extraordinário e ainda recurso em sentido estrito, das decisões onde houver concessão de liberdade provisória (artigo 581, V, CPP).

A súmula 208 do Supremo Tribunal Federal, que impossibilitava o recurso do assistente, nos casos de concessão do habeas corpus, hoje está incompatível com a redação dada pela Lei 12.403/2011, que possibilitou a intervenção do assistente, nessas hipóteses.

Havendo recurso parcial da acusação, pode o assistente recorrer da parte irrecorrida, desde que absolutória a decisão, sumária (artigo 397, CPP) ou não (artigo 386, CPP).

O prazo para recurso do assistente é o mesmo reservado para o Ministério Público, quando ele já estiver habilitado no processo, sendo que o seu prazo somente tem início após o encerramento do prazo do titular da acusação.

Se não for o assistente habilitado, o recurso deverá ser interposto em 15 dias (artigo 598, CPP).

Na hipótese de sentença absolutória, ainda que esteja de acordo o Ministério Público, abre-se ao assistente a possibilidade de interposição de recurso, nos termos do artigo 271 do Código de Processo Penal, uma vez que a decisão final na instância penal poderá vincular a instância civil, a impedir a busca de uma recomposição civil dos danos causados ao patrimônio, seja moral ou econômico da vítima.

Sérgio Carlos de Souza(O papel do assistente de acusação no processo penal brasileiro, in DIREITO AO DIREITO) nos diz que:

“Como o próprio nome já demonstra, o assistente de acusação possui um principal objetivo processual, o auxílio ao Órgão acusador, o Ministério Público, na acusação de ações penais que o competem. Contudo, cumpre dizer que não basta somente o interesse do “candidato” em se tornar um assistente, devendo o Ministério Público se manifestar sobre a autorização ou não dessa “ajuda” processual, bem como a decisão do juiz, tendo como limite o trânsito em julgado do processo, recebendo a causa no estado em que se achar, conforme disposto no art. 269, do Código de Processo Penal. Logo, entende-se que não caberá o auxílio do assistente de acusação no inquérito policial, nem ao menos no processo de execução penal, não sendo cabível que atos já preclusos para o Ministério Público possam ter a intervenção do assistente de acusação. “

O assistente de acusação somente poderá ingressar de forma efetiva no processo após o oferecimento e admissão da denúncia,

O assistente pode ser admitido a qualquer momento no curso do processo, enquanto não passar em julgado a sentença (artigo 269 do CPP).

Aliás é taxativo Guilherme de Souza Nucci ( Código de processo penal comentado, 10ª edição, pág. 599) ao ensinar sobre o ingresso do assistente durante o inquérito policial e sua impossibilidade:

“Não há interesse algum do ofendido em participar das investigações preliminares ao eventual processo. Afinal, o inquérito é inquisitivo e dele nem mesmo toma parte ativa o indiciado. Logo, deve aguardar o início da ação penal para manifestar o seu interesse em dela participar.”

Lecionou, outrossim, Mirabete (obra citada, pág. 333) que “não há que falar da possibilidade de sua admissão durante o inquérito policial ou antes do procedimento da denúncia (STF, RT 637/311), embora o ofendido possa requerer a instauração do procedimento inquisitivo bem como das medidas que entender necessárias à apuração dos fatos, ficando o deferimento do pedido ao prudente critério da autoridade policial”.

Destaco o pronunciamento sobre o tema de Luciano Feldens e Andrei Schimidt (Investigação criminal e ação penal. 2ª edição. Porto Alegre: Livraria do Advogado Editora, 2007, p. 14): "Visando à colheita de elementos tendentes à elucidação da autoria e da materialidade de determinada infração penal, ostenta, como finalidade única, subsidiar futura e eventual ação penal, a ser proposta pelo Ministério Público (nos delitos de ação penal pública) ou pelo ofendido (nos crimes de ação penal de iniciativa privada). Resta realçado, portanto, seu caráter eminentemente instrumental: o inquérito policial “não faz – em sentido próprio – justiça, senão que tem como objetivo imediato garantir o eficaz funcionamento da justiça”.

O Ministério Público será ouvido previamente sobre a admissão do assistente (artigo 272 do CPP).

O assistente receberá a causa no estado em que se achar. Causa, aliás, pressupõe ação penal instaurada.

Aliás, bem lembrou Lucas André Goés Ribeiro Cavancante (O assistente de acusação na ação penal) “no processo penal, a participação da vítima deve se limitar ao fornecimento de elementos que colaborem com a resolução do caso, sem qualquer carga ideológica que vise a algum tipo de interesse pessoal.”

O papel do assistente de acusação é auxiliar o Parquet, no processo, em seu papel de órgão acusador.

O assistente de acusação habilita-se na ação penal para atuar ao lado do Ministério Público, porém sem retirar a atribuição privativa desse órgão.

Caso o Ministério Público não apresente denúncia poderá o particular, se assim entender, ajuizar ação penal privada subsidiária da pública, nas hipóteses previstas pela lei processual penal.

O assistente de acusação somente poderá ingressar de forma efetiva no processo após o oferecimento e admissão da denúncia,

Prevendo a lei a intervenção do assistente apenas na “ação pública”, ou seja, na ação condenatória, não se tem admitido, com razão, sua participação nos processos de habeas corpus.

É inadmissível a intervenção do assistente de acusação no writ que é o habeas corpus.

A propósito tenha-se:

(...) O habeas corpus não é recurso, mas ação autônoma, com fundamento constitucional (inc. LXVIII do art. 5º da Constituição da Republica), destinada à proteção da liberdade de locomoção. São sujeitos dessa relação processual, além do órgão judiciário competente para julgálo, o impetrante, o paciente, a autoridade apontada como coatora e o Ministério Público, como fiscal da lei. Não dispõe de legitimidade o assistente de acusação para intervir em habeas corpus. A jurisprudência deste Supremo Tribunal orienta-se no sentido de ser inadmissível a intervenção do assistente de acusação na ação de habeas corpus. Inexiste imposição legal de intimação do assistente do Ministério Público no habeas corpus impetrado em favor do acusado. Como antes assentado, ele não integra a relação processual instaurada nessa ação autônoma de natureza constitucional. Também não tem o assistente de acusação legitimidade para recorrer de decisões proferidas em habeas corpus, por não constar essa atividade processual no rol exaustivo do art. 271 do Código de Processo Penal.

(STF, AgRg no HC 203.737, Rel. Min. Cármen Lúcia, decisão monocrática de 31/08/2021)

PROCESSO DE ‘HABEAS CORPUS’. ASSISTENTE DO MINISTÉRIO PÚBLICO. INTERVENÇÃO. INADMISSIBILIDADE. ATIVIDADE PROCESSUAL DESSE TERCEIRO INTERVENIENTE SUJEITA A REGIME DE DIREITO ESTRITO. ATUAÇÃO AD COADJUVANDUM QUE SE LIMITA, UNICAMENTE, À PARTICIPAÇÃO EM PROCESSOS PENAIS DE NATUREZA CONDENATÓRIA. AÇÃO DE ‘HABEAS CORPUS’ COMO INSTRUMENTO DE ATIVAÇÃO DA JURISDIÇÃO CONSTITUCIONAL DAS LIBERDADES. ILEGITIMIDADE DO INGRESSO, EM REFERIDA AÇÃO CONSTITUCIONAL, DO ASSISTENTE DO MINISTÉRIO PÚBLICO. DOUTRINA. JURISPRUDÊNCIA. CONSEQÜENTE DESENTRANHAMENTO DAS PEÇAS DOCUMENTAIS QUE ESSE TERCEIRO INTERVENIENTE PRODUZIU NO PROCESSO DE ‘HABEAS CORPUS’” ( HC n. 93.033/RJ, Relator o Ministro Celso de Mello, DJe. 8.8.2011).

Em conclusão dir-se-á que descabe, pois, invocar a “assistência” no inquérito que, reitere-se, presta-se à investigação e a coleta de elementos indiciários de autoria e materialidade delitivas destinadas à formação da opinio delicti.

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