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17 de Junho de 2024
  • 1º Grau
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TRT9 • Ação Trabalhista - Rito Ordinário • XXXXX-45.2022.5.09.0664 • 05ª VARA DO TRABALHO DE LONDRINA do Tribunal Regional do Trabalho da 9ª Região - Inteiro Teor

Detalhes

Processo

Órgão Julgador

05ª VARA DO TRABALHO DE LONDRINA

Juiz

ROBERTO JOAQUIM DE SOUZA
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PODER JUDICIÁRIO
JUSTIÇA DO TRABALHO
TRIBUNAL REGIONAL DO TRABALHO DA 9ª REGIÃO
05ª VARA DO TRABALHO DE LONDRINA
ATOrd XXXXX-45.2022.5.09.0664
RECLAMANTE: ALMIR TEIXEIRA LIMA
RECLAMADO: FRIMESA COOPERATIVA CENTRAL

SENTENÇA

Autos XXXXX-45.2022.5.09.0664

Reclamação Trabalhista – Procedimento Ordinário

Autuação: 14/03/2022

Valor: R$ 316.837,94

Parte autora: ALMIR TEIXEIRA LIMA

Parte ré: FRIMESA COOPERATIVA CENTRAL

Data: 21/06/2022

Adverte-se, inicialmente, que a numeração de páginas resulta da conversão do processo para PDF, em ordem crescente.

Vistos etc.

I - RELATÓRIO

Trata-se de reclamação trabalhista proposta por ALMIR TEIXEIRA LIMA em face de FRIMESA COOPERATIVA CENTRAL, ajuizada em 14/03/2022, na qual expõe fatos e formula pretensão, conforme rol contido na petição inicial. Requer a produção de provas e o acolhimento dos pedidos. Atribui à causa o valor de R$ 316.837,94. Junta procuração e documentos.

Contestação juntada (fls. 218-255) acompanhada de documentos, sobre os quais se manifestou o autor (317-322).

Em instrução realizada pelo sistema de registro áudio visual PJe-mídias foram ouvidas as partes e duas testemunhas (fls. 323/324).

Sem outras provas, foi encerrada a instrução processual.

Razões finais remissivas.

Tentativas conciliatórias sem êxito.

Decido.

II – FUNDAMENTAÇÃO

1. SÍNTESE DA LIDE

Busca o autor o reconhecimento judicial de que se ativou em favor da ré na condição de empregado, informando que foi admitido em 13/12/2017, sem registro na CTPS, como vendedor, mediante remuneração média mensal de R$ 3.500,00, tendo sido despedido em 26/06/2020.

Informa que no ato da admissão foi “compelido pela Reclamada a assinar contrato de representação comercial”, reputando-o, por isso, nulo.

Afirma que a ré praticou a “pejotização” com vistas a “mascarar a verdadeira relação jurídica de emprego”, pontuando que as atribuições por ele desenvolvidas coincidem com a atividade fim da ré.

Ilustra sua fundamentação mencionando que além das atividades de vendedor executava as de cobrador e outras atreladas ao SAC, sujeitando-se ao atingimento de metas e avaliações levadas a efeito por supervisor e promotor de vendas “entre outros”, anexando cópias de trocas de mensagens com a finalidade de comprovar subordinação.

Prossegue aduzindo que o roteiro de visitas era determinado pela ré, não dispondo (o autor) de clientes próprios.

Identifica no quadro fático delineado na causa de pedir a materialização da subordinação estrutural, apta a caracterizar relação de emprego.

Afirma à fl. 9 que recebia “comissões, salário, ajuda de custo, entre outros”, sem identificar, distinguir ou destacar valores, o que seria imprescindível diante dos termos da Súmula 340 do TST, máxime porque também postula o recebimento de horas extras.

De forma algo contraditória, no item 5.4 da causa de pedir, ao se referir à base de cálculo das horas extras, menciona “salário, adicional noturno e adicional de periculosidade” sem que haja afirmação de que os adicionais referidos compunham sua retribuição pecuniária.

A ré se defende atribuindo ao autor falta de legitimidade e interesse processuais.

No mérito, garante que se tratou de contrato de representação comercial, aludindo que embora celebrado em 2017 (fato incontroverso), o autor já era titular de pessoa jurídica desde o ano de 1998, atuando por 24 anos como representante comercial autônomo, por meio de sua empresa.

Que sob essa perspectiva, celebrou a ré contrato com a empresa REPRESENTAÇÕES COMERCIAIS TEIXEIRA LIMA LTDA – ME, da qual o autor é um dos sócios, com inscrição no CORE, negando qualquer relação jurídica diretamente com a pessoa natural do autor, sobretudo de índole empregatícia.

Explica que “em data pretérita à formalização do contrato de representação, a (sic) reclamante enviou à reclamada uma proposta de cadastro para representantes comerciais em nome da empresa REPRESENTAÇÕES COMERCIAIS TEIXEIRA LIMA LTDA - ME para atender a região.”.

Nega que houvesse relação de subordinação sob o prisma de contrato de emprego, esclarecendo que somente repassava instruções sobre promoções, preços, condições de pagamento que seriam aceitas, bem como sobre as características do seu produto, na forma do art. 29 da Lei nº 4886/65, eis que referido diploma atribui ao representante o dever de prestar informações à representada sempre que solicitado, pelo que a elaboração de relatórios não se confunde com controle pessoal.

Esclarece que a contraprestação ocorria exclusivamente através de comissões, a partir dos valores indicados nas notas fiscais emitidas pela empresa da qual é titular o autor.

Passo ao exame.

2. PRELIMINARES – ILEGITIMIDADE PASSIVA E FALTA DE INTERESSE DE AGIR

Há pertinência subjetiva entre os atores da relação de direito material afirmada e os sujeitos eleitos a compor a lide, sendo certo, ademais, que o provimento buscado pelo autor revela subjacente a existência de utilidade/necessidade, sobretudo sob a perspectiva do meio e forma escolhidas.

Na medida em que o autor formula pedido de reconhecimento judicial de vínculo empregatício dirigido à ré, somente ela detém legitimidade para resistir, pois ressalvadas as hipóteses legais, a ninguém é dado demandar em nome próprio direito alheio ( CPC, art. 18).

REJEITO.

3. RELAÇÃO JURÍDICA

Ouvido em Juízo, confessou o autor que constituiu uma empresa no ano de 1985.

Perguntado sobre a finalidade, respondeu que foi para “representar” uma empresa distribuidora de gomas e “drops”. Mas é certo que utilizou a expressão “eu representava”.

No final do depoimento disse que após ter se ativado em favor dessa empresa de gomas e “drops” como representante comercial, foi registrado como empregado, e que isso teria ocorrido em decorrência de uma aquisição empresarial entre os contratantes.

Não indicou outros empregos além desse, embora o lapso temporal contido nos questionamentos sempre tenha tido como ponto de partida o ano da criação de sua empresa, em 1985 (segundo a ré, 1998).

Chama atenção o fato de que com a inicial foi juntada apenas a primeira página de sua CTPS (fls. 21 e 205), deixando de anexar as demais páginas do documento que poderiam evidenciar a existência de contratos de emprego ao longo desses muitos anos (desde 1985).

Poderia, é claro, ser demonstrado o contrário: que não possui histórico recente ou longevo de ocupação laboral como empregado, enfim.

Prosseguindo na análise de seu depoimento, observa-se que declarou estar mantendo a empresa ativa, admitindo que sempre pagou os encargos correlatos, valendo-se da expressão “em dia” para noticiar situação regular.

Distinguiu as épocas em que reconhecidamente se ativou como representante comercial do período sob exame, pontuando que neste caso trabalhou com exclusividade, asseverando haver cláusula expressa no contrato a esse respeito.

Data venia, não há essa cláusula.

O que dispõe a cláusula 23ª do contrato de fl. 265 é exatamente o contrário, havendo ali expressa permissão para que a empresa contratada represente outros clientes, ressalvado, é claro, o caso de concorrência, o que é absolutamente pertinente, pois o representado não pode servir a dois interesses antagônicos ao mesmo tempo, o que se explica em básica regra de ética, sendo certo, ademais, que mesmo se houvesse disposição a exigir exclusividade do representante, essa circunstância não encontraria óbice no ordenamento jurídico e tampouco seria apta, isoladamente analisada, a imprimir natureza empregatícia ao liame.

Isso porque, como é cediço, a exclusividade não se insere no rol de requisitos para a formação de vínculo de emprego, de modo que a diferenciação estabelecida pelo autor em seu depoimento, além de contrastar os termos do contrato, em nada lhe socorreria acaso fosse verdadeira.

Disso resulta que a diferenciação a que se apega o autor para pretender ser declarado empregado, não resulta em fundamento consistente, tampouco encerra silogismo.

Ainda em depoimento relatou o autor que na celebração do contrato sob exame tratou com Vinícius (supervisor), que lhe teria dito que se tratava de contratação de representação comercial, com promessa futura de registro em CTPS.

Na sequência asseverou: “entrei como representante”, admitindo em seguida que não houve especificação, pelo suposto promitente, de data específica para que a relação se convolasse em contrato de emprego.

Essa informação não consta na petição inicial, e por corolário lógico, tampouco indicação de que o autor tenha se insurgido contra a “promessa”, elemento de conotação processual inovatória, no curso do contrato.

No relato do autor em juízo, ao revés do que dito na peça de ingresso, não há qualquer notícia de que tenha sido “compelido” a celebrar contrato de representação comercial. Ao contrário, denota-se de suas declarações que bem entendeu – e aceitou – o contrato nos moldes formalizados, e que igualmente se resignou a uma dita promessa de um suposto registro futuro, em data não fixada, aliás, sequer comprovada, além de inovatória da causa de pedir como assentado alhures.

Disso resulta que houve inequívoco “animus contrahendi” no ato da celebração do contrato e essa circunstância é de fundamental importância no deslinde da questão, pois atua no subjetivismo, na reserva mental, que devem ser contextualizados no ideal de boa-fé objetiva.

Segundo a regra do art. 422 do Código Civil, “Os contratantes são obrigados a guardar, assim na conclusão do contrato, como em sua execução, os princípios de probidade e boa-fé.”.

Essa boa-fé a que alude o legislador é a boa-fé objetiva, que não se trata de um imperativo ético abstrato, mas de norma condicionante e legitimadora de toda a experiência jurídica, servindo à interpretação dos mandamentos legais, das cláusulas contratuais e de seus tantos efeitos, constituindo condição básica para realização da Justiça.

Dito de outro modo, a boa-fé objetiva nada mais é do que o espelho do comportamento que se deseja e espera das pessoas, baseado na ética, lealdade e honestidade e no que de ordinário se observa pelo comportamento do homem médio, inclusive diante de seu histórico comportamental e laboral.

O Direito é impositivo de captação da realidade factual por inteiro, o que deve corresponder ao complexo normativo em vigor, tanto o estabelecido pelo legislador como o emergente do encontro das vontades dos contratantes.

E do relato do autor se extrai que houve, sim, por ambas as partes, o ajuste de vontades voltado à celebração de contrato de representação comercial, tratando-se de ato jurídico formal e materialmente perfeito, na forma.

Tal como previsto no art. 112 do Código Civil, “Nas declarações de vontade se atenderá mais à intenção nelas consubstanciada do que ao sentido literal da linguagem”, ou seja, o que pretenderam os contratantes tem relevante peso para o ordenamento jurídico.

No caso vertente, a reserva mental e a formalização correspondente coincidiram.

O art. 113, também do Código Civil, prescreve que “Os negócios jurídicos devem ser interpretados conforme a boa-fé e os usos do lugar de sua celebração.”.

A norma referida contém outras tantas disposições que prestam inestimável contribuição para a aferição da realidade negocial, que não pode estar sujeita a modificações futuras ao sabor da conveniência dos partícipes, assim:

“§ 1º A interpretação do negócio jurídico deve lhe atribuir o sentido que:

I - for confirmado pelo comportamento das partes posterior à celebração do negócio;

II - corresponder aos usos, costumes e práticas do mercado relativas ao tipo de negócio;

III - corresponder à boa-fé;

IV - for mais benéfico à parte que não redigiu o dispositivo, se identificável;

V - corresponder a qual seria a razoável negociação das partes sobre a questão discutida, inferida das demais disposições do negócio e da racionalidade econômica das partes, consideradas as informações disponíveis no momento de sua celebração.”.

Há, até aqui, fundamentos suficientes à rejeição das pretensões do autor.

Mas não é só.

Em depoimento o autor negou que pudesse angariar clientes ou organizar seu roteiro.

Bem, essa prerrogativa (ou falta dela) não constitui elemento definidor do contrato de representação comercial pois é da índole dessa modalidade de relação jurídica a intermediação do representado pelo representante, e nisso se esgota.

Os deveres instrumentais, as possibilidades maiores ou menores de ampliação do raio de ação (quantidade de clientes), não possui a influência imaginada.

De fato, não há lógica, nem disposição legal que o preveja, imaginar que o representante comercial deva ser portador de carteira de clientes do representado, quiçá no ato da contratação dos serviços.

Isso não faria sentido, pois é o representante quem se insere no negócio do representado, e não o contrário. Presume-se, daí, que os clientes pré-existam ao contrato de representação comercial.

E se isso não impede a angariação de novos clientes, por outro lado, essa possibilidade não transforma a relação em vínculo empregatício, pois o interesse é comum, haja vista a forma de retribuição que é atávica a essa modalidade de negócio.

Dito de outro modo, o contrato de representação comercial distingue-se também do contrato de emprego pelo seu maior grau de comutatividade.

Além disso, trata-se de relação que mitiga acentuadamente a alteridade, pois o representante trabalha por conta própria, e não por conta alheia.

Contudo, registre-se que segundo a testemunha MILTON CESAR FRIGO, que se disse representante comercial que substituiu o autor, é possível ao representante angariar novos clientes (que serão clientes da representada, e não do representante), tendo ele próprio obtido aproximadamente 50 (cinquenta) novos clientes.

Declarou o autor em juízo que todos os dias havia reuniões virtuais às 7h00, das quais participava “na frente do cliente”, mas a testemunha por ele indicada, DOUGLAS MARLON DE CASTRO BIANCONI, titubeou ao tratar do tema, primeiramente dizendo que as reuniões ocorriam diante do primeiro cliente do dia (embora virtuais), para depois mudar a versão e atestar que participava das reuniões dentro de seu veículo, estacionado no pátio do mercado Muffato.

Bem, ao largo da questão que envolve duração do trabalho – aqui há relação de prejudicialidade com o tema natureza do vínculo – a participação em reuniões não infirma, por si só, o contrato de representação comercial, pois o representante (contratado) sujeita-se às diretrizes do representado (contratante), como é intuitivo compreender.

DOUGLAS, a testemunha, vendedor registrado da ré, também estabeleceu diferença entre suas atribuições e as cometidas aos representantes comerciais, esclarecendo que ele, depoente, atende somente empresas de redes (seis, ao todo), sendo evidente que a rotina laboral neste caso é diversa daquela vivenciada pelo autor, o que se constata pela quantidade de clientes por este atendidos, pois segundo MILTON CESAR FRIGO, outra testemunha, quando este iniciou suas atividades no lugar do autor a carteira era composta por aproximadamente quarenta clientes.

O autor declarou que trabalhava “em média” até às 21h00 diariamente, atendendo aproximadamente doze clientes por dia (padarias, mercados, açougues etc.), porém, nenhuma das testemunhas o acompanhava e o horário de término dos atendimentos, segundo a primeira testemunha ouvida, não era coincidente entre os vendedores.

Além disso, a segunda testemunha ouvida, como já dito substituta do autor e com mais clientes a atender, declinou que seu expediente termina às 16h00/17h00 e que frui uma hora de intervalo.

Segundo o depoimento do autor, o supervisor controlava o horário dos vendedores, dizendo-os em número de oito, mas não soube indicar o horário de expediente desse supervisor.

Disse que o supervisor comparecia às rotas dos vendedores, mas cada um deles se rumava para destinos diferentes.

Disse não saber quanto tempo o supervisor usufruía de almoço, embora tenha dito que ele próprio (o depoente) usufruía 30min e que era controlado por aquele, o que não faz muito sentido.

Embora tenha dito que ocorria de almoçar com o supervisor – e o diz para se referir a uma forma de controle de horário - não foi firme ao esclarecer a frequência com que isso ocorria, sobretudo diante da existência de outros vendedores atrelados ao mesmo supervisor, cada qual eu sua rota.

Negou que o vendedor registrado o acompanhasse, ao contrário do que afirmado na petição inicial no item 4.3, alínea a.

O preposto declarou que foram repassados à empresa de titularidade do autor 40/45 clientes que estavam atrelados ao representante anterior, isso já no início do contrato, ressalvando que seria possível ao representante angariar novos clientes, após o crivo da empresa, o que restou demonstrado pelo depoimento da segunda testemunha, como visto.

Disse o preposto que não há cláusula de exclusividade no contrato de representação comercial, e isso também se provou eis que expresso no acervo documental adunado e não invalidado.

Também declarou o preposto que havia preferência da ré para que o trabalho fosse realizado pessoalmente pelo autor, porém, não se pode extrair disso uma confissão, na medida em que não existe vedação legal para que o representante comercial preste serviços com pessoalidade, podendo ser, inclusive, pessoa natural, ou seja, sem o uso de empresa constituída.

A discussão a respeito de estar o autor sujeito ou não à realização de cobranças de clientes e/ou atendimento aos clientes através do SAC, não se presta a desnaturar a natureza jurídica do contrato de representação comercial ou a caracterizar vínculo empregatício, pois em ambos os casos as atribuições instrumentais vinculam-se ao objeto final almejado em uma ou outra modalidade de contrato, havendo interesse convergente dos contratantes no sucesso das vendas, o que é determinado por mais de um fator estrutural.

A ré juntou contrato de representação comercial celebrado com ao autor (fls. 256-266). Não houve prova de qualquer vício em sua celebração.

Diante da existência de prova documental que confronta a natureza jurídica da relação indicada na exordial, caberia à parte autora o ônus de infirmar referido documento, por se tratar de fato constitutivo de seu direito ( CLT, art. 818, I), mas como visto pela análise completa dos demais elementos de prova, isso não ocorreu.

Dispõe o art. 1º da Lei 4.886/1965:

"Art. 1º Exerce a representação comercial autônoma a pessoa jurídica ou a pessoa física, sem relação de emprego, que desempenha, em caráter não eventual por conta de uma ou mais pessoas, a mediação para a realização de negócios mercantis, agenciando propostas ou pedidos, para, transmiti-los aos representados, praticando ou não atos relacionados com a execução dos negócios."

Já o art. da CLT empresta notável contribuição à identificação do vínculo de emprego, ao dispor que "considera-se empregador a empresa, individual ou coletiva, que, assumindo os riscos da atividade econômica, admite, assalaria e dirige a prestação de serviços".

Como se vê, a relação de emprego pressupõe a existência concomitante de certos elementos indispensáveis à sua caracterização, como pessoalidade e habitualidade na prestação dos serviços, onerosidade, alteridade e subordinação jurídica.

Amauri Mascaro do Nascimento acrescenta ainda que "será preciso ainda um elemento subjetivo, que é o animus contrahendi, isto é, o propósito de trabalhar para outrem como empregado e não com outra finalidade" (in Curso de Direito do Trabalho. 21ª ed. Revista e atualizada. São Paulo: Saraiva, 2006. p.617).

Pois bem.

É possível afirmar que a representação comercial distingue-se da relação de emprego pela autonomia do representante no desempenho das atribuições.

Há casos, entretanto, em que a relação de representação comercial aproxima-se em muito da relação de emprego, podendo com ela confundir-se.

Nesse ponto, ensina Mauricio Godinho Delgado quando trata da diferenciação entre o contrato de emprego e o contrato de representação comercial que (Curso de Direito do Trabalho, Ed. LTr, 8ª Edição, págs. 560/561):

"O operador jurídico, porém, em tais situações fronteiriças deve examinar, topicamente, os elementos que compõem a relação sociojurídica efetiva, para apreender se está diante de uma relação civil/comercial ou de uma meramente empregatícia. Trata-se, na verdade, de um exame da matéria fática, que deve ser efetivada a partir das provas trazidas a juízo e das presunções incidentes sobre o tema.

Duas grandes pesquisas sobrelevam-se nesse contexto: a pesquisa sobre a existência (ou não) da pessoalidade e a pesquisa sobre a existência (ou não) da subordinação."

Prossegue o renomado autor:

"Ressalte-se, contudo, que há outros traços que, mesmo despontando no plano concreto, não têm a aptidão de traduzir, necessariamente, a existência de subordinação. É que são aspectos comuns quer ao contrato de representação mercantil ou agência e distribuição, quer ao contrato de vendedor empregado ( CLT e Lei n. 3.207/57). São estes os traços fronteiriços usualmente identificados: remuneração parcialmente fixa; cláusula de não-concorrência; presença de diretivas e orientações gerais do representado ao representante; presença de planos específicos de atividades em função de certo produto" (pág. 562).

A onerosidade é traço comum nos contratos de emprego e contratos de representação comercial, daí porque sua presença não se presta, isoladamente, ao deslinde da questão.

Igualmente, nada impede que o contrato de representação comercial seja executado por um único representante (pessoalidade), de modo que também aqui esse elemento não é dotado de força individual para emprestar subsídio conclusivo.

Por outro lado - isso sim é relevante - não há prova consistente e convincente de que o autor tenha trabalhado de forma subordinada.

Mister frisar que nem mesmo o representante comercial, salvo autorização expressa, possui autonomia para alterar preços de produtos e conceder descontos, consoante dispõe o artigo 29 da Lei 4.886/1965.

Portanto, claro está que a autonomia e liberdade do representante comercial não é absoluta, devendo ele agir segundo os interesses do representado, que exatamente por isso possui a prerrogativa de definir estratégias de atuação e de solicitar prestação de contas, inclusive a partir de utilização de relatórios, troca de informações e orientações através de qualquer meio, até mesmo reuniões, pois ao fim e ao cabo é o seu empreendimento, nome e marca, o que deve representar o contratado sob os auspícios da Lei 4.886/1965. E além disso, tal como já dito, o interesse pelo sucesso é comum, portanto, os esforços são conjugados para atingir esse desiderato.

Seja como for, subordinação não é algo estático, possui níveis. Por isso, a mera detecção de diretrizes não terá o significado de ser equiparada à subordinação juslaboral.

Em nenhum momento evidenciou-se ingerência da ré na forma eleita pelo autor para a execução do objeto contratual, com exigências típicas da relação subordinada de emprego.

A prova documental carreada aos autos pelo autor não revela senão que atuação da ré no limites compatíveis com a natureza do contrato celebrado, de modo que não se presta a demonstrar subordinação típica de empregado, com ingerência direta do tomador no modo de execução contratual.

Na realidade, o acervo probatório integralmente examinado revelou que a tônica era o trabalho do autor sem qualquer acompanhamento, não havendo demonstração inequívoca de que devesse ele obedecer a roteiros sequenciais estabelecidos pela ré, seja em relação à identificação ou ordem dos clientes visitados.

As mensagens trocadas conformam-se ao poder de atuação da empresa representada, segundo seus interesses empresariais e comerciais, pois o contrato de representação comercial não é transferência administrativa completa da representada ao representante, que segue adstrito às diretrizes de execução contratual.

Conclui-se que não havia subordinação a não ser aquela atávica à forma de organização das vendas (através dos pedidos) a serem realizadas, o que não se confunde com a subordinação jurídica consoante a regra do art. da CLT, que tem pertinência com o modo da realização do trabalho.

Logo, não há prova de que o contrato de representação comercial havido entre autor e a ré tenha perpetrado fraude e/ou sonegação de direitos, pois ausentes os elementos fáticos configuradores do vínculo de emprego.

Ademais, o princípio da primazia da realidade, com o prestígio que deve merecer, não tem aplicação meramente unilateral, ou seja, sempre em favor de quem presta os serviços.

Postas tais premissas, declaro que entre autor e ré inexistiu vínculo de emprego, mas sim relação de trabalho “lato sensu”, materializada através de hígido contrato de representação comercial, nos termos da Lei 4.886/65.

Em razão disso, REJEITO os pedidos do item 11, números V, VI, VII, VIII, X, XI, XII, XIII, XIV, XV e XIX da inicial, já que embasados na inexistente relação de emprego.

O pedido de condenação da ré ao ressarcimento de despesas de combustível foi formulado no contexto da premissa de vínculo empregatício, não havendo na petição inicial qualquer remissão ao art. 326 do CPC (pedido subsidiário), de modo que desafia a mesma sorte dos demais. Porém, se não em prol do argumento, não logrou o autor comprovar que a ré deixou de lhe repassar a parcela prevista em contrato para suprimento de despesas e/ou que tenham remanescido diferenças. REJEITO o pedido do item 11, número IX.

4. JUSTIÇA GRATUITA

Com o advento da Lei 13.467/2017, as possibilidades de concessão da Justiça Gratuita estão reguladas nos parágrafos 3º e do art. 790 da CLT.

São duas as hipóteses: a primeira, decorre de uma presunção de carência financeira pelo trabalhador, tendo como norte o valor de seu salário (ou ganho, nas relações de trabalho “lato sensu”); a segunda, subordina-se à prova do estado de insuficiência financeira, pois a nova ordem já não se contenta, como se passava até novembro/2017, com mera declaração unilateral nesse sentido.

Com efeito, segundo a regra do parágrafo 3º do art. 790 da CLT, “É facultado aos juízes, órgãos julgadores e presidentes dos tribunais do trabalho de qualquer instância conceder, a requerimento ou de ofício, o benefício da justiça gratuita, inclusive quanto a traslados e instrumentos, àqueles que perceberem salário igual ou inferior a 40% (quarenta por cento) do limite máximo dos benefícios do Regime Geral de Previdência Social.”.

O autor comprova à fl. 331 o valor de seu salário atual, que se conforma à previsão acima, de modo que DEFIRO-LHE os benefícios da Justiça Gratuita.

5. HONORÁRIOS ADVOCATÍCIOS

Houve sucumbência integral do autor.

Porém, em decisão prolatada pelo STF na ADI 5766 do STF, ficou assentado que a não aplicação da suspensão da exigibilidade do pagamento dos honorários de sucumbência prevista no parágrafo 4º do art. 791-A da CLT, diz respeito às hipóteses em que, concomitantemente, não subsistam créditos na ação trabalhista intentada e seja o devedor dos honorários beneficiário da Justiça Gratuita.

Verifica-se na espécie completa adequação às duas hipóteses, pelo que DECLARO a inexigibilidade dos honorários advocatícios, isentando o autor do pagamento.

6. ENVIO DE OFÍCIOS (item XIX do pedido)

Não foram identificadas irregularidades cometidas pela ré que ensejem a expedição de ofício aos órgãos mencionados no exórdio.

REJEITO.

7. LITIGÂNCIA DE MÁ-FÉ

A parte ré irroga ao autor a condição de litigante temerário.

Não vislumbro má-fé na postura processual do autor, diante da complexidade do tema debatido, sendo-lhe lícita a discussão judicial dos direitos que entende ser titular.

O manejo de ação judicial, por si só, não constitui litigância de má-fé, sobretudo porque é promessa do Estado Democrático de direito (brasileiro) a realização do princípio da inafastabilidade da jurisdição, positivado no art. , XXXV da CF.

REJEITO.

III - DISPOSITIVO

Posto isso, resolvo REJEITAR as pretensões deduzidas por ALMIR TEIXEIRA LIMA, em ação trabalhista proposta em face de FRIMESA COOPERATIVA CENTRAL, na forma da fundamentação, que passa a ser parte integrante deste dispositivo.

Custas, pelo autor, devendo ser calculadas sobre o valor atribuído à causa de R$ 316.837,94, importando em R$ 6.336,75, dispensadas.

Publicação da sentença antecipada para esta data para adequação de pauta.

Intimem-se.

Nada mais.

LONDRINA/PR, 21 de junho de 2022.

ROBERTO JOAQUIM DE SOUZA
Juiz do Trabalho Substituto

Disponível em: https://www.jusbrasil.com.br/jurisprudencia/trt-9/1855905529/inteiro-teor-1855905532