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1 de Junho de 2024

Partilha

Questões Patrimoniais

Publicado por Raquel Anjos
há 2 anos

Para falarmos em partilha, necessariamente precisamos identificar o regime de bens. Isso porque, cada regime está vinculado a encargos específicos de exclusão de comunicabilidade, que ficam fora da partilha.

Neste sentido, importante salientar que, resguardada a ordem pública, é livre aos cônjuges e companheiros a escolha do regime jurídico patrimonial, podendo, inclusive, mesclar preceitos de regimes diversos, ou mesmo, criarem um regime próprio, não previsto em lei, para seus relacionamentos.

Essa liberdade, inclusive, deve ser respeitada na constituição da união estável, acompanhando a evolução da legislação processual.

A esse respeito, vejamos o que diz o Enunciado n.º 492 do Fórum Permanente de Processualistas Civis:

492. (art. 190) “O pacto antenupcial e o contrato de convivência podem conter negócios processuais.”

Destarte, embora referida liberdade deva ser respeitada, isso não implica permitir a renúncia de todos os regimes ou, ainda, possibilitar exclusivamente o regramento de seus bens e aquestos pelo direito obrigacional ou real, pois devem, igualmente, ser respeitados os direitos de família e as relações de ordem patrimonial. [1]

Posto isto, importante classificarmos os bens como aquestos, esclarecendo que tanto as dívidas, quanto os encargos também são de responsabilidade de ambos, sendo que essa divisão de patrimônio depende de uma simples operação matemática: ativo menos passivo. [2]

Independente do regime de bens escolhido pelo casal, com exceção da separação convencional, a extinção do relacionamento causa incontestáveis impactos econômicos.

Apesar disso, imperioso salientar que a lei admite a extinção do matrimônio, através do divórcio, sem que ocorra a partilha de bens, vejamos:

Art. 1.581. “O divórcio pode ser concedido sem que haja prévia partilha de bens.”

SÚMULA N. 197, STJ: “O divórcio direto pode ser concedido sem que haja prévia partilha dos bens.”

Contudo, há impedimento legal para que o divorciado que não partilhou bens realize novo casamento (artigo 1.523, III do Código Civil), inclusive, àquele que descumpre essa recomendação é obrigatório o casamento sob o regime da separação de bens, previsto no artigo 1641, I do Código Civil.

Art. 1.523. “Não devem casar:

(...)

III - o divorciado, enquanto não houver sido homologada ou decidida a partilha dos bens do casal”;

Art. 1.641. “É obrigatório o regime da separação de bens no casamento:

I - das pessoas que o contraírem com inobservância das causas suspensivas da celebração do casamento”;

Este mesmo princípio deve ser aplicado, por recomendação doutrinária, para a união estável, quando de sua extinção, porém sem expressa previsão legal.

Ademais, quando a partilha estiver desigual e houver a necessidade de transferência de patrimônio, configurando-se a doação, incidirá o Imposto de Transmissão Causa Mortis e Doações.

Quando a partilha envolver acervo societário, no que diz respeito às cotas sociais, dependendo do regime de bens definido, inicialmente será imprescindível distinguir se elas pertencem ao casal ou apenas a um dos cônjuges ou companheiros, como bem particular. [3]

Maria Berenice Dias, defende que se o ente societário pertence a ambos, será necessário partilhar o valor do capital integralizado à data da separação de fato (quando de fato ocorre o fim do regime de bens), ainda que o regime de bens seja da comunhão parcial. [4]

Porém, se o ente societário pertence a apenas um dos cônjuges ou companheiros, o outro terá direito apenas aos frutos de bem particular, previstos no artigo 1.660, V do Código Civil, bem como à metade dos dividendos a que tem direito o sócio, não percebidos durante o período da vida comum.

Conforme preleciona Maria Berenice Dias, é possível que o cônjuge ou companheiro exija a dissolução parcial da sociedade mediante a apuração de haveres, conforme prevê o artigo 599, III do Código Civil.

Apesar disso, a teor do artigo 1.027 do Código Civil, não poderá o cônjuge ou companheiro exigir, desde logo, a parte que lhe couber na cota social, apenas concorrendo à divisão periódica dos lucros, até que se liquide a sociedade. Vejamos:

Art. 1027 “Os herdeiros do cônjuge de sócio, ou o cônjuge do que se separou judicialmente, não podem exigir desde logo a parte que lhes couber na quota social, mas concorrer à divisão periódica dos lucros, até que se liquide a sociedade”.

A respeito da EIRELI - Empresa Individual de Responsabilidade Limitada -, que é formada por apenas um sócio, destacamos o Enunciado das Jornadas de Direito Comercial da Justiça Federal:

Enunciado

"O cônjuge ou companheiro de titular de EIRELI é legitimado para ajuizar ação de apuração de haveres, para fins de partilha de bens, na forma do art. 600, parágrafo único, do Código de Processo Civil."

Justificativa

"Muito embora exista separação patrimonial entre a pessoa física e a jurídica, é iminente que se procure resguardar a meação do cônjuge que está alheio ao universo empresarial, pois necessita apurar sua parte do patrimônio, que está na empresa ou que ali se desenvolveu.

Apurar se houve onerosidade ou não na operação econômica poderá determinar, na realidade, se será partilhado o resultado que surge hipoteticamente para a disputa entre o casal. O cônjuge que administra o bem deve prepará-lo para alcançar o casal, se bem indiviso, submetido às regras de administração de um único acervo. Nesse diapasão, ao tratar de frutos, Pontes de Miranda claramente qualifica os lucros como frutos, dentro da perspectiva de que eles são proveitos econômicos que derivam da coisa 'conforme o destino que ela tem ou pode ter parte dela'."

A proposta trata de equiparar o tratamento dado à Eireli com as sociedades limitadas, tendo em vista disposição legal, bem como o fato da confusão patrimonial que pode surgir entre os dois patrimônios e, inclusive, dar margem a fraude ao cônjuge se não providenciado.

Assim, o cônjuge ou companheiro que não é sócio, apesar de não receber cotas sociais, terá direito à sua valorização, valor que será apurado a partir da separação de fato. No entanto, tal qual ocorre com os patrimônios adquiridos antes do matrimônio, se a sociedade foi constituída antes do início do período de convivência, e a valorização das cotas for decorrência de mero fenômeno econômico, e não do esforço comum dos companheiros, esta não se comunica. [5]

Importante esclarecer, ainda, que mesmo aqueles bens adquiridos por um dos cônjuges ou companheiros, logo após a separação de fato, com o emprego de recursos acumulados ao longo do período de convivência, se comunicam, impondo-se a sua divisão. Isso porque, considera-se o emprego de esforço em comum.

Por fim, quando o bem for objeto de financiamento habitacional ou alienação fiduciária, não se impõe a partilha do bem, sendo apenas atribuídos direitos e ações sobre o bem, posto que este pertence ao agente financeiro. Neste caso, reconhecesse-se, por exemplo, a exclusividade sobre os direitos decorrentes do bem por um dos cônjuges e não a propriedade em si.

Com efeito, ressaltamos que o Código Civil estipula quatro regimes de bens, sendo eles: comunhão parcial de bens, comunhão universal de bens, participação final dos aquestos e separação de bens, sendo que a escolha de qualquer regime que não seja a comunhão parcial, deve ser feita em instrumento escrito, denominado pacto antenupcial.

Por fim, alertamos sobre a possibilidade de alterar o regime de bens na constância de casamento, conforme art. 734 do Código de Processo Civil, que prevê que essa alteração, observados os requisitos legais, poderá ser requerida, motivadamente, em petição assinada por ambos os cônjuges, na qual serão expostas as razões que justificam a alteração, ressalvados os direitos de terceiros.


[1] CALMON, Rafael. Partilha de bens na separação, no divórcio e na dissolução da união estável: aspectos materiais e processuais. – 2. ed. – São Paulo : Saraiva Educação, 2018, pg. 39/40.

[2] DIAS, Maria Berenice. Manual de Direito das Famílias. 13. ed. ver. Ampl. e atual. – Salvador: Editora JusPodivm, 2020, pg. 711.

[3] DIAS, Maria Berenice. Manual de Direito das Famílias. 13. ed. ver. Ampl. e atual. – Salvador: Editora JusPodivm, 2020, pg. 724.

[4] DIAS, Maria Berenice. Manual de Direito das Famílias. 13. ed. ver. Ampl. e atual. – Salvador: Editora JusPodivm, 2020, pg. 724.

[5] DIAS, Maria Berenice. Manual de Direito das Famílias. 13. ed. ver. Ampl. e atual. – Salvador: Editora JusPodivm, 2020, pg. 727.

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