26 de Maio de 2024
- 2º Grau
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Detalhes
Processo
Órgão Julgador
Publicação
Julgamento
Relator
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Inteiro Teor
PODER JUDICIÁRIO
TRIBUNAL REGIONAL FEDERAL DA 3ª REGIÃO
RECURSO INOMINADO CÍVEL (460) Nº XXXXX-59.2023.4.03.6308
RELATOR: 20º Juiz Federal da 7ª TR SP
RECORRENTE: UNIÃO FEDERAL - FAZENDA NACIONAL
PROCURADOR: PROCURADORIA-REGIONAL DA FAZENDA NACIONAL DA 3ª REGIÃO
RECORRIDO: JOAO VITOR FREITAS COSTA
Advogado do (a) RECORRIDO: NILCINEI DE OLIVEIRA GOMES MOREIRA - RJ197515-A
OUTROS PARTICIPANTES:
I
RECURSO INOMINADO CÍVEL (460) Nº XXXXX-59.2023.4.03.6308
RELATOR: 20º Juiz Federal da 7ª TR SP
RECORRENTE: UNIÃO FEDERAL - FAZENDA NACIONAL
PROCURADOR: PROCURADORIA-REGIONAL DA FAZENDA NACIONAL DA 3ª REGIÃO
RECORRIDO: JOAO VITOR FREITAS COSTA
Advogado do (a) RECORRIDO: NILCINEI DE OLIVEIRA GOMES MOREIRA - RJ197515-A
OUTROS PARTICIPANTES:
R E L A T Ó R I O
Trata-se de ação objetivando a não-incidência de imposto de renda sobre os valores indenizatórios percebidos por folgas não-gozadas.
A sentença julgou procedente o pedido, declarando a inexigibilidade do crédito tributário exigido a título de imposto de renda sobre as folgas indenizadas, com condenação da União-Fazenda Nacional ao ressarcimento dos valores retidos indevidamente na fonte, com ajuste anual.
A União interpôs recurso de sentença, alegando, em síntese, regularidade de incidência do imposto de renda, considerando a natureza da atividade desempenhada pela parte autora, qual seja trabalhador marítimo (extração de petróleo) e, consequentemente, sua submissão ao regime de trabalho especial previsto na Lei nº 5.811/72. Dessa forma, alega que restaria descaracterizada a natureza indenizatória da verba percebida em função do labor, integrando, assim, o salário de contribuição para fins de incidência do Imposto de Renda da Pessoa Física.
Foram apresentadas contrarrazões.
É o relatório.
RECURSO INOMINADO CÍVEL (460) Nº XXXXX-59.2023.4.03.6308
RELATOR: 20º Juiz Federal da 7ª TR SP
RECORRENTE: UNIÃO FEDERAL - FAZENDA NACIONAL
PROCURADOR: PROCURADORIA-REGIONAL DA FAZENDA NACIONAL DA 3ª REGIÃO
RECORRIDO: JOAO VITOR FREITAS COSTA
Advogado do (a) RECORRIDO: NILCINEI DE OLIVEIRA GOMES MOREIRA - RJ197515-A
OUTROS PARTICIPANTES:
VOTO
Recebo o recurso inominado interposto porquanto tempestivo e formalmente em ordem.
No caso dos autos, a controvérsia recursal cinge-se à natureza dos valores percebidos a título de folgas não usufruídas, e a consequente incidência, ou não, do imposto de renda da pessoa física.
A parte autora alega, em apertada síntese, que os valores supracitados não configuram contraprestação e sim, indenização, razão pela qual não deveriam ser considerados para fins de incidência tributária do imposto de renda.
Por outro lado, a União sustenta a possibilidade de incidência de imposto sobre a verba indenizatória, quando identificado o acréscimo patrimonial. E afirma que cabe analisar em que condições se efetua o pagamento de valores a título de folgas indenizadas, sendo imprescindível ter em consideração o disposto na Lei 5.811/72, que trata do trabalho marítimo.
Nesse aspecto, cabe destacar o seguinte trecho da r. sentença, que decidiu a questão de maneira exauriente (ID XXXXX):
"Em matéria preliminar, observo que o autor renunciou ao valor que excede a alçada do Juizado Especial Federal (ID XXXXX).
Não há parcelas prescritas já que a incidência de imposto de renda a que dá causa ao objeto dos autos ocorreu de 2018 em diante (ID XXXXX).
Quanto ao mérito, entendo que estão isentos do Imposto de Renda na Fonte: ajuda de custo, aviso prévio indenizado, férias e respectivo terço constitucional, diárias para viagem, indenização especial, indenização por rescisão antecipada do contrato de trabalho com termo estipulado, indenização por tempo de serviço, salário família, vale transporte e vale alimentação, o montante referente aos depósitos com os acréscimos legais do FGTS, todos conforme previsão da Lei n.º 7.713/88, artigos 3º, 7º e 6º, incisos I, II, V e XX e demais incisos e Lei n.º 8.218/91, artigo 25.
Ademais, verifico que, no caso dos autos, deve ser afastado o conceito de renda e, consequentemente, a incidência do imposto de renda, em relação às folgas indenizadas uma vez que a parte autora recebeu tais valores em razão da abstenção ao descanso a que fazia jus, não configurando, portanto, um acréscimo ao patrimônio, mas apenas uma compensação pelo prejuízo em razão da privação a que se submeteu, do que resulta concluir seu caráter indenizatório.
Acerca da incidência do imposto de renda nas indenizações, ensina o professor ROQUE ANTONIO CARRAZZA, na sua obra Curso de Direito Constitucional Tributário, editora RT, 1991, 2ª edição, São Paulo, pp. 349/350, que: “Na indenização, como é pacífico, há compensação, em pecúnia, por dano sofrido. Noutros termos, o direito ferido é transformado numa quantia de dinheiro. O patrimônio da pessoa lesada não aumenta de valor, mas simplesmente é reposto no estado em que se encontrava antes do advento do gravame (status quo ante). Em apertada síntese, pois, na indenização inexiste riqueza nova. E, sem riqueza nova, não pode haver incidência do IR ou de qualquer outro imposto da competência residual da União (neste último caso, o ausência de indício de capacidade contributiva, que é o princípio que informa a tributação por meio de impostos). Logo, as indenizações não são - e nem podem vir a ser - tributáveis por meio de IR.”
O Superior Tribunal de Justiça já sumulou o entendimento do não cabimento da incidência do imposto de renda sobre o pagamento de férias não gozadas, mas indenizadas (Súmula nº 125), por entender que tais verbas trabalhistas caracterizam-se por sua natureza indenizatória.
Em sede de imposto de renda, sabe-se que, salvo comprovação de fraude a acionistas ou de distribuição disfarçada de lucros, toda e qualquer indenização constitui hipótese de não incidência, em face do conceito de renda insculpido no próprio artigo 43, incisos I e II, do CTN.
Nesse sentido, não cabe ao legislador ordinário, nesta seara, tributar ou isentar, sendo inoperante a pretensa normatividade isentiva contida no inciso V, do artigo 6º, da Lei nº 7.713/88.
Saliento que a inexigibilidade do imposto de renda sobre as verbas aventadas, em momento algum decorre da aplicação da norma isentiva referida pela União em sua defesa, mas sim, trata-se de um caso de não - incidência tributária.
A verba percebida pelo autor tem natureza meramente compensatória, por isso, não se enquadra nas hipóteses legais de incidência do imposto de renda previstas no artigo 43, inciso I e II do CTN, não consubstanciando renda, definida como o produto do capital ou do trabalho, muito menos como acréscimo patrimonial de qualquer outra espécie.
A incidência do imposto de renda deve ser apreciada segundo a sua regra matriz constitucional, o que pressupõe, para a tributação em apreço, a aquisição de disponibilidade de riqueza nova por parte do destinatário legal tributário, riqueza nova que se condensa na ideia de acréscimos patrimoniais.
Desse modo, a definição de renda traz ínsita a noção de condutas humanas que revelem mais valia, o que de pronto exclui as indenizações, pois estas por não traduzirem incremento patrimonial, mas apenas a recomposição do patrimônio lesado de quem as recebe, não dão margem à incidência do imposto de renda sobre elas.
Em regra, o trabalhador avulso presta serviços aos operadores portuários e às demais empresas que atuam no setor marítimo com a intermediação do respectivo sindicato ou associação (portos não organizados), ou do Órgão Gestor de Mão-de-Obra, criado pela Lei n.º 8.630/93 e também previsto na Lei n.º 9.719/98 (portos organizados). Ambos, sindicatos e Órgão Gestor, apenas intermediam os serviços prestados pelo trabalhador avulso aos respectivos tomadores de serviço, que podem ser operadores portuários ou não. Seja empregado ou trabalhador avulso, o contrato individual de trabalho é um contrato a título oneroso: uma parte obriga-se unicamente em vista de uma vantagem que aspira. Sendo assim, não constitui salário as atribuições econômicas que o empregado percebe do empregador, em várias situações, atribuições estas correspondentes a seu salário sem que preste o correspondente serviço. É que acontece quando está enfermo, em serviço militar, em férias, em gozo de repouso remunerado etc., em todos esses casos, não está recebendo salário, mas indenização. A importância prática do entendimento ora esboçado somente corrobora o fato de que as férias, quando não gozadas, com muito maior razão, tem natureza indenizatória, e não salarial, o que afasta a incidência do imposto de renda, a meu ver, também no caso dos avulsos, independentemente do regime de concessão das férias e da responsabilidade tributária do órgão pagador.
O desconto/recolhimento indevido foi demonstrado por documentos (ID XXXXX).
Assim, os valores relativos às folgas indenizadas, considerando-se que não foram gozadas, tendo sido substituídas por dinheiro, não configuram o fato gerador do imposto de renda, uma vez que não houve acréscimo patrimonial, mas tão-somente a indenização de um direito não usufruído e, por tais razões, tais valores devem ser restituídos à parte autora.
Posto isso, julgo extinto o processo, com resolução do mérito, com fulcro no art. 487, I, do Código de Processo Civil, pelo que julgo procedente o pedido vertido na petição inicial, a fim de declarar a inexigibilidade do crédito tributário exigido a título de imposto de renda incidente sobre as folgas indenizadas ao autor. Condeno, assim, a parte ré ao refazimento/reconstituição das declarações de ajuste anual, mediante a exclusão dos valores da base de cálculo, apurando-se o valor do imposto devido, em sede de liquidação da sentença".
Dessa forma, os fundamentos da r. sentença devem ser adotados tais como dispostos, nos termos do artigo 46 da Lei n. 9.099/1995.
A propósito, destaque-se que a jurisprudência do Supremo Tribunal Federal firmou-se no sentido de que a adoção dos fundamentos contidos na sentença pela Turma Recursal não contraria o artigo 93, inciso IX, da Constituição Federal.
Saliento ainda que as questões objeto de recurso foram devidamente analisadas, acrescentando que o juiz não está adstrito a se manifestar sobre cada ponto ventilado pelas partes.
Nesse sentido, apenas como reforço de argumentação, transcrevo o seguinte julgado proferido pela primeira turma do Superior Tribunal de Justiça, que trata, em específico, das folgas não usufruídas por trabalhador marítimo (petrolífero):
TRIBUTÁRIO. VALORES RECEBIDOS COMO COMPENSAÇÃO DE FOLGAS NÃO USUFRUÍDAS NA OPORTUNIDADE DEVIDA. CARÁTER INDENIZATÓRIO. IMPOSTO DE RENDA NÃO-INCIDÊNCIA.
I - Sendo o agravado empregado da PETROBRÁS, o regime de trabalho é o estabelecido na Lei nº 5.811/72, que regula o trabalho dos empregados nas atividades de exploração, perfuração e produção de petróleo. Como tal, o trabalho é exercido em regime de revezamento e de sobreaviso, regulado na aludida lei.
II - Na hipótese de alteração do regime de trabalho por iniciativa do empregador, seria assegurado ao empregado o direito à percepção de uma indenização (art. 9º). Com o advento da CF/88 houve redução da jornada de trabalho dos petroleiros, ante o disposto no inciso XIV do art. 7º ("jornada de seis horas para o trabalho realizado em turnos ininterruptos de revezamento, salvo negociação coletiva").
III - Se a empregadora, por dificuldades operacionais, não promoveu a imediata alteração do regime de trabalho de seus empregados, o que veio a ocorrer apenas em agosto de 1990, e, para acertar o regime de descanso não gozado, ou das ditas folgas, no período entre a promulgação da CF/88 e a data da alteração do novo regime de trabalho, foi acertado com a empregadora que esta pagaria uma indenização, (aquela prevista no art. 9º da Lei nº 5.811/72), pelos períodos de descanso não usufruídos oportunamente, esses valores correspondiam à indenização das folgas não gozadas, por necessidade do empregador, em vista do sistema de turnos que foi implantado pela empresa.
IV - Em situação como a presente, este Tribunal vem entendendo não ser possível a incidência do imposto de renda sobre os valores recebidos como compensação das folgas não usufruídas na oportunidade devida. Precedentes: REsp nº 728.376/RN, Rel. Min. JOÃO OTÁVIO DE NORONHA, DJ de 19/03/2007; REsp nº 865.729/SE, Rel.Min. ELIANA CALMON, DJ de 03/10/2006; REsp nº 781.980/RN, Rel. Min. TEORI ALBINO ZAVASCKI, DJ de 03/04/2006; REsp nº 502.197/RS, Rel. Min. FRANCISCO PEÇANHA MARTINS, DJ de 29/08/2005; e AGREsp nº 669.155/RN, Rel. Min. LUIZ FUX, DJ de 28/03/2005.
V - Agravo regimental improvido.
(AgRg no REsp XXXXX/SE, Rel. Ministro FRANCISCO FALCÃO, PRIMEIRA TURMA, julgado em 23/10/2007, DJ 19/12/2007)
Ante o exposto, NEGO PROVIMENTO ao recurso inominado interposto pela parte ré, mantendo a r. sentença pelos seus próprios fundamentos, com base no artigo 46 da Lei n. 9.099/1995.
Condeno o recorrente vencido ao pagamento de honorários advocatícios, que fixo em 10% do valor da condenação.
É como voto.
E M E N T A
DIREITO TRIBUTÁRIO. VALORES RECEBIDOS COMO COMPENSAÇÃO DE FOLGAS NÃO USUFRUÍDAS NA OPORTUNIDADE DEVIDA. CARÁTER INDENIZATÓRIO. IMPOSTO DE RENDA NÃO-INCIDÊNCIA. MANTIDA SENTENÇA. RECURSO DA PARTE RÉ DESPROVIDO.