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24 de Maio de 2024
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    Recente decisão do TST que não concedeu estabilidade gestante ao contrato por prazo determinado analisada de acordo com as regras dos precedentes

    Publicado por Robson Manfre
    há 4 anos

    I - INTRODUÇÃO.

    Recentemente a Quarta Turma do Colendo Tribunal Superior do Trabalho no Recurso de Revista de nº 1001175-75.2016.5.02.0032 decidiu que a emprega em contrato em contrato de aprendizagem, que é um dos tipos do contrato por prazo determinado não tem direito à estabilidade gestante, com o fundamento de que houve superação do entendimento previsto no item III, da Súmula 244, do mesmo Tribunal Superior, pela decisão do Egrégio Supremo Tribunal Federal no RE 629.053/SP (tema 497), em 10/10/2018, com a seguinte tese firmada: A incidência da estabilidade prevista no art. 10, inc. II, do ADCT, somente exige a anterioridade da gravidez à dispensa sem justa causa.

    Entretanto, analisaremos os dois acórdãos acima indicados à luz da teoria dos precedentes, inclusive quais são os requisitos para saber se o precedente é aplicável ou não ao caso concreto, e se o Colendo Tribunal Superior do Trabalho aplicou corretamente o precedente do Egrégio Supremo Tribunal Federal.

    Mas antes de realizar este cotejo entre os julgados, devemos determinar o que é um precedente e quando ele é aplicado, e qual é sua estrutura.

    II – DOS PRECEDENTES.

    O precedente obrigatório foi primeiramente criado pela Emenda Constitucional 45/2004, também conhecida como a emenda da reforma do judiciário, criando a figura da Súmula Vinculante de competência exclusiva do Supremo Tribunal Federal, conforme disciplinado no artigo 103-A, da Constituição Federal, que foi regulamentada pela Lei 11.417/2006 que disciplinou a edição, revisão e cancelamento de súmula vinculante pelo Supremo tribunal Federal.

    O novo Código de Processo Civil de 2015 ampliou os precedentes obrigatórios criando um microssistema previsto nos artigos 926 a 928.

    Mais precisamente no artigo 927, do Código de Processo Civil enumera os precedentes que são de observação obrigatória pelos julgadores, os quais são:

    - as decisões do Supremo Tribunal Federal em controle concentrado de constitucionalidade;

    - os enunciados de súmula vinculante;

    - os acórdãos em incidente de assunção de competência ou de resolução de demandas repetitivas e em julgamento de recursos extraordinário e especial repetitivos;

    - os enunciados das súmulas do Supremo Tribunal Federal em matéria constitucional e do Superior Tribunal de Justiça em matéria infraconstitucional;

    - a orientação do plenário ou do órgão especial aos quais estiverem vinculados.

    Ocorre que, este rol não é exaustivo, mas apenas exemplificativo como bem apontado pela doutrina:

    Mas esse rol não é exaustivo.

    Embora não conste na listagem da lei, os precedentes cujo entendimento é consolidado na súmula de cada um dos tribunais (ainda que não seja tribunal superior) tem força obrigatória em relação ao próprio tribunal e aos juízes a eles vinculados. Daí a previsão do art. 926, CPC, quanto ao dever genérico de os tribunais brasileiros uniformizarem sua jurisprudência, mantendo-a estável, íntegra e coerente; isso permitirá a edição de súmula que consolide sua jurisprudência dominante, observando-se o procedimento traçado em seu regimento interno.[1]

    Tanto que o rol não é exaustivo que o Tribunal Superior do Trabalho na IN 39/2016, incluiu outros procedentes em seu artigo 15.[2]

    A obrigatoriedade de observância dos precedentes está previsto não somente nos artigos 926 a 928, do CPC, mas também no artigo 489, § 1º, inciso VI, do Código de Processo Civil, que declara que não será considerada não fundamentada uma decisão que não seguir os precedentes nele indicados.

    Pode ainda a lide ser julgada liminarmente improcedente caso o pedido contrarie um precedente, nos termos do artigo 332, do Código de Processo Civil.

    E a decisão pode ser omissa caso não aplique um precedente, nos termos do parágrafo único do artigo 1.022, do Código de Processo Civil.

    III – DA ANÁLISE DO PRECEDENTE.

    Para se analisar se um precedente é aplicável ou não a demanda deve se verificar os fatos e fundamentos jurídicos (ratio decidendi) que embasaram a criação deste precedente, conforme preconiza o § 2º, do artigo 926, do Código de Processo Civil:

    Art. 926...

    (...)

    § 2º Ao editar enunciados de súmula, os tribunais devem ater-se às circunstâncias fáticas dos precedentes que motivaram sua criação.

    Assim, somente quando os fatos forem similares é que se aplicam os mesmo fundamentos jurídicos, daí a essência do precedente. Não pode se ater apenas aos fundamentos jurídicos ou teses descritas nos precedentes e súmulas.

    A doutrina assim também tem se posicionado:

    A invocação de um precedente pressupõe e recomenda que sejam consideradas as circunstâncias de fato em que foi construído, para que só se aplique a causas em que a base fática seja similar. O enunciado de súmula, em sua simplicidade, se distancia do manancial fático das decisões, cuja difusão conduziu à sua edição. Mas a aplicação dos enunciados de súmula não pode ignorar o imperativo de observância dos fatos subjacentes à causa e confrontá-los com os precedentes que geraram o enunciado sumular; isso, porém se costuma ser ignorado.[3]

    Desse modo, a aplicação do precedente, “é preciso observar os fatos que foram decisivos para que a decisão anterior fosse efetivamente prolatada e, em seguida, analisar as similaridades com o caso subsequente, especificando se os fatos categorizados que foram considerados juridicamente importantes estão presentes e quais fatos não possuem relevância par ao Direito”[4]. Impõe, portanto, a análise das diferenças entre os dois casos analisados e a verificação da importância destas a ponto de justificar a não aplicação do precedente.[5]

    Portanto, o magistrado não vai analisar somente os fundamentos de um precedente para verificar se se aplica na lide a ser decidida, mas deve analisar também se os fatos daquele precedente são semelhantes.

    IV- DECISÃO DO TST E A APLICAÇÃO DO PRECEDENTE.

    Com base no descrito acima, vamos analisar se o Colendo Tribunal Superior do Trabalho na decisão do Recurso de Revista de nº 1001175-75.2016.5.02.0032 aplicou corretamente o precedente do Egrégio Supremo Tribunal Federal (RE 629.053/SP).

    Vamos partir da análise do precedente, ou seja, do Recurso Extraordinário 629.053/SP - (tema 497), com a seguinte tese firmada: A incidência da estabilidade prevista no art. 10, inc. II, do ADCT, somente exige a anterioridade da gravidez à dispensa sem justa causa.

    Mas como verificado acima, não é somente a tese firmada que deve ser analisada para verificar se o precedente é aplicável ao caso a ser decidido, mas também os fatos que embasaram a decisão.

    Na lide decidida pelo Supremo Tribunal Federal os fatos diziam sobre a aplicação da estabilidade gestacional a uma empregada que foi dispensa sem justa causa, antes mesmo da própria empregada saber que estava grávida, e, por conseguinte, o empregador também não sabia da gravidez quando a dispensou.

    A discussão foi sobre a aplicação do item I, da Súmula 244, do C. TST, que declara: “I - O desconhecimento do estado gravídico pelo empregador não afasta o direito ao pagamento da indenização decorrente da estabilidade (art. 10, II, b do ADCT).”.

    O Supremo Tribunal Federal entendeu pela responsabilidade objetiva do empregador, e pela proteção à maternidade e ao nascituro, decidiu que a empregada não necessita saber se estava grávida quando for dispensada, nem mesmo o empregador precisa saber deste fato, mas apenas verificar a data da concepção para se verificar a estabilidade gestacional.

    Pelo que se observa em nenhum momento o Supremo Tribunal Federal analisou a estabilidade gestacional pelo contrato por temo determinado, nem mesmo os fatos não estavam sobre esta questão.

    Em nenhum momento houve a indicação do item III, da Súmula 244, do TST[6] nesta lide, que trata especificamente da estabilidade gestante no contrato por tempo determinado.

    Outrossim, no Recurso de Revista de nº 1001175-75.2016.5.02.0032, a análise era sobre a estabilidade gestante nos contratos por tempo determinado, mais precisamente no contrato de aprendizagem (que é um dos contratos de prazo determinado previsto na legislação laboral), fato que em nada se assemelha ao decido pelo Supremo Tribunal Federal no precedente analisado acima.

    Pelo contrário já é sedimentado no próprio Supremo Tribunal Federal que estabilidade gestante também se aplica ao contrato por termo determinado e também aos servidores públicos que forem contratados a título precário (RE 880417 / PR, Relator (a): Min. LUIZ FUX, Julgamento: 29/02/2016 e RE 372980 / SP, Relator (a): Min. DIAS TOFFOLI, Julgamento: 12/02/2010).

    Aliás, quem não respeitou um precedente quando decidiu a lide foi justamente a Quarta Turma do Tribunal Superior do Trabalho ao não aplicar o item III, da Súmula 244, do próprio Tribunal Superior, violando a determinação legal do microssistema de precedentes previsto no Código de Processo Civil.

    Deveria a Quarta Turma do Tribunal Superior do Trabalho aplicar a figura do distinguishing, pois o precedente não tinha o mesmo fato e fundamento jurídico a ser aplicado na lide a ser decidida, violando a determinação prevista no § 16, do artigo 896-C, da CLT, que reza:

    Art. 896-C...

    (...)

    § 16. A decisão firmada em recurso repetitivo não será aplicada aos casos em que se demonstrar que a situação de fato ou de direito é distinta das presentes no processo julgado sob o rito dos recursos repetitivos.

    A figura do distinguishing está assim disciplinada na doutrina:

    Fala-se em distinguishing (ou distinguish), quando houver distinção entre o caso concreto (em julgamento) e o paradigma, seja porque não há coincidência entre os fatos fundamentais discutidos e aqueles que serviram de base à ratio decidendi (tese jurídica) constante no procedente, seja porque, a despeito de existir uma aproximação entre eles, alguma peculiaridade no caso em julgamento afasta a aplicação do precedente.[7]

    Portanto, a Quarta Turma do TST violou o próprio precedente de Súmula 244 item III, quando decidiu pela não estabilidade gestante o contrato por prazo determinado.

    V- CONCLUSÃO.

    Pelo que se observa da decisão prolatada pela Quarta Turma do TST no Recurso de Revista de nº 1001175-75.2016.5.02.0032, e pelo cotejo desta decisão com o precedente do Recurso Extraordinário 629.053/SP - (tema 497) do Supremo Tribunal Federal, verifica que não há semelhança fática entre eles, e muito menos jurídica, estando presente a figura do distinguishing, o que impossibilitaria a aplicação pelo C. TST deste precedente, nos termos do § 16, do artigo 896-C, da CLT.

    Também ficou demonstrado que a própria Quarta Turma do TST violou um precedente ao não aplicá-lo, qual seja, o item III, da Súmula 244, do TST, que determina que deve haver a concessão da estabilidade gestante mesmo nos contratos por prazo determinado.

    BIBLIOGRAFIA:

    Consolidação das Leis do Trabalho – Decreto-Lei 5.452/1943;

    Código de Processo Civil – Lei 13.105/2015;

    Instrução Normativa 39/2016 do Tribunal Superior do Trabalho;

    DIDIER JR., Fredie. BRAGA, Paula Sarno e OLIVEIRA, Rafael Alexandria de. Curso de Direito Processual Civil: Teoria da Prova, Direito Probatório, Decisão, Precedente, Coisa Julgada e Tutela Provisória, vol. 2, 10ª ed., Salvador: Jus Podivm, 2015;

    MIESSA, Élisson. Manual dos Recursos Trabalhistas: Teoria e Prática, 4ª ed., Salvador: Jus Podivm, 2020.


    [1] DIDIER JR., Fredie. BRAGA, Paula Sarno e OLIVEIRA, Rafael Alexandria de. Curso de Direito Processual Civil: Teoria da Prova, Direito Probatório, Decisão, Precedente, Coisa Julgada e Tutela Provisória, vol. 2, 10ª ed., Salvador: Jus Podivm, 2015, p. 461.

    [2] Art. 15. O atendimento à exigência legal de fundamentação das decisões judiciais (CPC, art. 489, § 1º) no Processo do Trabalho observará o seguinte:

    I – por força dos arts. 332 e 927 do CPC, adaptados ao Processo do Trabalho, para efeito dos incisos V e VIdo § 1º do art. 489 considera-se “precedente” apenas:

    a) acórdão proferido pelo Supremo Tribunal Federal ou pelo Tribunal Superior do Trabalho em julgamento de recursos repetitivos (CLT, art. 896-B; CPC, art. 1046, § 4º);

    b) entendimento firmado em incidente de resolução de demandas repetitivas ou de assunção de competência;

    c) decisão do Supremo Tribunal Federal em controle concentrado de constitucionalidade;

    d) tese jurídica prevalecente em Tribunal Regional do Trabalho e não conflitante com súmula ou orientação jurisprudencial do Tribunal Superior do Trabalho (CLT, art. 896, § 6º);

    e) decisão do plenário, do órgão especial ou de seção especializada competente para uniformizar a jurisprudência do tribunal a que o juiz estiver vinculado ou do Tribunal Superior do Trabalho.

    II – para os fins do art. 489, § 1º, incisos V e VI do CPC, considerar-se-ão unicamente os precedentes referidos no item anterior, súmulas do Supremo Tribunal Federal, orientação jurisprudencial e súmula do Tribunal Superior do Trabalho, súmula de Tribunal Regional do Trabalho não conflitante com súmula ou orientação jurisprudencial do TST, que contenham explícita referência aos fundamentos determinantes da decisão (ratio decidendi).

    III - não ofende o art. 489, § 1º, inciso IV do CPC a decisão que deixar de apreciar questões cujo exame haja ficado prejudicado em razão da análise anterior de questão subordinante.

    IV - o art. 489, § 1º, IV, do CPC não obriga o juiz ou o Tribunal a enfrentar os fundamentos jurídicos invocados pela parte, quando já tenham sido examinados na formação dos precedentes obrigatórios ou nos fundamentos determinantes de enunciado de súmula.

    V - decisão que aplica a tese jurídica firmada em precedente, nos termos do item I, não precisa enfrentar os fundamentos já analisados na decisão paradigma, sendo suficiente, para fins de atendimento das exigências constantes no art. 489, § 1º, do CPC, a correlação fática e jurídica entre o caso concreto e aquele apreciado no incidente de solução concentrada.

    VI - é ônus da parte, para os fins do disposto no art. 489, § 1º, V e

    VI, do CPC, identificar os fundamentos determinantes ou demonstrar a existência de distinção no caso em julgamento ou a superação do entendimento, sempre que invocar precedente ou enunciado de súmula.

    [3] DIDIER JR., Fredie. BRAGA, Paula Sarno e OLIVEIRA, Rafael Alexandria de. Curso de Direito Processual Civil: Teoria da Prova, Direito Probatório, Decisão, Precedente, Coisa Julgada e Tutela Provisória, vol. 2, 10ª ed., Salvador: Jus Podivm, 2015, p. 489.

    [4] MACÊDO, Lucas Buril de. Precedentes judiciais e o direito processual civil. Salvador: Jus Podivm, 2015, p. 353 apud MIESSA, Élisson. Manual dos Recursos Trabalhistas: Teoria e Prática, 4ª ed., Salvador: Jus Podivm, 2020, p. 627.

    [5] MIESSA, Élisson. Manual dos Recursos Trabalhistas: Teoria e Prática, 4ª ed., Salvador: Jus Podivm, 2020, p. 627.

    [6] Súmula 244 (...) III - A empregada gestante tem direito à estabilidade provisória prevista no art.100, inciso II, alínea b, do Ato das Disposições Constitucionais Transitórias, mesmo na hipótese de admissão mediante contrato por tempo determinado.

    [7] DIDIER JR., Fredie. BRAGA, Paula Sarno e OLIVEIRA, Rafael Alexandria de. Curso de Direito Processual Civil: Teoria da Prova, Direito Probatório, Decisão, Precedente, Coisa Julgada e Tutela Provisória, vol. 2, 10ª ed., Salvador: Jus Podivm, 2015, p. 491.

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