Busca sem resultado
jusbrasil.com.br
27 de Maio de 2024
  • 2º Grau
Entre no Jusbrasil para imprimir o conteúdo do Jusbrasil

Acesse: https://www.jusbrasil.com.br/cadastro

Detalhes

Processo

Órgão Julgador

4ª Câmara Cível

Publicação

Julgamento

Relator

Des. Odemilson Roberto Castro Fassa

Documentos anexos

Inteiro TeorTJ-MS_AC_00429604120128120001_b2fe5.pdf
Entre no Jusbrasil para imprimir o conteúdo do Jusbrasil

Acesse: https://www.jusbrasil.com.br/cadastro

Inteiro Teor

Tribunal de Justiça do Estado de Mato Grosso do Sul

12 de dezembro de 2018

4ª Câmara Cível

Apelação - Nº XXXXX-41.2012.8.12.0001 - Campo Grande

Relator – Exmo. Sr. Des. Odemilson Roberto Castro Fassa

Apelante : Júlia Costa de Oliveira Correa Pereira da Silva (Representado (a) por

seu Pai)

Repre. Legal : Frederico Corrêa Pereira da Silva

Advogado : Marco Antônio Ferreira Castello (OAB: 3342/MS)

Apelado : Cinemark Brasil S/A

Advogado : Marcos Alberto Sant' Anna Bitelli (OAB: 2607A/RJ)

Advogado : Gustavo José Vicente (OAB: 9773/MS)

Advogado : Alex Carlos Capura Araújo (OAB: XXXXX/SP)

E M E N T A – APELAÇÃO CÍVEL. AÇÃO DE INDENIZAÇÃO POR DANOS MORAIS. ACESSIBILIDADE A CADEIRANTE EM SALA DE CINEMA. PRELIMINAR – CERCEAMENTO DE DEFESA – AFASTADA. MÉRITO. INADEQUAÇÃO DO LOCAL DE ACESSO A PORTADOR DE DEFICIÊNCIA – ATO ILÍCITO – DANO MORAL CONFIGURADO. RECURSO CONHECIDO E PROVIDO.

Comprovado o ato ilícito referente à inadequação do local de acesso ao portador de necessidade especial, é presumido o dano moral decorrente da conduta do requerido, sendo necessária a fixação de indenização.

Analisadas as condições econômicas das partes, o valor arbitrado a título de danos morais deve ser fixado de forma a reparar o sofrimento da vítima e penalizar o causador do dano, respeitando a proporcionalidade e razoabilidade.

Os honorários de sucumbência serão fixados considerando-se o princípio da razoabilidade, bem como o grau de zelo do profissional, o lugar de prestação do serviço, a natureza e importância da causa, o trabalho realizado pelo advogado e o tempo exigido para o seu serviço, nos termos do § 2º do art. 85 do CPC.

A C Ó R D Ã O

Vistos, relatados e discutidos estes autos, acordam os juízes da 4ª Câmara Cível do Tribunal de Justiça, na conformidade da ata de julgamentos, por unanimidade, em parte com o parecer, rejeitar a preliminar e dar provimento ao recurso, nos termos do voto do Relator.

Campo Grande, 12 de dezembro de 2018.

Tribunal de Justiça do Estado de Mato Grosso do Sul

R E L A T Ó R I O

O Sr. Des. Odemilson Roberto Castro Fassa.

Júlia Costa de Oliveira Correa Pereira da Silva interpôs recurso de Apelação em face da sentença proferida em 19.07.2017, por Zidiel Infantino Coutinho, Juiz da 5ª Vara Cível da Comarca de Campo Grande que, na ação de indenização por danos morais ajuizada em desfavor de Cinemark Brasil S/A , julgou improcedentes os pedidos iniciais.

Em razões recursais (f. 232-251), argui preliminarmente cerceamento de defesa, haja vista que pugnou pela realização de provas testemunhal, pericial e documental, mas o pedido foi rejeitado pelo magistrado a quo.

Alega que é cadeirante e a requerida Cinemark não cumpriu com as exigências de melhorias que deveriam ser realizadas até 03.12.2008, conforme Decreto n. 5.296/2004.

Aduz que "se existe uma obrigação de atuação do fornecedor em atender determinados requisitos, dando-lhe um prazo de 48 meses, quatro anos, é evidente que, dentro desse prazo, a sua rebeldia em cumprir a determinação legal não se constitui ilícito".

Enfatiza que o Ministério Público Estadual instaurou inquérito civil, realizando Termo de Ajustamento de Conduta com a apelada, a qual se obrigou a realizar as adaptações necessárias ao atendimento da pessoa com deficiência.

Sustenta que à f. 172 há o requerimento de reforma do estabelecimento, protocolado na Prefeitura em 24.06.2013. Porém, os fatos narrados na inicial ocorreram antes do TAC firmado entre a requerida e o Ministério Público, em evidente ilícito civil.

Sustenta que o TAC não tem efeito ex tunc para afastar a ilicitude da requerida.

Destaca que teve que assistir o filme em lugar inadequado, primeira fileira, o que acarretava dores nas costas e coluna, bem como sua exclusão social, pois estava longe de seus primos e amigos, não podendo compartilhar a pipoca e as emoções do filme.

Menciona que tal situação lhe trouxe tristezas e angustias, configurando dano moral e não mero desgosto.

Aponta que a omissão voluntária da requerida, que deixou de realizar as adequações necessárias frente aos deficientes, enseja o dever de indenizar.

Requer o conhecimento e provimento do recurso para reformar a sentença e condenar a requerida à reparação por danos morais no valor de R$100.000,00 (cem mil reais).

O apelado apresentou contrarrazões (f. 255-267), pugnando pelo desprovimento do recurso.

Em parecer, a representante da Procuradoria-Geral de Justiça manifestou-se pelo parcial provimento do recurso (f. 285-299).

Tribunal de Justiça do Estado de Mato Grosso do Sul

V O T O

O Sr. Des. Odemilson Roberto Castro Fassa. (Relator)

Trata-se de recurso de Apelação interposto por Júlia Costa de Oliveira Correa Pereira da Silva , em face da sentença proferida em 19.07.2017, pelo Juiz da 5ª Vara Cível da Comarca de Campo Grande que, na ação de indenização por danos morais ajuizada em desfavor de Cinemark Brasil S/A , julgou improcedentes os pedidos iniciais.

Confira-se o dispositivo da sentença (f. 207-214):

"Assim, diante do exposto e de tudo mais que dos autos consta, julgo improcedente o pedido contido na Ação de Indenização por Danos Morais que JULIA COSTA DE OLIVEIRA CORREA PEREIRA DA SILVA promove em face de CINEMARK BRASIL S.A.

Em razão da sucumbência, condeno a autora ao pagamento de custas processuais e honorários advocatícios os quais arbitro em 10% (dez por cento) do valor atualizado da condenação, cuja cobrança resta suspensa por ser a autora beneficiária da assistência judiciária gratuita (art. 98, § 3º, CPC).

Declara-se extinto este feito, com resolução do mérito, nos termos do artigo 487, inciso I, do Código de Processo Civil.

Publique-se. Registre-se. Intime-se. Cumpra-se."

A sentença foi complementada com a decisão dos embargos de declaração (f. 225-227):

"Em razão da sucumbência, condeno a autora ao pagamento de custas processuais e honorários advocatícios os quais arbitro em 10% (dez por cento) do valor atualizado atribuído à causa, cuja cobrança resta suspensa por ser a autora beneficiária da assistência judiciária gratuita (art. 98, § 3º, CPC)".

Em razões recursais (f. 232-251), argui preliminarmente cerceamento de defesa, haja vista que pugnou pela realização de provas testemunhal, pericial e documental, mas o pedido foi rejeitado pelo magistrado a quo.

Alega que é cadeirante e a requerida Cinemark não cumpriu com as exigências de melhorias que deveriam ser realizadas até 03.12.2008, conforme Decreto n. 5.296/2004.

Aduz que "se existe uma obrigação de atuação do fornecedor em atender determinados requisitos, dando-lhe um prazo de 48 meses, quatro anos, é evidente que, dentro desse prazo, a sua rebeldia em cumprir a determinação legal não se constitui ilícito".

Enfatiza que o Ministério Público Estadual instaurou inquérito civil, realizando Termo de Ajustamento de Conduta com a apelada, a qual se obrigou a realizar as adaptações necessárias ao atendimento da pessoa com deficiência.

Sustenta que à f. 172 há o requerimento de reforma do estabelecimento, protocolado na Prefeitura em 24.06.2013. Porém, os fatos narrados na inicial ocorreram antes do TAC firmado entre a requerida e o Ministério Público, em

Tribunal de Justiça do Estado de Mato Grosso do Sul

evidente ilícito civil.

Sustenta que o TAC não tem efeito ex tunc para afastar a ilicitude da requerida.

Destaca que teve que assistir o filme em lugar inadequado, primeira fileira, o que acarretava dores nas costas e coluna, bem como sua exclusão social, pois estava longe de seus primos e amigos, não podendo compartilhar a pipoca e as emoções do filme.

Menciona que tal situação lhe trouxe tristezas e angustias, configurando dano moral e não mero desgosto.

Aponta que a omissão voluntária da requerida, que deixou de realizar as adequações necessárias frente aos deficientes, enseja o dever de indenizar.

Requer o conhecimento e provimento do recurso para reformar a sentença e condenar a requerida à reparação por danos morais no valor de R$100.000,00 (cem mil reais).

O apelado apresentou contrarrazões (f. 255-267), pugnando pelo desprovimento do recurso.

Em parecer, a representante da Procuradoria-Geral de Justiça manifestou-se pelo parcial provimento do recurso (f. 285-299).

Relato da demanda

A autora relata na inicial que é cadeirante e que, quando tinha 12 (doze) anos de idade, teve dificuldades em assistir a filmes na rede de cinemas Cinemark, no Shopping Campo Grande, localizado nesta Capital, pois na sala de cinema, só há lugares para cadeirantes na primeira fila, por ausência de rampas e cadeiras adequadas, que dificultavam que se sentasse com seus genitores e amigos. Apontou que na primeira fileira ficava com o pescoço torto e olhando para cima, em situação desconfortável. Ressaltou que o constrangimento é ainda maior quando tira férias escolares e vai ao cinema com primos e amigos, mas não pode sentar com os mesmos e compartilhar da pipoca e o filme. Destacou a necessidade de respeito ao Decreto n. 5.296/2004, normas ABNT NBR 9050/2004, Lei Federal n. 10.098/2000, bem como os artigos 227 e 244, ambos da Constituição Federal. Requereu a reparação por danos morais no valor de R$100.000,00 (cem mil reais). Juntou documentos à f. 17-23.

Em contestação (f. 28-44), a requerida pugnou a improcedência do pedido.

Impugnação à contestação (f. 118-123).

O Ministério Público Estadual manifestou-se pela designação de audiência de instrução de julgamento (f. 204-205).

Sobreveio a sentença de improcedência.

Preliminar

Cerceamento de defesa

Tribunal de Justiça do Estado de Mato Grosso do Sul

"Art. 355. O juiz julgará antecipadamente o pedido, proferindo sentença com resolução de mérito, quando:

I - não houver necessidade de produção de outras provas".

Conclui-se, portanto, que ao juiz é permitido a prolação de sentença quando entender que as provas carreadas aos autos são suficientes para a formação de seu convencimento.

Nesse sentido:

"E M E N T A – APELAÇÃO CÍVEL – EMBARGOS À EXECUÇÃO – PRELIMINAR DE CERCEAMENTO DE DEFESA – AFASTADA – CAPITALIZAÇÃO DE JUROS MENSAL – POSSIBILIDADE – ALEGAÇÃO DE EQUÍVOCO NO VALOR DESDE A PRIMEIRA PARCELA – CONTRATO CRISTALINO E PERFEITAMENTE INDICATIVO QUANTO ÀS COBRANÇAS – TAXAS E ENCARGOS COBRADOS DENTRO DOS LIMITES LEGAIS – COMPENSAÇÃO DE HONORÁRIOS – DISCUSSÃO QUE SE TORNA INÓCUA ANTE A SUCUMBÊNCIA NA TOTALIDADE DA PARTE EMBARGANTE – LIMITAÇÃO DOS JUROS REMUNERATÓRIOS AFASTADAS – MANUTENÇÃO DO QUE FOI ENTABULADO NO CONTRATO É uníssono o entendimento de que, no Processo Civil Brasileiro, o juiz é o destinatário da prova e cabe ao julgador indeferir as provas desnecessárias à solução do conflito . Não há qualquer ilegalidade na cobrança da capitalização de juros em periodicidade mensal, desde que devidamente pactuada no contrato e segundo os ditames legais. Em respeito à taxa média de mercado divulgada como índice para o mês da celebração do contrato, os juros remuneratórios devem permanecer fixados tal como no contrato de f. 24, pois a taxa de juros remuneratórios prevista no contrato sub examine não excede a taxa média praticada para o mesmo período. Não pode a parte embargante alegar que excesso da cobrança desde a primeira parcela, se desde a assinatura do contrato teve plena ciência dos valores que iria pagar. Ainda mais, se utilizou-se do empréstimo e, somente depois disso quer valer-se de tal alegação para se furtar ao seu correto pagamento". (destacado)

(TJMS. Apelação n. XXXXX-19.2013.8.12.0001, Campo Grande, 1ª Câmara Cível, Relator (a): Des. João Maria Lós, j: 16/05/2017, p: 17/05/2017)

"E M E N T A – APELAÇÃO CÍVEL. AÇÃO DE CONCESSÃO DE AUXÍLIO-ACIDENTE POR ACIDENTE DE TRABALHO. PRELIMINAR DE CERCEAMENTO DE DEFESA – AFASTADA. MÉRITO. PEDIDO DE CONCESSÃO DE AUXÍLIO-ACIDENTE – AUSÊNCIA DOS REQUISITOS – INCAPACIDADE LABORAL PARCIAL NÃO CONSTATADA. RECURSO NÃO PROVIDO. O juiz é o destinatário das provas, podendo indeferir as provas que reputar desnecessárias para o deslinde da causa, sem que configure cerceamento de defesa . Não comprovada a perda ou redução da capacidade para o trabalho, não há falar-se em concessão do benefício auxílio-acidente". (destacado)

(TJMS. Apelação n. XXXXX-40.2014.8.12.0020, Rio Brilhante, 4ª Câmara Cível, Relator (a): Des. Odemilson Roberto Castro Fassa, j: 07/12/2016, p: 09/12/2016)

Tribunal de Justiça do Estado de Mato Grosso do Sul

A apelante sustenta que o julgamento antecipado da demanda cerceou seu direito de defesa, de modo que a produção de provas pleiteada comprovariam as limitações suas limitações físicas e seriam indispensáveis ao deslinde fo feito (f. 250).

Ocorre que, conforme consta na própria sentença, o apelado não impugnou as alegações da autora, o que tornou a matéria fática incontroversa. Tanto é que o cinema, ora apelado, admitiu em sede de contestação que os lugares reservados para cadeirantes nas salas de exibição de filmes estão localizados na primeira fileira de assentos e que a empresa está empreendendo diligências para se adequar às supervenientes normas de acessibilidade.

A controvérsia está em averiguar se essa localização do espaço reservado para cadeirantes, que, conforme alega a autora, supostamente a impede de desfrutar da companhia de seus primos e amigos, configuraria ato ilícito apto a ensejar dano moral, ou se a situação experimentada pela autora se trata de simples aborrecimento, considerando que não houve falha na prestação do serviço pelo requerido.

Desse modo, verifica-se que a produção de provas postulada pela autora é desnecessária para formar o convencimento do magistrado. Isso porque as limitações e/ou dificuldades da apelante, por se tratar de cadeirante, são presumidas, não dependendo de prova os fatos notórios (art. 374, I, do CPC/2015).

Se não bastasse isso, o Procedimento Administrativo juntado pelo Ministério Público à f. 163-188 demonstra a necessidade de adaptação das salas de cinema de acordo com as normas de acessibilidade.

São suficientes, portanto, os documentos juntados pelas partes, não há falar-se em cerceamento de defesa.

Mérito

A matéria devolvida em sede de apelação cinge-se à análise de eventual dano causado à apelante.

Responsabilidade civil

No Direito Civil, a regra é a responsabilidade subjetiva, de modo que o dever de reparar exige a ocorrência de fato lesivo, causado por ação ou omissão culposa, dano patrimonial ou moral e nexo de causalidade entre o dano e a conduta do agente causador do dano.

Nesse sentido o teor do art. 186 e 927, ambos do CC/2002:

"Art. 186. Aquele que, por ação ou omissão voluntária, negligência ou imprudência, violar direito e causar dano a outrem, ainda que exclusivamente moral, comete ato ilícito."

"Art. 927. Aquele que, por ato ilícito (arts. 186 e 187), causar dano a outrem, fica obrigado a repará-lo."

Tribunal de Justiça do Estado de Mato Grosso do Sul

sentido amplo) é dispensada, sendo adotada a responsabilização na modalidade objetiva 2 .

Na hipótese dos autos, tem-se a existência de relação de consumo, de modo a incidir também o regramento do Código de Defesa do Consumidor.

Por corolário, incidindo o CDC, a requerida responde objetivamente pelos danos causados , não sendo necessário perquirir o elemento culpa, segundo disposição do artigo 14 do Código de Defesa do Consumidor.

Confira-se:

"Art. 14. O fornecedor de serviços responde, independentemente da existência de culpa, pela reparação dos danos causados aos consumidores por defeitos relativos à prestação dos serviços, bem como por informações insuficientes ou inadequadas sobre sua fruição e riscos.

§ 1º O serviço é defeituoso quando não fornece a segurança que o consumidor dele pode esperar, levando-se em consideração as circunstâncias relevantes, entre as quais:

I - o modo de seu fornecimento;

II - o resultado e os riscos que razoavelmente dele se esperam;

III - a época em que foi fornecido.

§ 2º O serviço não é considerado defeituoso pela adoção de novas técnicas.

§ 3º O fornecedor de serviços só não será responsabilizado quando provar:

I - que, tendo prestado o serviço, o defeito inexiste;

II - a culpa exclusiva do consumidor ou de terceiro.

No que se refere às pessoas portadoras de deficiência, a Constituição Federal de 1988 elenca uma série de dispositivos que visam a protegê-las, dentre os quais, citam-se:

"Art. 3º. Constituem objetivos fundamentais da República Federativa do Brasil:

(...)

IV - promover o bem de todos, sem preconceitos de origem, raça, sexo, cor, idade e quaisquer outras formas de discriminação".

"Art. 5º. Todos são iguais perante a lei, sem distinção de qualquer natureza, garantindo-se aos brasileiros e aos estrangeiros residentes no País a inviolabilidade do direito à vida, à liberdade, à igualdade, à

Tribunal de Justiça do Estado de Mato Grosso do Sul

segurança e à propriedade, nos termos seguintes: (...)".

" Art. 23. É competência comum da União, dos Estados, do Distrito Federal e dos Municípios:

(...)

II - cuidar da saúde e assistência pública, da proteção e garantia das pessoas portadoras de deficiência;"

" Art. 227 . É dever da família, da sociedade e do Estado assegurar à criança e ao adolescente, com absoluta prioridade, o direito à vida, à saúde, à alimentação, à educação, ao lazer, à profissionalização, à cultura, à dignidade, ao respeito, à liberdade e à convivência familiar e comunitária, além de colocá-los a salvo de toda forma de negligência, discriminação, exploração, violência, crueldade e opressão.

§ 1º O Estado promoverá programas de assistência integral à saúde da criança e do adolescente, admitida a participação de entidades não governamentais e obedecendo os seguintes preceitos:

(...)

II - criação de programas de prevenção e atendimento especializado para os portadores de deficiência física, sensorial ou mental, bem como de integração social do adolescente portador de deficiência, mediante o treinamento para o trabalho e a convivência, e a facilitação do acesso aos bens e serviços coletivos, com a eliminação de preconceitos e obstáculos arquitetônicos.

(...)

§ 2º A lei disporá sobre normas de construção de logradouros e edifícios de uso público e de fabricação de veículos de transporte coletivo, a fim de garantir o acesso adequado às pessoas portadoras de deficiência".

"Art. 244. A lei disporá sobre a adaptação dos logradouros, dos edifícios de uso público e dos veículos de transporte coletivo atualmente existentes a fim de garantir acesso adequado às pessoas portadoras de deficiência, conforme o disposto no art. 227, 2º".

O Decreto n. 5.296/2004, responsável por regulamentar a Lei n. 10.048/2000, na qual dá prioridade de atendimento às pessoas que especifica, bem como a Lei n. 10.098/2000, que estabelece normas gerais e critérios básicos para a promoção da acessibilidade das pessoas portadoras de deficiência ou com mobilidade reduzida, dispõe que:

"Art. 23. Nos teatros, cinemas, auditórios, estádios, ginásios de esporte, locais de espetáculos e de conferências e similares, serão reservados espaços livres para pessoas em cadeira de rodas e assentos para pessoas com deficiência ou com mobilidade reduzida , de acordo com a capacidade de lotação da edificação, conforme o disposto no art. 44 § 1º, da Lei 13.146, de 2015.

(...)

§ 3º Os espaços e os assentos a que se refere este artigo deverão situar-se em locais que garantam a acomodação de um acompanhante

Tribunal de Justiça do Estado de Mato Grosso do Sul

ao lado da pessoa com deficiência ou com mobilidade reduzida, resguardado o direito de se acomodar proximamente a grupo familiar e comunitário ". (destacado)

No mesmo sentido, o Estatuto da Pessoa com Deficiência (Lei n. 13.146/2015):

Art. 44. Nos teatros, cinemas, auditórios, estádios, ginásios de esporte, locais de espetáculos e de conferências e similares, serão reservados espaços livres e assentos para a pessoa com deficiência , de acordo com a capacidade de lotação da edificação, observado o disposto em regulamento.

§ 1º Os espaços e assentos a que se refere este artigo devem ser distribuídos pelo recinto em locais diversos, de boa visibilidade , em todos os setores, próximos aos corredores, devidamente sinalizados, evitando-se áreas segregadas de público e obstrução das saídas, em conformidade com as normas de acessibilidade.

(...)

§ 3º Os espaços e assentos a que se refere este artigo devem situarse em locais que garantam a acomodação de, no mínimo, 1 (um) acompanhante da pessoa com deficiência ou com mobilidade reduzida, resguardado o direito de se acomodar proximamente a grupo familiar e comunitário . (destacado)

Do conjunto legislativo, vê-se que a finalidade é assegurar a superação de desvantagens decorrentes de limitações de ordem pessoal, cujo objetivo primordial é a efetiva inclusão dos portadores de deficiência na sociedade, em respeito aos princípios da isonomia e da dignidade da pessoa humana.

Na espécie, evidente o defeito no serviço prestado pelo requerido, haja vista que a omissão em providenciar o quanto antes o adequado local lesou direito do qual a autora é titular, decorrendo o dever de indenizar.

Ainda que o requerido tenha alegado que foi inaugurado em dezembro/1999, antes da publicação da legislação específica mencionada, e ter demonstrado que vem tomando providências para se adequar às normas, conforme Procedimento Preparatório n. 14/2010 e Termo de Ajustamento de Conduta firmado com o Ministério Público Estadual (f. 60-115), o direito à acessibilidade a edificações para pessoas portadoras de necessidades especiais, principalmente a NBR 9050/2004, já era vigência há cerca de oito anos ao tempo dos fatos.

A representante da PGJ, em manifestação de f. 285-299, afirma inclusive que" a legislação foi desconsiderada pelo Cinemark até a intervenção do Ministério Público e, ainda após isso, não foi diligente em adequar, com prioridade, suas salas de cinema, tendo apresentado o projeto para melhoria do ângulo de visibilidade dos espaços para cadeirantes somente em julho/2012 (f. 90/95) ".

Dessa forma, não se podem tratar os fatos descritos pela autora como simples aborrecimentos. O conjunto probatório evidencia que a demora (omissão no caso), em providenciar a adequação das salas de exibição do cinema refletiu diretamente na dignidade da autora, pessoa portadora de deficiência.

Da análise dos autos, verifica-se que a autora juntou aos autos (f. 19-20) os comprovantes para entrada no cinema, com acompanhante. Além disso, juntou cópia da reportagem da época dos fatos em que a matéria era motivo de diversas

Tribunal de Justiça do Estado de Mato Grosso do Sul

reclamações.

Confira-se:

Tribunal de Justiça do Estado de Mato Grosso do Sul

A autora alega que por diversas vezes foi ao cinema e sentiu-se em

Tribunal de Justiça do Estado de Mato Grosso do Sul

desconforto por sentar-se longe dos amigos e/ou familiares, distanciando-se do convívio com eles quando do programa de lazer escolhido, até por conta de que nenhum deles quer assistir ao filme na primeira fileira.

Ademais o requerido não nega o ocorrido. Pelo contrário, reconhece a inadequação técnica, todavia afirma que foi inaugurado em 01/12/99 e a adaptação das salas para o ângulo de visibilidade previsto na NBR 9050/2004 geraria perda de assentos, inviabilizando o negócio do ponto de vista econômico.

Confira-se:

Foram juntados aos autos também os croquis (f. 99-102) com a planta das salas, e verifica-se que realmente o ângulo de visão onde estão localizados os assentos reservados aos portadores de deficiência ficam bem próximos à tela.

Veja-se:

Tribunal de Justiça do Estado de Mato Grosso do Sul

Tribunal de Justiça do Estado de Mato Grosso do Sul

Portanto, configurada a ilicitude da conduta, presente o dever de indenizar o dano moral pleiteado pela requerente.

Do dano moral

Segundo Maria Helena Diniz 3 , os danos morais, pela sua natureza de extrapatrimonialidade," são aqueles que atingem a esfera subjetiva da pessoa, cujo fato lesivo macula o plano dos valores da mesma em sociedade ou a sua própria integridade físico-psíquica, atingindo a sua honra, reputação, afeição, integridade física etc. ".

É inegável que o evento ocorrido causou ao requerente os sentimentos supracitados, porquanto a inadequação do ambiente gera dano moral presumido.

Nesse sentido, colaciona-se julgado:

"INDENIZATÓRIA. ACESSIBILIDADE DE CADEIRANTE À SALA DE CINEMA LOCALIZADA EM SHOPPING DA CAPITAL GAÚCHA. INVIABILIZADO O ACESSO AO PORTADOR DE DEFICIÊNCIA. PRÁTICA DE ATO ILÍCITO. VALORIZAÇÃO DO PRINCÍPIO CONSTITUCIONAL DA IGUALDADE. LESÃO À DIGNIDADE DA PESSOA HUMANA. DANOS MORAIS CONFIGURADOS NO CASO. PREPONDERÂNCIA DO CARÁTER PUNITIVO, PEDAGÓGICO E DISSUASÓRIO DA RESPONSABILIDADE CIVIL.

(TJRS. Apelação n. XXXXX, Rel.: Carlos Eduardo Richinitti, 3ª Turma Cível, j: 30/06/11, p: 13/07/11)

Constata-se que o dano exposto nos autos é daquele denominado dano moral puro , ou seja, a ofensa decorre da simples privação do consumidor de serviço essencial. Desse modo, o ofendido não necessita comprovar o efetivo dano moral, o qual se opera por força da simples violação.

A respeito disso, confira-se a lição de Sérgio Cavalieri Filho 4 :

"Se a ofensa é grave e de repercussão, por si só justifica a concessão de uma satisfação de ordem pecuniária ao lesado. Em outras palavras, o dano moral existe in re ipsa; deriva inexoravelmente do próprio fato ofensivo, de tal modo que, provada ofensa, ipso facto está demonstrado o dano moral à guisa de uma presunção natural, uma presunção hominis ou facti, que decorre das regras da experiência comum." .

Resta, assim, estabelecer o valor da indenização.

Valor da indenização

A questão atinente à quantificação do dano moral é tema de diversas discussões em âmbito doutrinário e jurisprudencial, notadamente porque o sistema

Tribunal de Justiça do Estado de Mato Grosso do Sul

jurídico não traz parâmetros legais para a determinação do quantum.

Tem prevalecido o posicionamento de se tratar de questão subjetiva que deve obediência aos princípios da razoabilidade e proporcionalidade.

Também tem destaque o entendimento no sentido de que o valor do dano deve atender a dupla finalidade: reparar o ofendido e desestimular a conduta do ofensor. Vale registrar recentes julgados do TJMS em que referido entendimento foi externado:

"E M E N T A – APELAÇÃO CÍVEL – AÇÃO COMINATÓRIA C/C INDENIZAÇÃO POR DANOS MORAIS – DANO MORAL INCONTROVERSO – QUANTUM INDENIZATÓRIO EM DESARMONIA COM OS PRINCÍPIOS DA RAZOABILIDADE E PROPORCIONALIDADE – RECURSO CONHECIDO E PROVIDO.

I – É incontroverso nos autos o ato ilícito praticado pela instituição de ensino que obstaculizou à autora o acesso às notas e provas em decorrência de débitos pretéritos. Entretanto, as circunstâncias que entremeiam a lide demonstram que o valor arbitrado pelo juízo de origem encontra-se em desarmonia com os princípios da razoabilidade e proporcionalidade, e demais decisões em casos análogos. Precedentes desta Câmara.

I – Necessária, portanto, a adequação da verba condenatória para valor que atenda satisfatoriamente a dupla finalidade da indenização por danos morais, qual seja, confortar a vítima pelo prejuízo e punir seu causador."

(TJMS - Apelação -Nº 0820856-85.2013.8.12.001 - Campo Grande - 3ª Câmara Cível - Rel. Des. Marco André Nogueira Hanson - j. em 7 de outubro de 2014) - destacado.

"E M E N T A - APELAÇÃO CÍVEL – AÇÃO DECLARATÓRIA DE INEXISTÊNCIA DE DÉBITO C/C INDENIZAÇÃO POR DANOS MORAIS – INSCRIÇÃO INDEVIDA DO NOME DA CONSUMIDORA NOS CADASTROS DE PROTEÇÃO AO CRÉDITO – DANO MORAL IN RE IPSA CONFIGURADO – QUANTUM INDENIZATÓRIO – PROPORCIONALIDADE – MANUTENÇÃO – SENTENÇA MANTIDA – RECURSO IMPROVIDO.

O constrangimento e o abalo sofridos, decorrentes de registro indevido nos órgãos de restrição ao crédito, constituem causa eficiente para ensejar direito à indenização por danos morais.

Já está assentado na doutrina e na jurisprudência que o valor da indenização fixado a título de dano moral deve atender à capacidade econômico-financeira do ofensor, de modo tal a se constituir em fator de desestímulo do ato praticado e atender, por outro lado, à intensidade do sofrimento do ofendido, à gravidade, natureza e repercussão da ofensa, sem se constituir em fonte de enriquecimento indevido à vítima."

(TJMS - Apelação -Nº 0801481-43.2014.8.12.008 - Corumbá - 4ª Câmara Cível - Rel. Des. Claudionor Miguel Abs Duarte - j. em 7 de outubro de 2014) – destacado.

Tribunal de Justiça do Estado de Mato Grosso do Sul

capacidade econômica do requerido e a jurisprudência da Corte no tocante à fixação de danos morais, fixo o quantum indenizatório em R$5.000,00 (cinco mil reais), quantia suficiente para reparar o dano sofrido.

DISPOSITIVO

Posto isso, afasto a preliminar de cerceamento de defesa, e, no mérito, dou provimento ao recurso interposto por Júlia Costa de Oliveira Correa Pereira da Silva para condenar o requerido Cinemark Brasil S/A ao pagamento de indenização a título de danos morais no valor de R$5.000,00 (cinco mil reais).

Inverto os ônus sucumbenciais e em razão da necessidade de atuação na esfera recursal, majoro os honorários advocatícios fixados em favor do advogado do autor para 15% (quinze por cento) sobre o valor da condenação, com fulcro no § 11 do art. 85 do CPC/15 5 .

D E C I S Ã O

Como consta na ata, a decisão foi a seguinte:

POR UNANIMIDADE, EM PARTE COM O PARECER, REJEITARAM A PRELIMINAR E DERAM PROVIMENTO AO RECURSO, NOS TERMOS DO VOTO DO RELATOR.

Presidência do Exmo. Sr. Des. Amaury da Silva Kuklinski

Relator, o Exmo. Sr. Des. Odemilson Roberto Castro Fassa.

Tomaram parte no julgamento os Exmos. Srs. Des. Odemilson Roberto Castro Fassa, Des. Claudionor Miguel Abss Duarte e Des. Amaury da Silva Kuklinski.

Campo Grande, 12 de dezembro de 2018.

jcm

Disponível em: https://www.jusbrasil.com.br/jurisprudencia/tj-ms/1119206062/inteiro-teor-1119206263

Informações relacionadas

Tribunal de Justiça do Rio de Janeiro
Jurisprudênciahá 2 anos

Tribunal de Justiça do Rio de Janeiro TJ-RJ - APELAÇÃO: APL XXXXX-68.2018.8.19.0210

Tribunal de Justiça de São Paulo
Jurisprudênciahá 8 anos

Tribunal de Justiça de São Paulo TJ-SP - Apelação: APL XXXXX-44.2015.8.26.0482 SP XXXXX-44.2015.8.26.0482

Tribunal de Justiça do Paraná
Jurisprudênciahá 4 anos

Tribunal de Justiça do Paraná TJ-PR - PROCESSO CÍVEL E DO TRABALHO - Recursos - Apelação: APL XXXXX-26.2018.8.16.0014 PR XXXXX-26.2018.8.16.0014 (Acórdão)

Tribunal de Justiça do Rio Grande do Sul
Jurisprudênciahá 13 anos

Tribunal de Justiça do Rio Grande do Sul TJ-RS - Recurso Cível: XXXXX RS

Tribunal de Justiça de Goiás
Jurisprudênciahá 6 anos

Tribunal de Justiça de Goiás TJ-GO - APELACAO: APL XXXXX-02.2015.8.09.0091